Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5026761-60.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: DIEGO HENRIQUE
PACIENTE: EMIDIO MORINIGO XIMENEZ, KLEBER GARCIA MORINIGO, JEFFERSON GARCIA MORINIGO

Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPO GRANDE/MS - 5ª VARA FEDERAL, OPERAÇÃO STATUS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5026761-60.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: DIEGO HENRIQUE
PACIENTE: EMIDIO MORINIGO XIMENEZ, KLEBER GARCIA MORINIGO, JEFFERSON GARCIA MORINIGO

Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPO GRANDE/MS - 5ª VARA FEDERAL, OPERAÇÃO STATUS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

Trata-se de Habeas Corpus, com pedido liminar, impetrado por André Gustavo Sales Damiani, Mayra Mallofré Ribeiro Carrillo e Diego Henrique, em favor de EMÍDIO MORINIGO XIMENEZ, JEFFERSON GARCIA MORINIGO e  KLEBER GARCIA MORINIGO, em razão de constrangimento ilegal oriundo de ato imputado ao r. Juízo da 5ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Campo Grande/MS (Dr. Dalton Igor Kita Conrado), que indeferiu pedido de revogação da prisão preventiva dos ora pacientes, nos autos de prisão preventiva nº 5005120-92.2019.4.03.6000, decretada no âmbito da denominada Operação Status.

A impetração alega, em síntese:

- ausência dos requisitos autorizados da medida excepcional;

- ausência de justa causa da decisão que decretou a prisão preventiva;

- ausência de contemporaneidade dos fatos que remontam o período de julho/2019 a maio/2020;

-  ilegalidade da transferência dos pacientes para o sistema penitenciário federal pelo prazo de 360 dias;

-  que a prisão cautelar decretada trata-se de cumprimento antecipado da pena;

-  que os pacientes são primários e homens de família;

- necessidade de preservação da saúde dos pacientes, pertencentes ao grupo de risco de coronavírus, com a aplicação das diretrizes fixadas no artigo 4º, I, alíneas “a” e “b” e inciso III da Recomendação 62/2020 do CNJ ,devido à condição de vulnerabilidade que apresentam. No caso, alega que os pacientes EMÍDIO MORINIGO XIMENEZ, contando com 64 anos de idade, apresenta saúde debilitada (portador de hipertensão, diabetes e usuário de medicação de uso contínuo e que se encontra em recuperação de recente cirurgia realizada na região cervical); KLEBER GARCIA MORINIGO também teria passado recentemente por cirurgia consistente na doação de parte do fígado para sua genitora, encontrando-se em recuperação e com baixa imunidade e, por fim,  JEFFERSON GARCIA MORINIGO possuiria doença renal crônica, estando sob constante acompanhamento médico.

Requer, liminarmente, a revogação da prisão cautelar dos pacientes mediante a imposição de medidas cautelares ou, ainda, a suspensão da determinação de transferência dos pacientes para presídio federal. Subsidiariamente, pleiteia a concessão de prisão domiciliar. No mérito, a confirmação da liminar com a concessão da ordem de Habeas Corpus.

A inicial veio acompanhada com documentos digitalizados.

Em sede de plantão judicial, a liminar foi indeferida (ID143077004).

As informações foram prestadas pelo r. juízo a quo (ID143292818).

O Ministério Público Federal, oficiante nesta instância, manifestou-se pela denegação da ordem (ID143362236).

É o relatório.

 

 

 


HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Nº 5026761-60.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS

IMPETRANTE: DIEGO HENRIQUE
PACIENTE: EMIDIO MORINIGO XIMENEZ, KLEBER GARCIA MORINIGO, JEFFERSON GARCIA MORINIGO

Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782
Advogados do(a) PACIENTE: MAYRA MALLOFRE RIBEIRO CARRILLO - SP219452, DIEGO HENRIQUE - SP337917, ANDRE GUSTAVO SALES DAMIANI - SP154782

IMPETRADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAMPO GRANDE/MS - 5ª VARA FEDERAL, OPERAÇÃO STATUS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS:

ID 143513178 - Diante da ausência de manifestação dos impetrantes  pela decretação do sigilo.  mantenha-se a atual classificação.

A ação de Habeas Corpus tem pressuposto específico de admissibilidade, consistente na demonstração primo ictu oculi da violência atual ou iminente, qualificada pela ilegalidade ou pelo abuso de poder que repercuta, mediata ou imediatamente, no direito à livre locomoção, conforme previsão do artigo 5º, LXVIII, da Constituição Federal e artigo 647 do Código de Processo Penal.

DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À DECRETAÇÃO DE PRISÃO PREVENTIVA

O Código de Processo Penal, em seu Título IX e, especificamente, no Capítulo III, dispõe acerca da prisão preventiva, cabendo salientar que tal instituto foi reformulado por força da edição da Lei nº 12.403, de 04.05.2011, que teve o objetivo de estabelecer que a custódia cautelar deve ser interpretada e ser decretada apenas quando não cabível no caso concreto qualquer outra medida (também de natureza cautelar) dentre aquelas elencadas no art. 319 do Diploma Processual (inteligência do art. 282, § 6º, de indicado Código, que prevê a prisão cautelar como ultima ratio),  alterada pela Lei nº13.964, de 24.12.2019.

Dentro desse contexto, mostra-se adequada a prisão cautelar quando os postulados que compõem a proporcionalidade (adequação, necessidade e proporcionalidade em sentido estrito) indicarem que a medida excepcional de constrição da liberdade antes da formação da culpa é imperiosa diante do caso concreto.

Por se revestir de natureza cautelar, a prisão preventiva somente poderá ser decretada caso presentes no caso concreto tanto o fumus boni iuris (chamado especificamente de fumus comissi delicti) como o periculum in mora (nominado especificamente de periculum libertatis), o que, a teor do art. 312 do Código de Processo Penal, consistem na necessidade de prova da materialidade delitiva e de indícios suficientes de autoria (fumus comissi delicti) e no fato de que a segregação preventiva tenha como escopo a garantia da ordem pública ou da ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou o asseguramento da aplicação da lei penal, considerando-se, ainda, o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado  (periculum libertatis). Destaque-se, outrossim, que a prisão preventiva também poderá ser imposta em decorrência do descumprimento de quaisquer das medidas constantes do art. 319 do Diploma Processual (conforme autorização expressa do parágrafo único do art. 312 do Código de Processo Penal).

Sem prejuízo do exposto, ainda que concorrentes no caso concreto os pressupostos anteriormente listados (fumus comissi delicti e periculum libertatis), faz-se necessária para a decretação da preventiva que a infração penal imputada àquele que se objetiva encarcerar cautelarmente enquadre-se nos parâmetros trazidos pelo art. 313 do Código de Processo Penal: (a) crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 anos; (b) agente já condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvado o disposto no inciso I do caput do art. 64 do Código Penal; e (c) crime envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, a criança, o adolescente, o idoso, o enfermo ou a pessoa com deficiência para garantir a execução das medidas protetivas de urgência (independentemente do quantum de pena cominada). Admite-se, ademais, a decretação da preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la (devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após sua identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida) - art. 313, parágrafo único, do Diploma Processual Penal.

Todavia, conforme comando expresso do art. 314 do Código de Processo Penal, incabível cogitar-se na segregação cautelar em análise se restar verificado pelo juiz, a teor das provas constantes dos autos, que o agente levou a efeito a infração escudado por uma das causas excludentes da ilicitude elencadas no art. 23 do Código Penal (estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito).

Importante ser dito que a privação de liberdade ora em comento pode ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou em sede de processo penal (art. 311 do Código de Processo Penal), devendo a decisão que a decretar, a substituir por outras medidas cautelares ou a denegar ser sempre motivada (seja por força do que prevê o art. 315 do Código Processual Penal, seja, principalmente, em razão do comando inserto no art. 93, IX, da Constituição Federal).

Consigne-se, por fim, que tal privação de liberdade deve ser analisada sempre com supedâneo na cláusula rebus sic stantibus, vale dizer, os pressupostos autorizadores da preventiva devem estar presentes no momento de sua decretação bem como ao longo do período de sua vigência. Nesse sentido, vide o art. 316 do Código de Processo Penal, que estabelece que o juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

DO CASO CONCRETO

Trata-se os autos subjacentes da "Operação Status", cujas investigações apontaram para a existência de um grupo criminoso organizado dedicado ao tráfico transnacional de drogas e lavagem de ativos com estrutura com diferentes núcleos de atuação.

Consta dos autos que em setembro de 2019, o Ministério Público Federal encampando parcialmente representação policial, requereu prisões temporárias e preventivas.

Em novembro de 2019, o Juízo Federal da 5ª Vara Federal indeferiu os pedidos de prisão ao argumento de insuficiência de provas de materialidade dos crimes de associação para o tráfico de drogas.

O Ministério Público Federal recorreu dessa decisão. Este Tribunal Regional Federal reconheceu a existência de indícios suficientes dos crimes de tráfico internacional de drogas e de lavagem de ativos. No entanto, o recurso em sentido estrito foi improvido ao argumento de que faltava demonstração de contemporaneidade dos fatos. A Procuradoria Regional da República opôs embargos de declaração apresentando elementos indicativos da permanência do grupo criminoso e da reiteração de atos criminosos a evidenciar a necessária contemporaneidade dos fatos para embasar prisões cautelares. 

Este relator conclui pela existência de contemporaneidade inerente à cautelaridade da prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal e da ordem pública. No entanto, acabou vencido, tendo sido negado provimento aos embargos declaratórios, sob o fundamento de que a apreciação de fatos novos apresentados em embargos declaratórios diretamente por este Tribunal caracterizaria supressão de instância (ID143038045).

A autoridade policial representou novamente pela decretação da prisão preventiva dos investigados junto ao juízo a quo  (Dra. Marcela Ascer Rossi), que em decisão fundamentada decretou a prisão preventiva dos pacientes, com fundamento na garantia da ordem pública), cumprindo destacar (ID143038038 -– p.62/75):

(...)

Trata-se de representação formulada pela Polícia Federal (ID 35530081) pela decretação da PRISÃO PREVENTIVA de JEFFERSON GARCIA MORINIGO, KLEBER GARCIA MORINIGO, EMIDIO MORINIGO XIMENEZ, ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, SLANE CHAGAS, ROBSON LOURIVAL ALCARAZ AJALA, TAIRONE CONDE COSTA, YURI RODRIGO VINCO DE OLIVEIRA, ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR e ELSON MARQUES DOS SANTOS, em virtude de todos os elementos de informação colhidos a respeito dos investigados ao longo das investigações, em especial, o Relatório de Informação da Operação Status (Julho de 2019 a Maio de 2020).

(...)

2 – DA PRISÃO PREVENTIVA – Autos nº 5005120-92.2019.4.03.6000

Cuida-se de espécie de prisão cautelar decretada pela autoridade judiciária competente, mediante representação da autoridade policial ou requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, em qualquer fase das investigações ou do processo criminal, sempre que estiverem preenchidos os requisitos legais (CPP, art. 313) e ocorrerem os motivos autorizadores listados no art. 312 do CPP, e desde que se revelem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão (CPP, art. 319).

Como toda e qualquer medida cautelar, a prisão preventiva também está condicionada à presença concomitante do fumus boni iuris, aqui denominado de fumus comissi delicti, e do periculum in mora (periculum libertatis).

Com a entrada em vigor da Lei n° 12.403/11, para além da demonstração do fumus comissi delicti, consubstanciado pela prova da materialidade e indícios suficientes de autoria ou de participação, e do periculum libertatis (garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou garantia de aplicação da lei penal), também passa a ser necessária a demonstração da ineficácia ou da impossibilidade de aplicação de qualquer das medidas cautelares diversas da prisão.

Nesse sentido, o art. 282, § 6°, do CPP, com a redação dada pela Lei nº 13.964/2019, estabelece que a prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada. Na mesma linha, o art. 310, inciso II, do CPP, autoriza a conversão da prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 do CPP, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.

Pode-se dizer, então, que o novo sistema de medidas cautelares pessoais trazido pela Lei nº 12.403/11 evidencia que as medidas cautelares diversas da prisão são preferíveis em relação à prisão preventiva, dentro da ótica de que sempre se deve privilegiar os meios menos gravosos e restritivos de direitos fundamentais. Tem-se aí a característica da preferibilidade das medidas cautelares diversas da prisão, da qual decorre a consequência de que, diante da necessidade da tutela cautelar, a primeira opção deverá ser sempre uma das medidas previstas nos arts. 319 e 320. Por outro lado, como reverso da moeda, a prisão preventiva passa a funcionar como a extrema ratio, somente podendo ser determinada quando todas as outras medidas alternativas se mostrarem inadequadas.

Portanto, o magistrado só poderá decretar a prisão preventiva quando não existirem outras medidas menos invasivas ao direito de liberdade do acusado por meio das quais também seja possível alcançar os mesmos resultados desejados pela prisão cautelar.

2.1 – Do Fumus Comissi Delicti

O fumus comissi delicti, indispensável para a decretação da prisão preventiva, vem previsto na parte final do art. 312 do CPP: prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. É indispensável, portanto, que se verifique se a conduta supostamente praticada pelo agente é típica, ilícita e culpável, apontando as provas em que se apoia sua convicção.

No tocante à materialidade, como denota a expressão “prova da existência do crime” constante do art. 312 do CPP, exige-se um juízo de certeza quando da decretação da prisão preventiva. No caso de crimes que deixam vestígios, não há falar em indispensabilidade do exame de corpo de delito para a decretação da prisão preventiva. Na verdade, como é cediço, o laudo pericial pode ser juntado durante o curso do processo, salvo nas hipóteses de drogas (laudo de constatação da natureza da droga art. 50, § 1°, da Lei n° 11.343/06) e crimes contra a propriedade imaterial (CPP, art. 525), em que o exame de corpo de delito assume condição de verdadeira condição específica de procedibilidade.

No que tange à autoria, entretanto, exige o Código a presença de “indício suficiente de autoria”. Como é cediço, a palavra indício possui dois significados. Ora é usada no sentido de prova indireta, tal qual preceitua o art. 239 do CPP, ora é usada no sentido de uma prova semiplena, ou seja, aquela com menor valor persuasivo.

É exatamente neste último sentido que a palavra indicio é usada no art. 312 do CPP, da mesma forma que ocorre no art. 126 e no art. 413 do CPP. Ou seja, indício suficiente é aquele que autoriza um prognóstico de um julgamento positivo sobre a autoria ou a participação.

Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal concluiu, no RHC 83.179/PE, de relatoria do Min. Sepúlveda Pertence (DJ 22/08/2003, p. 22) que, para a decretação da prisão preventiva, faz-se necessário a verificação de indícios de autoria, locução na qual indício não tem o sentido específico de prova indireta e eventualmente conclusivo, que lhe dá a lei (CPP, art. 239), mas, sim, o de indicação, começo de prova ou prova incompleta.

Por conseguinte, quanto à materialidade delitiva, é necessário que haja prova, certeza de que o fato existiu, sendo, neste ponto, uma exceção ao regime normal das medidas cautelares, na medida em que, para a caracterização do fumus boni iuris, há determinados fatos sobre os quais o juiz deve ter certeza, não bastando a mera probabilidade. Já no tocante à autoria delitiva, não se exige que o juiz tenha certeza desta, bastando que haja elementos probatórios que permitam afirmar a existência de indício suficiente, isto é, probabilidade de autoria, no momento da decisão, sendo a expressão “indício” utilizada no sentido de prova semiplena.

2.2 – Do Periculum Libertatis

O periculum libertatis, indispensável para a segregação preventiva, está consubstanciada em um dos fundamentos do art. 312 do CPP: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) garantia da aplicação da lei penal; d) conveniência da instrução criminal.

Por força do parágrafo 1º do art. 312 do CPP, a prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (CPP, an. 282, § 4°).

Comparando-se a redação antiga do art. 312 do CPP com a atual, que lhe foi conferida pela Lei n. 13.964/ 19, percebe=se que, na parte final do referido dispositivo, o legislador passou a exigir, para além da prova da existência do crime e indício suficiente de autoria, a presença de uma situação de perigo gerada pelo estado de liberdade do imputado. Nesse ponto em especial, não houve qualquer inovação por parte do Pacote Anticrime.

Afinal, sempre se entendeu que a decretação de toda e qualquer prisão preventiva tem como pressuposto o denominado periculum libertatis, consubstanciado numa das hipóteses já ressaltadas no caput do art. 312, ou, como dispõe o art. 282, inciso I, do CPP, quando a medida revelar-se necessária para a aplicação da lei penal, para a investigação ou instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais. É este, pois, o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado, que sempre figurou, e deverá continuar a figurar, como pressuposto indispensável para a decretação de toda e qualquer medida cautelar, ao qual deverá se somar, obviamente, o fumus comissi delicti, consubstanciado pela prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria ou de participação.

Para que a prisão preventiva seja decretada, não é necessário que o perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado esteja evidenciado com a presença concomitante de todas as hipóteses do art. 312. Basta a presença de um único destes para que o decreto prisional seja expedido. Logicamente, pode haver caso em que esteja presente mais de um fundamento (v.g., garantia da ordem pública e conveniência da instrução criminal), e com a devida fundamentação da decisão, confere-se ainda mais legitimidade à determinação judicial. Outrossim, para fins de decretação de toda e qualquer medida cautelar, o periculum libertatis que a justifica deve ser atual, presente. É dizer, não se admite a decretação de uma medida cautelar para tutelar fatos pretéritos, que não necessariamente ainda se fazem presentes por ocasião da decisão judicial em questão. É o que a doutrina chama de princípio da atualidade (ou contemporaneidade) do perigo. E dentro desse contexto que deve ser compreendida, portanto, a parte final do art. 312, §2°, incluído pela Lei n. 13.964/ 19, segundo o qual a decisão que decretar a prisão preventiva deve ser motivada e fundamentada em receio de perigo e existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que justifiquem a aplicação da medida adotada. A despeito de se tratar de regramento inédito no âmbito do Código de Processo Penal, pelo menos de maneira expressa, sua aplicação às medidas cautelares, principalmente às prisões, já era amplamente admitida pelos Tribunais Superiores.

Em síntese, pode-se dizer que, no caminho para a decretação de uma prisão preventiva, deve-se, inicialmente, verificar o tipo penal cuja prática é atribuída ao agente, aferindo, a partir do art. 313 do CPP, se o crime em questão admite a decretação da prisão preventiva. Num segundo momento, incumbe ao magistrado analisar se há elementos que apontem no sentido da presença simultânea de prova da existência do crime e de indícios suficientes de autoria (fumus comissi delicti). O último passo é aferir a presença do periculum libertatis, compreendido como o perigo concreto que a permanência do suspeito em liberdade acarreta para a investigação criminal, para o processo penal, para a efetividade do direito penal ou para a segurança social Logicamente, esses fatos que justificam a prisão preventiva devem ser contemporâneos à decisão que a decreta.

2.3 – O CASO CONCRETO – OPERAÇÃO STATUS

2.3.1 – Dos Crimes investigados

Os delitos objeto do IPL n° 116/2018-DRE/SR/PF/MS, atribuídos aos investigados, são referentes ao tráfico internacional de entorpecentes (art. 33, caput, c/c art. 40, I, da Lei nº 11.343/2006), lavagem de capitais (art. 1º, caput, §§ 1º e 2º, da Lei nº 9.613/98) e organização criminosa (art. 2º, da Lei nº 12.850/2013), todos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos, enquadrando-se no primeiro quesito de aferição do cabimento de decretação da prisão preventiva.

2.3.2 – Do fumus comissi delicti e periculum libertatis

Os elementos de informação produzidos durante as investigações demonstram a presença simultânea de prova da existência do crime e de indícios suficientes de autoria.

As investigações realizadas pela Polícia Federal foram prolíficas em trazer aos autos diversos elementos que comprovam a prática dos delitos de tráfico transnacional de entorpecentes e lavagem de capitais pela organização criminosa investigada.

Dentre eles, menciona-se alguns elementos, abordados de forma técnica e aprofundada no voto do Excelentíssimo Desembargador Federal Fausto de Sanctis, no julgamento dos recursos de apelação e em sentido estrito interpostos pelo Ministério Público Federal (ID 35481865).

Na Representação ofertada pela Autoridade Policial por meio da qual vindica por prisões cautelares, por busca e apreensão e pela indisponibilidade de bens (ID 122802552), infere-se que as investigações culminaram na conclusão, em tese, pela existência de grupo coordenado, nas atividades de tráfico de cocaína e de lavagem de dinheiro, por JEFFERSON MORINIGO, por KLEBER MORINIGO e por EMIDIO MORINIGO. Verificou-se que estas três pessoas mantêm poucos bens registrados em seus respectivos nomes (apesar de apresentarem padrão de vida bem elevado), razão pela qual existiria, em tese, uma complexa rede de “laranjas” (composta tanto por pessoas físicas como por pessoas jurídicas) com o desiderato de efetivação de movimentações financeiras e de omissão às autoridades fiscalizatórias competentes do patrimônio amealhado, em tese, em decorrência do tráfico de estupefacientes.

Quanto à existência de crime antecedentes, verificou-se que a família Morinigo possuiria envolvimento com o tráfico há muito tempo, destacando que os três principais investigados (JEFFERSON MORINIGO, KLEBER MORINIGO e EMIDIO MORINIGO) ostentariam condenações pelo mencionado delito.

Apontou-se também a ocorrência de apreensões de cargas de cocaína decorrentes direta ou indiretamente desta Operação, que confirmariam o envolvimento dos Morinigo com o tráfico:

- flagrante realizado em 09 de outubro de 2018 (Inquérito Policial nº 437/2018), com a prisão de RENATO HERNANI DE MORAES MENDES, de GERSON GARCIA e de EVERTON LUIZ COSTA DE OLIVEIRA - 119 quilos de cocaína transportados nos tanques de caminhonetes Toyota Hilux, e todos com a peculiaridade dos veículos terem sido transferidos para os nomes dos condutores dias antes do flagrante. Descortinou-se que GERSON GARCIA é irmão de ANA MARIA GARCIA MORINIGO, que, por sua vez, é mãe de JEFFERSON GARCIA MORINIGO; já RENATO é casado com ELYZANDRA ANTÔNIA MAGALHÃES BEZERRA, que, por sua vez, é irmã de ELIZANGELA MARIA MAGALHÃES BEZERRA, que é esposa de JEFFERSON GARCIA MORINIGO. Sem prejuízo do exposto, segundo a Autoridade Policial, RENATO já teria constado como formal proprietário de diversos veículos, em tese, pertencentes ao grupo, possuiria registros de hospedagem realizados em conjunto com os líderes da organização e teria transmitido declaração de Imposto de Renda do mesmo terminal que JEFFERSON MORINIGO, KLEBER MORINIGO, ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, SILVANA LIMA, JOSIANE AZAMBUJA GUERINI, RODRIGO LIMA VILHANUEVA e KELEE CRISTINA PINESSO já o teriam feito. Ressaltou, ademais, o Delegado Federal que, após as apreensões realizadas em decorrência do flagrante ora em comento, os “MORINIGO” teriam convocado reunião com a presença de diversos membros da suposta organização criminosa com o fito de, possivelmente, definir a forma de atuação do grupo após os fatos e a mudança de residência de alguns para a cidade paraguaia de Pedro Juan Caballero;

flagrante realizado em 25 de outubro de 2018 (Inquérito Policial nº 457/2018), com a prisão de EDIMAR HELENO DE PAULA, pelo transporte de 33,7 kg (trinta e três quilos e setecentos gramas) de cocaína ocultos no tanque de combustível do veículo VW/Amarok que conduzia (com o detalhe de que o automotor encontrava-se registrado em seu próprio nome);

- flagrante realizado em 23 de janeiro de 2019, com a prisão de RONDINELE DA SILVA DE JESUS, pelo transporte de 170,9 kg (cento e setenta quilos e novecentos gramas) de cocaína em fundo falso existente no assoalho do compartimento de carga do caminhão de placas NRZ-1520, veículo este que, em tese, pertenceria à “Empresa Tratto” que teria sido constituída de forma fictícia por ELSON MARQUES DOS SANTOS e por ELSON MARQUES DOS SANTOS JÚNIOR com o fito, segundo relato policial, de possibilitar a criação de uma história a dar cobertura ao transporte de estupefaciente realizado pelo grupo criminoso.

Outro ponto apurado que reforça o envolvimento dos Morinigo com o tráfico seria a existência de uma espécie de “auxílio-reclusão” não previdenciário pago, em tese, pelos “MORINIGO”, consistente na conduta de se arcar mensal ou bimestralmente com as despesas de manutenção dos familiares de indivíduos presos em decorrência do tráfico de drogas. Houve a juntada de planilha indicativa de tais “mesadas” com a indicação de, ao menos, 18 (dezoito) beneficiários, sendo que o mais antigo remontava ao ano de 2007 (havendo, ademais, indicação a fatos ocorridos nos anos de 2011, 2014, 2015, 2016, 2017, 2018 e 2019).

Além dos líderes JEFFERSON MORINIGO, KLEBER MORINIGO e EMIDIO MORINIGO, as investigações apontaram outros integrantes da organização criminosa, dentre os quais destacam-se:

i) ELTON VELASQUE MORINIGO, sobrinho de EMIDIO MORINIGO. Possuiria, a teor das interceptações telefônicas realizadas, contato direto com os líderes da organização, em tese, criminosa, tendo por função transmitir ordens aos demais membros operacionais do grupo e participar do transporte do entorpecente. Teria demonstrado preocupação ao longo do dia em que realizado o flagrante de 09 de outubro de 2018 ante a demora de RENATO HERNANI DE MORAES MENDES, de GERSON GARCIA e de EVERTON LUIZ COSTA DE OLIVEIRA em chegarem ao endereço de destino. Teria transmitido aos demais envolvidos, após a prisão de 09 de outubro de 2018, ordem para que “parassem tudo”. Colheu-se, ademais, ligação em que haveria o relato de envolvimento em um acidente com uma motocicleta quando dirigia um caminhão que estaria carregado de droga. Guardaria vínculo com ALDO GRANCE MORINIGO, tendo sido interceptado diálogo em que ambos tratariam do atraso, por parte da organização (em tese) criminosa, no pagamento por serviços prestados;

ii) ALDO GRANCE MORINIGO, sobrinho de EMIDIO MORINIGO e primo de ELTON VELASQUE MORINIGO. Seu envolvimento, em tese, com a traficância decorreria, por exemplo, de diálogo que teria sido interceptado, mantido com sua esposa nos idos de 09 de outubro de 2018, no qual teria ordenado que ela saísse imediatamente de casa em razão do receio de que a residência fosse alvo de alguma diligência policial. Teria sido interceptada, também, ligação mantida com ELTON VELASQUE MORINIGO (sobre possível atraso de pagamento pelos serviços prestados) e outras em que mencionaria o envolvimento de JEFFERSON MORINIGO. Colheu-se, ademais, outra ligação em que teria havido a menção de que estaria proibido de ir até o barracão-sede da “JG CONSTRUTORA”, o que permitiria a conclusão de que haveria preocupação, por parte dos líderes da organização (em tese) criminosa, de que os membros operacionais (ou seja, ligados diretamente à traficância) fossem vistos nos mesmos locais frequentados pelos líderes. Inferiu-se, segundo noticiado pelo Delegado, a existência de publicação de imagens em rede social (“Facebook”) nas quais ALDO estaria na companhia tanto de EMIDIO MORINIGO como de KLEBER MORINIGO;

iii) RONDINELE DA SILVA DE JESUS e NELIDA TOLEDO RODRIGUES. De acordo com o apurado, ambos residiriam no estado de Mato Grosso e teriam vindo para o Mato Grosso do Sul (cidade de Campo Grande) com o escopo, segundo relatado pela Autoridade Policial, de participar do esquema de tráfico que seria levado a efeito pelo grupo. NELIDA seria irmã de GIVADO TOLEDO DOS REIS (que seria, segundo o apurado, um dos homens de confiança dos “MORINIGO”). NELIDA e RONDINELE teriam mantido contato com GERSON GARCIA (preso em flagrante em 09 de outubro de 2018) e com ELSON MARQUES DOS SANTOS e ELSON MARQUES DOS SANTOS JÚNIOR (supostos coordenadores do “setor” da organização, em tese, criminosa, ligado diretamente ao tráfico). Teria sido captada ligação em que NELIDA teria relatado a uma tia que trabalharia apenas “quando tivesse viagem para fazer”, o que denotaria sua atuação no esquema de tráfico, viajando em conjunto com RONDINELE com o objetivo de não despertar suspeitas nas equipes de fiscalização, bem como ligações em que NELIDA aduziria sobre as viagens que realizaria em favor do tráfico (costumando receber R$ 2.000,00 – dois mil reais – por cada uma e reclamando da pequena quantidade de trajetos realizados ao longo do mês). Por sua vez, teria sido aferido que RONDINELE trabalharia com a desmontagem dos tanques de combustível dos veículos após a droga ter chegado a Campo Grande/MS, ressaltando-se que referida pessoa foi presa em flagrante em 23 de janeiro de 2019 (quando surpreendido pela Polícia Militar transportando aproximadamente 170,9 kg – cento e setenta quilos e novecentos gramas - de cocaína). Especificamente no dia da prisão em flagrante de GERSON GARCIA (09 de outubro de 2018), teriam sido interceptadas ligações que demonstrariam a preocupação tanto de RONDINELE como de NELIDA em sair dos locais em que se encontravam a fim de não serem surpreendidos por ação policial – aliás, segundo relatos da Autoridade Policial, exatamente naquela oportunidade, RONDINELE encontrar-se-ia na casa de GERSON GARCIA;

v) GIVAGO TOLEDO DOS REIS e MARIA EMILIA MARQUES DOS SANTOS TOLEDO. MARIA EMILIA é irmã de POLLYANA IRANI MARQUES e sobrinha de ELSON MARQUES DOS SANTOS, sendo que, segundo a Autoridade Policial, no dia do flagrante de 09 de outubro de 2018, teria sido a responsável por pedir um “uber” para que RONDINELE DA SILVA DE JESUS e CARMELO VERA RIOS pudessem sair da casa de GERSON GARCIA momento após sua detenção – haveria, ademais, ligação interceptada no dia seguinte a este flagrante em que MARIA EMILIA conversaria com mulher não identificada e teria mencionado preocupação por GIVAGO ter trocado mensagens com GERSON GARCIA. Já GIVAGO é irmão de NELIDA TOLEDO MARQUES e seria uma das pessoas (pertencente, em tese, ao “setor” responsável pelo tráfico) que possuiria maior relação de proximidade com os líderes da organização (em tese) criminosa, conclusão esta que estaria respaldada em diálogos interceptados com a sua esposa em que mencionaria, por exemplo, que teria estado com ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, YURI RODRIGO VINCO DE OLIVEIRA e GUSTAVO GARCIA, além do “patrão”;

vi) ELSON MARQUES DOS SANTOS, MARA PERPETUA BARROS MARTINS e ELSON MARQUES DOS SANTOS JÚNIOR. Seriam coordenadores de um dos “braços” da organização (em tese) criminosa, estando ligados, ao que parece, com as atividades de tráfico propriamente ditas. Ressaltou a Autoridade Policial que ELSON MARQUES DOS SANTOS e MARA PERPETUA (sua esposa) possuiriam indiciamentos, em sua ampla maioria, relacionados com a prática de associação criminosa e de contrabando. ELSON MARQUES DOS SANTOS JÚNIOR seria casado com GISLAYNE MIRANDA DA SILVA, que, por sua vez, seria irmã de CRISTIANE MIRANDA DA SILVA DE PAULA, que, por sua vez novamente, seria casada com EDIMAR HELENO DE PAULA (preso em flagrante delito no dia 25 de outubro de 2018 quando transportava aproximadamente 33,7 Kg – trinta e três quilos e setecentos gramas – de cocaína ocultos no tanque de combustível do veículo que conduzia – VW/Amarok – IPL 457/2018)

De acordo com relatórios de inteligência, ELSON MARQUES DOS SANTOS e ELSON MARQUES DOS SANTOS JÚNIOR (seu filho) teriam estado à frente de tratativas atinentes à negociação e ao transporte de drogas apreendidas, sendo os responsáveis pelas seguintes atividades, dentre outras: cooptação de EDIMAR HELENO DE PAULA; aquisição e transferência da caminhonete VW/Amarok para o nome de EDIMAR HELENO DE PAULA; contato direto com parte da organização (em tese) criminosa responsável pela preparação da droga em Pedro Juan Caballero/PY; e organização da logística para distribuição da droga em outras regiões do Brasil. Teria havido a interceptação de telefonema em que EDIMAR HELENO DE PAULA, após sua chegada em Pedro Juan Caballero/PY, teria ligado para ELSON MARQUES DOS SANTOS com a finalidade de reclamar a dificuldade em se retirar o tanque de combustível da caminhonete VW/Amarok, que seria muito diferente “da outra lá” (em alusão às anteriores “Toyota Hilux”) – nessa toada, EDIMAR HELENO DE PAULA teria pedido que ELSON MARQUES DOS SANTOS levasse ferramentas para auxiliar na retirada do tanque.

Já no que diz respeito à MARA PERPETUA, teriam sido interceptadas ligações entre outros envolvidos em que teria havido ilação de que MARA participaria das atividades de recrutamento de indivíduos para fins de transporte da droga, tendo chegado, inclusive, a combinar com POLLYANA IRANI MARQUES que esta passaria a receber pelas viagens realizadas.

vii) CRISTIANE MIRANDA DA SILVA DE PAULA e EDIMAR HELENO DE PAULA. CRISTIANE é irmã de GISLAYNE MIRANDA DA SILVA, que, por sua vez, seria esposa de ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR – assim, EDIMAR, preso em flagrante em 25 de outubro de 2018, é concunhado de ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR (apontado pela Autoridade Policial como coordenador do “setor” de tráfico da organização – em tese – criminosa). Segundo as investigações, durante a viagem de EDIMAR, que teria sido realizada para buscar cocaína em Pedro Juan Caballero/PY, CRISTIANE teria atuado como contato de apoio dele, momento em que teria diligenciado junto a ELSON MARQUES DOS SANTOS para obter ferramentas que seriam utilizadas na desmontagem do tanque de combustível da VW/Amarok;

viii) CRISTIANO JONATAN DIAZ. Seria, em tese, o “laranja” que teria sido contratado por ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR para registrar a empresa “Trato Rações” (que seria a empregada pelo “setor” de tráfico da organização – em tese – criminosa para dissimular o transporte de cocaína. Salienta a Autoridade Policial que ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR teria providenciado a locação de um barracão, bem como a abertura da empresa em nome de CRISTIANO, sem se descurar da colocação do veículo utilizado também em nome de CRISTIANO, com o objetivo de não despertar suspeitas com o transporte e com o local de traslado da droga em Campo Grande/MS. Haveria informações, ademais, no sentido de que CRISTIANO teria prestado auxilio à família de RONDINELE DA SILVA DE JESUS após a prisão deste;

ix) ROBSON AJALA, com o papel de doleiro da organização, seria acionado pelos integrantes da organização (em tese) criminosa para a finalidade de pagamento ou de ressarcimento de títulos e de despesas do grupo, o que poderia se dar por meio da entrega de numerário a pessoa que se dispusesse a atravessar a fronteira (sendo, então, a dívida paga pessoalmente em uma agência bancária ou em um correspondente bancário localizado em Ponta Porã/MS) ou por meio da remessa do título ou da despesa para adimplemento via doleiro (que, no mais das vezes, providenciava o pagamento em Curitiba/PR, localidade em que, segundo as investigações, situar-se-ia o “setor” mais bem estruturado da organização ligado à lavagem de dinheiro, vale dizer, com a movimentação de vultosas quantias através de empresas de fachada e pagamentos de altas somas a “laranjas”). Traz, ainda, à tona a Autoridade Policial uma peculiaridade que teria sido encontrada na atuação daquele que seria o tal “doleiro”: nas hipóteses em que o pagamento (por meio de depósito) fosse realizado pelo “setor” de lavagem sediado em Curitiba/PR, a pessoa que fosse efetivar materialmente o pagamento teria por hábito enviar a ROBSON os respectivos comprovantes efetuados (seja de pagamento, seja de depósito), destacando-se que ROBSON, para fins de controle, os encaminhava ao e-mail “gammegall@hotmail.com”, mecanismo este que teria permitido a identificação do “auxílio-reclusão” não previdenciário.

x) SLANE CHAGAS: abriu a empresa “JV Motors”. Tratar-se-ia da empresa aberta após o encerramento da “Classe A Veículos Campo Grande/MS” (que, recorde-se, transformou-se na “JG CONSTRUTORA”) e que também estaria imbricada com atos de movimentação e de ocultação de patrimônio pertencente, em tese, aos “MORINIGO” (por meio da negociação de veículos que seriam do clã como, exemplificativamente, na situação relacionada com a doação de carro que estaria exposto em sua empresa à ELEANA LEMES). Segundo a Autoridade Policial, SLANE também teria atuado como gestor de assuntos diversos relacionado a veículos dos “MORINIGO”, como, por exemplo, na cotação de seguro do automotor de EMIDIO MORINIGO e na aquisição do BMW X2 para ELIZANGELA MARIA MAGALHÃES BEZERRA (esposa de JEFFERSON MORINIGO). Funcionaria como representante dos “MORINIGO” junto a TAIRONE no que se refere às negociações de automóveis realizadas por este último.

xi) TAIRONE CONDE COSTA e sua esposa GILZA AUGUSTA DE ASSIS E SILVA – disponibilizam estrutura para ocultar o patrimônio pertencente supostamente à organização, em tese, criminosa), através da pessoa jurídica “Classe A Veículos Cuiabá/MT”, empresa que possuiria o mesmo nome fantasia ostentado pela loja de veículos que seria de titularidade dos “MORINIGO” em Campo Grande/MS, onde os Morinigo adquiriram diversos veículos de luxo e alto luxo, sempre em nome de laranjas. Com supedâneo nas movimentações bancárias da pessoa jurídica (obtidas pelo afastamento de seu sigilo), teria sido possível constatar que elas apresentar-se-iam de forma notoriamente incompatível com o volume de veículos que seria comercializado pelo ente moral, não tendo sido verificada a emissão de notas fiscais ou outras providências pela empresa que pudessem demonstrar a regularidade dos negócios ali celebrados.

Aferiu-se no decorrer das investigações, que estiveram ou estariam expostos na loja “Classe A Veículos Cuiabá/MT” diversos veículos de luxo que pertenceriam à família “MORINIGO” (citando, a título exemplificativo, uma LAMBORGUINI e um PORSCHE 911) ao lado de outros automóveis que seriam de titularidade de terceiras pessoas (sem ser possível saber a que título). Salienta, ademais, que, em decorrência de dados advindos da quebra dos sigilos bancário e fiscal de TAIRONE (e de sua esposa GILZA AUGUSTA DE ASSIS E SILVA, recordando-se que esta é a formal proprietária da “Pousada Paraíso do Manso”), teria sido descoberto que tais pessoas não desempenhariam atividades que possibilitassem justificar a obtenção de patrimônio milionário existente em nome de ambos, razão pela qual se firmou conclusão no sentido de que TAIRONE (para o que interessa neste momento) atuaria em parceria com os “MORINIGO” (e com terceiros não imbricados nesta “OPERAÇÃO”) por meio do fornecimento de estrutura formal para a ocultação de patrimônio e para fins de lavagem de dinheiro, aspecto que seria sufragado, outrossim, pela inferência do recebimento de inúmeros depósitos bancários sem identificação e de forma fracionada nas contas da empresa.

xii) YURI RODRIGO VINCO DE OLIVEIRA: um dos principais “laranjas” da organização. Segundo a Autoridade Policial, a pessoa jurídica Classe A Veículos Campo Grande seria utilizada pelos investigados para a finalidade de realizar lavagem de dinheiro (proveniente, em tese, do tráfico de drogas) na cidade de Campo Grande/MS. Segundo diligências investigativas, teria sido descortinado mecanismo por meio do qual se costumava realizar diversas transferências fictícias de propriedade dos automotores expostos à comercialização, registrando-os em nomes de “laranjas” (muitos dos quais estariam albergados na “OPERAÇÃO STATUS”) e de funcionários da pessoa jurídica ora em comento, culminando, em alguns casos, até mesmo na indicação de propriedade final (vale dizer, ao cabo do suposto branqueamento) em nome de um dos “MORINIGO” ou da própria “Classe A Veículos Campo Grande/MS” – nessa toada, a Autoridade Policial faz menção aos nomes de supostos “laranjas” como sendo YURI RODRIGO VINCO DE OLIVEIRA e SLANE CHAGAS (este último “proprietário” de veículos que, somados, corresponderiam à cifra aproximada de R$ 7.988.000,00 – sete milhões, novecentos e oitenta e oito mil reais).

xiii) ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA: sócio da empresa Classe A Veículos Campo Grande juntamente com Jefferson Morinigo. na declaração de ajuste referente ao exercício de 2018, teria surgido, como bens e direitos, sua participação (em 20% nas quotas de capital, equivalente a R$ 500.000,00 – quinhentos mil reais, o que não encontraria respaldo em movimentações financeiras que dariam lastro para tal implemento monetário) na empresa “Classe A Veículos Campo Grande/MS”, aspecto que teria quase que dobrado seu patrimônio em relação ao exercício pretérito, em momento que seria coincidente com a entrada, em 24 de maio de 2017, de JEFFERSON MORINIGO na pessoa jurídica telada (integralizando capital de R$ 2.000.000,00 – dois milhões de reais).

Em trabalho de campo, teriam sido observados outros bens de sua propriedade, porém não declarados, o que, segundo a investigação, apontaria para a titularidade efetiva do grupo investigado. Dentro de tal contexto, o volume de notas fiscais que teriam sido destinadas a ALEXANDRE em decorrência da aquisição de bens e de mercadorias está distante da realidade por ele apresentada ao Fisco Federal em sede de declarações de ajuste.

Analisaram-se os extratos bancários que a movimentação de valores de tal magnitude seria incompatível com os importes apresentados nas declarações de rendimento à Receita Federal para os respectivos anos-calendário, de molde que, levando-se em consideração também o histórico laboral de ALEXANDRE, seria possível cogitar-se que os recursos movimentados em suas contas pertenceriam a terceiras pessoas que integrariam a organização (em tese) criminosa sob investigação.

Notas fiscais emitidas por empresas de veículos também ligaram os nomes de Alexandre e Slane. Outro indício da existência de ligação entre ele e o grupo investigado são notas fiscais emitidas em nome de ALEXANDRE para aquisição de peças, de manutenções e de óleos fariam referência a veículos que já teriam pertencido ou pertenceriam a outros membros da organização (em tese) criminosa (como, por exemplo, “NOVA BAND”, “CLASSE A”, “RENATO HERNANI DE MORAES MENDES”, “JG CONSTRUTORA” e “ALDO GRACE MORINIGO”), o que sugeriria que o nome de ALEXANDRE estaria sendo utilizado como destinatários de mercadorias, de bens e de direitos pertencentes a terceiras pessoas investigadas.

Em suma, restou assentado no Acórdão proferido em 14 de maio de 2020 pela Décima Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região o implemento dos requisitos afetos à necessidade de prova da existência do crime e de indícios suficientes de autoria (ID’s 132081349, 132081698, 131704678, 139877802 e 131704676).

No tocante ao requisito do o requisito do periculum libertatis, observa-se a necessidade de se resguardar a ordem pública, por meio da cessação das atividades, em tese, ilícitas de constante branqueamento de dinheiro por diversos expediente de lavagem, bem como a cessação das atividades referentes ao tráfico de entorpecentes exercidas no bojo da organização, em tese, criminosa. Nesse sentido é a jurisprudência dos Tribunais Superiores, “a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa enquadra-se no conceito de garantia da ordem pública, constituindo fundamentação cautelar idônea e suficiente para a prisão preventiva” (STF, HC 95.024/SP, 1.ª Turma, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, DJe de 20/02/2009; STJ - RHC 39715/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, j. 08/05/2014, DJe 16/05/2014).

Necessária ainda, a garantia de aplicação da lei penal, considerando-se a indicação de que os líderes da organização, em tese, criminosa teriam se mudado ou estariam em vias de se mudar para o Paraguai, devendo ser destacada a efetiva existência de perigo gerado pelo estado de liberdade de tais agentes, na justa medida em que a análise dos elementos investigativos carreados aos autos deram conta da perpetuação dos atos de lavagem até os dias presentes.

2.3.3 - Contemporaneidade delitiva

A análise dos elementos investigativos contidos no “Relatório de Informação Operação Status (Julho de 2019 a Maio de 2020)”(ID 132371699 – págs. 12/213) teria conseguido demonstrar, até os dias presentes, a reiterada e a constante prática (em tese) de lavagem de dinheiro por indicadas pessoas, havendo a necessidade de mencionar que o clã MORINIGO (composto por JEFFERSON, KLEBER e EMIDIO) estaria presentemente sendo beneficiado por atos de ocultação patrimonial que continuariam (em tese) sendo executados pelas pessoas de ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, de SLANE CHAGAS, de ROBSON LOURIVAL AJALA e de TAIRONE CONDE COSTA.

Isto pois, ainda que o “Relatório de Informações” a que foi feita menção (ID 132371699 – págs. 12/213) indique a ausência de elementos de dados (telefônicos ou telemáticos) interceptados oriundos de terminais que seriam ou poderiam ser utilizados pelo clã Morinigo, o que, em um primeiro momento, poderia indicar a cessação de qualquer (em tese) prática eventualmente delitiva, nota-se, na realidade, que o substrato organizacional situado abaixo dos Morinigo na organização (em tese) criminosa, composto por ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, por SLANE CHAGAS, por ROBSON LOURIVAL AJALA e por TAIRONE CONDE COSTA, teria continuado de forma reiterada, até tempos presentes, a escamotear e a dissimular patrimônio que pertenceria a EMIDIO, JEFFERSON E KLEBER MORINIGO, vale dizer, o suposto delito de lavagem de dinheiro continuaria sendo perpetrado, não apenas com os bens que já teriam sido descobertos ao longo da investigação e que constaram de análise no acórdão proferido em 14 de maio de 2020, mas também por meio do acréscimo de novos bem ao patrimônio.

 A família Morinigo ainda mantém diversos imóveis de luxo no Brasil e no Paraguai, apesar de muitos se encontrarem registrados em nome de terceiro.

Este Relatório de Informação da Operação Status, atualizado até maio de 2020 permitiu obter as informações a respeito dos seguintes investigados:

  1. JEFFERSON GARCIA MORINIGO: Teria sido constatada a existência de troca de mensagens entre JEFFERSON e sua esposa Elisangela, em abril de 2020, por meio das quais JEFFERSON informa que estaria com a intenção de comprar mais cabeças de gado e, assim, dirigir-se-ia a uma fazenda. Nas investigações, foi averiguado que entre abril e maio de 2020 JEFFERSON e SLANE foram conhecer algumas chácaras para compra. JEFFERSON estava interessado na aquisição de mais um imóvel, a ser pago com recursos possivelmente obtidos como proveito do crime de tráfico internacional de drogas. Pela conversa com o corretor de imóvel, parte do pagamento seria com entrega de veículos.

  2.  ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA teria continuado a exercer função de “operador financeiro” do grupo à luz de que ainda seria o intermediador dos MORINIGO com o doleiro que se encontraria localizado no Paraguai (ROBSON AJALA – responsável, em tese, por executar os pagamentos e as despesas da organização), sem prejuízo da manutenção de vínculo com SLANE CHAGAS (que, por sua vez, intermediaria a venda e escamotearia veículos que pertenceriam aos “patrões” JEFFERSON, KLEBER e EMIDIO MORINIGO) e com arquiteto responsável por obras do clã (havendo, até mesmo, indícios de que ALEXANDRE repassaria ordens oriundas dos MORINIGO no sentido de que era para o arquiteto iniciar obras novas, ou seja, além daquelas que estariam em curso).

  3. SLANE CHAGAS ocuparia o papel, conforme já adiantado no item acima, de intermediar a venda e de executar a transferência de veículos que seriam ligados ao esquema coordenado pelos MORINIGO. Diversas teriam sido as conversas telefônicas interceptadas em que SLANE, aparentemente, estaria imbricado com patrimônio do clã MORINIGO lavado (em tese) por meio da aquisição de automóveis, havendo a indicação de compra, em uma única oportunidade, de 05 (cinco) veículos (uma “S-10” 2017/2018, duas “Fiat Strada” 2019/2019 e dois “Toyota Corolla” 2019/2019). Também teria atuado para fins de escamoteamento patrimonial no licenciamento de dois automotores de altíssimo luxo (quais sejam, uma “DODGE RAM LARAMIE”, possuidora de placas GEM4C00, e uma “LAND ROVER RANGE ROVER SPT 3.0 TD HSE”, possuidora de placas QAU4I27), que não figurariam como sendo formalmente de propriedade de JEFFERSON, de KLEBER e de EMIDIO MORINIGO, porém gravitariam em torno de familiares deles (ANDERSON GARCIA MORINIGO e ESTER MARIA MAGALHÃES BEZERRA).

Sem prejuízo do exposto, teria atuado, ademais, na venda de um veículo “LAND ROVER VELAR P300 SE RDYN” (possuidor de placas QCL1J90) que estava, em tese, em nome de ESTER MARIA MAGALHÃES BEZERRA (pessoa que sequer teria CNH e, mesmo assim, ostentaria uma frota de 03 – três – carros de valores extremamente elevados), bem como de uma “DODGE RAM” registrada em nome da pessoa jurídica “JG Construtora” (de JEFFERSON MORINIGO), que, não se sabe por qual motivo (o que não deixa de ser curioso), acabou por integrar patrimônio de uma mulher (Marcilei Sabara Souza) que não ostentaria CNH e sequer teria qualquer vínculo empregatício ou societário a dar lastro a uma transação de mais de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) – mais curioso ainda seria o fato de que Marcilei seria irmã de um homem (Deividson Angelo Sabara) que ostentaria 03 (três) passagens por tráfico de drogas. Agregue-se, ademais, que SLANE também teria exercido o papel de intermediador em contatos por meio dos quais um dos MORINIGO (a princípio e segundo as investigações, JEFFERSON) teria manifestado interesse em adquirir uma chácara em Campo Grande/MS.

Existiriam, ainda, conversas interceptadas entre o final de abril e o começo de maio de 2020 que teriam sido mantidas por SLANE com um corretor de imóveis sobre a intenção de compra de uma chácara localizada em Campo Grande/MS que teria sido visitada por SLANE e por “ele” (em alusão a JEFFERSON MORINIGO).

Por fim, apontou a autoridade policial que teria sido interceptada uma troca de mensagens SMS entre SLANE e sua esposa Thais, em 20 de abril de 2020, por meio da qual haveria a expressa menção por parte de Thais de que seu então esposo estaria envolvido com “esse povo”, que seria um “bando de tranqueira” e de “bandido” em alusão, em tese, às atividades que seriam praticadas pelos membros de cúpula da organização (em tese) criminosa.

d) TAIRONE CONDE COSTA também teria por função ocultar patrimônio da organização (em tese) criminosa por meio de sua loja de veículos (“Classe A Veículos Cuiabá/MT”), não devendo ser esquecida informação que apontaria que sua esposa, GILZA AUGUSTA DE ASSIS E SILVA, também teria levado a efeito atos de lavagem (sendo, talvez, o mais vultoso o registro da “Paraíso do Manso Resort” em seu nome). Teriam sido interceptadas conversas em que TAIRONE estaria tentando negociar propriedades rurais (sem a devida constatação a quem pertenceriam) ao mesmo tempo em que teria ficado esclarecida sua participação, em tese, nas Fazendas Tereré e Aliança (que pertenceriam aos MORINIGO, que a estariam explorando a pleno vapor por meio de plantações e possível criação de gado, e estaria em nome de um “faz tudo” da organização: JOSELITO PINHEIRO DE ABREU). Nota-se também diálogos sobre a aquisição de uma lancha que custaria mais de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Ademais, diversos veículos teriam sido vendidos e comprados nesse período final de apuração investigativa, havendo inclusive uma não explicada venda de uma Lamborghini (que poderia ser a mesma utilizada por JEFFERSON MORINIGO e que teria sido deixada no “Paraíso do Manso Resort” porque JEFFERSON teria sido acometido de uma enfermidade quando se deslocou até a propriedade) e uma aquisição de um NISSAN “GTR Black Edition 2012”. Por fim, teria sido obtida a informação de que TAIRONE teria custeado parcelas de um consórcio para aquisição de uma lancha que, na realidade, seria de JEFFERSON MORINIGO.

No mês de janeiro de 2020, dois diálogos foram interceptados oriundos de TAIRONE: no primeiro deles, TAIRONE conversaria com uma pessoa de nome André demonstrando interesse em comprar uma lancha de 36 (trinta e seis) pés ao valor de mais de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais); já na segunda conversa, TAIRONE falava a um homem não identificado que queria vender uma fazenda que lhe pertencia ao mesmo tempo em que informava que em outra teria plantado aproximadamente mil hectares de arroz (havendo correlação com diálogo exarado por JOSELITO PINHEIRO DE ABREU em que haveria a menção de que uma plantação de arroz teria dado prejuízo às FAZENDAS TERERÉ e ALIANÇA em mais de R$ 1.000.000,00 – um milhão de reais – pois o cultivo não teria ido adiante).

Em fevereiro de 2020, teria sido interceptada ligação em que TAIRONE ordena que uma pessoa de nome Daniel se dirija ao “Manso” para pegar uma “LAMBORGUINE” (que, segundo a autoridade policial, teria sido utilizada por JEFFERSON MORINIGO para se deslocar até sua propriedade no Lago do Manso e, em razão de problemas de saúde enfrentados por este, acabou deixando o carro naquele local). Já em março de 2020, em conversas interceptadas de TAIRONE, teria havido diálogo: (i) em que este conversa com um despachante sobre a venda de um “Porsche Cayenne” (que estaria exposto na “Classe A Veículos Cuiabá/MT” e possuiria placas KRR1755); (ii) em que TAIRONE teria ordenado que “Roco” fosse buscar em uma concessionária Land Rover o veículo “Range Rover V8” (que pertenceria a JEFFERSON MORINIGO e estaria registrado em nome de sua sogra ESTER MARIA MAGALHÃES BEZERRA); e (iii) em que TAIRONE teria informado a um amigo não identificado que estaria vendendo uma “LAMBORGUINE” e comprando um “GTR Black Edition 2012” com 7.000 (sete mil) quilômetros rodados.

Em abril de 2020, TAIRONE teria mantido diálogo com uma atendente de imobiliária para a finalidade de solicitar a avaliação de uma área situada na “Terra do Golf” (Paraíso do Manso/MT), manifestando, inclusive, intenção de realização de construções no entorno da lagoa para ulteriormente vendê-la. Outra ligação interceptada em abril de 2020, ainda que para tratar de assunto diverso, teria permitido a inferência, segundo a autoridade policial, de que TAIRONE teria assumido o pagamento pelo prazo de 02 (dois) anos de um consórcio de uma lancha que seria de propriedade de JEFFERSON MORINIGO.

e) ROBSON AJALA ocuparia o papel de ser o doleiro da organização, atuando em conjunto (mas não exclusivamente) com as pessoas de THAIS MARTINS DE AQUINO e de PABULO RIBAS DOS SANTOS, por meio da constituição de diversas pessoas jurídicas. Sua atuação se faria presente até os dias atuais na justa medida em que gastos do clã MORINIGO seriam sempre repassados a ROBSON, por meio, exemplificativamente, da atuação de ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA (despesas com funcionários, por exemplo) ou de JOSELITO PINHEIRO DE ABREU (despesas com as Fazendas Tereré e Aliança)

 O Relatório de Inteligência observou a existência de correspondência eletrônica enviada no dia 23/04/2020 para a caixa de entrada gammegall@hotmail.com, a qual é utilizada por ROBSON AJALA, principal operador financeiro do grupo criminoso. De acordo com a correspondência enviada, estão ali descritos os gastos custeados diretamente por ALEXANDRE VILHANUEVA e que devem ser ressarcidos pela suposta organização criminosa.

A existência de tal sistema denota que a suposta organização criminosa oculta a movimentação dos valores a si pertencentes, terceirizando os pagamentos necessários a doleiros sediados no Paraguai e com ramificações em todo o Brasil.

f) ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR, que atua como espécie de gerente do setor de tráfico de drogas da suposta organização criminosa, teve uma ligação interceptada em 25.04.2020 com um homem identificado como GUI, em que havia menção expressa dos interlocutores quanto ao transporte de 200 kg (duzentos quilos) de droga, o que demonstra que continua empenhado na prática do tráfico de drogas (Relatório de Informação Operação Status - Julho de 2019 a Maio de 2020 – ID 35530628, fl. 153/155). Destaca-se que ELSON JUNIOR, teria chamado a atenção de “Gui” para que não mantivesse esse tipo de diálogo por meio de ligações telefônicas convencionais e que logo trocariam mensagens por Whatsapp.

Em 23.01.2019, RONDINELE foi preso em flagrante no distrito de Vista Alegre, município de Maracaju-MS, transportando carregamento de 130 kg de pasta base de cocaína em fundo falso de caminhão-baú marca Volkswagen, placa NRZ-1520. RONDINELE estava a serviço de ELSON e ELSON JR. Os diálogos após a prisão de RONDINELE ajudam a elucidar o caso. No Auto Circunstanciado nº 01/2019, os policiais federais indicaram conversas telefônicas captadas para mostrar o grau de envolvimento de NELIDA, ELSON e ELSON JR nessa empreitada criminosa.

Infere-se que o caso afeto ao flagrante descrito, em conjunto com o diálogo interceptado de Elson Junior e “Gui”, apontam, indiciariamente, para muito além do que mera coincidência, indicando que Elson Junior possuiria, em tese, ligação com os Morinigo, atuando até os dias atuais em atividades relacionadas ao tráfico de entorpecentes.

g) ELSON MARQUES DOS SANTOS: também integrante do setor de tráfico de drogas da organização criminosa. Com relação a este indivíduo, não há elementos de informação atuais e recentes que permitam concluir que segue nas atividades relacionadas ao tráfico de drogas. A única informação mais atualizada trazida no Relatório a respeito deste indivíduo é que ele, juntamente com ELSON JUNIOR E MARA PERPETUA, estaria “queimado” com a organização (em tese) criminosa, especialmente com JEFFERSON MORINIGO, muito provavelmente em razão das prisões de RONDINELE e de EDIMAR (o que potencialmente deveria ter gerado uma dívida enorme com a organização).

2.3.4 – Conclusão pelo preenchimento dos requisitos para a decretação da prisão preventiva

Dentro de tal contexto, decreto a prisão preventiva dos investigados JEFFERSON GARCIA MORINIGO, KLEBER GARCIA MORINIGO, EMIDIO MORINIGO XIMENEZ, ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, SLANE CHAGAS, ROBSON LOURIVAL ALCARAZ AJALA e TAIRONE CONDE COSTA, com o fito de se resguardar a ordem pública, por meio da cessação das atividades, em tese, ilícitas de constante branqueamento de dinheiro por diversos expediente de lavagem, e de ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR, resguardando-se a ordem pública através da cessação das atividades, em tese, referentes ao tráfico de entorpecentes exercidas no bojo da organização, em tese, criminosa, bem como de garantir a aplicação da lei penal, considerando-se a indicação de que os líderes da organização, em tese, criminosa teriam se mudado ou estariam em vias de se mudar para o Paraguai, devendo ser destacada a efetiva existência de perigo gerado pelo estado de liberdade de tais agentes, na justa medida em que a análise dos elementos investigativos carreados aos autos deram conta da perpetuação dos atos de lavagem até os dias presentes.

(...)

O pedido de revogação da prisão preventiva dos pacientes restou indeferido, cuja decisão é o objeto da presente impetração, que se passa a transcrever (ID143038035):

(...)

1. PEDIDOS DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA

Pugna a defesa dos réus EMIDIO MORINIGO, JEFFERSON MORINIGO e KLEBER MORINIGO pela revogação da prisão preventiva argumentando a inexistência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva e a condição de vulnerabilidade dos requerentes como pertencentes a grupo de risco de coronavírus (ID 38716407).

Instado, o Ministério Público Federal manifestou-se contrário ao pedido (ID 38876787), destacando que persistem os fundamentos que ensejaram a decretação da prisão dos acusados, apontando os indícios de autoria e materialidade que basearam a decisão anterior deste juízo.

Neste ponto, destaco que, assim como ressaltou o Parquet, o artigo 316 do Código de Processo Penal dispõe que: “O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”

Desse modo, entendo que, no caso, não se vislumbra a princípio qualquer modificação na situação anterior que decretou a prisão preventiva dos acusados. Vale asseverar que, ante a perspectiva adotada pela decisão proferida no ID 36214888, demonstrou-se o preenchimento de todos os requisitos do art. 312, do CPP, havendo indícios suficientes da autoria e materialidade, assim como do periculum libertatis.

Segundo os relatórios de inteligência produzidos e a representação final da Autoridade Policial, as investigações apontaram, e foi reconhecido pelo E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que EMIDIO MORINIGO, JEFFERSON MORINIGO e KLEBER MORINIGO, ao menos em tese, são os líderes de uma organização criminosa altamente estruturada e que, além de estar envolvida na prática de delitos de tráfico internacional de drogas - vide as apreensões ocorridas durante o período de interceptação telefônica e as condenações pretéritas dos investigados - também ocultava bens e valores por meio de interpostas pessoas. Desse modo, segundo a decisão que decretou as prisões, a manutenção da segregação cautelar dos presos visa interromper a cadeia de ações da organização criminosa e cessar a prática delitiva, de modo a preservar a ordem pública e garantir a aplicação da lei penal.

Nesse sentido, dentro da perspectiva adotada pela decisão de ID 36214888, entendo que ainda subsistem as razões que ensejaram a decretação da prisão de EMIDIO, JEFFERSON e KLEBER. Importante ressaltar que, em princípio, o juiz de primeiro grau não é instância revisora de outro juiz de primeiro grau.

No tocante às condições de saúde dos presos, inicialmente observo que a Recomendação nº 62/2020 trata-se meramente de uma recomendação, com vistas a evitar maior propagação do coronavírus e salvaguadar a saúde dos custodiados, não gozando assim de caráter vinculante e nem mesmo sendo causa de revogação de todas as custódias preventivas no país. Ademais, o sistema penitenciário nacional tem empreendido esforços e adotado medidas para conter o avanço da doença nos estabelecimentos prisionais. Assim, entendo que antes de avaliar os riscos efetivos aos presos, faz-se necessário previamente consultar o local em que se encontram recolhidos de modo a verificar o real risco de contaminação a que estão submetidos. Neste ponto, destaco que há nos autos pedido de inclusão destes no sistema penitenciário federal, ocasião em que o pleito defensivo poderá ser revisto, após devidamente avaliado os índices de contágio nos presídios federais.

 Ante o exposto, INDEFIRO, por ora, o pedido de revogação da prisão preventiva dos presos EMIDIO MORINIGO, JEFFERSON MORINIGO e KLEBER MORINIGO, uma vez que ainda remanescem presentes os motivos que ensejaram sua decretação, segundo a perspectiva da decisão de ID 36214888.

Sem prejuízo, dê-se vista ao Ministério Público Federal para que se manifeste acerca dos pedidos de revogação da prisão preventiva de SLANE CHAGAS (ID 38808719), ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA (ID 38810120) e ELSON MARQUES DOS SANTOS JUNIOR (ID 38904919).

2. PEDIDO DE TRANSFERÊNCIA PARA O PRESÍDIO FEDERAL

 Defiro o pedido do Ministério Público Federal para fins de determinar a autuação em apartado do pedido de inclusão dos presos EMIDIO MORINIGO, JEFFERSON MORINIGO e KLEBER MORINIGO no sistema penitenciário federal, de modo a evitar maior tumulto processual nestes autos e garantir celeridade à apreciação do pedido.

(...)

A decisão que manteve a prisões cautelares dos pacientes assentada nos fundamentos acima expostos não padece de qualquer ilegalidade, fundada que se encontra nos requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal.

Como se observa, a custódia cautelar revelou-se necessária com base em dados concretos coletados, não se tratando de meras ilações acerca da gravidade abstrata do ocorrido.

In casu, o fumus comissi delicti e o periculum libertatis restaram comprovados.

A materialidade e os indícios autoria restaram bem demonstradas na representação da autoridade policial e relatórios de investigação, a ponto de fazer com que este Tribunal, em sede de julgamento de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, reconhecesse a existência de indícios suficientes dos crimes de tráfico internacional de drogas e de lavagem de ativos, concedendo as medidas de busca e apreensão e sequestro que foram executadas por ocasião da recente deflagração da referida operação.

A par disso, a longa investigação desenvolvida reuniu elementos consistentes de materialidade e autoria de crimes de lavagem de dinheiro, organização criminosa e tráfico de drogas. Subjacente ao tráfico de drogas, restou demonstrada a existência de um forte esquema de lavagem de dinheiro a beneficiar EMÍDIO MORINIGO XIMENEZ, JEFFERSON GARCIA MORINIGO e  KLEBER GARCIA MORINIGO, ora pacientes, respectivamente pai e seus dois filhos.

O requisito da garantia da ordem pública, como critério a ser aferido para a decretação da custódia cautelar, é de ser visto não apenas como medida para evitar que o acusado continue a praticar delitos, mas também como uma resposta à sociedade, em face do crime em tese praticado.

Os delitos objeto de apuração são graves, eis que causam grande repercussão social. A permanência dos pacientes em liberdade seria autêntico escárnio e descrédito da justiça, na medida em que a sociedade espera sempre a atuação serena, porém firme, da Justiça e das demais instâncias de persecução penal.

A ordem pública é ofendida pela nefasta atuação da organização criminosa, continuadamente. Inobstante a ocorrência de apreensões e prisões, não teria havido interrupção da atividade delinquencial.

Note-se que somente com o aprofundamento das investigações é que se revelaram o modo de execução dos crimes, seus possíveis membros como também a continuidade das ações delitivas, possibilitando as prisões preventivas decretadas nos autos subjacentes.

O Supremo Tribunal Federal, com efeito, já se manifestou no sentido de que "a custódia cautelar visando a garantia da ordem pública legitima-se quando evidenciada a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa" (RHC 122182, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 19.8.2014).

Assim, fica nítida a gravidade em concreto das condutas e a imprescindibilidade da prisão preventiva para assegurar a ordem pública, por meio da cessação das atividades do grupo criminoso. Há necessidade da segregação, também, por conta do risco comprometedor da aplicação da lei penal, devendo ser considerada também a estrutura da organização, em tese criminosa, e seus arraigados laços com o Paraguai, o que pode ser facilitador de fuga àquele país. Registre-se, neste ponto, que há indícios de que os líderes da organização, em tese, criminosa teriam se mudado ou estariam em vias de se mudar para o Paraguai, devendo ser destacada a efetiva existência de perigo gerado pelo estado de liberdade de tais agentes, na justa medida em que a análise dos elementos investigativos carreados aos autos deram conta da perpetuação dos atos de lavagem.

Nesse prisma, foi reconhecido por este Tribunal que EMIDIO MORINIGO, JEFFERSON MORINIGO e KLEBER MORINIGO, ao menos em tese, são os líderes de uma organização criminosa altamente estruturada e que, além de estar envolvida na prática de delitos de tráfico internacional de drogas - conforme as apreensões ocorridas durante o período de interceptação telefônica e as condenações pretéritas dos ora pacientes - também ocultavam bens e valores por meio de interpostas pessoas.

Desse modo,  a manutenção da segregação cautelar dos pacientes visa interromper a cadeia de ações da organização criminosa e cessar a prática delitiva, de modo a preservar a ordem pública e garantir a aplicação da lei penal.

Da Contemporaneidade 

Ainda consoante exposição contida na representação da autoridade policial e relatórios de investigação constantes da presente impetração, o grupo criminoso continuaria plenamente ativo até o momento da deflagração desta operação policial. Novos crimes teriam sido perpetrados e ações permanentes de lavagem de ativos (sobretudo na forma de ocultação de propriedade e de localização de bens adquiridos com proveitos do tráfico internacional de drogas) persistiriam. A riqueza ilícita além de sustentar padrão de vida elevado dos criminosos estaria em constante processo de reciclagem, o que se poderia constatar pelas seguintes ocorrências: manutenção de propriedade de diversos imóveis de alto padrão no Paraguai e interesse pela compra de uma chácara localizada em Campo Grande/MS; continuidade da utilização do esquema do doleiro ROBSON AJALA para pagamento de despesas do grupo criminoso e de gastos pessoais dos ora pacientes e lavagem de dinheiro com ocultação de propriedade do veículo Range Rover Sport, placa QAU-4127 em nome de Esther Magalhães Bezerra, sogra de JEFFERSON GARCIA MORINIGO, veículo que custa mais de meio milhão de reais e que teria sido adquirido em fevereiro de 2020.

Nesse sentido, este relator, nos embargos de declaração oposto pelo Ministério Público,  apesar de ter restado vencido, concluiu pela existência de contemporaneidade inerente à cautelaridade da prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal e da ordem pública,  vazado nos termos abaixo:

(...)

“Entretanto, a análise dos elementos investigativos apresentados pelo Parquet federal contidos no “Relatório de Informação Operação Status (Julho de 2019 a Maio de 2020)” (ID 132371699 – págs. 12/213 – objeto de esmiuçamento nos termos anteriormente tratados) somente permite a decretação de prisão preventiva em relação a JEFFERSON MORINIGO, a KLEBER MORINIGO, a EMIDIO MORINIGO, a ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, a SLANE CHAGAS, a ROBSON LOURIVAL AJALA e a TAIRONE CONDE COSTA, uma vez que a autoridade policial teria conseguido demonstrar, até os dias presentes, a reiterada e a constante prática (em tese) de lavagem de dinheiro por indicadas pessoas, havendo a necessidade de mencionar que o clã MORINIGO (composto por JEFFERON, por KLEBER e por EMIDIO) estaria presentemente sendo beneficiado por atos de ocultação patrimonial que continuariam (em tese) sendo executados pelas pessoas de ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, de SLANE CHAGAS, de ROBSON LOURIVAL AJALA e de TAIRONE CONDE COSTA. Nessa toada, ainda que o “Relatório de Informações” a que foi feita menção (ID 132371699 – págs. 12/213) indique a ausência de elementos de dados (telefônicos ou telemáticos) interceptados oriundos de terminais que seriam ou poderiam ser utilizados pelo clã MORINIGO (composto por JEFFERON, por KLEBER, o que, em um primeiro momento, poderia indicar a cessação e por EMIDIO) de qualquer (em tese) prática eventualmente delitiva, nota-se, na realidade, que o substrato organizacional situado abaixo dos MORINIGO na organização (em tese) criminosa (composto por ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, por SLANE CHAGAS, por ROBSON LOURIVAL AJALA e por TAIRONE CONDE COSTA) teria continuado de forma reiterada, até tempos presentes, a escamotear e a dissimular patrimônio que pertenceria aos MORINIGO, vale dizer, o suposto delito de lavagem de dinheiro continuaria sendo perpetrado (aliás, não com os bens que já teriam sido descobertos ao longo da investigação e que constaram de análise no v. acórdão embargado, mas por meio do acréscimo de novos patrimônios) – apenas a título de exemplo (haja vista que o que se irá indicar já constou de trechos precedentes deste voto): (b.1) ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA teria continuado a exercer função de “operador financeiro” do grupo à luz de que ainda seria o intermediador dos MORINIGO com o doleiro que se encontraria localizado no Paraguai (ROBSON AJALA – responsável, em tese, por executar os pagamentos e as despesas da organização), sem prejuízo da manutenção de vínculo com SLANE CHAGAS (que, por sua vez, intermediaria a venda e escamotearia veículos que pertenceriam aos “patrões” JEFFERSON, KLEBER e EMIDIO MORINIGO) e com arquiteto responsável por obras do clã (havendo, até mesmo, indícios de que ALEXANDRE repassaria ordens oriundas dos MORINIGO no sentido de que era para o arquiteto iniciar obras novas, ou seja, além daquelas que estariam em curso). (b.2) SLANE CHAGAS ocuparia o papel, conforme já adiantado no item acima, de intermediar a venda e de executar a transferência de veículos que seriam ligados ao esquema coordenado pelos MORINIGO. Diversas teriam sido as conversas telefônicas interceptadas em que SLANE, aparentemente, estaria imbricado com patrimônio do clã MORINIGO lavado (em tese) por meio da aquisição de automóveis, havendo a indicação de compra, em uma única oportunidade, de 05 (cinco) veículos (uma “S-10” 2017/2018, duas “Fiat Strada” 2019/2019 e dois “Toyota Corolla” 2019/2019). Também teria atuado para fins de escamoteamento patrimonial no licenciamento de dois automotores de altíssimo luxo (quais sejam, uma “DODGE RAM LARAMIE”, possuidora de placas GEM4C00, e uma “LAND ROVER RANGE ROVER SPT 3.0 TD HSE”, possuidora de placas QAU4I27), que não figurariam como sendo formalmente de propriedade de JEFFERSON, de KLEBER e de EMIDIO MORINIGO, porém gravitariam em torno de familiares deles (ANDERSON GARCIA MORINIGO e ESTER MARIA MAGALHÃES BEZERRA). Sem prejuízo do exposto, teria atuado, ademais, na venda de um veículo “LAND ROVER VELAR P300 SE RDYN” (possuidor de placas QCL1J90) que estava, em tese, em nome de ESTER MARIA MAGALHÃES BEZERRA (pessoa que sequer teria CNH e, mesmo assim, ostentaria uma frota de 03 – três – carros de valores extremamente elevados), bem como de uma “DODGE RAM” registrada em nome da pessoa jurídica “JG Construtora” (de JEFFERSON MORINIGO), que, não se sabe por qual motivo (o que não deixa de ser curioso), acabou por integrar patrimônio de uma mulher (Marcilei Sabara Souza) que não ostentaria CNH e sequer teria qualquer vínculo empregatício ou societário a dar lastro a uma transação de mais de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) – mais curioso ainda seria o fato de que Marcilei seria irmã de um homem (Deividson Angelo Sabara) que ostentaria 03 (três) passagens por tráfico de drogas. Agregue-se, ademais, que SLANE também teria exercido o papel de intermediador em contatos por meio dos quais um dos MORINIGO (a princípio e segundo as investigações, JEFFERSON) teria manifestado interesse em adquirir uma chácara em Campo Grande/MS. (b.3) também teria por função TAIRONE CONDE COSTA ocultar patrimônio da organização (em tese) criminosa por meio de sua loja de veículos (“Classe A Veículos Cuiabá/MT”), não devendo ser esquecida informação que apontaria que sua esposa,GILZA AUGUSTA DE ASSIS E SILVA, também teria levado a efeito atos de lavagem (sendo, talvez, o mais vultoso o registro da “Paraíso do Manso Resort” em seu nome). Teriam sido interceptadas conversas em que TAIRONE estaria tentando negociar propriedades rurais (sem a devida constatação a quem pertenceriam) ao mesmo tempo em que teria ficado esclarecida sua participação, em tese, nas Fazendas Tereré e Aliança (que pertenceriam aos MORINIGO, que a estariam explorando a pleno vapor por meio de plantações e possível criação de gado, e estaria em nome de um “faz tudo” da organização: JOSELITO PINHEIRO DE ABREU). Nota-se também diálogos sobre a aquisição de uma lancha que custaria mais de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Ademais, diversos veículos teriam sido vendidos e comprados nesse período final de apuração investigativa, havendo inclusive uma não explicada venda de uma “LAMBORGHINI” (que poderia ser a mesma utilizada por JEFFERSON MORINIGO e que teria sido deixada no “Paraíso do Manso Resort” porque JEFFERSON teria sido acometido de uma enfermidade quando se deslocou até a propriedade) e uma aquisição de um NISSAN “GTR Black Edition 2012”. Por fim, teria sido obtida a informação de que TAIRONE teria custeado parcelas de um consórcio para aquisição de uma lancha que, na realidade, seria de JEFFERSON MORINIGO (b.4) ROBSON AJALA ocuparia o papel de ser o doleiro da organização, atuando em conjunto (mas não exclusivamente) com as pessoas de THAIS MARTINS DE AQUINO e de PABULO RIBAS DOS SANTOS, por meio da constituição de diversas pessoas jurídicas. Sua atuação se faria presente até os dias atuais na justa medida em que gastos do clã MORINIGO seriam sempre repassados a ROBSON, por meio, exemplificativamente, da atuação de ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA (despesas com funcionários, por exemplo) ou de JOSELITO PINHEIRO DE ABREU (despesas com as Fazendas Tereré e Aliança). Dentro de tal contexto, lançando mão da cláusula rebus sic stantibus (art. 316 do Código de Processo Penal), mostra-se pertinente a decretação da prisão preventiva dos investigados JEFFERSON MORINIGO, KLEBER MORINIGO, EMIDIO MORINIGO,ALEXANDRE LIMA VILHANUEVA, SLANE CHAGAS, ROBSON LOURIVAL AJALA e TAIRONE CONDE COSTA com o fito de se resguardar a ordem pública (por meio da cessação das atividades – em tese – ilícitas de constante branqueamento de dinheiro por diversos expediente de lavagem) e de garantir a aplicação da lei penal (haja vista a indicação de que os líderes da organização – em tese – criminosa – teriam mudado ou estariam em vias de se mudar para o Paraguai), devendo ser destacada a efetiva existência de perigo gerado pelo estado de liberdade de tais agentes na justa medida em que a análise dos elementos investigativos carreados a estes Embargos de Declaração deram conta da perpetuação dos atos de lavagem até os dias presentes. Consigne-se, por oportuno, que medidas cautelares diversas da segregação preventiva não teriam o condão de permitir a cessação de práticas (a princípio) delitivas à luz de que os atos de lavagem poderiam se perpetuar por meio de contatos telefônicos das mais diversas matizes e de troca de dados pela internet e aplicativos que se utilizam da Rede Mundial de Computadores, ainda que limitada, por exemplo, a locomoção dos agentes ao âmbito residencial por meio da imposição de monitoração eletrônica, aspecto que somente restará efetivamente interrompido por meio da incomunicabilidade inerente ao encarceramento preventivo.

(...)

Ademais, trata-se de crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos, restando configurada a hipótese autorizativa do artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal.

Cumpre ressaltar que eventuais condições favoráveis, como residência fixa, família constituída e ocupação lícita não constituem circunstâncias aptas a garantir a revogação da prisão preventiva, quando existem outros elementos que justificam a necessidade da segregação cautelar, como se observa no caso em tela. (RHC 9.888, rel. Min. Gilson Dipp, DJU 23.10.00; HC 40.561/MG, Rel. Min. Felix Fischer, DJ 20.06.05, pág. 314).

Verifica-se, por fim, que o decisum impugnado está devidamente fundamentado, em observância nos artigos 5º, inciso LXI, e 93, inciso IX, ambos da Constituição Federal, estando alicerçado em elementos concretos, os quais demonstram a necessidade de decretação da prisão preventiva nos termos do que dispõe o artigo 312 do Código de Processo Penal, cumprindo o escopo inserto no artigo 93, IX, da Constituição Federal.

Quanto à ilegalidade da transferência dos pacientes para o sistema penitenciário federal não procede o inconformismo dos impetrantes, uma vez que não tendo a autoridade impetrada se pronunciado acerca deste tópico, inexiste o alegado constrangimento ilegal sofrido pelos ora pacientes.

No que tange à Recomendação CNJ nº 62/2020, dispõe o artigo 4º:

Art. 4º Recomendar aos magistrados com competência para a fase de conhecimento criminal que, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus, considerem as seguintes medidas:

I - a reavaliação das prisões provisórias, nos termos do art. 316, do Código de Processo Penal, priorizando-se:

a) mulheres gestantes, lactantes, mães ou pessoas responsáveis por criança de até doze anos ou por pessoa com deficiência, assim como idosos, indígenas, pessoas com deficiência ou que se enquadrem no grupo de risco;

b) pessoas presas em estabelecimentos penais que estejam com ocupação superior à capacidade, que não disponham de equipe de saúde lotada no estabelecimento, que estejam sob ordem de interdição, com medidas cautelares determinadas por órgão do sistema de jurisdição internacional, ou que disponham de instalações que favoreçam a propagação do novo coronavírus;

c) prisões preventivas que tenham excedido o prazo de 90 (noventa) dias ou que estejam relacionadas a crimes praticados sem violência ou grave ameaça à pessoa;

II - a suspensão do dever de apresentação periódica ao juízo das pessoas em liberdade provisória ou suspensão condicional do processo, pelo prazo de 90 (noventa) dias;

III - a máxima excepcionalidade de novas ordens de prisão preventiva, observado o protocolo das autoridades sanitárias.

Trata-se a sobredita norma de uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça para que os magistrados reavaliem a prisão provisória, priorizando-se os réus que se enquadrem nas situações elencadas, e não de um direito subjetivo à liberdade provisória.

Os documentos médicos apresentados pela defesa buscam fazer crer que os pacientes seriam frágeis. Alegam, por exemplo, que uma cirurgia de doação de parte do fígado ocorrida há quase dois anos em KLEBER MORINIGO ainda o colocaria sob risco de vida e que EMIDIO MORINIGO teria  se submetido “recentemente” a cirurgia em hérnia do disco cervical. Contudo, o atestado acostado indica que a cirurgia ocorreu no ano de 2018.

Os laudos juntados mencionam basicamente que os pacientes fazem “acompanhamento médico”, e inclusive fizeram consultas recentes. Todavia não existe nenhum impedimento a que os eventuais acompanhamentos médicos necessários e também os medicamentos requeridos pelos presos não lhes sejam adequadamente prestados via sistema público de saúde (SUS), que é interligado ao sistema penitenciário.

Cumpre consignar que em decisão proferida pelo Desembargador Federal Marcello Granado, do TRF da 2ª Região, nos autos da Remessa Necessária Criminal nº 5019036-70.2020.4.02.5101/RJ, foram compilados dados que demonstram que o risco da população carcerária ser acometida pela infecção Covid-19 e, eventualmente, vir a óbito, é menor do que o da população em geral.

Em consulta realizada em 02.10.2020 no sítio da internet do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, observa-se que a população carcerária atualmente monta a 748.009 presos, tendo sido diagnosticados 27.772 presos com Covid-19, dos quais, infelizmente, 114 vieram a óbito.

Esses números indicam que cerca de 3,71% da população carcerária foi infectada, enquanto que o número de óbitos na população carcerária representa aproximadamente 0,01% dos presos. Por outro lado, conforme dados constantes do site https://susanalitico.saude.gov.br/extensions/covid-19_html/covid-19_html.html, a população brasileira atualmente é de aproximadamente 210.147.125 pessoas, sendo que o número de infectados pela Covid-19 chegou a 4.880.523, dos quais 145.388 pessoas vieram a óbito (dados atualizados até 02.10.2020).

Esses dados demonstram que, ainda que se desconsidere a reconhecida subnotificação do número de diagnósticos de infectados pela Covid-19 no País, a taxa de infectados na população em geral é de 2,32%, enquanto que a taxa de óbitos é de aproximadamente 0,06%, o que indica que a probabilidade de alguém no Brasil vir a falecer de Covid-19 é 06 (seis) vezes maior que o da população que se encontra no sistema prisional.

Como é de conhecimento público, o Departamento Penitenciário - DEPEN e os Governos do Estado de São Paulo e do Mato Grosso do Sul suspenderam visitas nas unidades prisionais, o que significa o isolamento necessário para evitar a rápida proliferação da doença, conforme orientação da OMS - Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde.

Diante de tais considerações não se vislumbra, portanto, a existência de constrangimento ilegal passível de ser sanada pela concessão da ordem de Habeas Corpus.

Ante o exposto, DENEGO a ordem de Habeas Corpus.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. “OPERAÇÃO STATUS”. GRUPO CRIMINOSO ORGANIZADO DEDICADA AO TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS E LAVAGEM DE ATIVOS. REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA INDEFERIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 312 DO CPP. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. COMTEMPORANEIDADE. RECOMENDAÇÃO DO CNJ 62/2020.  AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUE OS PACIENTES ESTARIAM EM SITUAÇÃO DE GRAVE RISCO DE CONTAMINAÇÃO. ORDEM DENEGADA.

- A prisão preventiva dos pacientes foi decretada com fundamento na garantia da ordem pública.

- O pedido de revogação da prisão preventiva dos pacientes restou indeferido.

- A decisão que manteve a prisões cautelares dos pacientes assentada nos fundamentos acima expostos não padece de qualquer ilegalidade, fundada que se encontra nos requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal.

- A custódia cautelar revelou-se necessária com base em dados concretos coletados, não se tratando de meras ilações acerca da gravidade abstrata do ocorrido.

- A materialidade e os indícios autoria restaram bem demonstradas na representação da autoridade policial e relatórios de investigação, a ponto de fazer com que este Tribunal, em sede de julgamento de recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público, reconhecesse a existência de indícios suficientes dos crimes de tráfico internacional de drogas e de lavagem de ativos, concedendo as medidas de busca e apreensão e sequestro que foram executadas por ocasião da recente deflagração da referida operação. A par disso, a longa investigação desenvolvida reuniu elementos consistentes de materialidade e autoria de crimes de lavagem de dinheiro, organização criminosa e tráfico de drogas. Subjacente ao tráfico de drogas, restou demonstrada a existência de um forte esquema de lavagem de dinheiro a beneficiar os pacientes, respectivamente pai e seus dois filhos.

- O requisito da garantia da ordem pública, como critério a ser aferido para a decretação da custódia cautelar, é de ser visto não apenas como medida para evitar que o acusado continue a praticar delitos, mas também como uma resposta à sociedade, em face do crime em tese praticado.

- Os delitos objeto de apuração são graves, eis que causam grande repercussão social. A permanência dos pacientes em liberdade seria autêntico escárnio e descrédito da justiça, na medida em que a sociedade espera sempre a atuação serena, porém firme, da Justiça e das demais instâncias de persecução penal.

- A ordem pública é ofendida pela nefasta atuação da organização criminosa, continuadamente. Inobstante a ocorrência de apreensões e prisões, não teria havido interrupção da atividade delinquencial.

- Note-se que somente com o aprofundamento das investigações é que se revelaram o modo de execução dos crimes, seus possíveis membros como também a continuidade das ações delitivas, possibilitando as prisões preventivas decretadas nos autos subjacentes.

- O Supremo Tribunal Federal, com efeito, já se manifestou no sentido de que "a custódia cautelar visando a garantia da ordem pública legitima-se quando evidenciada a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa" (RHC 122182, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 19.8.2014).

- Nítida a gravidade em concreto das condutas e a imprescindibilidade da prisão preventiva para assegurar a ordem pública, por meio da cessação das atividades do grupo criminoso. Há necessidade da segregação, também, por conta do risco comprometedor da aplicação da lei penal, devendo ser considerada também a estrutura da organização, em tese criminosa, e seus arraigados laços com o Paraguai, o que pode ser facilitador de fuga àquele país. Registre-se, neste ponto, que há indícios de que os líderes da organização, em tese, criminosa teriam se mudado ou estariam em vias de se mudar para o Paraguai, devendo ser destacada a efetiva existência de perigo gerado pelo estado de liberdade de tais agentes, na justa medida em que a análise dos elementos investigativos carreados aos autos deram conta da perpetuação dos atos de lavagem.

- Restou reconhecido por este Tribunal que os pacientes, ao menos em tese, são os líderes de uma organização criminosa altamente estruturada e que, além de estar envolvida na prática de delitos de tráfico internacional de drogas - conforme as apreensões ocorridas durante o período de interceptação telefônica e as condenações pretéritas dos ora pacientes - também ocultavam bens e valores por meio de interpostas pessoas.

- Desse modo,  a manutenção da segregação cautelar dos pacientes visa interromper a cadeia de ações da organização criminosa e cessar a prática delitiva, de modo a preservar a ordem pública e garantir a aplicação da lei penal.

- Ainda consoante exposição contida na representação da autoridade policial e relatórios de investigação constantes da presente impetração, o grupo criminoso continuaria plenamente ativo até o momento da deflagração desta operação policial. Novos crimes teriam sido perpetrados e ações permanentes de lavagem de ativos (sobretudo na forma de ocultação de propriedade e de localização de bens adquiridos com proveitos do tráfico internacional de drogas) persistiriam. A riqueza ilícita além de sustentar padrão de vida elevado dos criminosos estaria em constante processo de reciclagem.

- Este relator, nos embargos de declaração oposto pelo Ministério Público,  apesar de ter restado vencido, concluiu pela existência de contemporaneidade inerente à cautelaridade da prisão preventiva para assegurar a aplicação da lei penal e da ordem pública.

- Trata-se de crime doloso punido com pena privativa de liberdade máxima superior a 04 (quatro) anos, restando configurada a hipótese autorizativa do artigo 313, inciso I, do Código de Processo Penal.

- Eventuais condições favoráveis, como residência fixa, família constituída e ocupação lícita não constituem circunstâncias aptas a garantir a revogação da prisão preventiva, quando existem outros elementos que justificam a necessidade da segregação cautelar, como se observa no caso em tela. (RHC 9.888, rel. Min. Gilson Dipp, DJU 23.10.00; HC 40.561/MG, Rel. Min. Felix Fischer, DJ 20.06.05, pág. 314).

- decisum impugnado está devidamente fundamentado, em observância nos artigos 5º, inciso LXI, e 93, inciso IX, ambos da Constituição Federal, estando alicerçado em elementos concretos, os quais demonstram a necessidade de decretação da prisão preventiva nos termos do que dispõe o artigo 312 do Código de Processo Penal, cumprindo o escopo inserto no artigo 93, IX, da Constituição Federal.

- Quanto à ilegalidade da transferência dos pacientes para o sistema penitenciário federal não procede o inconformismo dos impetrantes, uma vez que não tendo a autoridade impetrada se pronunciado acerca deste tópico, inexiste o alegado constrangimento ilegal sofrido pelos ora pacientes.

-- No que tange à Recomendação CNJ nº 62/2020, trata-se a sobredita norma de uma recomendação do Conselho Nacional de Justiça para que os magistrados reavaliem a prisão provisória, priorizando-se os réus que se enquadrem nas situações elencadas, e não de um direito subjetivo à liberdade provisória.

- Os laudos juntados mencionam basicamente que os pacientes fazem “acompanhamento médico”, e inclusive fizeram consultas recentes. Todavia não existe nenhum impedimento a que os eventuais acompanhamentos médicos necessários e também os medicamentos requeridos pelos presos não lhes sejam adequadamente prestados via sistema público de saúde (SUS), que é interligado ao sistema penitenciário.

- Cumpre consignar que em decisão proferida pelo Desembargador Federal Marcello Granado, do TRF da 2ª Região, nos autos da Remessa Necessária Criminal nº 5019036-70.2020.4.02.5101/RJ, foram compilados dados que demonstram que o risco da população carcerária ser acometida pela infecção Covid-19 e, eventualmente, vir a óbito, é menor do que o da população em geral.

- Em consulta realizada em 02.10.2020 no sítio da internet do Departamento Penitenciário Nacional – DEPEN, observa-se que a população carcerária atualmente monta a 748.009 presos, tendo sido diagnosticados 27.772 presos com Covid-19, dos quais, infelizmente, 114 vieram a óbito.

- Esses números indicam que cerca de 3,71% da população carcerária foi infectada, enquanto que o número de óbitos na população carcerária representa aproximadamente 0,01% dos presos. Por outro lado, conforme dados constantes do site https://susanalitico.saude.gov.br/extensions/covid-19_html/covid-19_html.html, a população brasileira atualmente é de aproximadamente 210.147.125 pessoas, sendo que o número de infectados pela Covid-19 chegou a 4.880.523, dos quais 145.388 pessoas vieram a óbito (dados atualizados até 02.10.2020).

- Esses dados demonstram que, ainda que se desconsidere a reconhecida subnotificação do número de diagnósticos de infectados pela Covid-19 no País, a taxa de infectados na população em geral é de 2,32%, enquanto que a taxa de óbitos é de aproximadamente 0,06%, o que indica que a probabilidade de alguém no Brasil vir a falecer de Covid-19 é 06 (seis) vezes maior que o da população que se encontra no sistema prisional.

- Como é de conhecimento público, o Departamento Penitenciário - DEPEN e os Governos do Estado de São Paulo e do Mato Grosso do Sul suspenderam visitas nas unidades prisionais, o que significa o isolamento necessário para evitar a rápida proliferação da doença, conforme orientação da OMS - Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde.

- Ordem denegada.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.