Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO (318) Nº 5029487-07.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. Presidência

EXCIPIENTE: LEONARDO SAFI DE MELO

Advogados do(a) EXCIPIENTE: RICARDO LOSINSKAS HACHUL - SP358482, RENATO LOSINSKAS HACHUL - SP307340, PEDRO LUIZ BUENO DE ANDRADE - SP174084, CAIO HENRIQUE GODOY DA COSTA - SP385344, LEONARDO MASSUD - SP141981, LEANDRO SARCEDO - SP157756

EXCEPTO: DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO (318) Nº 5029487-07.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. Presidência

EXCIPIENTE: LEONARDO SAFI DE MELO

Advogados do(a) EXCIPIENTE: RICARDO LOSINSKAS HACHUL - SP358482, RENATO LOSINSKAS HACHUL - SP307340, PEDRO LUIZ BUENO DE ANDRADE - SP174084, CAIO HENRIQUE GODOY DA COSTA - SP385344, LEONARDO MASSUD - SP141981, LEANDRO SARCEDO - SP157756

EXCEPTO: DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Cuida-se de exceção de suspeição oposta por Leonardo Safi de Melo em face da Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, com vistas a afastá-la da relatoria da Ação Penal Originária nº 5021828-44.2020.4.03.000, em trâmite no Órgão Especial desta E. Corte. 

Alega o excipiente, réu no feito supracitado, não ostentar a Desembargadora Federal excepta condições de imparcialidade necessárias à presidência da instrução processual em contraditório e ao julgamento do processo, sob os seguintes fundamentos: por ter presidido o inquérito judicial e, assim, participado da busca por provas capazes de sustentar a hipótese investigada; por ter travado contato direto e aprofundado com essas provas; por ter exercido funções jurisdicionais na fase investigatória, em ambiente inquisitivo, inclusive deferindo uma série de medidas cautelares propugnadas pela PF e pelo MPF em face do Excipiente e dos demais investigados; por ter dado claros indicativos, já no voto proferido ao ensejo do recebimento da denúncia, de sua convicção sobre a força e robustez dos elementos que sob sua presidência foram obtidos pela PF e pelo MPF

Afirma, ademais, que, afora o inegável compromisso com as investigações já realizadas, a Desembargadora Federal excepta preside atualmente o inquérito judicial nº 5022135-95.2020.4.03.0000, no bojo do qual são apurados fatos correlatos imputados ao excipiente, circunstância a reforçar a necessidade de seu afastamento do colegiado que apreciará a ação penal.  

Invoca, ainda, a fim de demonstrar a violação ao princípio acusatório ocorrida na espécie, as disposições da Lei nº 13.964/19, a qual, dentre outras inovações, criou a figura do juiz das garantias, justamente para impedir situações como a que motiva a presente exceção de suspeição. 

Por fim, alega ter a excepta voltado a externar sua convicção sobre a culpabilidade do acusado na Sessão do Órgão Especial de 14/10/2020, oportunidade em que se manifestou pela manutenção da prisão preventiva do excipiente após o decurso de 90 dias da sua decretação. 

Diante desse contexto, pugna pelo acolhimento e pela procedência da presente exceção de suspeição, com a consequente redistribuição da ação penal a novo Relator, bem assim a decretação da nulidade dos atos praticados pela excepta após o recebimento da denúncia. 

Nos termos do art. 285 do Regimento Interno desta E. Corte, os autos foram encaminhados à Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, a qual refutou os argumentos expendidos na inicial. 

O excipiente requereu a imediata suspensão da ação penal nº 5021828- 44.2020.4.03.0000 até a solução do presente incidente (Id nº 146074543). 

O Ministério Público Federal manifestou-se pela rejeição da exceção de suspeição (Id nº 146178733).

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 


EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO (318) Nº 5029487-07.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. Presidência

EXCIPIENTE: LEONARDO SAFI DE MELO

Advogados do(a) EXCIPIENTE: RICARDO LOSINSKAS HACHUL - SP358482, RENATO LOSINSKAS HACHUL - SP307340, PEDRO LUIZ BUENO DE ANDRADE - SP174084, CAIO HENRIQUE GODOY DA COSTA - SP385344, LEONARDO MASSUD - SP141981, LEANDRO SARCEDO - SP157756

EXCEPTO: DESEMBARGADORA FEDERAL THEREZINHA CAZERTA

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Cinge-se a controvérsia a incidente de exceção de suspeição oposto em face da Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, relatora da Ação Penal Originária nº 5021828-44.2020.4.03.000, em trâmite perante o Órgão Especial desta E. Corte. 

Em primeiro lugar, é válido assinalar que, nos feitos de competência originária, por força de disposição legal expressa (art. 2º da Lei nº 8.038/90), o relator, escolhido na forma regimental, será o juiz da instrução, que se realizará segundo o disposto neste capítulo, no Código de Processo Penal, no que for aplicável, e no Regimento Interno do Tribunal.    

Nessa mesma esteira, estabelecem os artigos 205 e 207 do Regimento Interno deste E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, in verbis

 

Art. 205 - O Relator, escolhido na forma do art. 68 do Regimento Interno deste Tribunal, será o Desembargador Federal da instrução do processo, com as atribuições estabelecidas pela lei processual e pelo Regimento Interno deste Tribunal.  

Art. 207 - O Relator, como Desembargador Federal de instrução do processo, terá as atribuições que a legislação processual confere aos Juízes singulares. 

Parágrafo único - Caberá agravo regimental sem efeito suspensivo e na forma do Regimento, da decisão do Relator que: 

a) decretar ou denegar fiança ou a arbitrar;  

b) decretar prisão preventiva;  

c) recusar produção de qualquer prova ou a realização de qualquer diligência. 

 

Não bastasse, o art. 83 do Código de Processo Penal fixa a competência por prevenção toda vez que, concorrendo dois ou mais juízes igualmente competentes ou com jurisdição cumulativa, um deles tiver antecedido aos outros na prática de algum ato do processo ou de medida a este relativa, ainda que anterior ao oferecimento da denúncia ou da queixa. 

Diante desse quadro normativo, a circunstância de a Desembargadora Federal excepta ter presidido o inquérito judicial que instruiu a peça acusatória não conduz, por si só, ao reconhecimento de sua parcialidade para relatar a ação penal correlata.  

E o mesmo entendimento vale para outros inquéritos ou peças informativas com os quais tenha contato, ainda que guardem relação com os fatos imputados na Ação Penal nº 5021828-44.2020.4.03.000. 

E assim se dá porquanto, consoante explanado pelo e. Ministro Teori Albino Zavascki  (Embargos de Declaração na AÇÃO PENAL nº 300, Superior Tribunal de Justiça, Corte Especial, Sessão de 17/10/2007), a autorização legal para a realização de medidas cautelares (as quais seriam submetidas ao juiz singular, caso não houvesse regra especial de competência) e a fiscalização da legalidade da investigação (a qual é presidida pela autoridade policial) não transformam o relator em juiz instrutor, nem representam quebra do sistema acusatório. Pelo contrário, prossegue, conferem-lhe o papel de fiscalizador da legalidade e garantidor dos direitos fundamentais do investigado.  

No mesmo sentido, trago à colação o seguinte aresto do C. Supremo Tribunal Federal, in verbis

 

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRESIDÊNCIA DE INQUÉRITO. IMPEDIMENTO DO MAGISTRADO. INOCORRÊNCIA. ART. 255 do CPP. ROL TAXATIVO . PRECEDENTES. JUIZADO DE INSTRUÇÃO. INOCORRÊNCIA. INCOMPATIBILIDADE DO ART. 75 DO CPP COM A CONSTITUIÇÃO. INEXISTÊNCIA. ORDEM DENEGADA. I - As hipóteses de impedimento elencadas no art. 252 do Código de Processo Penal constituem um numerus clausus. II - Não é possível, pois, interpretar-se extensivamente os seus incisos I e II de modo a entender que o juiz que atua em fase pré-processual desempenha funções equivalentes ao de um delegado de polícia ou membro do Ministério Público. Precedentes. III - Não se adotou, no Brasil, o instituto acolhido por outros países do juizado de instrução, no qual o magistrado exerce, grosso modo, as competências da polícia judiciária. IV - O juiz, ao presidir o inquérito, apenas atua como um administrador, um supervisor, não exteriorizando qualquer juízo de valor sobre fatos ou questões de direito que o impeça de atuar com imparcialidade no curso da ação penal. V - O art. 75 do CPP, que adotou a regra da prevenção da ação penal do magistrado que tiver autorizado diligências antes da denúncia ou da queixa não viola nenhum dispositivo constitucional. VI - Ordem denegada. 

(HC 92893, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 02/10/2008, DJe-236  DIVULG 11-12-2008  PUBLIC 12-12-2008 EMENT VOL-02345-01  PP-00118) 

 

Vale esclarecer, no ponto, não ter a relatora atuado como autoridade policial ou exercido atividade de investigação, mas agido após a provocação do Ministério Público e da Polícia Federal, como determina a lei, apreciando os pedidos de medidas investigatórias realizadas pelos órgãos de persecução penal. 

Não bastasse, é válido assinalar ter a Jurisprudência pátria sedimentado a orientação de que a atuação do julgador na fase pré-processual ou em feitos de natureza administrativa não se equipara a prejulgamento da causa, isto é, não macula manifestações exaradas ulteriormente em sede judicial e sob o crivo do contraditório. 

A uma, porque o art. 252 do Código de Processo Penal, dispositivo de interpretação taxativa, expressamente consigna estar impedido de exercer jurisdição o magistrado que tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão.  

E essa, evidentemente, não é hipótese vertente, considerada a natureza jurídica do inquérito judicial, expediente antecedente ao ajuizamento da ação penal, cujo escopo consiste em reunir elementos a subsidiar o oferecimento de eventual denúncia. 

De outro lado, para que se possa falar em suspeição, nos termos do art. 254 do Código de Processo Penal, demanda-se a indicação de ato concreto e apto a contaminar a convicção do julgador, isto é, a denotar sua parcialidade na condução da instrução ou julgamento do feito.  

Confiram-se, nesse mesmo sentido, os seguintes arestos de nossas Cortes Superiores: 

 

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. JULGAMENTO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO E RECEBIMENTO DE DENÚNCIA PELO MESMO ORGÃO COLEGIADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL. IMPEDIMENTO DOS DESEMBARGADORES PARTICIPANTES DE AMBAS AS SESSÕES DO ÓRGÃO ESPECIAL. NÃO OCORRÊNCIA. ART. 252, III, DO CPP. IMPOSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. ROL TAXATIVO. 1. Por expressa previsão constitucional (arts. 93, VIII, e 96, III, da CF), tanto o procedimento administrativo disciplinar quanto a ação penal nos quais envolvido magistrado de primeiro grau serão processados e julgados pelo respectivo Tribunal, não havendo falar em “outra instância” para fins de impedimento previsto no art. 252, III, do Código de Processo Penal. Precedentes. 2. Ordem denegada. 
 
(HC 112121, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 10/02/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-039 DIVULG 27-02-2015 PUBLIC 02-03-2015) 

  

Habeas corpus. Processual Penal. Impedimento de desembargadores integrantes de órgão especial que tenham julgado procedimento administrativo disciplinar contra juíza federal e emitido pronunciamento pela imposição de disponibilidade à magistrada. Inexistência. Ordem denegada. 1. Embora a pretensão formulada no writ não guarde relação direta com a liberdade de locomoção da paciente, circunstância que demonstraria a inadequação da via eleita, no caso vertente, diante de aventada ocorrência de nulidade absoluta, há indiretamente um cerceamento à liberdade de ir e vir da paciente, de modo a, excepcionalmente, entender-se cabível a impetração. 2. O disposto no inciso III do art. 252 do Código de Processo Penal merece interpretação restritiva, circunscrevendo-se o impedimento do juiz às causas em que tenha atuado em graus de jurisdição distintos, não comportando a norma ampliação da hipótese taxativamente estabelecida. 3. Ordem denegada. 

(HC 120017, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 27/05/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-153  DIVULG 07-08-2014  PUBLIC 08-08-2014) 

 

HABEAS CORPUS. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO REJEITADA. IMPEDIMENTO OU SUSPEIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ATUAÇÃO DE MAGISTRADO EM PROCESSO JUDICIAL E PROCESSO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE ATOS QUE DEMONSTREM O COMPROMETIMENTO DA IMPARCIALIDADE DO MAGISTRADO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. NÃO OCORRÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 

1. A jurisprudência desta Corte consolidou-se no sentido de que "as causas de impedimento (...) de magistrado estão dispostas taxativamente no Código de Processo Penal, não comportando interpretação ampliativa. O disposto no art. 252, III, do CPP aplica-se somente aos casos em que o juiz atuou no feito em outro grau de jurisdição como forma de evitar ofensa ao princípio do duplo grau. Não há impedimento quando o magistrado exerce, na mesma instância, jurisdição criminal após ter atuado em processo administrativo disciplinar". (REsp 1177612/SP, Rel. Min. OG FERNANDES, SEXTA TURMA, DJe 17/10/2011). 

2. Na espécie, verifica-se que a manifestação do referido Desembargador nos autos dos procedimentos administrativos instaurados perante o Conselho Nacional de Justiça limitaram-se à atuação de natureza administrativa relativa ao cargo então ocupado de Corregedor Regional da Justiça Federal da 2a Região, não representando prejulgamento da causa, não havendo falar, pois, em impedimento para apreciar os processos judiciais em que figura como réu o ora paciente. Não há que se cogitar, ainda, de suspeição, haja vista que não foi demonstrada, consoante destacou o Tribunal de origem, a existência de nenhum ato do Magistrado em questão que indique o comprometimento de sua imparcialidade, nos termos do rol exemplificativo descrito no art. 254 do Código de Processo Penal. 

Para chegar-se a conclusão diversa, é necessário o revolvimento do acervo fático probatório amealhado ao feito, o que é inviável na via angusta do writ. 

3. Habeas corpus denegado. 

(HC 324.206/RJ, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 17/08/2015) 

 

Deste último julgado, peço vênia para destacar o seguinte excerto: 

 

Nesta senda, as causas de impedimento previstas no artigo 252, inciso III, do Código de Processo Penal seriam taxativas, numerus clausus, resultando da atuação do magistrado em diferentes graus de jurisdição, não ocorrendo tal óbice em relação às esferas administrativa e judicial.  

Na espécie, verifica-se que a manifestação do referido Desembargador nos autos dos procedimentos administrativos instaurados perante o Conselho Nacional de Justiça limitaram-se à atuação de natureza administrativa relativa ao cargo então ocupado de Corregedor Regional da Justiça Federal da 2ª Região, não representando prejulgamento da causa, não havendo falar, pois, em impedimento para apreciar os processos judiciais em que figura como réu o ora paciente.  

Não há que se cogitar, ainda, de suspeição, haja vista que não foi demonstrada, consoante destacou o Tribunal de origem, a existência de nenhum ato do Magistrado em questão que indique o comprometimento de sua imparcialidade, nos termos do rol exemplificativo descrito no art. 254 do Código de Processo Penal. Para chegar-se a conclusão diversa, é necessário o revolvimento do acervo fático probatório amealhado ao feito, o que é inviável na via angusta do writ. 

 

Assim também é o entendimento desta E. Corte Regional. Confira-se: 

 

PROCESSUAL PENAL. EXCEÇÃO DE IMPEDIMENTO. REJEIÇÃO LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL. DESPROVIMENTO. 

 - Intempestividade da exceção de impedimento em face de Relator. Art. 282 do RITRF-3ªR. 

 - No processo penal, a teor do art. 111 do CPP, as exceções não suspendem, em regra, o andamento da ação, a não ser nos casos excetuados pela própria Lei Penal Adjetiva, isto é, no que tange à suspeição ou ao impedimento, quando houver o reconhecimento pelo magistrado excepto (art. 99 do CPP), ou se reconhecida a procedência da argüição pela parte contrária (art. 102 do CPP), hipóteses não ocorrentes in casu. 

 - Inaplicabilidade do art. 252, III, do CPP a caso em que o pronunciamento judicial apontado como gerador do impedimento ocorreu na mesma instância e em outro processo. Jurisprudência do STF e do STJ. 

 - Agravo regimental desprovido.  

(TRF 3ª Região, ORGÃO ESPECIAL,  Impedi - EXCEÇÃO DE IMPEDIMENTO CRIMINAL - 810 - 0017940-46.2006.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PRESIDENTE, julgado em 09/11/2006, DJU DATA:24/11/2006 PÁGINA: 324) 

 

No que concerne à Lei nº 13.964/19, em especial no tocante à instituição da figura do juiz de garantias, melhor sorte não socorre o excipiente. 

Com efeito, além de discutível, em face dos princípios da especialidade e colegialidade, a implementação dessa regra nas ações penais de competência originária, tem-se que o ministro Luiz Fux suspendeu por tempo indeterminado a eficácia dos dispositivos relacionados ao tema (ADIs nº 6298, 6299, 6300 e 6305). 

Feitas essas considerações, remanesce, tão somente, verificar se, em alguma medida, a Desembargadora Federal excepta praticou ato concreto revelador de sua inaptidão, sob o ponto de vista da imparcialidade, de relatar a Ação Penal nº 5021828-44.2020.4.03.000. 

In casu, da análise das manifestações destacadas pelo excipiente, exaradas por ocasião do recebimento da denúncia e da apreciação da manutenção da prisão preventiva, não vislumbro prejulgamento ou valoração antecipada da prova, mas atuação consentânea com os deveres institucionais inerentes ao magistrado.  

Aliás, a própria petição inicial aponta trechos que revelam a cautela da magistrada com sua imparcialidade, tais como "indícios" e "suspeitas", os quais são requisitos das medidas examinadas. 

Ora, o recebimento da peça acusatória e a verificação dos requisitos para a decretação ou manutenção da prisão preventiva requerem certa incursão no mérito da causa, competindo ao julgador avaliar a prova da materialidade e a presença de indícios de autoria delitiva. Não é demais lembrar que a instrução ocorrerá com a devida obediência à ampla defesa e ao contraditório, oportunidade em que o réu poderá expor suas razões e produzir novos elementos probatórios.  

A mera circunstância de o juiz indicar elementos colhidos na fase de investigação, com o intuito de respaldar seu posicionamento, não traduz parcialidade. Pelo contrário, ao assim proceder, o magistrado vai ao encontro do dever de fundamentar suas decisões e deliberações judiciais, cânone plasmado no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal.  

Conclui-se, portanto, não ter o excipiente indicado a ocorrência de fatos concretos e específicos aptos a comprometer a imparcialidade da Desembargadora Federal suscitada e, consequentemente, suficientes para contaminar a sua convicção pessoal. Em verdade, a insurgência está adstrita aos atos normativos delimitadores da competência para instruir e julgar a ação penal originária, o que não autoriza o reconhecimento de suspeição ou impedimento. 

Vale dizer, não ficou demonstrado, efetivamente, abuso de poder da Desembargadora Federal excepta, tampouco qual seria seu interesse na solução da demanda.   

Nessa mesma senda, de rigor registrar a manifestação do membro da Procuradoria Regional da República, no particular:  

 

No que concerne à alegação do excipiente de que haveria quebra de imparcialidade supostamente demonstrada por expressões utilizadas pela e. Relatora, em decisões prolatadas, é de ver que todas as decisões monocráticas e votos proferidos pela Excelentíssima Desembargadora Federal expressaram convencimento fundado em níveis de cognição perfunctória adequados aos respectivos momentos processuais e aos pressupostos legais de cada providência requerida pelas partes, sempre mediante provocação. A própria formulação das expressões destacadas pelo excipiente – tais como “indiscutíveis indícios”, “robustas suspeitas”, “participação esta que restou evidenciada logo de início”, “robustez dos elementos iniciais” – patenteia a inequívoca ausência de antecipação de juízo aprofundado e definitivo do mérito da ação penal. 

 Ademais, no presente feito, o recebimento da denúncia e o julgamento da ação penal são realizados por decisão colegiada, proferida pelo Juízo constitucionalmente competente, o Colendo Órgão Especial desse Egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região, composto por 17 (dezessete) Magistrados (CF, art. 108, inciso I, alínea “a”, c/c o RITRF3, art. 11, parágrafo único).  

Ora, a colegialidade, por si só, é importante mecanismo de controle da independência e da imparcialidade judiciais, como deixou assente o Min. Luiz Fux, por ocasião do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI – nº 4.414/AL1 pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal. 

 

Em suma, não efetivamente consubstanciada hipótese legalmente prevista a caracterizar a parcialidade do julgador (artigos 252 e 254 do CPP), de rigor a rejeição da pretensão do excipiente.  Entendimento diverso, isto é, o afastamento da Desembargadora do julgamento do feito sem motivo concreto, implicaria ofensa ao princípio do juiz natural.    

Diante do presente julgamento, prejudicado o pedido de suspensão da Ação Penal nº 5021828- 44.2020.4.03.0000 (Id nº 146074543). 

Ante o exposto, com fulcro nos artigos 103, § 4º, do Código de Processo Penal e 284, § 2º, do Regimento Interno desta E. Corte, voto por rejeitar a exceção de suspeição.  

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL PENAL – EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO - COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA (LEI Nº 8.038/90) - PRESIDÊNCIA DO INQUÉRITO JUDICIAL – INEXISTÊNCIA DE IMPEDIMENTO OU SUSPEIÇÃO - JUIZ DAS GARANTIAS (LEI Nº 13.964/19) - INAPLICABILIDADE – RECEBIMENTO DA DENÚNCIA E APRECIAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES - INOCORRÊNCIA DE PREJULGAMENTO - PARCIALIDADE DO JULGADOR NÃO DEMONSTRADA - PEDIDO REJEITADO.  

1. Nos feitos de competência originária, por força de disposição legal expressa (art. 2º da Lei nº 8.038/90 e arts. 205 e 207 do RITRF3), o relator, escolhido na forma regimental, será o juiz da instrução. Inexistência de impedimento para relatar a ação penal correlata. 

2.  A atuação do julgador na fase pré-processual ou em feitos de natureza administrativa não se equipara a prejulgamento da causa, isto é, não macula manifestações exaradas ulteriormente em sede judicial e sob o crivo do contraditório. 

3. Inaplicabilidade da figura do “juiz das garantias” (Lei nº 13.964/2019) na espécie, porquanto, além de discutível, em face dos princípios da especialidade e colegialidade, a implementação dessa regra nas ações penais de competência originária, a eficácia dos dispositivos relacionados ao tema foi suspensa por tempo indeterminado pelo Ministro Relator das ADIs nº 6298, 6299, 6300 e 6305.  

4. In casu, verifica-se não ter a relatora atuado como autoridade policial ou exercido atividade de investigação, mas agido após a provocação do Ministério Público e da Polícia Federal, como determina a lei, apreciando os pedidos de medidas investigatórias realizadas pelos órgãos de persecução penal. 

5. As manifestações destacadas pelo excipiente, exaradas por ocasião do recebimento da denúncia e da apreciação da manutenção da prisão preventiva, não revelam prejulgamento ou valoração antecipada da prova, mas atuação consentânea com os deveres institucionais inerentes ao magistrado. 

6. Não efetivamente consubstanciada hipótese legalmente prevista a caracterizar a parcialidade do julgador (artigos 252 e 254 do CPP), de rigor a rejeição da pretensão do excipiente.  O afastamento da Desembargadora Federal relatora do julgamento do feito sem motivo concreto, em verdade, implicaria ofensa ao princípio do juiz natural.   

7. Exceção de suspeição rejeitada.  

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Antes de iniciado o julgamento, foi suscitada Questão de Ordem pelo advogado do excipiente, Leonardo Massud, no sentido da não permanência das Desembargadoras Federais Therezinha Cazerta e Marisa Santos (exceptas) na sala de sessão durante o julgamento (aplicação do artigo 286, do Regimento Interno desta Corte). O Órgão Especial, por maioria, acolheu a questão de ordem, nos termos do voto do Desembargador Federal BAPTISTA PEREIRA, com quem votaram os Desembargadores Federais ANDRÉ NABARRETE, MARLI FERREIRA, NEWTON DE LUCCA, NERY JUNIOR, ANDRÉ NEKATSCHALOW, CONSUELO YOSHIDA, SOUZA RIBEIRO, WILSON ZAUHY, NINO TOLDO, INÊS VIRGINIA, LUIZ STEFANINI (convocado para compor quórum), COTRIM GUIMARÃES (convocado para compor quórum) e MARCELO SARAIVA (convocado para compor quórum). Vencidos os Desembargadores Federais MAIRAN MAIA (Presidente) e DIVA MALERBI, que rejeitavam a questão de ordem. As Desembargadoras Federais THEREZINHA CAZERTA e MARISA SANTOS, na qualidade de exceptas nas Exceções de Suspeição 5029487-07.2020.4.03.0000 e 5029494-96.2020.4.03.0000, não votaram na questão de ordem. Quanto ao mérito, o Órgão Especial, à unanimidade, rejeitou a exceção de suspeição oposta em face da Desembargadora Federal Therezinha Cazerta, nos termos do voto do Desembargador Federal Presidente MAIRAN MAIA (Relator). Votaram os Desembargadores Federais DIVA MALERBI, BAPTISTA PEREIRA (com redução de fundamento), ANDRÉ NABARRETE, MARLI FERREIRA, NEWTON DE LUCCA, NERY JUNIOR (com redução de fundamento), ANDRÉ NEKATSCHALOW, CONSUELO YOSHIDA, SOUZA RIBEIRO, WILSON ZAUHY (com redução de fundamento), MARISA SANTOS, NINO TOLDO, INÊS VIRGINIA, LUIZ STEFANINI (convocado para compor quórum), COTRIM GUIMARÃES (convocado para compor quórum) e MARCELO SARAIVA (convocado para compor quórum). Impedida a Desembargadora Federal THEREZINHA CAZERTA. Ausentes, os Desembargadores Federais PEIXOTO JUNIOR, HÉLIO NOGUEIRA e PAULO DOMINGUES., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.