Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5002353-48.2019.4.03.6108

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

APELADO: SERGIO ALBERTO SLEUTJES, WALTER WILLIAM SLEUTJES

Advogado do(a) APELADO: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SC29924-A
Advogado do(a) APELADO: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SC29924-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5002353-48.2019.4.03.6108

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

APELADO: SERGIO ALBERTO SLEUTJES, WALTER WILLIAM SLEUTJES

Advogado do(a) APELADO: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SC29924-A
Advogado do(a) APELADO: ENEIDA VASCONCELOS DE QUEIROZ MIOTTO - SC29924-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de remessa oficial e apelações interpostas pela União Federal (Fazenda Nacional) e pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, em face da r. sentença (Id. num. 132942559), que concedeu a segurança pleiteada nos autos do mandado de segurança impetrado por SERGIO ALBERTO SLEUTJES e WALTER WILLIAM SLEUTJES contra ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM BAURU-SP e em também em desfavor do litisconsorte FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – FNDE, com o fim de assegurar a inexigibilidade da contribuição do salário educação, e o reconhecimento como indevidos dos valores recolhidos a esse título nos 5 anos que antecederam a impetração. 

Em suma, alegam ser pessoas físicas exploradoras de atividades ligadas à produção rural, não estando enquadrados como sociedades ou empresários individuais, pelo que não estão sujeitos ao recolhimento de contribuições exigidas a título de salário educação (art. 212, § 5º, da Constituição, Lei nº 9.424/1996 e Decreto nº 6.003/2006). 

Ressaltam que não são pessoas jurídicas registradas na Junta Comercial e que têm inscrição no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) apenas para atender obrigação acessória imposta pelo de Estado de São Paulo, fato que não tem o condão de fazer nascer uma pessoa jurídica. Não há pedido de liminar. 

A União foi notificada e manifestou interesse em ingressar no feito. 

Citado, o FNDE apresentou manifestação apenas para aduzir a desnecessidade de sua integração na lide, visto entender que bastará a representação pela PFN. 

As informações foram prestadas. A Autoridade tida por coatora discorreu sobre a conformação jurídica do salário-educação, sustentando que os Impetrantes se enquadram no conceito previdenciário de empresa ou em ente equiparado a tal e, por isso, devem recolher o salário-educação sobre a folha de salários. 

O MM. Juiz a quo, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, CONCEDEU A SEGURANÇA pleiteada no presente mandado de segurança, para o fim de declarar a inexigibilidade do recolhimento da contribuição do salário-educação sobre a folha de salários, pagos pelos Impetrantes. Por consequência, determinou à autoridade impetrada se abster de praticar atos tendentes à satisfação do crédito decorrente das referidas verbas, tais como inclusão no CADIN e negativa de expedição de certidões. Foi determinado, também que os valores indevidamente recolhidos dentro do prazo prescricional delimitado na sentença e até o seu trânsito em julgado deverão ser corrigidos pela SELIC e compensados nos termos do artigo 89 da Lei 8.212/91 (com redação dada pela Lei 11.941/2009), da IN 1717/2017, do artigo 170-A do CTN e artigo 39, §4º, da Lei 9.250/95. Os Impetrantes poderão optar pela via da compensação ou, querendo a repetição de indébito, deverão ajuizar a ação própria (Súmula 271 – STF).  Sem condenação em honorários, nos termos do artigo 25, da Lei 12.016/2009. Custas ex lege.  Sentença sujeita a reexame necessário, na forma do art. 14, § 1º, da Lei n. 12.016/2009. 

Em razões recursais, alega o FNDE que é parte ilegítima para compor o polo passivo da presente ação, requerendo a reforma da r. sentença com a exclusão da lide (Id. num. 132942567). 

A União Federal aduz em sua Apelação, em síntese, que “... o impetrante – que possui inscrição no CNPJ – está sujeito ao pagamento da contribuição do salário-educação, porquanto o exercício da atividade rural na condição de empregador rural tem o condão de equipará-los à empresa sujeita ao financiamento do ensino fundamental público, tudo em estrita observância à legislação constitucional e infraconstitucional”. Desta forma, requer a reforma integralmente da r. sentença (Id. num. 132942568).

Com contrarrazões, vieram os autos a este E. Tribunal.

O ilustre Representante do Ministério Público Federal opina pelo regular prosseguimento do feito.

É o Relatório.

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5002353-48.2019.4.03.6108

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. ANTONIO CEDENHO

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V O T O

 

 

 

Trata-se de recursos de apelação e remessa oficial interpostos em face da sentença que concedeu a segurança para assegurar aos impetrantes a não incidência do salário-educação sobre a folha salarial decorrente de suas atividades como produtores rurais pessoas físicas. A r. decisão garantiu aos impetrantes o direito à restituição administrativa ou compensação, após o trânsito em julgado, dos valores indevidamente recolhidos nos cinco anos anteriores à impetração a título da exação, corrigidos pela taxa Selic, observando-se as limitações impostas pelo art. 26-A da Lei nº 11.457/2007. A sentença foi submetida ao reexame necessário.

O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, autarquia federal criada pela Lei nº 5.537/1968, é o destinatário da maior parte do valor pago a título de contribuição ao salário-educação.

Com o advento da Lei nº 11.457/2007, a União passou a exercer, por meio da Secretaria da Receita Federal do Brasil, as atividades de arrecadação, recolhimento, fiscalização, inscrição em dívida ativa e cobrança judicial da exação, nos termos dos arts. 2º, 3º e 16 da Lei nº 11.457/2007, mediante o recebimento do percentual de 1% do produto da exação (art. 6º do Decreto n. 6.003/2006 c/c o art. 15, § 1º da Lei n. 9.424/1996).

Em decisão proferida no EREsp 1.619.954/SC, a 1ª Seção do e. STJ firmou o entendimento de que não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais nas quais se discute a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto os serviços sociais são apenas destinatários de subvenção econômica, não sendo os titulares de capacidade tributária ativa.

Confira-se:

PROCESSUAL CIVIL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. SERVIÇOS SOCIAIS AUTÔNOMOS. DESTINAÇÃO DO PRODUTO. SUBVENÇÃO ECONÔMICA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. LITISCONSÓRCIO. INEXISTÊNCIA.
1. O ente federado detentor da competência tributária e aquele a quem é atribuído o produto da arrecadação de tributo, bem como as autarquias e entidades às quais foram delegadas a capacidade tributária ativa, têm, em princípio, legitimidade passiva ad causam para as ações declaratórias e/ou condenatórias referentes à relação jurídico-tributária.
2. Na capacidade tributária ativa, há arrecadação do próprio tributo, o qual ingressa, nessa qualidade, no caixa da pessoa jurídica.
3. Arrecadado o tributo e, posteriormente, destinado seu produto a um terceiro, há espécie de subvenção.
4. A constatação efetiva da legitimidade passiva deve ser aferida caso a caso, conforme a causa de pedir e o contexto normativo em que se apoia a relação de direito material invocada na ação pela parte autora.
5. Hipótese em que não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais em que são partes o contribuinte e o/a INSS/União Federal e nas quais se discutem a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto aqueles (os serviços sociais) são meros destinatários de subvenção econômica.
6. Embargos de divergência providos para declarar a ilegitimidade passiva ad causam do SEBRAE e da APEX e, por decorrência do efeito expansivo, da ABDI.
(EREsp 1619954/SC, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/04/2019, DJe 16/04/2019) grifamos

Nesse cenário, a 2ª Turma do e. STJ, adotou o mesmo raciocínio ao FNDE, alterando seu entendimento em razão da referida autarquia ser, também, mera beneficiária da arrecadação da contribuição ao salário-educação a cargo da União.

Confira-se:

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA O SALÁRIO-EDUCAÇÃO. LEGITIMIDADE DO FNDE. PRODUTOR RURAL. PESSOA FÍSICA COM REGISTRO NO CNPJ. EQUIPARAÇÃO À EMPRESA.
I - O feito decorre de ação ajuizada para obter a restituição da contribuição do salário-educação cobrado de produtor rural, pessoa física, com inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ, como contribuinte individual.
II - A contribuição do salário-educação é devida pelo produtor rural, pessoa física, que possui registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ, ainda que contribuinte individual, pois somente o produtor rural que não está cadastrado no CNPJ está desobrigado da incidência da referida exação. Precedentes: AgInt no AREsp n. 821.906/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, DJe 4/2/2019; AgInt no REsp n. 1.719.395/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 27/11/2018.                                  
III - O Superior Tribunal de Justiça vinha entendendo que o Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE) deve integrar a lide que tem como objeto a contribuição ao salário-educação, conforme decidido nos REsp n. 1.658.038/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 30/6/2017 e AgInt no REsp n. 1.629.301/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 13/3/2017. Entretanto, em recente julgamento, no EREsp n. 1.619.954/SC, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça declarou a ilegitimidade passiva do SEBRAE, da APEX e da ABDI, nas ações nas quais se questionam as contribuições sociais a eles destinadas. Tal entendimento foi fundamentado na constatação de que a legitimidade passiva em tais demandas está vinculada à capacidade tributária ativa. Assim, sendo as entidades referidas meras destinatárias da referida contribuição, são ilegítimas para figurar no polo passivo ao lado da União. O mesmo raciocínio se aplica na hipótese dos autos, apontando a ilegitimidade passiva do FNDE, porquanto a arrecadação da denominada contribuição salário-educação tem sua destinação para a autarquia, com os valores, entretanto, sendo recolhidos pela União, por meio da Secretaria da Receita Federal.
IV - Recurso especial da Fazenda Nacional provido. Recurso Especial do FNDE provido para declarar sua ilegitimidade passiva.
(REsp 1743901/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/05/2019, DJe 03/06/2019) grifamos

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. FNDE. CONTRIBUIÇÃO AO SALÁRIO-EDUCAÇÃO. LEGITIMIDADE. LEI 11.457/2007. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282/STF. ENTENDIMENTO FIRMADO PELA PRIMEIRA SEÇÃO DO STJ NOS ERESP 1.619.954/SC. ACÓRDÃO FUNDAMENTADO EM MATÉRIA CONSTITUCIONAL. INVIABILIDADE DE ANÁLISE EM RECURSO ESPECIAL. (...)
3. A Segunda Turma do STJ possuía entendimento de que o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE era parte legítima para figurar em causas referentes à contribuição ao salário-educação.
4. Em recente análise da matéria, nos EREsp 1.619.954/SC, a Primeira Seção do STJ firmou a seguinte compreensão: "(...) não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais em que são partes o contribuinte e o/a INSS/União Federal e nas quais se discutem a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto aqueles (os serviços sociais) são meros destinatários de subvenção econômica" (Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 16.4.2019).
5. Na ocasião, a e. Min. Assusete Magalhães proferiu voto-vista esclarecendo que esse entendimento é também aplicável às contribuições ao salário-educação: "(...) Conquanto os acórdãos embargados citem dois precedentes de minha relatoria, de 2015, que admitem a legitimidade passiva do FNDE, ao lado da União, em ação de repetição de contribuição para o salário-educação, reexaminando detidamente o assunto, à luz da Lei 11.457, de 16/03/2007, e de toda a legislação que rege a matéria, especialmente as Instruções Normativas RFB 900/2008 e 1.300/2012, já revogadas, e a vigente Instrução Normativa RFB 1.717/2017 - que dispõem no sentido de que 'compete à RFB efetuar a restituição dos valores recolhidos para outras entidades ou fundos, exceto nos casos de arrecadação direta, realizada mediante convênio -, reconsidero minha posição, aliás, hoje já superada pela mais recente jurisprudência da própria Segunda Turma, sobre a matéria".

6. A Segunda Turma, na sessão de 9.5.2019, readequou o seu entendimento sobre a matéria. Precedente: REsp 1.743.901/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, data de julgamento 9.5.2019, pendente de publicação.

(...)
(REsp 1810680/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 09/09/2019) grifamos

À luz de recentes decisões proferidas pela jurisprudência, o FNDE é parte passiva ilegítima em processo versando sobre a contribuição ao salário-educação.

Assim, impõe-se a exclusão do FNDE do polo passivo da ação, devendo ser acolhido o presente recurso de apelação, inexistindo, portanto, litisconsórcio passivo necessário com a União, devendo a demanda em face do FNDE ser extinta, sem resolução do mérito, com fulcro no inc. VI do art. 485 do CPC, sem condenação em honorários por força do art. 25, da Lei nº 12.016/2009.

Competindo à Secretaria da Receita Federal do Brasil as atividades relacionadas à arrecadação do salário-educação, nos termos do art. 3º, § 6º, da Lei nº 11.457/2007, a relação jurídico-tributário é estabelecida entre a União e o contribuinte, o que justifica, inclusive, a ausência de legitimidade passiva “ad causam” do FNDE.

O contribuinte do salário-educação é a empresa, entendida como qualquer firma individual ou sociedade que assuma o risco da atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não.

Confira-se a redação do art. 15 da Lei n° 9.424/1996:

Art 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas,a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº8.212, de 24 de julho de 1991

O art. 2º do Decreto nº 6.003/2006 trata sobre os contribuintes do salário-educação:

Art. 2º  São   contribuintes   do   salário-educação  as  empresas  em  geral  e as  entidades públicas e privadas vinculadas ao Regime Geral da Previdência Social, entendendo-se como tais, para fins desta incidência, qualquer firma individual ou sociedade que assuma o risco de   atividade   econômica,   urbana   ou   rural,   com   fins   lucrativos   ou   não, bem assim a sociedade de economia mista, a empresa pública e demais sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público, nos termos do art. 173, § 2º, da Constituição.

O STJ, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.162.307, representativo da controvérsia, adotou um conceito amplo de empresa para fins de identificação do sujeito passivo do salário-educação, firmando a Tese (Tema Repetitivo nº 362) de que “A contribuição para o salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, assim entendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006.”

Confira-se a ementa do r. julgado:

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. CONTRIBUIÇÃO PARA O SALÁRIO-EDUCAÇÃO. RECEPÇÃO PELA CARTA DE 1988, DA LEGISLAÇÃO REGULADORA DA MATÉRIA (DECRETO 1.422/75). SUJEITO PASSIVO. CONCEITO AMPLO DE EMPRESA.
1. A contribuição para o salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, assim entendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006. (Precedentes: REsp 272.671/ES, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/02/2008, DJe 04/03/2009; REsp 842.781/RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 13/11/2007, DJ 10/12/2007; REsp 711.166/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 04/04/2006, DJ 16/05/2006)
2. O salário-educação, anteriormente à Constituição da República de 1988, era regulado pelo Decreto-Lei 1.422/1975, que, no tocante à sujeição passiva, acenou para um conceito amplo de empresa, ao estabelecer que: "Art. 1º. (...) § 5º - Entende-se por empresa para os fins deste decreto-lei, o empregador como tal definido na Consolidação das Leis do Trabalho, e no artigo 4º da Lei 3.807, de 26 de agosto de 1960, com a redação dada pelo art. 1º da Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, bem como as empresas e demais entidades públicas e privadas, vinculadas à previdência social, ressalvadas as exceções previstas na legislação específica e excluídos os órgãos da administração direta."
3. Sob esse enfoque, empresa, para os fins do citado Decreto-Lei, encerrava o conceito de empregador, conforme definido na Consolidação das Leis do Trabalho e no art. 4º, da Lei 3.807/60, verbis: CLT: "Art. 2º. Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. § 1º. Equiparam-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados." Lei 3.807/60, com a nova redação dada pela Lei 5.890/73: "Art. 4º. Para os efeitos desta lei, considera-se: a) empresa - o empregador, como tal definido na CLT, bem como as repartições públicas autárquicas e quaisquer outras entidades públicas ou serviços administrados, incorporados ou concedidos pelo Poder Público, em relação aos respectivos servidores no regime desta lei."
4. A Carta Constitucional promulgada em 1988, consoante entendimento do STF, recepcionou formal e materialmente a legislação anterior, tendo o art. 25 do ADCT revogado tão-somente o § 2º, do art. 1º, do citado Decreto-Lei, que autorizava o Poder Executivo a fixar e alterar a alíquota, sendo forçoso concluir pela subsistência da possibilidade de exigência do salário-educação, nos termos da legislação em vigor à época. (Precedente do STF: RE 290079, Relator(a): Min. Ilmar Galvão, Tribunal Pleno, julgado em 17/10/2001, DJ 04-04-2003)
5. Com efeito, a alteração do regime aplicável ao salário-educação, implementada pela novel Constituição da República, adstringiu-se à atribuição de caráter tributário, para submetê-la ao princípio da legalidade, mas preservando a mesma estrutura normativa insculpida no Decreto-Lei 1.422/75, vale dizer: mesma hipótese de incidência, base de cálculo e alíquota.
6. Destarte, a Lei 9.424/96, que regulamentou o art. 212, § 5º, da Carta Magna, ao aludir às empresas como sujeito passivo da referida contribuição social, o fez de forma ampla, encartando, nesse conceito, a instituição, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço, bem como qualquer entidade, pública ou privada, vinculada à previdência social, com ou sem fins lucrativos, ressalvadas as exceções previstas na legislação específica e excluídos os órgãos da administração direta (art. 1º, § 5º, do Decreto-Lei 1.422/75 c/c art. 2º da CLT).
7. O Decreto 6.003/2006 (que revogou o Decreto 3.142/99), regulamentando o art. 15, da Lei 9.424/96, definiu o contribuinte do salário-educação com foco no fim social desse instituto jurídico, para alcançar toda pessoa jurídica que, desenvolvendo atividade econômica, e, por conseguinte, tendo folha de salários ou remuneração, a qualquer título, seja vinculada ao Regime Geral de Previdência Social: "Art. 2o São contribuintes do salário-educação as empresas em geral e as entidades públicas e privadas vinculadas ao Regime Geral da Previdência Social, entendendo-se como tais, para fins desta incidência, qualquer firma individual ou sociedade que assuma o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem assim a sociedade de economia mista, a empresa pública e demais sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público, nos termos do art. 173, § 2o, da Constituição."
8. "A legislação do salário-educação inclui em sua sujeição passiva todas as entidades (privadas ou públicas, ainda que sem fins lucrativos ou beneficentes) que admitam trabalhadores como empregados ou que simplesmente sejam vinculadas à Previdência Social, ainda que não se classifiquem como empresas em sentido estrito (comercial, industrial, agropecuária ou de serviços). A exação é calculada sobre a folha do salário de contribuição (art.1º, caput e § 5º, do DL 1.422/75)." (REsp 272.671/ES, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 21/02/2008, DJe 04/03/2009, REPDJe 25/08/2009)
9. "É constitucional a cobrança da contribuição ao salário-educação, seja sob a Carta de 1969, seja sob a Constituição Federal de 1988, e no regime da Lei nº 9424/96." (Súmula 732 do STF)
10. In casu, a recorrente é associação desportiva, sem fins lucrativos, vinculada à Previdência Social e com folha de empregados, encartando-se no conceito amplo de empresa, razão pela qual se submete à incidência do salário-educação.
11. É que a Lei 9.615/88, que instituiu normas gerais sobre desporto e regulou a atuação das entidades que exploram o desporto profissional, equiparou essas entidades às sociedades empresárias, in verbis: "Art. 27. As entidades de prática desportiva participantes de competições profissionais e as entidades de administração de desporto ou ligas em que se organizarem, independentemente da forma jurídica adotada, sujeitam os bens particulares de seus dirigentes ao disposto no art. 50 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, além das sanções e responsabilidades previstas no caput do art. 1.017 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002, na hipótese de aplicarem créditos ou bens sociais da entidade desportiva em proveito próprio ou de terceiros. § 13. Para os fins de fiscalização e controle do disposto nesta Lei, as atividades profissionais das entidades de prática desportiva, das entidades de administração de desporto e das ligas desportivas, independentemente da forma jurídica como estas estejam constituídas, equiparam-se às das sociedades empresárias, notadamente para efeitos tributários, fiscais, previdenciários, financeiros, contábeis e administrativos."
12. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008.”  (sem grifos no original)
(REsp 1162307/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 24.11.2010, DJe 03.12.2010)

Portanto, é necessário analisar os elementos trazidos aos autos em atenção ao conceito amplo de empresa.

Assenta-se a r. sentença no entendimento de que o tributo não é exigível do produtor rural pessoa física não inscrito no Registro Público e Empresas Mercantis e que a mera inscrição no CNPJ não descaracteriza a condição de pessoa física do produtor rural.

De acordo com a jurisprudência desta e. Corte, o fato de o produtor rural estar cadastrado no CNPJ não descaracteriza a sua condição de pessoa física não inscrita no registro público de empresas mercantis (Junta Comercial), por se tratar de mera formalidade imposta pela Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, nos termos da Portaria CAT n.° 117/10 do Estado de São Paulo.

Confira-se:

Art. 2º O estabelecimento gráfico credenciado pela Secretaria da Fazenda e indicado na AIDF Eletrônica, ao confeccionar impressos de Nota Fiscal de Produtor, deverá fazer constar, por qualquer meio gráfico indelével, no quadro "Dados Adicionais" no campo "Informações Complementares", a expressão: "A inscrição do Produtor Rural e da Sociedade em Comum de produtor rural no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas - CNPJ não descaracteriza a sua condição de "pessoa física" não inscrita no "Registro Público de Empresas Mercantis" (Junta Comercial), exceto se exercer a faculdade prevista no art. 971 do Código Civil - art. 2º da Portaria CAT nº 117/2010."

A jurisprudência deste e. Tribunal formou-se no sentido de que somente se preenchidos os requisitos contidos no art. 966 do CC/2002 seria o produtor rural considerado empresário, consoante o conceito amplo de empresa, que é voltado para produção e comercialização inseridos em um contexto organizacional organizado, habitual e especializado.

Confira-se :

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PRODUTOR RURAL QUE ATUA NA PRODUÇÃO E VENDA DE HORTALIÇAS E HORTICULTURAS. ESPECIFICIDADES DO CASO CONCRETO. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – CONCEITO AMPLO DE EMPRESA – TESE REPETITIVA Nº 362. ARTIGO 966 DO CÓDIGO CIVIL – AMPLITUDE DO CONCEITO DE EMPRESÁRIO. EXERCÍCIO PROFISSIONAL DA ATIVIDADE ECONÔMICA CARACTERIZADO. CONTRIBUIÇÃO AO SALÁRIO-EDUCAÇÃO – ARTIGO 15 DA LEI Nº 9.424/1996 – SUJEIÇÃO.
1. Ação ajuizada por produtor rural pessoa física. Cultivo de hortaliças e horticulturas. Pretensão de não se submeter ao recolhimento do salário-educação e de obter a restituição dos valores pagos nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.
2. A análise da questão atinente à sujeição ao recolhimento da contribuição ao salário-educação teve seus parâmetros delimitados pelo STJ em julgado alçado à sistemática dos recursos repetitivos (REsp 1162307/RJ ; Tese nº 362).
3. O simples fato de estar o contribuinte cadastrado no CNPJ em razão de imposição normativa da Receita Federal ou da Fazenda Estadual não o qualifica como empresa. Os elementos trazidos aos autos devem ser analisados em atenção ao quanto estabelecido no REsp 1.162.307/RJ (conceito amplo de empresa) e tendo em vista também a amplitude do conceito de empresário, nos termos previstos no artigo 966 do Código Civil. Citação doutrinária.
4. Diante da amplitude destes conceitos, é de se notar que, se o produtor rural exerce profissionalmente atividade econômica para a produção ou circulação de bens ou serviços, de forma a assumir obrigações e auferir créditos, deve ser considerado empresário – e, portanto, submeter-se ao recolhimento da exação combatida.
5. Produtor rural pessoa física que possui registro no CEI e no CNPJ, documento que indica logradouro diverso daquele informado nas guias de pagamento, embora localizado no mesmo município.
6. Produção e colheita realizada em dois estabelecimentos, mediante utilização de modernas técnicas de semeação, plantio e colheita. Manutenção de entreposto de comercialização no Ceagesp Vila Leopoldina (consulta realizada na rede mundial de computadores).
7. O próprio valor objetivado para fins de restituição (cento e oitenta e nove mil, sessenta e seis reais e nove centavos) consubstancia indicativo da existência de significativo contingente de funcionários subordinados ao autor/apelante.
8. Exercício de atividade econômica de forma estruturada e organizada, envolvendo o cultivo de diversos produtos, além de ampla circulação e venda das mercadorias oriundas da produção. Contribuinte que se amolda ao amplo conceito de empresa e de empresário. Precedentes do TRF3.
9. Considerada legítima a sujeição à contribuição ao salário-educação na hipótese dos autos, resta prejudicada a pretensão de compensação dos valores anteriormente recolhidos a este título.
10. Acréscimo do percentual de 2% (dois por cento) ao importe fixado na sentença a título de verba honorária (artigo 85, § 11, do CPC).
11. Apelação a que se nega provimento.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000393-56.2016.4.03.6110, Rel. Desembargador Federal CECILIA MARIA PIEDRA MARCONDES, julgado em 06/06/2019, Intimação via sistema DATA: 17/06/2019) grifamos

APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. FNDE. SALÁRIO EDUCAÇÃO. AUSÊNCIA DE COISA JULGADA MATERIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO FNDE. RESP 1.743.901. MÉRITO: PRODUTOR RURAL PESSOA FÍSICA. PROVA DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EMPRESÁRIA. AUSÊNCIA DE CERTEZA E LIQUIDEZ QUANTO AO DIREITO VINDICADO (NÃO CONTRIBUIR). PROVA DOCUMENTAL INSATISFATÓRIA DO QUANTO ALEGADO. RECURSO E REEXAME PROVIDOS.
(...)
2. Por força do art. 32 da IN RFB 971/09, o produtor rural é obrigado a solicitar matrícula CEI para cada propriedade rural, ainda que localizada no mesmo município, ficando as contribuições vinculadas àquelas matrículas. Logo, diante do procedimento de identificação de cada propriedade rural para a arrecadação, não se tem a tríplice identidade exigida para obstar o curso do presente feito.
3. Quanto à ilegitimidade passiva, há decisão em sede de agravo de instrumento interposto pelo apelante, reconhecendo sua legitimidade para atuar no polo passivo da demanda (AI 5005636-07.2018.4.03.0000). Porém, em recente julgamento, a Primeira Seção do STJ resolveu divergência tomando por tese posição oposta, reconhecendo que o interesse das aludidas entidades (FNDE, no caso) é meramente econômico, cumprindo privativamente à União Federal, por meio de sua Secretaria da Receita Federal, fiscalizar e apurar o recolhimento tributário (art. 149 da CF e Lei 11.457/07).
4. No mérito: em recurso representativo da controvérsia, o STJ adotou um conceito amplo de empresa para fins de identificação do sujeito passivo do salário-educação, abrangendo as firmas individuais e as sociedades que assumam o risco da atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, e mantenham folha de salários ou remuneração. O STJ desenvolveu ainda a tese de que o produtor rural pessoa física, desprovido de registro no CNPJ, não se enquadraria no conceito de empresa para fins de incidência do salário-educação. Precedentes.
5. Este Tribunal aplica o entendimento do STJ a contrariu sensu, com o devido temperamento, ao passo que a inscrição do CNPJ não tem o condão de caracterizar o produtor rural como empresário, tratando-se de formalidade exigida para fins de fiscalização. A indicação do produtor rural como contribuinte individual junto ao CNPJ seria um reforço nessa direção, ante o disposto no art. 12, V, a, da Lei 8.212/91.
6. Somente se preenchidos os requisitos contidos na legislação civil – o art. 966 do CC/02 -, pode o produtor rural ser considerado empresário. Mais precisamente e consoante o conceito amplo de empresa, se a prestação dos serviços é voltada para a produção e comercialização de bens agrícolas, e está inserida em um contexto organizacional imbuído de profissionalismo e habitualidade, a respectiva remuneração paga pelo produtor rural servirá de base de cálculo da aludida contribuição.

7. Na espécie dos autos, a prova demonstra que o impetrante é proprietário de fazenda localizada em Rio Brilhante (MS), dotada de atividade agropecuária na lavoura e na pecuária (matrícula CEI 32.340.00500/82), “sem qualquer registro no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica – CNPJ OU na Junta Comercial para este fim” (101936177). Nada obstante, como demonstrado pela certidão de CNPJ trazida em apelo, compõe sociedade empresarial familiar na qualidade de sócio administrador, denominada “Fortaleza Investimentos Ltda”, holding que tem por objeto social secundário atividades agropecuárias. A sociedade tem capital social de R$ 2.564.500,00 e tem sede em Salvador do Sul (RS), mesma localidade em que se situa a propriedade rural vinculada ao CEI 19.166.00028-83 – objeto de análise em mandado de segurança ajuizado no âmbito da Justiça Federal de Porto Alegre (RS).
8. Ao contrário do que diz o impetrante em suas contrarrazões, as informações trazidas em apelo indicam índole empresarial na atividade realizada pelo mesmo, com a formação de holding familiar para coordenar a atuação no setor rural. Mais precisamente e como já dito, há prova de que a atividade rurícola realizada pelo impetrante está inserida em um contexto organizacional imbuído de profissionalismo e habitualidade. Sua presença como sócio administrador de outras sociedades também do ramo agrícola – ainda que hoje sejam baixadas – reforça a presunção aqui assinalada, ao que se agrega o vulto do capital social da sociedade familiar constituída.
9. Diante dos fatos apresentados no curso dos autos e da prova amealhada, fica abalada a veracidade da situação narrada pelo impetrante em sua inicial, inexistindo a certeza de sua condição de produtor rural não empresário. Pelo contrário. Tudo indica que a atividade rurícola é exercida enquanto elemento de empresa, de forma organizada e complexa, não permitindo afastar a incidência do salário educação, nos termos do art. 2º do Decreto 6.003/06 e do art. 5º da Lei 9.424/96.
(TRF 3ª Região, 6ª Turma,  ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5000231-26.2018.4.03.6002, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 06/06/2020, Intimação via sistema DATA: 10/06/2020)

A pessoa física que se dedica à atividade rural se submete à disciplina civil, considerando-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços (art. 966 do CC).

Confira-se:

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Consoante os autos, os impetrantes exercem em conjunto a atividade rural e estão registrados no CNPJ sob nº 07.922.794/0001-90, figurando, assim, no critério pessoal da regra-matriz de incidência tributária da contribuição social em discussão, eis que as atividades por ele desenvolvidas ostentam feições completamente distintas do mero empregador rural pessoa física. A família Sleutjes é bem conhecida, como Grandes Produtores.

Conforme se organiza a atividade econômica do produtor rural pessoa física inscrita no CNPJ -  que pode se dar sob inegáveis características profissionais, assumindo contornos empresariais - surge a condição de sujeito passivo da contribuição ao salário-educação, nos termos do art. 212, §5º, da CF, do art. 15 da Lei n. 9.424/96 e do art. 2º do Decreto 6.003/2006.

Confira-se:

 

"TRIBUTÁRIO. SALÁRIO EDUCAÇÃO. SUJEITO PASSIVO. EMPRESAS. PRODUTOR RURAL. EQUIPARAÇÃO. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 15 DA LEI 9.424/96, BEM COMO 1º E 2º DO DECRETO 6.003/06.
1. Nos termos das normas que regem a matéria, infere-se ser devida a contribuição para o salário-educação pelas empresas em geral e pelas entidades públicas e privadas vinculadas ao Regime Geral da Previdência Social, considerando como tais, para fins de incidência, qualquer firma individual ou sociedade que assuma o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não. Jurisprudência do C. STJ.
3. Os autores estão cadastrados na Receita Federal como contribuintes individuais, mas têm amplas atividades de cultivo de frutas cítricas, cereais e cana-de-açúcar, em diferentes municípios de São Paulo, apresentando inúmeros CNPJ, não podendo ser tratados como singelos produtores rurais - pessoas físicas.
4. Contribuintes equiparados à empresa para fins de recolhimento do salário-educação. Aplicação do princípio da solidariedade social, expressamente albergado pela Constituição Federal.

5. Inversão do ônus da sucumbência. Honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC/1973, vigente à época da propositura da ação."
(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA,  ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2258428 - 0003243-06.2015.4.03.6143, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MAIRAN MAIA, julgado em 15/08/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/08/2018) grifamos

No mesmo sentido:

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AÇÃO DECLARATÓRIA. RESTITUIÇÃO. SALÁRIO-EDUCAÇÃO. PRODUTOR RURAL. PESSOA FÍSICA. ATIVIDADE EMPRESARIAL. EMPREGADOS. EXIGIBILIDADE.
1. A definição de "empresa", para fins de identificação do sujeito passivo do salário-educação, constante do artigo 1º, § 3º da Lei 9.766/1998, não pressupõe a constituição de pessoa jurídica, mas, tão-somente, o exercício de atividade empresarial com vinculação à Seguridade Social - ou seja, com emprego de segurados do sistema de seguridade social, segundo a Lei 8.212/1991.
2. Na espécie, é forçoso reconhecer que a atividade praticada pela agravante importa sujeição passiva em relação à contribuição ao Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Conforme a documentação que acompanhou o recurso, a agravante, conquanto não tenha constituído pessoa jurídica específica, é produtora rural que exerce atividades de plantação de hortaliças/horticulturas, organizadamente e com significativo contingente de empregados, a considerar o valor que se pretende a restituição (R$ 189.066,09), único elemento presente capaz de demonstrar a caracterização objetiva de "empresa", possuindo registro de CNPJ. Presentes, a princípio, todos os elementos caracterizadores de atividade empresarial, a permitir a cobrança da contribuição ao FNDE, tal como defendida pelo Fisco.
3. Agravo de instrumento desprovido.”  (sem grifos no original)
(TRF 3ª Região, 3ª Turma,  AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001764-52.2016.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 15/03/2017, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/03/2017)

Assim, consoante a exegese da legislação de regência e a jurisprudência supracitada, é de se concluir que os impetrantes exercem atividade econômica de forma estruturada e organizada, que envolve a ampla circulação e venda de produtos originários de sua produção. Assim, os apelados se amoldam ao amplo conceito de empresa e de empresário a permitir a cobrança da contribuição ao FNDE.

Diante o exposto, deve ser reconhecida a ilegitimidade passiva do FNDE, devendo ser acolhido o presente recurso de apelação, julgando extinto o feito sem resolução do mérito em relação a ele, dando provimento ao recurso de apelação da União e ao reexame necessário, conforme fundamentação.

É o voto.

 

 



 

 

 

E M E N T A

 

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PARA O SALÁRIO-EDUCAÇÃO. FNDE. ILEGITIMIDADE. ENTENDIMENTO CONFORME O EREsp 1.619.954/SC. LEGITIMIDADE DA UNIÃO. STJ. TEMA/REPETITIVO Nº 362 (REsp nº 1.162.307/RJ). ESPECIFICIDADE DO CASO CONCRETO. PRODUTORES RURAIS PESSOAS FÍSICAS INSCRITOS NO CNPJ. CONCEITO AMPLO DE EMPRESA. ARTIGO 966 DO CÓDIGO CIVIL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE EMPRESARIAL AMPLA, ESPECIALIZADA E ORGANIZADA PROFISSIONALMENTE. EXIGIBILIDADE. RECURSO DO FNDE ACOLHIDO. REEXAME NECESSÁRIO E RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDOS.

1 - À luz de recentes decisões proferidas pela jurisprudência, o FNDE é parte passiva ilegítima em processo versando sobre a contribuição ao salário-educação.

2 - Competindo à Secretaria da Receita Federal do Brasil as atividades relacionadas à arrecadação do salário-educação, nos termos do art. 3º, § 6º, da Lei nº 11.457/2007, a relação jurídico-tributário é estabelecida entre a União e o contribuinte, o que justifica, inclusive, a ausência de legitimidade passiva “ad causam” do FNDE.

3 - O contribuinte do salário-educação é a empresa, entendida como qualquer firma individual ou sociedade que assuma o risco da atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não (Inteligência da Lei nº 9.424/96 e Decreto nº 6.003/2006).

4 - O STJ, no julgamento do Recurso Especial n.º 1.162.307, representativo da controvérsia, adotou um conceito amplo de empresa para fins de identificação do sujeito passivo do salário-educação, firmando a Tese (Tema Repetitivo nº 362) de que “A contribuição para o salário-educação tem como sujeito passivo as empresas, assim entendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006.”

5 - De acordo com a jurisprudência desta e. Corte, o fato de o produtor rural estar cadastrado no CNPJ não descaracterizaria a sua condição de "pessoa física não inscrita no registro público de empresas mercantis (Junta Comercial)", por se tratar de mera formalidade imposta pela Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo, nos termos da Portaria CAT n.° 117/10 do Estado de São Paulo.

6 - A jurisprudência deste Tribunal formou-se no sentido de que somente se preenchidos os requisitos contidos no art. 966 do CC/2002 seria o produtor rural considerado empresário, consoante o conceito amplo de empresa, que é voltado para produção e comercialização inseridos em um contexto organizacional organizado, habitual e especializado (TRF3ª APCivel 5000393-56.2016.4.03.6110 e  ApelRemNec 5000231-26.2018.4.03.6002).

7 - Assim, consoante a exegese da legislação de regência e a jurisprudência supracitada, é de se concluir que os impetrantes exercem atividade econômica de forma estruturada e organizada, que envolve a ampla circulação e venda de produtos originários de sua produção. Assim, os apelados se amoldam ao amplo conceito de empresa e de empresário a permitir a cobrança da contribuição ao FNDE.

8 - Recurso de apelação do FNDE acolhido, julgando extinto o feito sem resolução do mérito em relação a ele.

9 - Recurso de apelação da União e reexame necessário providos.

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, reconheceu a ilegitimidade passiva do FNDE, devendo ser acolhido o presente recurso de apelação, julgando extinto o feito sem resolução do mérito em relação a ele, e deu provimento ao recurso de apelação da União e ao reexame necessário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.