Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002125-55.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: FERNANDO ANTONIO PICCOLO

Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL MIRANDA GABARRA - SP256762-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: SERGIO BARREZI DIANI PUPIN - SP288428-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002125-55.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: FERNANDO ANTONIO PICCOLO

Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL MIRANDA GABARRA - SP256762-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: SERGIO BARREZI DIANI PUPIN - SP288428-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 04/04/2014  em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (06/06/2013), mediante o reconhecimento do caráter especial das atividades mencionadas na petição inicial, além de indenização por danos morais.  Subsidiariamente, requer a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

O Juízo a quo após acolher embargos de declaração, julgou improcedente o pedido de compensação por dano moral e parcialmente procedente o pedido remanescente, para determinar que o INSS considere o exercício de atividade especial nos períodos de 02/01/1978 a 31/10/1980, 01/08/1988 a 30/09/1990, 01/12/1990 a 30/11/1993 e de 01/03/1994 a 31/12/1995. Condenou o autor ao pagamento de honorários advocatícios fixados em R$ 2500,00 (dois mil e quinhentos reais), cuja execução, por força do deferimento da gratuidade, deverá observar o disposto pela Lei n  1.060/50.

Inconformado, apela o autor, arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença, em decorrência de cerceamento de defesa, eis que não foi realizada a prova pericial. No mérito, sustenta que comprovou o exercício de atividade especial, por meio de laudo subscrito por engenheiro de segurança do trabalho. Afirma, ainda, que devem ser computados todos os períodos em que houve recolhimento de contribuições previdenciárias, bem como o interregno em que exerceu a função de estagiário.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

É o breve relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002125-55.2014.4.03.6102

RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA

APELANTE: FERNANDO ANTONIO PICCOLO

Advogado do(a) APELANTE: RAFAEL MIRANDA GABARRA - SP256762-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELADO: SERGIO BARREZI DIANI PUPIN - SP288428-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Conforme dispõe o inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal: "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes". (grifei).

Por sua vez, o art. 370 do CPC/15 dispõe:

 

"Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias." (grifei)

 

É de se recordar que o princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Eduardo Couture, revelando profunda visão sobre o aspecto constitucional do direito processual, enunciou que "A lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).

 

Sobre o direito à prova, esclarece Cândido Rangel Dinamarco:

 

"Direito à prova é o conjunto de oportunidades oferecidas à parte pela Constituição e pela lei, para que possa demonstrar no processo a veracidade do que afirmam em relação aos fatos relevantes para o julgamento.(...)

A imensa importância da prova na experiência do processo erigiu o direito à prova em um dos mais respeitados postulados inerentes à garantia política do devido processo legal, a ponto de se constituir em um dos fundamentais pilares do sistema processual contemporâneo. Sem sua efetividade não seria efetiva a própria garantia constitucional do direito ao processo. (...)

No plano infraconstitucional o direito à prova está indiretamente afirmado pelo art. 332 do Código de Processo Civil (...)

Na Constituição, o direito à prova é inerência do conjunto de garantias do justo processo, que ela oferece ao enunciar os princípios do contraditório e ampla defesa, culminando por assegurar a própria observância destes quando garante a todos o due processo of law (art. 5º, incs. LIV e LV - supra, nn. 94 e 97). Pelo aspecto constitucional, direito à prova é a liberdade de acesso às fontes e meios segundo o disposto em lei e sem restrições que maculem ou descaracterizem o justo processo." (Instituições de Direito Processual Civil, vol. III, 6ª ed., Malheiros: São Paulo, 2009, pp. 46/47, grifos meus)

 

Com efeito, incabível impedir que o segurado possa comprovar por perícia que efetivamente houve a exposição a fatores de risco. A legislação previdenciária colocou a cargo da empresa empregadora a elaboração do laudo técnico comprobatório da especialidade. Se a empresa, porém, deixa de elaborar o laudo, e, ao mesmo tempo, é negado ao segurado o direito de fazer prova do fator de risco, a ação proposta por este estará fatalmente fadada ao insucesso. Não por não fazer o segurado jus ao direito material reclamado; mas simplesmente por ter sido privado dos meios capazes de comprovar que o labor se deu em condições nocivas.

Devido registrar, outrossim, que o C. STJ também admite que o caráter especial do trabalho exercido seja comprovado por meio de prova pericial por similaridade, realizada em empresa com características semelhantes àquela em que se deu a prestação da atividade, caso a mesma não esteja mais em funcionamento. Neste sentido, os seguintes precedentes:

 

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA 284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO.

(...)

2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.

3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica.

4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente prestou seus serviços.

5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.

6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.

7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se ajustarem às particularidades do caso concreto.

8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido."

(REsp nº 1.370.229, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, v.u., j. 25/02/14, DJe 11/03/14, grifos meus)

 

"PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE.

1. 'Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica'. (REsp 1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013).

2. Agravo Regimental não provido."

(AgRg no REsp nº 1.422.399, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., j. 18/03/14, DJe 27/03/14, grifos meus)

 

No presente caso, o julgamento antecipado da lide causou efetivo prejuízo à parte autora, por impedir, no presente momento, a comprovação do caráter especial das atividades exercidas nos períodos pleiteados.

Ademais, com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.

Observo que, o laudo técnico realizado unilateralmente pelo autor não é hábil a comprovar o labor em condições especiais, nos termos exigidos pela legislação previdenciária.

Assim, impositiva a anulação da sentença, para que seja produzida a prova pericial relativa aos períodos laborados após 28/04/1995.

Ante o exposto, acolho a preliminar para anular a sentença a sentença recorrida, determinando o retorno dos autos à Vara de Origem para fins de produção da prova pericial, ficando prejudicada, no mérito, a apelação.

É o meu voto.                                        

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PREVIDENCIÁRIO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO.

I- O inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal dispõe que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

II- O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).

III- No presente caso, o julgamento antecipado da lide causou efetivo prejuízo à parte autora, por impedir, no presente momento, a comprovação do caráter especial das atividades exercidas nos períodos pleiteados.

IV- Impositiva a anulação da sentença, para que seja produzida a prova pericial relativa aos períodos laborados após 28/04/1995.

V- Preliminar acolhida. Apelo da parte autora prejudicado, no mérito.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu acolher a preliminar para anular a r. sentença, determinando a remessa dos autos ao Juízo de Origem, para realização da prova pericial, ficando prejudicada, no mérito, a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.