APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023204-34.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ROSALINA ALVES CARVALHO
Advogado do(a) APELADO: PEDRO LUIS MENTI SANCHEZ - SP297852
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023204-34.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ROSALINA ALVES CARVALHO Advogado do(a) APELADO: PEDRO LUIS MENTI SANCHEZ - SP297852 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. A sentença proferida em 10/02/2016 julgou procedente o pedido inicial e condenou o INSS a conceder à autora o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez a partir do requerimento administrativo, 22/07/2013, com o pagamento dos valores em atraso acrescidos de correção monetária segundo a Lei nº 6.899/81, de juros de mora decrescente de 1% a.m., condenando o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a sentença. Sentença não submetida a reexame necessário. Apela INSS, argüindo preliminar de nulidade da sentença, por não ter apreciado todos os fundamentos da defesa apresentada, especificamente a questão da filiação tardia da autora. No mérito, sustenta a preexistência das patologias incapacitantes à refiliação da autora ao RGPS, além de sua idade avançada e filiação tardia, conforme conclusão do laudo pericial no sentido se tratar de patologias inerentes ao grupo etário. Alega ainda que o benefício de auxílio-doença concedido em 2013 decorreu de patologia sem relação com a doença que fundamentou a concessão da aposentadoria por invalidez, originada no ano de 2012, qual seja, insuficiência valvar mitral. Sem contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0023204-34.2017.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ROSALINA ALVES CARVALHO Advogado do(a) APELADO: PEDRO LUIS MENTI SANCHEZ - SP297852 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Inicialmente, afasto a preliminar de nulidade da sentença, pois a matéria relativa à filiação tardia da autora foi apreciada no julgado, que afastou a alegação de preexistência sob o fundamento de que o INSS não se desincumbiu do ônus de provar que o autor já era portador de doença antes de sua filiação ao RGPS, ou que a incapacidade não sobreveio por progressão ou agravamento dessa doença. No mérito, a Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado. A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante. Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego. A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado. Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários. Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado. Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;". No caso concreto. A autora, nascida em 08/04/1950, alegou na inicial encontrar-se incapacitada para suas atividades habituais por estar acometida de patologias de natureza cardíaca e ortopédicas em coluna cervical e lombar, além de osteoartrose nos pés e ombros. A presente ação foi aforada em 04/09/2013, constando do CNIS (fls. 110) que a autora, filiada como segurada facultativa, perdeu a qualidade de segurada em 31/07/2008, refiliando-se ao RGPS, na condição de segurada facultativa, em 01/07/2011. A perícia médica judicial (fls. 75), realizada em 22/09/2014, ocasião em que a parte autora contava com 64 anos de idade, constatou encontrar-se acometida de quadro de diabetes tipo II, obesidade, hipertensão arterial sistêmica, insuficiência vascular periférica e osteoartrose, concluindo pela existência de incapacidade total e permanente para as atividades habituais, fixada a data de início das doenças há 10 anos e data de início da incapacidade no ano de 2012. Observa-se do conjunto probatório que a incapacidade da parte autora deriva de patologias de natureza crônico-degenerativas, evidentemente preexistentes à sua refiliação ao RGPS, o que impossibilita a concessão do benefício. Ora, é sabido que a Previdência Social é ramo da seguridade social assemelhado ao seguro, vez que possui caráter eminentemente contributivo. O custeio do sistema pressupõe o recolhimento de contribuições para o fundo que será revertido àqueles que, preenchidos os requisitos, padecerem em eventos previstos e por ele cobertos. Para outras situações de desamparo social, previu o constituinte benefícios assistenciais que dispensam contribuições regulares (art. 6º c/c art. 203, CF). A doença ou invalidez são contingências futuras e incertas, todavia, as doenças degenerativas, evolutivas, próprias do envelhecer devem ser analisadas com parcimônia, já que filiações extemporâneas e reingressos tardios afrontam a lógica do sistema, causando desequilíbrio financeiro e atuarial. Nesse sentido, os seguintes julgados: TRF3, AC 0034800-49.2016.403.9999SP, Décima Turma, Des. Fed. NELSON PORFIRIO, Julgamento: 20/06/2017, e-DJF3 Judicial I: 29/06/2017; TRF3, AC 0000986-12.2017.403.9999 SP, Oitava Turma, Des. Fed. TANIA MARANGONI, Julgamento: 06/03/2017, e-DJF3 Judicial I: 20/03/2017. Ademais, é condição imprescindível para concessão da aposentadoria por invalidez, que no momento do surgimento da incapacidade laboral, estejam preenchidos os requisitos de qualidade de segurado e carência, conforme previsto no artigo 42, § 2º: "Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição. (...) § 2º A doença ou lesão de que o segurado já era portador ao filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social não lhe conferirá direito à aposentadoria por invalidez, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão." Logo, tratando-se de doenças preexistentes à refiliação ao RGPS, nos termos do art. 42, § 2°, da Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão do benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez postulados, pelo que de rigor a decretação da improcedência do pedido inicial. Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, de acordo com o §6º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015. Ante o exposto, rejeito a preliminar e DOU PROVIMENTO à apelação. É o voto.
DECLARAÇÃO DE VOTO
A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA: A par do respeito e da admiração que nutro pelo Ilustre Relator, dele divirjo, em parte.
Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59).
No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação.
Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei.
Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral.
No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial, concluiu que a parte autora está incapacitada de forma total e permanente para o exercício da atividade laboral, como se vê do laudo oficial.
E, nesse ponto, não há controvérsia, pois o inconformismo do INSS, em suas razões de apelo, se restringe às alegações de filiação tardia e preexistência da incapacidade.
A parte autora, quando reingressou no regime, em julho de 2011, contava com idade de 60 anos, condição esta que, se demonstrado que o início da incapacidade laborativa é posterior à nova filiação à Previdência, não é suficiente para afastar o seu direito à obtenção do benefício por incapacidade.
Não obstante a Lei nº 10.741/2003 considere idosa a pessoa com idade igual ou superior a 60 anos (artigo 1º), a idade mínima exigida para a obtenção do amparo social é de 65 anos (artigo 34). O mesmo limite etário também é exigido para a concessão do benefício de aposentadoria por idade (Lei nº 8.213/91, art. 48).
Assim, de acordo com as Leis nºs 8.213/91 e 10.741/2003, a pessoa idosa, antes dos 65 anos de idade, ainda tem condições de trabalhar e de se manter, não estabelecendo a legislação previdenciária vigente uma idade mínima para a filiação, nem qualquer restrição aos casos de ingresso no regime com mais de 60 anos.
Na verdade, o que a Lei nº 8.213/91, em seus artigos 42 e 59, veda é a concessão dos benefícios por incapacidade a pessoas que ingressaram ou reingressaram no regime já impossibilitadas de trabalhar, condição que deve ser verificada por perícia médica, não sendo suficiente, para tanto, a mera presunção.
E não há que se falar, no caso, de preexistência da incapacidade à nova filiação.
Com efeito, o perito judicial, ao concluir que a parte autora é portadora de Diabetes tipo II, Obesidade, Hipertensão arterial sistêmica controlada, Insuficiência circulatória periférica e Osteoporose e está incapacitada de forma total e permanente para o trabalho, afirmou expressamente, em seu laudo, que a incapacidade teve início em 2012, ou seja, após a nova filiação, como se vê do laudo constante de fls. 65/67, complementado à fl. 87:
"6 - Desde quando o(a) autor(a) pode ser considerado(a) incapacitado(a) para a função laborativa habitual? Tal requisito tem importância fundamental para fixação da data de início da incapacidade do(a) mesmo(a), portanto, solicita-se que na medida do possível, se fixe com base nos documentos apresentados." (fl. 44)
Resposta: "6 - 2012." (fl. 66)
"O ano de 2012 foi confirmado a incapacidade para o trabalho; pelos laudos médicos atestados pelos especialistas (cardiologista/clínico)." (fl. 87)
E, se discordava da conclusão do perito judicial, deveria o INSS impugnar o laudo e, através de seu assistente técnico, demonstrar o contrário, o que não ocorreu.
Ademais, estivesse a parte autora, antes do seu ingresso no regime, realmente incapacitada para o trabalho, como alega o INSS, este não teria indeferido a prorrogação e reconsideração requeridas em 05/06/2013 e 28/06/2013, embasando-se na ausência de incapacidade (vide fls. 15/16).
Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores.
Acompanho o voto do Relator, na parte em que rejeita a preliminar.
Ante o exposto, REJEITO a preliminar, nos termos do voto do Ilustre Relator, e, dele divergindo em parte, NEGO PROVIMENTO ao apelo e DETERMINO, DE OFÍCIO, a alteração de juros de mora e correção monetária, nos termos expendidos no voto. Mantenho, quanto ao mais, a sentença recorrida.
É COMO VOTO.
/gabivi/asato
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO NÃO COMPROVADA. INCAPACIDADE PREEXISTENTE. FILIAÇÃO TARDIA.
1. Rejeitada a preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação, pois a matéria relativa à filiação tardia da autora ao RGPS foi apreciada e afastada pelo julgado.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
2. O conjunto probatório produzido demonstra a preexistência da patologias incapacitantes à filiação da autora ao RGPS, na medida em que o laudo médico pericial judicial é categórico ao afirmar a natureza crônico degenerativa das doenças, tratando-se de patologias típicas do grupo etário, evidenciando se tratar de doenças anteriores à filiação.
3. Em se tratando de doença preexistente à refiliação ao RGPS, nos termos do art. 42, § 2°, da Lei n° 8.213/91, não preencheu a parte autora um dos requisitos legais exigidos pela legislação de regência para a concessão dos benefícios por incapacidade, a tornar inviável a concessão do benefício de auxílio doença ou aposentadoria por invalidez postulados, pelo que de rigor a decretação da improcedência do pedido inicial.
4. Inversão do ônus da sucumbência. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
5. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida.