Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003793-34.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IZABEL DOMINGUES DE LIMA ORTIGOZA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MARTINELLI - SP246930-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003793-34.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IZABEL DOMINGUES DE LIMA ORTIGOZA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MARTINELLI - SP246930-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

R E L A T Ó R I O

 

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença previdenciário, desde a data do requerimento administrativo.

O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado.

A parte autora apela, pleiteando, preliminarmente, o reconhecimento do cerceamento de seu direito de defesa, na medida em que indeferido o pedido de realização da nova perícia médica ou estudo social, que reitera. Pleiteia, ao final, a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão pretendida.

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

 THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003793-34.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IZABEL DOMINGUES DE LIMA ORTIGOZA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: ALESSANDRO MARTINELLI - SP246930-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

 

Preliminarmente, não procede a alegação de nulidade decorrente do indeferimento do pedido de realização de novo laudo médico pericial.

É notório que a incapacidade laborativa deva ser provada por laudo de perito médico.

O médico nomeado pelo juízo possui habilitação técnica para proceder ao exame pericial da parte requerente, de acordo com a legislação em vigência, que regulamenta o exercício da medicina, não sendo necessária a especialização para o diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias.

O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou nesse sentido, assim como este órgão julgador, conforme ementas transcritas a seguir:

“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DO TRABALHO. PROVA PERICIAL. DEVIDO PROCESSO LEGAL. ARTIGO 145, § 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. NOMEAÇÃO DE PERITO MÉDICO ESPECIALISTA COMO PRESSUPOSTO DE VALIDADE. NÃO CARACTERIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A pertinência da especialidade médica, em regra, não consubstancia pressuposto de validade da prova pericial. A escolha do perito médico deve ser de livre nomeação do juiz.

2. Se o perito médico nomeado não se julgar apto à realização do laudo pericial, deverá escusar-se do encargo, pois comprometido com a ciência e a ética médica.

3. No presente caso, em que o autor alega incapacidades decorrentes de diversas patologias, o juiz nomeou médico radiologista, ato que se mostra razoável, considerando que foi garantido ao periciando nova prova pericial, caso indicada a necessidade de complementação.

4. Recurso especial conhecido e não provido.”

(REsp 1514268/SP, rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, 2.ª TURMA, julgado em 19/11/2015, DJe 27/11/2015)

“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO PERICIAL. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORAL. NOVA PERÍCIA. DESNECESSIDADE. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS.

- São requisitos para a concessão de benefícios por incapacidade: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais – quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

- A ausência de incapacidade laboral do segurado para o exercício de atividades laborais habituais (temporária ou definitiva), atestada por meio de perícia médica judicial, bem como de outros elementos de prova que autorizem convicção em sentido diverso, afastam a possibilidade de concessão de benefício por incapacidade.

-  A mera irresignação do segurado com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências.

- É desnecessária a nomeação de um perito especialista para cada sintoma alegado. Precedentes.

- Apelação não provida.”

(TRF3, 9ª Turma, Apelação Cível 5922051-79.2019.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, julgado em 22/02/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 03/03/2020)

Neste processo, o laudo foi produzido por médico de confiança do juízo, que fez a devida anamnese do periciando e respondeu a todos os quesitos do juízo e das partes, respondendo ao pedido de esclarecimentos em laudo complementar, inclusive.

Além disso, conforme informou no laudo, foram analisados todos os exames e atestados médicos apresentados.

A perícia revelou-se suficiente para a formação do convencimento do juízo, revelando, a insurgência da parte autora, inconformismo insuficiente para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido.

Eventual contradição entre o laudo pericial e os atestados médicos apresentados pela parte não pode motivar a nulidade de um ou outro documento médico.

Da mesma forma, o pedido de produção de estudo social não merece guarida, por não ser o instrumento adequado a infirmar as conclusões do laudo médico pericial, no tocante às condições de saúde da postulante.

Rejeita-se, portanto, a preliminar em questão.

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA

Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida.

O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012).

Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.

"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;

V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.

§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."

A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa.

Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível o recolhimento de, pelo menos, seis meses, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios.

Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma lei, a saber:

“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:

I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”

Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida.

 

DO CASO DOS AUTOS (AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA)

A principal condição para deferimento do benefício não se encontra presente, eis que não comprovada a incapacidade para o trabalho.

Do que consta do laudo pericial anexado aos autos, a parte autora não está incapacitada para o exercício de suas atividades laborativas.

Frisou, a perita, já considerada a documentação médica particular acostada, que a parte autora foi diagnosticada como portadora do vírus HIV em 06/09/2013, quando passou a fazer uso de medicação antirretroviral, além de “antecedente de herpes zoster em membro superior direito, depressão e ansiedade”, contudo, do seu quadro clínico não decorre qualquer repercussão negativa em sua capacidade laborativa (Id. 78586220, p. 119-127).

Diante dos questionamentos formulados pela parte autora, o perito apresentou laudo complementar, no qual esclareceu que “Ter uma doença não é sinônimo de incapacidade. Há três décadas a AIDS era uma sentença de morte. Hoje, é considerada uma doença crônica. Os progressos da ciência nos campos de diagnóstico e tratamento da doença, aliados a políticas públicas de saúde no País, vêm possibilitando melhor qualidade de vida às pessoas que vivem com HIV. Os dados estatísticos confirmam uma melhoria no diagnóstico e tratamento precoces, melhor adesão e retenção das pessoas vivendo com HIV em nosso Estado. Atualmente, a morte por AIDS ocorre devido ao diagnóstico tardio ou falência terapêutica. As pessoas vivendo com HIV, com seguimento adequado em serviços especializados, podem ter qualidade de vida por tempo indeterminado. Apesar de a doença ainda não ter cura, acabou-se a época em que o diagnóstico de AIDS era sinônimo de sofrimento e morte. Os exames de carga viral e de contagem de células de. defesa do tipo CD4 mostram carga viral não detectável e aumento das células de defesa, portanto a doença está controlada, não se conseguindo detectar a presença do vírus e houve aumento das células de defesa. Periciada, mais uma vez, não apresentou exames recentes de uma pessoa que faz o seguimento adequado, preconizado pelo serviço público de saúde e disponibilizado em todas as cidades. Os cursos de formação de médicos - peritos orientam o perito a responder os quesitos de forma simples e objetiva e este perito segue os ensinamentos recebidos. Conclusão e respostas aos quesitos mantidos.” (Id. 78586220, p. 147-149).

A gravidade da patologia diagnosticada não se discute, tendo o próprio legislador conferido tratamento diferenciado por meio da isenção do requisito da carência, contudo, tendo em vista a inexistência de repercussão funcional decorrente do quadro clínico da autora, entendo não ser caso de concessão do benefício pleiteado.

Nem cabe argumentar que o juiz não se encontra vinculado ao laudo pericial, eis que não foram trazidos aos autos elementos hábeis a abalar as conclusões nele contidas.

Nesse contexto, “a mera irresignação do segurado com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório ou omisso, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências” (9.ª Turma, Apelação Cível 5897223-19.2019.4.03.9999, rel. Desembargadora Federal Daldice Santana, e - DJF3 Judicial 1 de 03/03/2020).

Forçoso, portanto, o reconhecimento da improcedência do pedido.

Posto isso, rejeito a matéria preliminar e nego provimento à apelação.

É o voto.

 
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DO LAUDO PERICIAL. INSUBISISTÊNCIA DA ALEGAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE LABORATIVA. PRESTÍGIO DO LAUDO PERICIAL JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- Insuficiência do inconformismo para gerar dúvidas quanto à integridade do documento médico produzido. Rejeição da matéria preliminar.

- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, nas hipóteses em que exigida.

- Constatada pela perícia médica a capacidade laborativa, resta indevida a concessão do benefício.

- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.