Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5183445-86.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5183445-86.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N

 

 

R E L A T Ó R I O

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de ação proposta por PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de auxílio-reclusão.

Juntados procuração e documentos.

Deferido o pedido de gratuidade da justiça.

O INSS apresentou contestação.

Réplica da parte autora.

Foi realizada audiência de instrução e julgamento.

O MM. Juízo de origem julgou procedente o pedido.

Inconformada, a autarquia interpôs recurso de apelação alegando, em síntese, que não restou comprovada a união estável entre a parte autora e o falecido, não fazendo jus ao benefício.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal se manifestou pelo provimento do recurso.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5183445-86.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: PRISCILA REIS DOS SANTOS SILVA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE LOPES MANTOVANELLI - SP259069-N

 

 

V O T O

O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Estabelece o artigo 201, inciso IV, da Constituição Federal que:

"Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: 

IV- salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda;" 

O artigo 80 da Lei 8.213/91, que regulamenta o citado dispositivo constitucional, assim dispunha à época da prisão do instituidor:

"Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço. 

Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário." 

Ainda, o art. 116, caput, do Decreto 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social), prevê:

"Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais)."

Dessarte, em sede de auxílio-reclusão devia-se demonstrar, basicamente, os seguintes requisitos: (a) o recolhimento do segurado à prisão; (b) a qualidade de segurado do recluso; (c) a dependência econômica do interessado; e (d) o enquadramento do preso como pessoa de baixa renda (o último salário-de-contribuição deve ser igual ou inferior ao limite legal), a teor dos artigos 201, IV, da CF, 80 da Lei 8.213/91 e 116 do Decreto nº 3.048/99.

O pedido foi instruído com comprovante do efetivo recolhimento à prisão do Sr. Arlindo Batista de Oliveira Junior em 07/08/2018 (página 01 - ID 126127174).

Quanto ao requisito da qualidade de segurado, da análise do extrato do CNIS juntado à página 01 - ID 126127195 extrai-se que seu último vínculo laboral encerrou-se em 19/06/2018. Tendo em vista que a reclusão deu-se em 07/08/2018, conclui-se que o recluso mantinha sua condição de segurado, nos termos do art. 15, II, da Lei nº 8.213/91.

Relativamente à qualidade de dependente, verifica-se do inciso I, do artigo 16, da Lei 8.213/91, que a companheira é beneficiária do Regime Geral de Previdência Social na condição de dependente do segurado. Ainda, determina o § 4º do referido artigo que a sua dependência econômica é presumida:

"Art. 16. São beneficiários do regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: 

I- o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido;

II- "omissis"

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada." 

No caso, a parte autora alega ser companheira do segurado, sendo necessária a comprovação da união estável entre eles.

Da análise dos autos, observa-se que foram trazidos documentos que podem ser considerados como início de prova material da referida convivência, haja vista, principalmente: (i) a carteirinha de visitante juntada à página 01 - ID 126127175, em que a parte autora consta como companheira do recluso; (ii) a declaração de união estável colacionada às páginas 01/02 - ID 126127177, em que consta que conviviam havia aproximadamente 11 meses; (iii) as cartas juntadas às páginas 01/26 - ID 126127178, 01/02 - ID 126127179 e 01/06 - ID 126127180; e (iv) as fotos anexadas às páginas 01/03 - ID 126127181.

Corroborando o início de prova material apresentado, a informante do juízo e a testemunha confirmaram que a parte autora convivia em união estável com o recluso.

Neste contexto, diante da suficiência de provas que atestam a existência de vida comum, restou comprovada a alegada união estável, sendo, portanto, presumida sua dependência econômica em relação ao segurado.

Resta, ainda, analisar a renda do segurado recluso, conforme restou decidido no julgamento pelo E. Supremo Tribunal Federal em Repercussão Geral, do RE 587365, publicado no DOU em 08/05/2009 e relatado pelo Ministro Ricardo Lewandowski, cuja ementa segue:

"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. 

I- Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. 

II-Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários. 

III-Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade. 

IV- Recurso extraordinário conhecido e provido."

No caso, observa-se que, à época em que foi preso, o segurado estava desempregado, sendo irrelevante o fato de seu último salário-de-contribuição ter sido superior ao limite estabelecido.

É o que dispõe o §1º do artigo 116, do Decreto 3.048/99:

"Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais).

§ 1º É devido auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-contribuição na data do seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado."

Neste sentido, a jurisprudência desta 10ª Turma:

"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-RECLUSÃO. EXISTÊNCIA DE OMISSÃO. CARÁTER INFRINGENTE. POSSIBILIDADE. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. 1- A condição de desempregado do segurado, no momento imediatamente anterior à reclusão do mesmo, torna irrelevante a última contribuição previdenciária feita, caracterizando erro material no acórdão, sujeito à revisão pela Corte julgadora. 2- Excepcionalmente, o efeito modificativo dos embargos de declaração tem vez quando, apenas, houver defeito material que, após sanado, obrigue a alteração do resultado do julgamento, Precedente do STJ. 3- Embargos de declaração acolhidos." (TRF 3ª Região - 10ª Turma; AC 00373676320104039999, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, DJU 28.03.2012, decisão unânime)

Logo, conclui-se que o segurado recluso possuía a condição de baixa renda para o fim de concessão de auxílio-reclusão, cumprindo, dessa forma, todos os requisitos ensejadores do pedido autoral, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida neste ponto.

O termo inicial do benefício deveria ser fixado na data do recolhimento do segurado à prisão. No entanto, mantenho na data do requerimento administrativo, tal como fixado pela r. sentença, sob pena de reformatio in pejus.

No que tange ao prazo de duração do benefício, o artigo 77, §2º, inciso V, alínea "b", da Lei nº 8.213/91, aplicável ao presente caso, prevê que a cota do benefício cessará para o cônjuge ou companheiro em 04 (quatro) meses, se o segurado não tiver vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem iniciado em menos de 02 (dois) anos antes do fato gerador.

No caso dos autos, além de não ter sido demonstrado o recolhimento de mais de 18 (dezoito) contribuições pelo segurado, não restou comprovado que a união estável foi iniciada mais de 02 (anos) antes da prisão, já que a própria parte autora declarou a duração de aproximadamente 11 meses.

Dessarte, conclui-se que a parte autora faz jus a apenas 04 (quatro) parcelas do benefício.

Deve-se observar, ainda, que já tendo havido o pagamento das 04 (quatro) parcelas em razão da tutela de urgência, indevida a fixação de correção monetária e juros de mora.

Cumpre consignar, por fim, que apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT, entendo que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no AR E 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de valores recebidos de boa fé, em razão de sua natureza alimentar.

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação do INSS, para determinar a concessão do benefício por apenas quatro meses, haja vista o preceito legal do art. 77, §2º, V, “b” da Lei nº 8.213/91 c/c art. 80, caput, da Lei nº 8.213/91, tudo na forma acima explicitada.

É como voto.



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. UNIÃO ESTÁVEL COMPROVADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. PRAZO DE DURAÇÃO. ARTIGO 77, §2º, V, "B", DA LEI Nº 8.213/91. BENEFÍCIO DEVIDO POR APENAS QUATRO MESES. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

1. O auxílio-reclusão é devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes de segurado de baixa renda recolhido à prisão.

2. Em face dos ditames do artigo 16 da Lei 8.213/91, a dependência econômica da companheira é presumida.

3. Demonstrada a alegada união estável entre a parte autora e o recluso, estando satisfeito o requisito da qualidade de dependente.

4. Preenchidos os demais requisitos, faz jus a parte autora ao recebimento do benefício de auxílio-reclusão.

5. O termo inicial deveria ser fixado na data do recolhimento do segurado à prisão. No entanto, mantém-se na data do requerimento administrativo, como estabelecimento pela r. sentença, uma vez que não houve apelação da parte autora.

6. Quanto ao prazo de duração do benefício, o artigo 77, §2º, inciso V, alínea "b", da Lei nº 8.213/91, aplicável ao presente caso, prevê que a cota do benefício cessará para o cônjuge ou companheiro em 04 (quatro) meses, se o segurado não tiver vertido 18 (dezoito) contribuições mensais ou se o casamento ou a união estável tiverem sido iniciados em menos de 02 (dois) anos antes do fato gerador.

7. Não tendo sido comprovado o recolhimento de 18 (dezoito) contribuições mensais, nem a convivência em união estável por prazo superior a 02 (dois) anos, conclui-se que a parte autora faz jus a apenas 04 (quatro) parcelas do benefício, montante este já pago pela autarquia em razão da concessão da tutela de urgência.

8. Não havendo prestações atrasadas, indevida a fixação de correção monetária e juros de mora.

9. Apesar do julgamento do recurso representativo de controvérsia REsp nº 1.401.560/MT, entende-se que, enquanto mantido o posicionamento firmado pelo e. STF no ARE 734242 AgR, este deve continuar a ser aplicado nestes casos, afastando-se a necessidade de devolução de valores recebidos de boa-fé, em razão de sua natureza alimentar.

10. Apelação do INSS parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento a apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.