Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009951-76.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: LENI LOURENCO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009951-76.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: LENI LOURENCO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N

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R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por LENI LOURENÇO DOS SANTOS, objetivando a concessão de salário-maternidade de trabalhadora rural.

A r. sentença (ID 104227801 - Pág. 69/72) julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão do benefício de salário-maternidade à autora, em razão do nascimento de seu filho, nos termos e prazo estabelecidos no art. 71 da Lei nº 8.213/91, respeitada a prescrição quinquenal, no valor, cada prestação, de 01 (um) salário mínimo vigente à época em que devidas as parcelas, a partir da data do parto. Consignou que os valores serão acrescidos de juros de mora, desde a data da citação, calculados com base no índice oficial de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1°-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, e de correção monetária desde a data do vencimento de cada parcela, com base no índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança (TR), até 25.03.2015, a partir de tal data, com base no Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA - E). Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, até a data da sentença, afastada a incidência das prestações vincendas, em razão do disposto na Súmula 111 do STJ.

Em razões recursais (ID 104227801 - Pág. 81/88), o INSS pugna pela reforma da sentença, uma vez que, segundo alega, o conjunto probatório carreado aos autos seria insuficiente para demonstrar o labor rural pelo período de carência exigido em lei, sendo inadmissível prova exclusivamente testemunhal. Acrescenta que diarista/boia-fria não se enquadra no conceito de segurada especial, de modo que indispensável o recolhimento de contribuições. Alega, ainda, que não restou comprovada a união estável entre a demandante e o pai de seu filho e que a qualidade de segurado especial deste não pode ser a ela estendida, “porque isso só é possível quando o trabalho rural é desenvolvido em regime de economia familiar, e, no entanto, o pai do filho da autora quando exerceu atividade rural o fez na qualidade de "EMPREGADO"”. Subsidiariamente, requer a fixação da correção monetária nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97. Prequestiona a matéria.

A autora apresentou contrarrazões (ID 104227801 - Pág. 93/97).

Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito (ID 104227801 - Pág. 109/111).

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009951-76.2017.4.03.9999

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: LENI LOURENCO DOS SANTOS

Advogado do(a) APELADO: BRUNO BORGES SCOTT - SP323996-N

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V O T O

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

A Constituição reconhece como direitos sociais, a fim de assegurá-los, inclusive mediante cobertura da Previdência Social, a proteção à maternidade e à infância (artigos 6º, 7º, XVIII, e 201, II).

No âmbito do Regime Geral da Previdência Social, foi previsto o benefício de salário-maternidade (artigo 18, I, g, da Lei n.º 8.213/91), a ser concedido de acordo com os ditames legais, observando-se o princípio tempus regit actum.

Considerando as diversas alterações legislativas relativas a esse benefício, faço uma breve análise do arcabouço legal.

Em sua redação original, a Lei de Benefícios da Previdência Social previu a possibilidade de concessão do salário-maternidade tão somente às seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica (artigo 71).

Com a vigência, em 28.03.1994, da Lei n.º 8.861/94, a segurada especial passou a constar do rol das beneficiárias do salário-maternidade, sendo-lhe devido o benefício no valor de um salário mínimo (artigo 39, parágrafo único, da LBPS).

Em 29.11.1999, com a vigência da Lei n.º 9.876/99, todas as seguradas do RGPS, independente de sua classificação, passaram a ter direito ao benefício.

Durante o período de graça, a segurada desempregada fará jus ao recebimento do salário-maternidade nos casos de demissão antes da gravidez, ou, durante a gestação, nas hipóteses de dispensa por justa causa ou a pedido (artigo 97, parágrafo único, do Decreto n.º 3.048/99).

No que tange à carência, entretanto, estabeleceu-se a seguinte distinção: (i) independe de carência (artigo 26, VI, da LBPS) o benefício devido às seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica; (ii) devem contar com 10 (dez) contribuições mensais (artigo 25, III, da LBPS) as seguradas contribuinte individual e facultativa; (iii) já a segurada especial deve comprovar o exercício da atividade campesina pelo período imediatamente anterior ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, por 12 (doze) meses, se o benefício for devido antes da vigência da Lei n.º 9.876/99, ou por 10 (dez) meses, se devido após a vigência do referido Diploma Legal, conforme disposto nos artigos 25, III, e 39, parágrafo único, da LBPS.

Registre-se que, na hipótese de parto antecipado, o período de carência será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que houve essa antecipação (artigo 25, parágrafo único, da LBPS).

No caso de perda da qualidade, as contribuições anteriores serão computadas para efeito de carência, a partir da refiliação, quando a segurada contar com: (i) 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, no período anterior à vigência da Lei n.º 13.457/17 (artigo 24, parágrafo único, da LBPS); e (ii), a partir de 27.06.2017, metade do número de contribuições exigidas (artigo 27-A da LBPS).

O salário-maternidade é devido durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre os 28 (vinte e oito) dias anteriores ao parto, até a data de ocorrência deste.

No caso das mães de crianças acometidas por sequelas neurológicas decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, foi assegurado o recebimento do benefício por 180 (cento e oitenta) dias, na forma do artigo 18, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 13.301/16.

Na hipótese de aborto não criminoso, comprovado mediante atestado médico, a segurada terá direito ao salário-maternidade correspondente a duas semanas (artigo 93, § 5º, do Decreto n.º 3.048/99).

A partir de 16.04.2002, com a vigência da Lei n.º 10.421/02, que incluiu o artigo 71-A na Lei n.º 8.213/91, o benefício também passou a ser devido no caso de adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança.

Inicialmente, foi previsto o benefício pelo período de 120 (cento e vinte) dias, se a criança tiver até 1(um) ano de idade, de 60 (sessenta) dias, se a criança tiver entre 1 (um) e 4 (quatro) anos de idade, e de 30 (trinta) dias, se a criança tiver de 4 (quatro) a 8 (oito) anos de idade. Porém, em 07.06.2013, com a vigência da Medida Provisória n.º 619/2013, convertida na Lei n.º 12.873/13, não mais prevaleceu a distinção de idade do adotado, fixando-se o benefício como devido integralmente por 120 (cento e vinte) dias.

Com a vigência da Lei n.º 12.873/13, em 25.10.2013, também se garantiu direito ao salário-maternidade ao segurado, e não apenas à segurada, que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança.

A Lei n.º 12.873/13 ainda estabeleceu que, no caso de falecimento da segurada ou segurado que fizer jus ao recebimento do salário-maternidade, o benefício será pago, por todo o período ou pelo tempo restante a que teria direito, ao cônjuge ou companheiro sobrevivente que tenha a qualidade de segurado, exceto no caso do falecimento do filho ou de seu abandono, observadas as normas aplicáveis ao salário-maternidade e condicionada a sua percepção ao afastamento do segurado do trabalho ou da atividade desempenhada, sob pena de suspensão do benefício (artigos 71-B e 71-C da LBPS).

No que tange à comprovação da atividade campesina, registro que a comprovação do tempo de serviço, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Nesse sentido, o enunciado de Súmula n.º 149 do c. Superior Tribunal de justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário".

Consoante o entendimento firmado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, inclusive objeto do enunciado de Súmula n.º 577, é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.

É forte o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, isto é, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro.

Nesse sentido, tem-se o enunciado de Súmula n.º 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU ("Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar."), bem como os seguintes precedentes do c. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte:

"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADOR RURAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO LEGAL DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA. INEXISTÊNCIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 149/STJ. AÇÃO IMPROCEDENTE. 1. Nenhum dos documentos apresentados comprova o exercício da atividade rural no período de carência (138 meses - artigos 142 e 143 da Lei nº 8213/91) imediatamente anterior ao requerimento do benefício (2004), havendo apenas a prova testemunhal colhida. 2. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é no sentido de que "conquanto não se exija a contemporaneidade da prova material durante todo o período que se pretende comprovar o exercício de atividade rural, deve haver ao menos um início razoável de prova material contemporânea aos fatos alegados, admitida a complementação da prova mediante depoimentos de testemunhas" (AgRg no REsp 1150825/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/10/2014, DJe 23/10/2014). 3. Incide a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário"), cuja orientação foi confirmada no julgamento do REsp n. 1.133.863/RN, Rel. Ministro Celso Limongi (Desembargador Convocado do TJ/SP), Terceira Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011, submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil, uma vez que, no presente caso, a prova testemunhal não se fez acompanhar de qualquer documento contemporâneo ao tempo de atividade reclamado. 4. Ação rescisória improcedente." (STJ, 3ª Seção, AR 3994, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, v.u., DJe 23.09.2015)

"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. APOSENTADORIA POR IDADE DE TRABALHADOR RURAL. ÓBITO DO CÔNJUGE. INÍCIO MATERIAL DE PROVA. AUSÊNCIA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESP 1.352.721/SP. - A aposentadoria por idade de rurícola exige idade mínima de 60 anos (homem) e 55 anos (mulher), bem assim comprovação do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência da benesse, conforme tabela progressiva, de cunho transitório, inserta no art. 142 da Lei nº 8.213/91, a ser manejada conforme o ano de implementação do requisito etário, ficando afastada a obrigatoriedade de contribuições. - Possibilidade de demonstração do labor campesino, mediante utilização de princípios de provas em nome do cônjuge da postulante da aposentadoria por idade, mesmo após o falecimento deste. - Nessa circunstância, os documentos indiciários devem guardar proximidade ao lapso de carência, exigindo-se, ainda, prova testemunhal robusta, no sentido de que a solicitante persistiu a labutar nas lides rurais, até completar a idade mínima à aposentação postulada. - In casu, muito embora as testemunhas tenham afirmado que a parte autora exerceu labor rural pelo interregno de carência, os elementos havidos como princípios de prova documental desservem à finalidade probante, à falta de contemporaneidade com o lapso no âmbito do qual haveria de ser demonstrada a faina campestre. - Precedente do STJ submetido à sistemática dos recursos representativos de controvérsia (REsp nº 1.352.721/SP), no qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material do labor campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito. - Embargos infringentes desprovidos. - Extinção do processo, de ofício, sem resolução do mérito.(TRF3, 3ª Seção, EI 00330343420114039999, relatora Desembargadora Federal Ana Pezarini, v.u., DJe 01.12.2017)

Há remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural (confira-se: STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015).

Em complementação ao tema, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.

Também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Registra-se que o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o empregado, diarista, volante etc., eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.

Nesse sentido, destaco trecho do voto condutor da relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, no julgamento proferido, em 22.06.2017, à unanimidade desta 3ª Seção, com relação à Ação Rescisória n.º 2015.03.00.004818-6:

"[...] O trabalho rural em regime de economia familiar permite o aproveitamento do início de prova material em reciprocidade entre os membros da entidade familiar, sendo permitida a comunicação da qualificação profissional de um membro para outro, como ocorre entre os cônjuges, entre pais e filhos, e em outras hipóteses nas quais presente o parentesco.

No reconhecimento do trabalho rural do diarista não se permite, em regra, o aproveitamento da prova material, que não em nome próprio, em razão do caráter solitário e avulso do trabalho desempenhado.

Assim, o diarista só poderá aproveitar o início de prova material produzida em nome de outrem, mesmo que de algum familiar, se devidamente amparado pelas demais provas dos autos. [...]"

Do caso concreto.

A autora demonstrou o nascimento de seu filho em 26.06.2013, conforme certidão (ID 104227801 - Pág. 22).

Aduzindo trabalhar em regime de economia familiar e em propriedade de terceiros (boia-fria), juntou aos autos para comprovação da atividade campesina: a) certidão de nascimento do filho, em que foi qualificada como lavradora, assim como o genitor da criança (ID 104227801 - Pág. 22); b) cópia da CTPS do genitor da criança, em que constam vínculos de natureza rural, sendo o último, como tratorista, de 02.06.2010 a 06.08.2010 (ID 104227801 - Pág. 19/21).

A certidão de nascimento em que a requerente foi qualificada como lavradora constitui prova material indiciária do labor campesino, a qual foi corroborada por idônea e segura prova testemunhal.

Deveras, a testemunha Maria Cristina de Almeida Rosa afirmou conhecer a autora há 20 (vinte) anos, morando no mesmo bairro, a qual trabalha na lavoura (tomate, milho, feijão, carpindo), em sítio, para outra pessoa. Asseverou que a Sra. Leni laborou mesmo grávida até uns 03/04 meses e que seu esposo trabalha em “serraria”, no mato, por dia também.

Desta feita, a prova oral se mostrou robusta o suficiente para ampliar a eficácia probatória dos documentos.  

Assim, reconheço o exercício de atividade rural no período de carência imediatamente anterior ao parto, sendo devido o salário-maternidade, tal como consignado.

Assevero que o C. STJ já firmou entendimento de que o trabalhador rural boia-fria, diarista ou volante é equiparado ao segurado especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, de modo que inexigível o recolhimento de contribuições para fins de concessão do beneplácito.

Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários. 2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012). 3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias.

4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.

(REsp 1762211/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/11/2018, DJe 07/12/2018)

A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantida, no mais, a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição.

Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO-MATERNIDADE. RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE CAMPESINA. PROVA MATERIAL INDICIÁRIA EXISTENTE. PROVA TESTEMUNHAL SUFICIENTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA DE OFÍCIO.

1 - A Constituição reconhece como direitos sociais, a fim de assegurá-los, inclusive mediante cobertura da Previdência Social, a proteção à maternidade e à infância (artigos 6º, 7º, XVIII, e 201, II). No âmbito do Regime Geral da Previdência Social, foi previsto o benefício de salário-maternidade, a ser concedido de acordo com os ditames legais, observando-se o princípio tempus regit actum.

2 - Em sua redação original, a Lei de Benefícios da Previdência Social previu a possibilidade de concessão do salário-maternidade tão somente às seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica (artigo 71). Com a vigência, em 28.03.1994, da Lei n.º 8.861/94, a segurada especial passou a constar do rol das beneficiárias do salário-maternidade, sendo-lhe devido o benefício no valor de um salário mínimo (artigo 39, parágrafo único, da LBPS). Em 29.11.1999, com a vigência da Lei n.º 9.876/99, todas as seguradas do RGPS, independente de sua classificação, passaram a ter direito ao benefício. Durante o período de graça, a segurada desempregada fará jus ao recebimento do salário-maternidade nos casos de demissão antes da gravidez, ou, durante a gestação, nas hipóteses de dispensa por justa causa ou a pedido (artigo 97, parágrafo único, do Decreto n.º 3.048/99).

3 - No que tange à carência, estabeleceu-se a seguinte distinção: (i) independe de carência (artigo 26, VI, da LBPS) o benefício devido às seguradas empregada, trabalhadora avulsa e empregada doméstica; (ii) devem contar com 10 (dez) contribuições mensais (artigo 25, III, da LBPS) as seguradas contribuinte individual e facultativa; (iii) já a segurada especial deve comprovar o exercício da atividade campesina pelo período imediatamente anterior ao início do benefício, ainda que de forma descontínua, por 12 (doze) meses, se o benefício for devido antes da vigência da Lei n.º 9.876/99, ou por 10 (dez) meses, se devido após a vigência do referido Diploma Legal, conforme disposto nos artigos 25, III, e 39, parágrafo único, da LBPS. Registre-se que, na hipótese de parto antecipado, o período de carência será reduzido em número de contribuições equivalente ao número de meses em que houve essa antecipação (artigo 25, parágrafo único, da LBPS). No caso de perda da qualidade, as contribuições anteriores serão computadas para efeito de carência, a partir da refiliação, quando a segurada contar com: (i) 1/3 (um terço) do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, no período anterior à vigência da Lei n.º 13.457/17 (artigo 24, parágrafo único, da LBPS); e (ii), a partir de 27.06.2017, metade do número de contribuições exigidas (artigo 27-A da LBPS).

4 - O salário-maternidade é devido durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre os 28 (vinte e oito) dias anteriores ao parto, até a data de ocorrência deste. No caso das mães de crianças acometidas por sequelas neurológicas decorrentes de doenças transmitidas pelo Aedes aegypti, foi assegurado o recebimento do benefício por 180 (cento e oitenta) dias, na forma do artigo 18, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 13.301/16. Na hipótese de aborto não criminoso, comprovado mediante atestado médico, a segurada terá direito ao salário-maternidade correspondente a duas semanas (artigo 93, § 5º, do Decreto n.º 3.048/99).

5 - A partir de 16.04.2002, com a vigência da Lei n.º 10.421/02, que incluiu o artigo 71-A na Lei n.º 8.213/91, o benefício também passou a ser devido no caso de adoção ou obtenção de guarda judicial para fins de adoção de criança. Inicialmente, foi previsto o benefício pelo período de 120 (cento e vinte) dias, se a criança tiver até 1(um) ano de idade, de 60 (sessenta) dias, se a criança tiver entre 1 (um) e 4 (quatro) anos de idade, e de 30 (trinta) dias, se a criança tiver de 4 (quatro) a 8 (oito) anos de idade. Porém, em 07.06.2013, com a vigência da Medida Provisória n.º 619/2013, convertida na Lei n.º 12.873/13, não mais prevaleceu a distinção de idade do adotado, fixando-se o benefício como devido integralmente por 120 (cento e vinte) dias. Com a vigência da Lei n.º 12.873/13, em 25.10.2013, também se garantiu direito ao salário-maternidade ao segurado, e não apenas à segurada, que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança.

6 - A Lei n.º 12.873/13 ainda estabeleceu que, no caso de falecimento da segurada ou segurado que fizer jus ao recebimento do salário-maternidade, o benefício será pago, por todo o período ou pelo tempo restante a que teria direito, ao cônjuge ou companheiro sobrevivente que tenha a qualidade de segurado, exceto no caso do falecimento do filho ou de seu abandono, observadas as normas aplicáveis ao salário-maternidade e condicionada a sua percepção ao afastamento do segurado do trabalho ou da atividade desempenhada, sob pena de suspensão do benefício (artigos 71-B e 71-C da LBPS).

7 - No que tange à comprovação da atividade campesina, registre-se que a comprovação do tempo de serviço, nos termos do artigo 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito. Nesse sentido, o enunciado de Súmula n.º 149 do c. Superior Tribunal de justiça: "A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário".

8 - Consoante o entendimento firmado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil de 1973, inclusive objeto do enunciado de Súmula n.º 577, é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.

9 - É forte o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, isto é, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro. Precedentes desta Corte, do c. STJ e da TNU.

10 - Há remansosa jurisprudência no sentido de ser extensível à mulher a condição de rurícola nos casos em que os documentos apresentados, para fins de comprovação da atividade campesina, indiquem o marido como trabalhador rural. Em complementação ao tema, a 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.304.479/SP, sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973, entendeu que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.

11 - Também restou assentado pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.321.493/SP, em sede de recurso representativo de controvérsia, que é possível o abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural dos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, sendo, para tanto, imprescindível a apresentação de início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

12 - Registra-se que o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o empregado, diarista, volante etc., eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.

13 - No caso concreto, a autora demonstrou o nascimento de seu filho em 26.06.2013, conforme certidão. Aduzindo trabalhar em regime de economia familiar e em propriedade de terceiros (boia-fria), juntou aos autos para comprovação da atividade campesina: a) certidão de nascimento do filho, em que foi qualificada como lavradora, assim como o genitor da criança; b) cópia da CTPS do genitor da criança, em que constam vínculos de natureza rural, sendo o último, como tratorista, de 02.06.2010 a 06.08.2010.

14 - A certidão de nascimento em que a requerente foi qualificada como lavradora constitui prova material indiciária do labor campesino, a qual foi corroborada por idônea e segura prova testemunhal.

15 - A prova oral se mostrou robusta o suficiente para ampliar a eficácia probatória dos documentos.  

16 - Reconhecido o exercício de atividade rural no período de carência imediatamente anterior ao parto, sendo devido o salário-maternidade, tal como consignado.

17 - O C. STJ já firmou entendimento de que o trabalhador rural boia-fria, diarista ou volante é equiparado ao segurado especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, de modo que inexigível o recolhimento de contribuições para fins de concessão do beneplácito. Precedente.

18 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

19 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

20 - Apelação do INSS desprovida. Alteração dos critérios de correção monetária e juros de mora de ofício.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantida, no mais, a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.