Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004430-04.2018.4.03.6128

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP
PROCURADOR: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP

Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO MARQUES DE JESUS - SP182194-A

APELADO: VALDIR CARLOS MENEGUELLO

Advogado do(a) APELADO: LIGIA PIRES DE CAMPOS SANCHEZ GARCIA - SP126889-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004430-04.2018.4.03.6128

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP
PROCURADOR: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP

Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO MARQUES DE JESUS - SP182194-A
APELADO: VALDIR CARLOS MENEGUELLO

Advogado do(a) APELADO: LIGIA PIRES DE CAMPOS SANCHEZ GARCIA - SP126889-A

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de embargos de declaração contra acórdão assim ementado:

 

"DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SENTENÇA FUNDAMENTADA. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ANUIDADES. ARTIGO 64 DA LEI 5.194/1966. INADIMPLEMENTO. CANCELAMENTO AUTOMÁTICO. VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INCONSTITUCIONALIDADE. RE 808.424. ANUIDADES DEVIDAS. LEI 12.514/2011. FATO GERADOR. INSCRIÇÃO.

1. Rejeitada a preliminar de nulidade, pois a sentença enfrentou e rejeitou, motivadamente, a alegação de inconstitucionalidade do artigo 64 da Lei 5.194/1966, ressaltando que "não tem cabimento a tese da ausência do devido processo legal, uma vez que o devido processo legal visa proteger o cidadão contra os órgãos administrativos, e não proteger a omissão do órgão administrativo gerando obrigações ao cidadão"; inexistindo, pois, violação aos artigos 489, § 1º,  IV, do CPC, e 93, IX, da CF.

2. Embora previsto pelo artigo 64 da Lei 5.194/1966 o cancelamento automático do registro, em caso de inadimplência durante dois anos consecutivos, a Suprema Corte, em repercussão geral no RE 808.424, firmou a seguinte tese: "É inconstitucional o artigo 64 da Lei nº 5.194/1966, considerada a previsão de cancelamento automático, ante a inadimplência da anuidade por dois anos consecutivos, do registro em conselho profissional, sem prévia manifestação do profissional ou da pessoa jurídica, por violar o devido processo legal".

3. O fundamento da declaração de inconstitucionalidade foi a violação do devido processo legal e, portanto, o cancelamento é possível, desde que não seja automático, garantido o direito de prévia manifestação do profissional, a fim de que possa regularizar, justificar ou questionar a existência da inadimplência. 

4. Logo, é inconstitucional o cancelamento automático e, portanto, sem que o conselho tome a iniciativa de intimar o profissional para assegurar-lhe o devido processo legal não produz efeito a norma em questão. A omissão em intimar o profissional acerca de sua inadimplência para efeito de cancelamento do registro não gera o direito subjetivo do profissional de ser excluído de ofício e, assim, ser desobrigado de recolher anuidades e nem impõe à autarquia a proibição de promover execução fiscal. O direito subjetivo do profissional é o de requerer o desligamento do órgão de classe, adotando a iniciativa de cancelar o registro profissional e, enquanto não o fizer, a obrigação de recolher anuidades decorre, na vigência da Lei 12.514/2011, do simples fato de estar registrado no conselho profissional, ainda que não exerça a atividade de engenheiro. 

5. No caso, as anuidades referem-se aos períodos de 2013 a 2106, na vigência da Lei 12.514/2011, que estabelece que o fato gerador da obrigação tributária é o registro do profissional no conselho respectivo, razão pela qual, sendo inconstitucional o cancelamento automático de que trata o artigo 64 da Lei 5.194/1966, na forma do pronunciamento em repercussão geral da Corte Constitucional, não procedem os embargos do devedor. 

6. Apelação parcialmente provida." 

 

Alegou-se omissão, pois no RE 808.424 decidiu a Suprema Corte ser inconstitucional o cancelamento automático da inscrição após dois anos de inadimplência, porém não se manifestou "sobre as consequências tributárias do lapso temporal de inadimplemento do art. 65 da Lei 5.194/1966; não afastou, tampouco o dever do Conselho Profissional de cancelar a inscrição, impondo-o, apenas, que antes do cancelamento, notifique o profissional. Não é razoável a crença de que o STF quis premiar as entidades que se mantiveram desidiosas por anos a fio (quase vinte anos, nesse caso concreto), quando a pretensão dos julgadores, claramente, era de proteger o contribuinte. Isso porque, se o Conselho Profissional não cumpriu o dever de cancelamento da inscrição após dois anos de inadimplemento – ainda que, para tanto, tivesse que comunicar o profissional – não pode exigir do contribuinte (que não teve atendidos seus direitos ao cancelamento e à comunicação sobre o cancelamento) o pagamento das anuidades supervenientes. Anote-se, por fim, que, se mantida a interpretação do acórdão embargado, milhares de contribuintes (não só aqueles vinculados ao Conselho em questão) poderão ser surpreendidos com a cobrança de débitos tributários que reputavam extintos; nesse sentido, o art. 8º do CPC estabelece que, ao aplicar o ordenamento, o julgador atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, com observância, dentre outros princípios, da proporcionalidade e da razoabilidade – definitivamente, portanto, cabe ao julgador zelar pela segurança jurídica (neste caso concreto, consubstanciada no postulado da não-surpresa tributária)."

Apresento o feito em mesa para julgamento (artigo 1.024, § 1º, CPC). 

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004430-04.2018.4.03.6128

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP
PROCURADOR: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP

Advogado do(a) APELANTE: HUMBERTO MARQUES DE JESUS - SP182194-A
APELADO: VALDIR CARLOS MENEGUELLO

Advogado do(a) APELADO: LIGIA PIRES DE CAMPOS SANCHEZ GARCIA - SP126889-A

 

  

 

V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, são manifestamente improcedentes os embargos de declaração, inexistindo quaisquer dos vícios apontados, restando nítido que se cuida de recurso interposto com o objetivo de rediscutir a causa e manifestar inconformismo diante do acórdão embargado.

As alegações não envolvem omissão, contradição, obscuridade ou erro material sanáveis em embargos de declaração, mas efetiva impugnação ao acórdão embargado, que teria incorrido em error in judicando, desvirtuando, pois, a própria natureza do recurso, que não é a de reapreciar a causa como pretendido. 

De fato, não existe qualquer omissão a ser suprida, pois proferido o julgamento a partir do decidido pela Suprema Corte no RE 808.424, ressaltando que a inadimplência não gera direito do conselho profissional de promover cancelamento automático da inscrição, o que vale tanto para o órgão como para o profissional no sentido de exigir, por parte do conselho, a intimação para que o cancelamento seja promovido, e, por parte do profissional, o requerimento de desligamento para que possa eximir-se das respectivas obrigações, inclusive o adimplemento de anuidades, dado que, para ambos, a mera inadimplência não configura hipótese de cancelamento ou exclusão do quadro de inscritos no conselho profissional.

Para esclarecimento, embora já expresso o acórdão neste sentido, basta ler o seguinte excerto do voto condutor, reproduzido na ementa do julgado recorrido:

 

"Perceba-se que a declaração de inconstitucionalidade foi decretada em tutela ao direito do profissional registrado no conselho de ser previamente ouvido em garantia ao devido processo legal, de maneira que não se vedou o cancelamento em decorrência da inadimplência, mas apenas se condicionou a prática do ato à prévia manifestação do eventual prejudicado com a medida, a fim de que pudesse regularizar, justificar ou questionar a inadimplência. 

Logo, é inconstitucional o cancelamento automático e, portanto, sem que o conselho tome a iniciativa de intimar o profissional para assegurar-lhe o devido processo legal não produz efeito a norma em questão. A omissão em intimar o profissional acerca de sua inadimplência para efeito de cancelamento do registro não gera o direito subjetivo do profissional de ser excluído de ofício e, assim, ser desobrigado de recolher anuidades e nem impõe à autarquia a proibição de promover execução fiscal.

O direito subjetivo do profissional é o de requerer o desligamento do órgão de classe, adotando a iniciativa de cancelar o registro profissional e, enquanto não o fizer, a obrigação de recolher anuidades decorre, na vigência da Lei 12.514/2011, do simples fato de estar registrado no conselho profissional, ainda que não exerça a atividade de engenheiro." 

 

Evidencia-se que, na verdade, pretende o embargante eximir-se de recolher anuidades sem que tenha requerido o desligamento do conselho profissional, e atribuindo exclusivamente ao órgão a incumbência de promover o cancelamento para garantir-lhe o direito de não ser cobrado de encargos legais decorrentes do registro subsistente, quando é certo que o pronunciamento da Suprema Corte não impôs aos conselhos profissionais o dever de cancelar ou baixar registro de inadimplente, de modo a gerar a apontada desídia, mas apenas de o fazer, se for o caso, mediante prévia intimação do profissional, não havendo equivalência entre o decidido e o postulado pelo embargante a título de omissão no julgamento.

Ao vedar cancelamento automático de registro profissional sem prévia intimação do interessado, a decisão proferida no RE 808.424 não impôs ao órgão o dever de cancelar por inadimplência o registro profissional, nem dispensou o profissional de requerer a baixa ou cancelamento do registro por iniciativa própria para eximir-se de futuras cobranças em decorrência do vínculo com a entidade. Logo, sem ter requerido baixa ou cancelamento do registro perante o conselho de classe, o profissional não pode alegar "surpresa" nem "desídia" do conselho, dado que, a rigor, o fato gerador da obrigação tributária restou consumado pela manutenção do registro profissional e pelo tempo em que perdurou e perdurar, razão pela qual, à evidência, não houve qualquer omissão no julgamento, mas mera insurgência ou inconformismo do embargante com a solução aplicada, o que não enseja embargos de declaração. 

Se tal motivação é equivocada ou insuficiente, fere as normas apontadas ou contraria julgados ou jurisprudência, deve a embargante veicular recurso próprio para a impugnação do acórdão e não rediscutir a matéria em embargos de declaração. 

Por fim, embora tratados todos os pontos invocados nos embargos declaratórios, de relevância e pertinência à demonstração de que não houve qualquer vício no julgamento, é expresso o artigo 1.025 do Código de Processo Civil em enfatizar que se consideram incluídos no acórdão os elementos suscitados pela embargante, ainda que inadmitido ou rejeitado o recurso, para efeito de pré-questionamento, pelo que aperfeiçoado, com os apontados destacados, o julgamento cabível no âmbito da Turma.

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. 

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SENTENÇA FUNDAMENTADA. CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SÃO PAULO. ANUIDADES. ARTIGO 64 DA LEI 5.194/1966. INADIMPLEMENTO. CANCELAMENTO AUTOMÁTICO. VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INCONSTITUCIONALIDADE. RE 808.424. ANUIDADES DEVIDAS. LEI 12.514/2011. FATO GERADOR. INSCRIÇÃO. VÍCIOS INEXISTENTES. REJEIÇÃO. 

1. São manifestamente improcedentes os embargos de declaração, inexistindo quaisquer dos vícios apontados, restando nítido que se cuida de recurso interposto com o objetivo de rediscutir a causa e manifestar inconformismo diante do acórdão embargado. As alegações não envolvem omissão, contradição, obscuridade ou erro material sanáveis em embargos de declaração, mas efetiva impugnação ao acórdão embargado, que teria incorrido em error in judicando, desvirtuando, pois, a própria natureza do recurso, que não é a de reapreciar a causa como pretendido. 

2. De fato, não existe qualquer omissão a ser suprida, pois proferido o julgamento a partir do decidido pela Suprema Corte no RE 808.424, ressaltando que a inadimplência não gera direito do conselho profissional de promover cancelamento automático da inscrição, o que vale tanto para o órgão como para o profissional no sentido de exigir, por parte do conselho, a intimação para que o cancelamento seja promovido, e, por parte do profissional, o requerimento de desligamento para que possa eximir-se das respectivas obrigações, inclusive o adimplemento de anuidades, dado que, para ambos, a mera inadimplência não configura hipótese de cancelamento ou exclusão do quadro de inscritos no conselho profissional.

3. Para esclarecimento, embora já expresso o acórdão neste sentido, basta ler o seguinte excerto do voto condutor, reproduzido na ementa do julgado recorrido: "Perceba-se que a declaração de inconstitucionalidade foi decretada em tutela ao direito do profissional registrado no conselho de ser previamente ouvido em garantia ao devido processo legal, de maneira que não se vedou o cancelamento em decorrência da inadimplência, mas apenas se condicionou a prática do ato à prévia manifestação do eventual prejudicado com a medida, a fim de que pudesse regularizar, justificar ou questionar a inadimplência. Logo, é inconstitucional o cancelamento automático e, portanto, sem que o conselho tome a iniciativa de intimar o profissional para assegurar-lhe o devido processo legal não produz efeito a norma em questão. A omissão em intimar o profissional acerca de sua inadimplência para efeito de cancelamento do registro não gera o direito subjetivo do profissional de ser excluído de ofício e, assim, ser desobrigado de recolher anuidades e nem impõe à autarquia a proibição de promover execução fiscal. O direito subjetivo do profissional é o de requerer o desligamento do órgão de classe, adotando a iniciativa de cancelar o registro profissional e, enquanto não o fizer, a obrigação de recolher anuidades decorre, na vigência da Lei 12.514/2011, do simples fato de estar registrado no conselho profissional, ainda que não exerça a atividade de engenheiro.".

4. Evidencia-se que, na verdade, pretende o embargante eximir-se de recolher anuidades sem que tenha requerido o desligamento do conselho profissional, e atribuindo exclusivamente ao órgão a incumbência de promover o cancelamento para garantir-lhe o direito de não ser cobrado de encargos legais decorrentes do registro subsistente, quando é certo que o pronunciamento da Suprema Corte não impôs aos conselhos profissionais o dever de cancelar ou baixar registro de inadimplente, de modo a gerar a apontada desídia, mas apenas de o fazer, se for o caso, mediante prévia intimação do profissional, não havendo equivalência entre o decidido e o postulado pelo embargante a título de omissão no julgamento.

5. Ao vedar cancelamento automático de registro profissional sem prévia intimação do interessado, a decisão proferida no RE 808.424 não impôs ao órgão o dever de cancelar por inadimplência o registro profissional, nem dispensou o profissional de requerer a baixa ou cancelamento do registro por iniciativa própria para eximir-se de futuras cobranças em decorrência do vínculo com a entidade. Logo, sem ter requerido baixa ou cancelamento do registro perante o conselho de classe, o profissional não pode alegar "surpresa" nem "desídia" do conselho, dado que, a rigor, o fato gerador da obrigação tributária restou consumado pela manutenção do registro profissional e pelo tempo em que perdurou e perdurar, razão pela qual, à evidência, não houve qualquer omissão no julgamento, mas mera insurgência ou inconformismo do embargante com a solução aplicada, o que não enseja embargos de declaração. 

6. Se tal motivação é equivocada ou insuficiente, fere as normas apontadas ou contraria julgados ou jurisprudência, deve a embargante veicular recurso próprio para a impugnação do acórdão e não rediscutir a matéria em embargos de declaração. 

7. Por fim, embora tratados todos os pontos invocados nos embargos declaratórios, de relevância e pertinência à demonstração de que não houve qualquer vício no julgamento, é expresso o artigo 1.025 do Código de Processo Civil em enfatizar que se consideram incluídos no acórdão os elementos suscitados pela embargante, ainda que inadmitido ou rejeitado o recurso, para efeito de pré-questionamento, pelo que aperfeiçoado, com os apontados destacados, o julgamento cabível no âmbito da Turma.

8. Embargos de declaração rejeitados. 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.