Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004929-66.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: FABIANO DE OLIVEIRA COSTA

Advogado do(a) APELANTE: ALAIN PATRICK ASCENCIO MARQUES DIAS - SP171840

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004929-66.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: FABIANO DE OLIVEIRA COSTA

Advogado do(a) APELANTE: ALAIN PATRICK ASCENCIO MARQUES DIAS - SP171840

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.

A sentença, prolatada em 06.02.2019, julgou o pedido improcedente nos termos que seguem: "Por todo o exposto, REJEITO o pedido, resolvendo o mérito -nos termos do artigo 487, I, do CPC. Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios da parte adversa, arbitrados em 10% do valor da condenação e nas custas processuais, observada à gratuidade. Restam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com natureza infringentes, importará a multa do artigo 1026, §2°, do CPC. Em caso de recurso de apelação, ciência à parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias úteis (art. 1.010 §1°do CPC). Após, subam os presentes autos ao Tribunal, com nossas homenagens e cautelas de estilo. Com o advento da Lei n° 13.105/2015, o juízo de admissibilidade é efetuado pelo juízo ad quem, na forma do artigo 1.010, § 3°, a seguir transcrito: "Após as formalidades previstas nos § 1° e 2°, os autos serão remetidos ao tribunal pelo juiz, independentemente de juízo de admissibilidade." Tendo em vista a expressa revogação do artigo 1.096 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (Provimento CO 0 0002486-55.2012.8.26.0060 - lauda 1, 17/2016), bem como a nova orientação trazida pelo Código de Processo Civil (artigo 1.010, § 3°) as Unidades Judiciais de 1° Grau estão dispensadas de efetuar o cálculo do preparo. Ciência ao Ministério Público. Transitada em julgado, arquivem-se os presentes autos, observando-se as formalidades legais. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se."

Apela a parte autora alegando para tanto que preenche os requisitos necessários para a concessão do benefício assistencial. Prequestiona, a expressa manifestação a respeito das normas legais e constitucionais aventadas.

Com contrarrazões, os autos vieram a este Tribunal.

O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento da demanda.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004929-66.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: FABIANO DE OLIVEIRA COSTA

Advogado do(a) APELANTE: ALAIN PATRICK ASCENCIO MARQUES DIAS - SP171840

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.

O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).

A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.

Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).

Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de suprimir o vício apontado.

Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.

Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.

Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica,  por analogia, a regra do parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idos0 (Lei 10.741/03),  a pedido de benefício assistencial formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.

Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.

Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitam sob o mesmo teto não integrarem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.

Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.

Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido com base nos elementos contidos no estudo social, tendo se convencido não restar configurada a condição de hipossuficiência financeira ou miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:

“Assim procedeu-se no caso em apreço, pois em análise detalhada da contenta, notadamente quanto ao requisito da hipossuficiência, observa-se, através do estudo social, que o contexto familiar vivido pelo requerente não caracteriza situação de miséria, ' capaz de permitir a concessão do benefício. Frisa-se que o autor reside em casa própria e que as despesas necessárias oriundas de sua enfermidade são fornecidas pela rede pública de saúde, de acordo com o estudo social de fis. 206/208. Com isso, depreende-se dos autos que não se verifica situação de miserabilidade, impedindo a implantação da benesse pretendida, eis que ausentes as elementares legais para a sua concessão.”

De fato, o estudo social (ID 97480917 – pág. 05/11), elaborado em 05.10.2018, revela que a parte autora reside com sua mãe e um irmão, maior de idade em imóvel próprio, de alvenaria, em péssimo estado de conservação e higiene, cobertura de amianto, sem forro, o piso é de cimento queimado rachado em diversas partes, as paredes internas e externas possuem reboco e pintura gastos, os cômodos são ventilados por janelas de ferro, e há duas saídas com porta de madeira. A casa possui cinco cômodos, sendo eles uma sala, uma cozinha, dois quartos, um banheiro, e uma área externa. Móveis e eletrodomésticos básicos e em péssimo estado de conservação. Contam com infraestrutura básica como: Energia, água encanada, rede de esgoto, asfalto e limpeza urbana.

A renda da casa advém da aposentadoria da mãe do autor no valor de um salário mínimo (R$ 957,00).

Informaram despesas com água R$ 80,10, energia elétrica R$ 104,72, alimentação R$ 300,00 e gás R$ 65,00, totalizando R$ 549,82. Medicamentos disponíveis através da rede pública.

A perita social emitiu parecer favorável, considerando a situação econômica fragilizada, que no seu entender, não possui recursos próprios para manutenção de suas necessidades básicas mensais, sendo assim é co-dependente de terceiros.

Entretanto, Em que pese a existência de eventuais dificuldades financeiras, não há evidência de que as necessidades básicas do autor não estejam sendo supridas. Nesse sentido, apura-se que a família vive em imóvel próprio que oferece o abrigo necessário, e não havendo comprovação da existência de despesas extraordinárias essências à manutenção da vida do autor, conclui-se, que as provas trazidas aos autos não foram hábeis à demonstração da impossibilidade de sustento, como exige o art. 20 da Lei 8.742/1993

Consta ainda que o grupo conta com elemento jovem e apto ao trabalho.

Ressalto que o benefício assistencial não se destina a complementar o orçamento doméstico, mas sim prover aqueles que se encontram em efetivo estado de necessidade.

Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos autos e não comprovada a condição de miserabilidade, pressuposto indispensável para a concessão do benefício, de rigor a manutenção da sentença de improcedência do pedido por seus próprios fundamentos.

Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%, devendo ser observada, se for o caso, a suspensão da exigibilidade prevista no § 3º do artigo 98 daquele Codex.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação da parte autora e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação exposta.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

APELAÇÃO CÍVEL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. HIPOSSUFICIÊNCIA/MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADA. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.  

1. O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família, nos termos dos artigos 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.

2. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência não preenchido. Laudo social indica que a parte autora encontra-se amparada pela família e não há evidência de que suas necessidades básicas não estejam sendo supridas. O benefício assistencial não se presta a complementação de renda.

3. Benefício assistencial indevido.

4. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015. Exigibilidade condicionada à hipótese prevista no § 3º do artigo 98 do Código de Processo Civil/2015.

5. Apelação da parte autora não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.