
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000485-55.2016.4.03.6103
RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: MARCELO ARAUJO PALHARES DE ANDRADE
Advogado do(a) APELANTE: MARIA RUBINEIA DE CAMPOS SANTOS - SP256745-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000485-55.2016.4.03.6103 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: MARCELO ARAUJO PALHARES DE ANDRADE Advogado do(a) APELANTE: MARIA RUBINEIA DE CAMPOS SANTOS - SP256745-A APELADO: UNIAO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR): Trata-se de Apelação interposta pela parte autora, MARCELO ARAÚJO PALHARES ANDRADE, Major-Aviador da Força Aérea Brasileira, contra a sentença (ID 132704239) que revogou a tutela antecipada e julgou improcedente o pedido de afastamento de punição disciplinar que lhe foi imposta como resultado do processo de sindicância instaurado por meio da Portaria nº 267-T/DPE, de 23 de agosto de 2016, ou, no Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATDA. Condenação em honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da causa, observada a gratuidade da justiça: O apelante, em suas razões recursais (ID 132704), repisa a inicial e pugna pela reforma da sentença, asseverando, em apertada síntese, cerceamento de defesa no procedimento administrativo disciplinar e descumprimento da ICA 111-2 na sindicância instaurada, com a necessária anulação da mesma e do FATD dela decorrente. Apresentadas as contrarrazões (ID 132704259), subiram os autos a este Tribunal. É, no essencial, o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000485-55.2016.4.03.6103 RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA APELANTE: MARCELO ARAUJO PALHARES DE ANDRADE Advogado do(a) APELANTE: MARIA RUBINEIA DE CAMPOS SANTOS - SP256745-A APELADO: UNIAO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR): Admissibilidade O apelo é próprio e tempestivo, razão pela qual dele conheço. Do mérito Cinge-se a controvérsia à aventada ilegalidade da Sindicância instaurada pela Portaria DCTA N. 267-T/DPE, de 23 de agosto de 2016 e do respectivo Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar (FATD) 003/2016, datado de 17 de outubro de 2016, do Comando da Aeronáutica, que impôs ao autor, então Major Aviador, integrante no Núcleo de Instituto Aplicações Operacionais (NulAOp), no Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial, de 10 (dez) dias prisão, por ter, segundo a Administração, faltado com a verdade em relação às ocorrências relativas ao atropelamento no interior do DCTA, no dia 11 de agosto de 2016, enquadrando-se nos n. 50 e parágrafo único do art. 10, com as atenuantes da letra 2A e agravantes da letra 3C do art. 13, tudo do RDAER. Aduz a parte autora que não houve observância ao devido processo legal na aplicação da punição. Refere que: - “não foi chamado ao feito desde seu início e não pôde participar da produção das provas, para exercer os direitos de acusado, ou, assessorado por Advogado, realizar perguntas, contraditar testemunhas e consignar esclarecimentos”; - “tanto a Rebeca (vitima) quanto as demais testemunhas todas foram ouvidas sem a presença do autor”; - foi utilizada manobra ardilosa com a oitiva de testemunhas que não presenciaram os fatos: “KÁTIA REGINA ZANETI BAGGIO e CRISTIANE KLOPSCH, que foram aos autos administrativos falar sobre a comunicação disciplinar confeccionada pela TENENTE CECÍLIA, esposa do sindicante, que ocorreu à sombra do conhecimento do sindicado e sem sua presença obrigatória para o ato”; - o procedimento administrativo disciplinar foi instaurado com o desiderato de vingança da autoridade instauradora; - que houve “juntada de um fato atípico ocorrido nas vias de circulação do DCTA envolvendo 02 civis que abordaram o sindicado sob alegação de que estava dirigindo de forma ofensiva, fato comunicado pela TENENTE CECÍLIA, que coincidentemente é esposa do sindicante MAJOR FABIO DE CASTRO DUTRA, sendo que os assuntos tratados não tem nenhuma correlação, exceto por aparente vingança pessoal, já que a comunicação feita pela TENENTE CECILIA, por ser fato atípico, não foi considerada pelo DCTA, lembrando que nestas oitivas não estava presente o sindicado e a testemunha de Inquirição, CAP DANIEL LELIS BAGIO, esposo da testemunha KÁTIA REGINA ZANETI BAGGIO, contrariando a determinação da ICA e colocando o sindicante em suspeição”; - a punição disciplinar diverge e muito da realidade fática, haja vista que o autor não teve condições de se defender, sendo irrazoável; - não lhe foi ofertada expressamente a possibilidade de interposição de recurso de reconsideração de ato quando da ciência da punição; - “verte da conclusão da sindicância onde o Excelentíssimo TEM BRIG AR ANTONIO EGITO DO AMARAL (Diretor do DCTA) conclui que o sindicado deve ser punido por ter faltado com a verdade, na sindicância, quando alegou ter parado o veículo; sendo certo e incontroverso, que a advertência de falar a verdade cabe apenas as testemunhas”. Vejamos. Dos documentos trazidos aos autos (IDs 95726440 e 95726441), verifico que na sindicância instaurada em cumprimento a Portaria DCTA N. 267-T/DPE, de 23 de agosto de 2016, o autor figurou como sindicado em virtude da ocorrência de um atropelamento ocorrido na avenida que dá acesso ao portão da unidade militar (Bejauveira), fato que teria sido testemunhado pela esposa de um soldado. Na Sindicância, restou apurado que o militar teria praticado conduta que configura indício de infração penal militar, capitulada no art. 210 do Código Penal Militar, sendo, então, os autos remetidos ao Tenente Brigadeiro do Ar Antônio Carlos Egito do Amaral – Diretor-Geral do DCTA, que entendeu configurar inegável omissão de socorro à vítima, crime de competência da Justiça Criminal Comum e, também, transgressão disciplinar, determinando a abertura de novo procedimento no âmbito administrativo, chamado de Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATD, nº 003/2016, em 17/10/2016, resultando na aplicação de pena de 10 (dez) dias de prisão, sob o fundamento do autor ter faltado com a verdade em relação ao atropelamento suprarreferido. Segundo informado pelo DCTA, o infrator teve plena ciência da acusação que sobre ele pesa, foi oportunizada defesa, a solução do referido procedimento foi devidamente fundamentada e o autor notificado. Refere o Comando da Aeronáutica que: .- (...) a sindicância instaurada teve a finalidade de propiciar ao Comando o convencimento sobre ter havido ou não ato transgressivo no comportamento do investigado. Apenas isso. Nesse tipo de procedimento, como é sabido, este não é sujeito de direito, mas, antes, mero objeto de investigação, daí porque não se falar em garantia de defesa nos seus atos constitutivos. No procedimento posterior, regulado pela Portaria n. 728/GC3, de 10 de novembro de 2010, neste sim, o exercício de defesa está plenamente assegurado; vale dizer, apurou-se primeiro a ocorrência tida como transgressiva, para depois instaurar-se o procedimento punitivo, observadas as regras do ato regulamentador mencionado, com inteira oportunidade para o transgressor se defender, como se constata claramente das peças que o integram. Bem a propósito disso, releva a observação de que o investigado teve inteira ciência dos autos da Sindicância bem antes da inauguração do procedimento FATD, mais precisamente no dia 06.10.2016, daí porque não pode prosperar sua alegação de que não foi possível exercitar sua defesa ali. E ademais, ele não foi punido na Sindicância. Ao solucioná-la a autoridade que a instaurou, no caso o Exmo. Sr. Diretor Geral do DCTA, concluiu que o fato dela originário (o atropelamento de pedestre no interior do “campus”), pelo que restou apurado, estaria a constituir crime, da competência da Justiça Comum Estadual, em razão de que determinou a esta chefia que noticiasse o fato à Delegacia de Polícia Local, o que foi plenamente providenciado. E tendo constado que ele, investigado, omitira fato relevante quando ouvido pelo Oficial Sindicante e faltado com a verdade em relação a outro fato também objeto de apuração, recomendou que a Chefia imediata do faltoso viesse a avaliara, para efeitos disciplinares aquele seu proceder, observadas as disposições da mencionada Portaria 782/GC3, em distinto procedimento. 3. por conta dessas constatadas infrações é que o autor da ação veio a ser punido pela Chefia do NUIAPO e não em razão do fato que deu origem à Sindicância como por ele alegado e acolhido pela Juíza do feito. Resta evidente, nesse contexto, que à míngua de sustentação válida para justificar sua conduta, adotou estratégia insidiosa, confundindo-se, ou o que é mais provável, fazendo-se confundido na avaliação do ocorrido, com pretensão de buscar invalidação do ato punitivo que, como demonstrado, está conforme a regulamentação e em plena harmonia com as garantias constitucionais.(...)(G.N) De fato, infere-se que a sindicância foi instaurada para apuração dos fatos relacionados a um atropelamento ocorrido nas instalações do DCTA e não direta e inicialmente em relação à pessoa do autor. Consta da Portaria DCTA n. 267-T/DPE, de 23.08.2016 que a instaurou: (...) Art1º- determinar que seja instaurada a Sindicância para apurar o fato constante da parte n. 1890/BINFA_SSD, de 16 de agosto de 2016, do Comandante Interino do BINFA -64 e do Relatório WPF/2015, de 17 de agosto de 2016, da Seção de Investigação e Justiça do GIA-SJ. Delegando para este fim, competência ao Maj. Esp Arm FABIO DE CASTRO DUTRA (IFI/2348411), como sindicante, e ao 2º Tem QCON MEc RODNEY PARECIDO DOMENE SUHR (...), como escrivão”(...) Verifica-se, ainda, que posteriormente à sindicância (Id 132704073): - foi dada ciência do Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar ao autor em 17.10.2016; - consta como fato que originou o referido formulário: “Conforme consta na Solução de Sindicância n. 03/SIND/DCTA/2016 que tratava da ocorrência de atropelamento no interior do Campus do DCTA, ocorrida no dia 11 de agosto de 2016, foi imputado ao militar arrolado as seguintes condutas: a) omitir do Oficial Sindicante circunstância relevante para apuração do acidente originário, negando a este, quando do seu depoimento inicial, a informação de haver promovido a troca do para brisas do seu veículo logo na manhã seguinte do atropelamento; e b) de haver faltado com a verdade quando afirmou ao Sindicante que teria parado o veículo no momento do atropelamento, versão esta contrariada por testemunha presencial, em seguro depoimento.” - após defesa exercida na FADT, concluiu-se que “houve transgressão disciplinar conforme descrito no número 50 do parágrafo único do art. 10 do RDAER, classificada como grave, pois é de natureza densonrosa e ofensiva à dignidade militar, conforme constatado no item 1 e conforme letras A e B do art. 12 do RDAER.” - o autor foi punido com dez dias de prisão por ter faltado com a verdade em relação às ocorrências relativas ao atropelamento no interior do DCTA, no dia 11 de agosto de 2016, enquadrado no n. 50 e parágrafo único do art. 10, com as atenuantes da letra 2A e agravantes da letra 3C do art. 13 do RDAER. Com efeito, conforme informado pela Administração Militar, em um primeiro momento ocorreram investigações internas pela Seção de Investigação e Justiça que tiveram como objeto o atropelamento reportado, sendo realizadas diligências que relacionaram o autor aos fatos em virtude das informações relativas ao veículo envolvido no acidente. Conforme relatório do agente de investigações, esta cronologia fica clara (ID 135182077): (...) Após tomarmos ciência do fato descrito na parte da referência, iniciamos de imediato as diligências no sentido de identificarmos a autoria. De posse das informações verbais do SO A. Ricardo (SAR/IAE), que socorreu a vítima e sua esposa que também informou aos integrantes da equipe de serviço do portão da Brejauveira o fato, rumamos para a central de Monitoramento Eletrônico do BINFA, e lá obtivemos informações de horários e possíveis veículos a serem averiguados, que pudessem nos levar ao autor do atropelamento e omissão de socorro. 2. Diversas possibilidades forma averiguadas e combinações de placas de veículos analisadas, tendo em vista a má qualidade de imagem do vídeo de saída de veículos e pedestres do Portão Brejauveira, mesmo assim prosseguimos com as diligências. 3. Fizemos, também diligências na Divisão de sáude do GIA SJ e no Hospital da Vila Industrial de São José dos Campos, no intuito de saber o estado da vítima e obtermos informações que nos levassem a autoria. A vítima, na presença da sua irmã 2S Raquel, relatou que estava bem, aguardando resultados de exames, mas não se lembrava de nada do que ocorrera. 4. na estaca zero, voltamos às imagens e como já citado, após inúmeras combinações e checagem de horários na manhã de ontem identificamos o veículo Honda Civic, cor preto, placa FKF 7986, selo 13642, estacionado na frente ao prédio da antiga Direção Geral do DCTA, que estava naquele momento, com amassado no capo do lado direito e paralamas do mesmo lado também danificado. 5. Diante das informações acima rumamos para a Seção de identificação do BINFA e obtivemos a informação de que o veículo supracitado está registrado em nome do sr. Marcelo Araújo Palhares de Andrade Maj Av, residente no PHR 23ª, n 108, prestando serviços no NUIAOP. (...) Após, estas investigações inicias, é que o autor foi chamado a depor perante a Seção de Investigação e Justiça, sendo, na sequência, determinada a instauração de sindicância, em 30.08.2016, do que se infere não haver possibilidade dele ter sido cientificado das apurações iniciais, porquanto justamente não se sabia a autoria. Registre-se, que a sindicância foi instaurada para apuração de “fatos” e não de conduta praticada pelo autor, recaindo tal situação, na hipótese prevista no item 5.2.3 do ICA 111- Instrução que dispõe sobre Sindicância no âmbito do Comando da Aeronáutica: 5.2.3 Não havendo a figura do sindicado, mas apenas um fato a ser apurado, torna-se desnecessária a concessão do prazo para o oferecimento de defesa prévia e para a apresentação de alegações finais. Nesta esteira, é de registar que nos testemunhos colhidos da vítima e daquela que a socorreu não há citação do autor, apenas há relatos sobre as circunstâncias do atropelamento. Somente no decorrer da sindicância, é que os fatos apurados levaram à conclusão da autoria, quando então o mesmo foi ouvido. Em conclusão de sindicância há o seguinte registro sobre estes dois momentos de apuração (ID 135182073): (...) O Oficial Sindicante apurou que o sindicado adotou conduta inteiramente reprovável no episódio, primeiro por não ter parado o veículo na ocasião e depois por haver tentado de todas as formas afastar sua responsabilidade pelo acidente, promovendo logo na manhã seguinte a troca de para-brisas do carro. Em clara atitude de dissimulação. Além disso, teria ele omitido, no seu depoimento inicial na IVJ e no depoimento prestado nesta própria sindicância, num primeiro momento a troca daquela peça, somente vindo a admitir isso quando o Sindicante lhe surpreendeu com a exbição do vídeo fornecido pelo BINFA que mostrava o para brisas com cerca de 30% da área fragmentada. (...) Destaca-se, igualmente, que o militar foi devidamente cientificado da solução da sindicância, como se percebe da cópia do Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar assinado pelo mesmo (ID 132704053) permitindo-lhe apresentar suas justificativas por escrito ou alegações de defesa, o que também foi feito efetivamente, como se observa do mesmo documento. Ao contrário do que alega o apelante, foi assegurado ao autor o conhecimento dos atos administrativos no momento oportuno e o seu direito de resposta, oportunizando-se a sua defesa, mediante a exposição de sua versão dos fatos. Também não se confirma nos autos a alegada perseguição. Logo, como bem anotou o magistrado sentenciante, o militar exerceu seu direito de manifestar-se no decorrer do procedimento administrativo que culminou em sanção, cuja fundamentação transcrevo e acrescento às razões de decidir: (...) Com efeito, o autor foi devidamente cientificado dos fatos que lhe foram imputados através do FATD (Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar), sendo-lhe oportunizada a apresentação, por escrito, de justificativa, conforme consta do documento de fls.171/172, o que foi efetivamente exercido pelo autor, que ofereceu defesa às fls.173/175. Acerca da legalidade da apresentação de defesa por escrito, já se pronunciou o STJ nos seguintes termos (grifei): “Se a punição imposta ao militar foi baseada em prévio procedimento, no qual se abriu a possibilidade do acusado acompanhar todos os atos, bem como apresentar defesa escrita, não há nulidade por ofensa ao direito de ampla defesa ou contraditório” (ROMS - RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – 17911 – Fonte: DJ DATA:29/11/2004 PG:00353 - Rel. FELIX FISCHER). Assim, conclui-se que a possibilidade de apresentar justificativas, ainda que por escrito, e nela expender todas as suas razões, é suficiente para o pleno exercício do direito de defesa. Ressalto que no caso concreto a sindicância que precedeu o FATD (Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar), foi instaurada apenas para apuração dos fatos, não possuindo caráter punitivo (fls.188 e 229/237). A penalidade aplicada ao autor decorreu do segundo procedimento administrativo, ou seja, do FATD (Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar). Observo, ainda, que aos 16/08/2016 o autor foi ouvido na referida sindicância (fl.195), de modo que é inegável que, desde tal momento o autor tinha ciência da apuração que estava sendo feita acerca dos fatos. E, somente depois de apurados os fatos, foi iniciado o FATD (Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar), que resultou na aplicação de penalidade, e no qual foram garantidos ao autor o contraditório e ampla defesa. Desta forma, impõe-se concluir que foram observados os ditames do Regulamento Disciplinar da Aeronáutica no que se refere à apuração de infração disciplinar e à aplicação de penalidade administrativa, porquanto no âmbito da fixação de pena disciplinar ao autor, na qualidade de militar, reputa-se respeitado o devido processo legal com a observância do procedimento previsto no respectivo regulamento disciplinar, não havendo que se falar em abuso de autoridade e/ou excesso de poder. (...) Não se vislumbra, assim, a existência de qualquer vício a macular a regularidade e legalidade do ato impugnado, havendo os procedimentos em tela se desenvolvido com observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Por fim, anoto que o art. 47 da Lei 6.880/1980 delimita o alcance dos regulamentos militares quanto às transgressões disciplinares, impondo a sua classificação e especificação, trazendo a prisão como hipótese de pena disciplinar, com respaldo no art. 5º, LXI, da Constituição. O Decreto n. 76.322/75 que aprovou o Regulamento Disciplinar da Aeronáutica - RDAER foi editado em estrita observância ao disposto no artigo 47 do Estatuto dos Militares, o qual autoriza a especificação e classificação das transgressões disciplinares via regulamento. Deste modo, a previsão de prisão disciplinar encontra fundamento na própria carta constitucional, bem como em leis e atos regulamentares válidos e legítimos. Ademais, o serviço militar é alicerçado na hierarquia e disciplina e dirigido por regras rígidas que incluem o sistema de aplicação de penalidades. Logo, nada está a indicar a existência de arbitrariedades. De fato, ao Judiciário não cabe apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas, sob pena de invasão de competência. Como consabido, é possível o reexame do ato administrativo à luz da razoabilidade, mas não cabe ao Poder Judiciário imiscuir-se no juízo e discricionariedade administrativos, em respeito ao princípio da separação de poderes. Desta feita, de rigor a manutenção da sentença. Encargos da sucumbência Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência este regramento. Mantida a decisão em grau recursal, impõe-se a majoração dos honorários a serem pagos pela parte autora por incidência do disposto no §11º do artigo 85 do NCPC. Assim, majoro os honorários advocatícios, levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, aos quais acresço 1%, totalizando o percentual de 11% (onze por cento), observada a gratuidade da justiça. Dispositivo Pelo exposto, nego provimento ao apelo da parte autora e dou provimento ao apelo da União É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO. MILITAR. AERONÁUTICA. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. FATD. NULIDADES. INOCORRÊNCIA. RECURSO NÃO PROVIDO.
1.Trata-se de Apelação interposta pela parte autora, Major- Aviador da Força Aérea Brasileira, contra a sentença que revogou a tutela antecipada e julgou improcedente o pedido de afastamento de punição disciplinar que lhe foi imposta como resultado do processo de sindicância instaurado por meio da Portaria nº 267-T/DPE, de 23 de agosto de 2016, ou, no Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATDA. Condenação em honorários advocatícios em 10% (dez por cento) do valor da causa, observada a gratuidade da justiça.
2.Na Sindicância, restou apurado que o militar teria praticado conduta que configura indício de infração penal militar, capitulada no art. 210 do Código Penal Militar, sendo, então, os autos remetidos ao Tenente Brigadeiro -Diretor-Geral do DCTA, que entendeu configurar inegável omissão de socorro à vítima, crime de competência da Justiça Criminal Comum e, também, transgressão disciplinar, determinando a abertura de novo procedimento no âmbito administrativo, chamado de Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar – FATD, nº 003/2016, em 17/10/2016, resultando na aplicação de pena de 10 (dez) dias de prisão, sob o fundamento do autor ter faltado com a verdade em relação ao atropelamento suprarreferido.
3.Conforme informado pela Administração Militar, em um primeiro momento ocorreram investigações internas pela Seção de Investigação e Justiça que tiveram como objeto o atropelamento reportado, sendo realizadas diligências que relacionaram o autor aos fatos em virtude das informações relativas ao veículo envolvido no acidente. Após, estas investigações inicias, é que o autor foi chamado a depor perante a Seção de Investigação e Justiça, sendo, na sequência, determinada a instauração de sindicância, em 30.08.2016, do que se infere não haver possibilidade dele ter sido cientificado das apurações iniciais, porquanto justamente não se sabia a autoria.
4.Registre-se, que a sindicância foi instaurada para apuração de “fatos” e não de conduta praticada pelo autor, recaindo tal situação, na hipótese prevista no item 5.2.3 do ICA 111- Instrução que dispõe sobre Sindicância no âmbito do Comando da Aeronáutica.
5. O militar foi devidamente cientificado da solução da sindicância, como se percebe da cópia do Formulário de Apuração de Transgressão Disciplinar assinado pelo mesmo permitindo-lhe apresentar suas justificativas por escrito ou alegações de defesa, o que também foi feito efetivamente, como se observa do mesmo documento.
6. Assegurado ao autor o conhecimento dos atos administrativos no momento oportuno e o seu direito de resposta, oportunizando-se a sua defesa, mediante a exposição de sua versão dos fatos. Também não se confirma nos autos a alegada perseguição.
7. Punições disciplinares encontram fundamento na própria carta constitucional. O serviço militar é alicerçado na hierarquia e disciplina e dirigido por regras rígidas que incluem o sistema de aplicação de penalidades.
8. Ao Judiciário não cabe apreciar o mérito administrativo discricionário, mas tão somente a legalidade dos atos e eventuais excessos nas escolhas.
9. Recurso da parte autora não provido.