Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017072-24.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: PAULO DE TARSO GARCIA

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017072-24.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: PAULO DE TARSO GARCIA

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação ajuizada por PAULO DE TARSO GARCIA em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a parte autora a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do óbito de sua esposa, Elizabeth Pinto Garcia, ocorrido em 13/12/2005.

 

A sentença julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder o benefício ao autor, a partir da data do requerimento administrativo (09/06/2015), e ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas monetariamente nos termos do Manual de Cálculos na Justiça Federal. Condenou o réu, ainda, ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação, considerado como termo final desta a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do C. STJ.

Foi determinada, ainda, em sede de antecipação de tutela, a implantação imediata do benefício.

Dispensado o reexame necessário nos termos do §3º do art. 496, do Código de Processo Civil/2015.

 

Apela o INSS requerendo, preliminarmente, a suspensão da tutela concedida na sentença bem como o reconhecimento da ocorrência da prescrição do direito ao benefício. No mérito, sustenta, em síntese, a ausência de comprovação da qualidade de segurado e da condição de trabalhador rural do falecido, sendo indevido o benefício pretendido. Subsidiariamente, requer a observância do art. 1º - F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009 quanto aos juros de mora e a correção monetária..

Com contrarrazões vieram os autos a esta Corte.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0017072-24.2018.4.03.9999

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: PAULO DE TARSO GARCIA

Advogado do(a) APELADO: LICELE CORREA DA SILVA FERNANDES - SP129377-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

PRELIMINAR

 

Rejeito a preliminar aventada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, posto que é plenamente possível a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Precedentes (STF, Rcl 1067 / RS, Tribunal Pleno, Relatora Min. Ellen Gracie, j. 05/9/2002, v.u., DJ 14/02/2003, p. 60; STJ, RESP 539621, Sexta Turma, Relator Min. Hamilton Carvalhido, j. 26/5/2004, v.u., DJ 02/8/2004, p. 592)

Nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil/2015, vigente à época da sentença, o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que evidenciada a prova do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

No caso, conforme avaliação do Juízo a quo, restaram configurados os requisitos autorizadores da concessão do benefício, pelo que mantenho seus efeitos.

 

Preliminarmente, com relação à prescrição , ressalto que ela não atinge o fundo do direito pleiteado, de benefício previdenciário, mas apenas as prestações vencidas no quinquênio anterior à propositura da ação, isoladamente consideradas.

 

Nesse sentido, transcrevo o seguinte julgado do STJ:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR DIADE RURAL. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. A controvérsia debatida nos autos gira em torno da ocorrência ou não da prescrição do fundo de direito , relativamente ao indeferimento do pedido de concessão de aposentadoria.

2. Os benefícios previdenciários estão ligados ao próprio direito à vida digna e são direitos sociais que compõem o quadro dos direitos fundamentais.

3. A pretensão ao benefício previdenciário em si não prescreve, mas tão somente as prestações não reclamadas em certo tempo, que vão prescrevendo uma a uma, em virtude da inércia do beneficiário.

4. Com efeito, a jurisprudência do STJ, em recentes julgados, consolidou o entendimento de que nos feitos relativos à concessão de benefício, não prescreve o fundo de direito , mas apenas as verbas pleiteadas anteriores aos cinco anos do ajuizamento da ação.

5. Agravo regimental não provido."

(STJ, SEGUNDA TURMA; AGRESP 201400410420, Min. Mauro Campbell Marques; DJE DATA 29/04/2014).

 

Assim, afasto a ocorrência da prescrição do direito ao benefício e passo ao exame do mérito.

 

MÉRITO

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

 

Os requisitos a serem observados para a concessão da pensão por morte estão previstos nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, sendo necessária a comprovação, cumulativamente: a) do óbito ou morte presumida de pessoa que seja segurada (obrigatória ou facultativa) da Previdência Social; b) da existência de beneficiário dependente do de cujus, em idade hábil ou preenchendo outras condições previstas em lei; e c) da qualidade de segurado do falecido.

A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.110.565/SE, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, fixou que o deferimento do benefício de pensão por morte está vinculado ao cumprimento da condição de segurado do falecido, salvo na hipótese prevista na Súmula 416/STJ: "É devida a pensão por morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito".

A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.

O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária.

Por sua vez, o §4º desse dispositivo legal estabelece que haverá a perda da qualidade de segurado no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.

Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.

Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.

Nesse passo, importa consignar que a redação original do inciso I do artigo 26 Lei de Benefícios, bem como aquela que lhe foi dada pela Lei nº 9.876/99, mantida pela Lei nº 13.135/2015, dispensa o cumprimento de carência para fins de concessão do benefício de pensão por morte.

 

No tocante aos dependentes do segurado falecido, o direito à pensão por morte encontra-se disciplinado na Lei n. 8.213/91, art. 16, in verbis:

" Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente."

 

Vale lembrar que esse benefício é devido ao conjunto de dependentes do de cujus que reúnam as condições previstas nos art. 77 da Lei 8.213/1991, obviamente cessando para o dependente que não mais se enquadre nas disposições desse preceito normativo. Nem mesmo a constatação de dependente ausente obsta a concessão da pensão, cabendo sua habilitação posterior (art. 76 da Lei 8.213/1991).

Por sua vez, o § 4º desse mesmo artigo estabelece que "a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada".

A dependência econômica não precisa ser exclusiva, de modo que persiste ainda que a parte autora tenha outros meios de complementação de renda. Interpretação abrangente do teor da Súmula 229, do extinto E. TFR.

Nesse sentido, também não impede a concessão do benefício em tela o fato de o dependente receber aposentadoria, pois o art. 124 da Lei nº 8.213/1991 não veda a acumulação da pensão por morte com aposentadoria, quando presentes os requisitos legais. Nega, apenas, a acumulação de mais de uma pensão, deixada por cônjuge ou companheiro, assegurado o direito de se optar pelo pagamento da mais vantajosa.

 

O caso dos autos

 

Contesta a autarquia apelante a qualidade de segurada da falecida, uma vez que a parte autora não teria comprovado o exercício do labor rural à epoca do óbito.

No tocante à condição de segurado, os direitos previdenciários daqueles que exercem a atividade laborativa no campo surgiram com o advento da Lei nº 4.214/63 – Estatuto da Terra. A Lei Complementar nº 11/71 instituiu o PRORURAL – Programa de Assistência ao Trabalhador Rural. Atualmente a Lei nº 8.213/91 assiste a todos os trabalhadores, sendo que o artigo 11 desta Lei discorre também sobre a condição de segurado especial do trabalhador rural.

É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como à filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)

 

A sentença de primeiro grau julgou procedente o pedido de concessão do benefício sob os seguintes fundamentos:

 

"Funda-se no disposto nos artigos 11 e 74 da Lei Federal n°8.213/91, e nesta senda, necessária a comprovação de que o(a) "de cujus" mantinha a qualidade de segurado especial, bem como da relação de parentesco e de dependência. A relação de parentesco e dependência são presumidas, já que as partes eram casadas (fls.12).

As provas produzidas nos autos, oral e documental, comprovaram que tanto o autor (fls. 19/21), como sua falecida esposa (fls.15/18), exerciam de fato atividade de natureza rural, sendo que os recolhimentos constantes do CNIS de fls.51, em nome do autor, reportam-se aos períodos constantes das NFs de fls.19/21, sendo que as contribuições são originárias da mencionada atividade rurícola."

 

Com efeito, a parte autora acostou aos autos notas fiscais de insumos agrícolas, expedidas em seu nome e de sua esposa, em vários períodos, inclusive o do óbito. As testemunhas ouvidas em audiência, unânimes e conclusivas, atestaram o labor rural da falecida, esposa do autor, por muitos anos até dias próximos ao óbito, em regime de economia familiar.

 

Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante concluiu pela existência da qualidade de segurado da de cujus com base na totalidade do conjunto probatório acostado nos autos, sendo de rigor a manutenção da sentença de procedência por seus próprios fundamentos legais.

 

No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.

 

Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp 1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.

 

Considerando o não provimento do recurso, de rigor a aplicação da regra do §11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.

 

Ante o exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação do INSS e, com fulcro no §11º do artigo 85 do Código de Processo Civil, majoro os honorários de advogado em 2% sobre o valor arbitrado na sentença, nos termos da fundamentação.

 

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. PENSÃO POR MORTE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. FAZENDA PÚBLICA. EFEITO DEVOLUTIVO DA APELAÇÃO. QUALIDADE DE SEGURADO. TRABALHADOR RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MAJORADOS.

1. É plenamente possível a antecipação da tutela contra a Fazenda Pública nas causas de natureza previdenciária e assistencial. Apelação dotada apenas de efeito devolutivo. Preliminar rejeitada.

2. O benefício de pensão por morte está disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/1991, sendo requisitos para a sua concessão a qualidade de segurado do de cujus e a comprovação de dependência do pretenso beneficiário.

3. Conjunto probatório suficiente à comprovação da qualidade de segurado do falecido de modo a preencher os requisitos para concessão do benefício.

4. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração. Correção de ofício.

5. Sucumbência recursal. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.

6. Sentença corrigida de ofício. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação do INSS não provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito, rejeitar a preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.