Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003051-76.2013.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: FABIO DANIELE FILHO

Advogado do(a) APELANTE: MARLI JACOB - SP83322

APELADO: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: FABIA ALESSANDRA DANIELE
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: MARLI JACOB - SP83322

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003051-76.2013.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: FABIO DANIELE FILHO

Advogado do(a) APELANTE: MARLI JACOB - SP83322

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: FABIA ALESSANDRA DANIELE
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: MARLI JACOB

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação de indenização, por danos materiais e morais, intentada contra a UNIÃO FEDERAL, por indevida constrição judicial nos autos da ação trabalhista nº 01425.2007.087.02.00.2.

A r. sentença julgou “(...) improcedentes os pedidos, nos termos do  artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno o autor nas custas e nos honorários advocatícios de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), com correção monetária a partir desta data, na forma da Resolução n° 134/2010, do Conselho da Justiça Federal, ou da que a substituir, pelos índices da tabela das ações condenatórias em geral. Intimem-se a União e o Ministério Público Federal (...)”.

Em suas razões, pretende o apelante a reforma integral da r. sentença, para “(...) condenar a apelada à devolução da quantia de R$19.566,23 (dezenove mil, quinhentos e sessenta e seis reais vinte e três centavos), corrigida monetariamente desde o desembolso da quantia, acrescida de juros de legais até o efetivo pagamento, bem como condenando também o Estado ao pagamento de danos morais não inferior a noventa salários mínimos, em razão da gravidade do ato praticado em face de menor e da própria extensão do dano, pois desde a penhora indevida com transferência de numerário a terceiro, o mesmo está privado de seu patrimônio, condenando a apelada ao pagamento de honorários advocatícios, em 10% do valor atualizado da condenação, custas e despesas processuais (...)”.

Manifestação do Ministério Público Federal, opinando pelo acolhimento do pedido deduzido na petição inicial.

Com contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003051-76.2013.4.03.6100

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: FABIO DANIELE FILHO

Advogado do(a) APELANTE: MARLI JACOB - SP83322

APELADO: UNIÃO FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

TERCEIRO INTERESSADO: FABIA ALESSANDRA DANIELE
 

ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: MARLI JACOB

 

 

 

V O T O

 

De início, esclareço que o Código de Processo Civil de 1973 será o diploma processual aplicável ao deslinde da controvérsia, pois a r. sentença foi publicada na vigência do código revogado.

Cumpre destacar que, embora os agentes públicos, em geral, e não apenas os integrantes do Poder Judiciário, não respondam pessoalmente por atos praticados na função, salvo caso de dolo ou culpa (artigo 37, § 6º, CF), ou dolo ou fraude (artigo 49, I, da LC 35/1979), o regime especial de responsabilidade pessoal do agente público ou político não se estende à Administração Pública, a qual, junto ao administrado lesado, responde objetivamente, independentemente da prova de dolo, culpa ou fraude, bastando comprovação da relação de causalidade entre o ato imputado e o dano produzido, tal como já decidiu o Supremo Tribunal Federal, frente ao artigo 37, § 6º, da Constituição Federal (RE 228.977, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA, DJ de 12/04/2002, p. 66):

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. AÇÃO REPARATÓRIA DE DANO POR ATO ILÍCITO. ILEGITIMIDADE DE PARTE PASSIVA. RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO ESTADO. A autoridade judiciária não tem responsabilidade civil pelos atos jurisdicionais praticados. Os magistrados enquadram-se na espécie agente político, investidos para o exercício de atribuições constitucionais, sendo dotados de plena liberdade funcional no desempenho de suas funções, com prerrogativas próprias e legislação específica. Ação que deveria ter sido ajuizada contra a Fazenda Estadual - responsável eventual pelos alegados danos causados pela autoridade judicial, ao exercer suas atribuições -, a qual, posteriormente, terá assegurado o direito de regresso contra o magistrado responsável, nas hipóteses de dolo ou culpa. 4. Legitimidade passiva reservada ao Estado. Ausência de responsabilidade concorrente em face dos eventuais prejuízos causados a terceiros pela autoridade julgadora no exercício de suas funções, a teor do art. 37, § 6º, da CF/88. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido."

Esta Corte já decidiu,  ser possível a condenação da União por indevido bloqueio de ativos financeiros, determinado em processo judicial, quando se tratar de responsabilidade por erro inescusável a partir de relação de causalidade firmada em função da prestação de serviços inequivocamente deficiente.

A presente ação, ajuizada por FÁBIO DANIELE FILHO, menor incapaz, representado por sua genitora, FÁBIA ALESSANDRA DANIELE, em face da UNIÃO FEDERAL, tem por objetivo a devolução da quantia de R$ 19.566,23 (dezenove mil, quinhentos e sessenta e seis reais e vinte e três centavos), acrescida de juros e correção monetária, em razão da indevida constrição judicial cometida nos autos nº 01425.2007.087.02.00.2, que tramitou perante a 87ª Vara do Trabalho de São Paulo, bem como a condenação da ré ao pagamento de danos morais, referente à gravidade do ato praticado e à privação de seu patrimônio.

In casu, foi instaurada reclamação trabalhista, em 16/07/2007, por ERIKA LETÍCIA DA SILVA em face de INSTITUTO EDUCACIONAL SANTA ROSA LTDA, representado pelo sócio VALTER RODRIGUES DE GOUVEIA, perante a 87° Vara do Trabalho de São Paulo, pleiteando verbas trabalhistas referentes ao período de 01/03/2001 até 19/12/2005. Houve o bloqueio da importâcia de R$ 19.566,23 (dezenove mil, quinhentos e sessenta e seis reais e vinte e trés centavos), da conta poupança n° 013.00087203.5, de titularidade do menor FÁBIO DANIELE FILHO, nascido em 09/08/2000, por utilizar o CPF de sua genitora FÁBIA ALESSANDRA DANIELE.

Resta comprovado que a genitora do autor, FÁBIA ALESSANDRA DANIELE, fez parte do quadro societário da empresa no período de 29.11.1994 até 16.09.1998, logo, não há que se falar em responsabilidade acerca do débito trabalhista em questão.

Todavia, fato de extrema relevância não foi observado quando da prolação da sentença.

Além disso, é bem de ver, às regras pertinentes à impenhorabilidade da conta poupança, que não pode exceder 40 salários mínimos, montante que, à época dos fatos, totalizava R$ 20.400,00.

Logo, forçoso convir que referida regra, também, passou despercebida pelo magistrado.

Cumpre destacar que, no caso concreto, a ocorrência dos equívocos é incontroversa, decorrendo de decisão tomada em sede de reclamação trabalhista, resultando penhora de valores indevidos, seja pela inexistência de relação societária contemporânea aos fatos, seja pelo descumprimento das regras acerca da impenhorabilidade de montante depositado em conta poupança.

São elementos da responsabilidade civil em geral, a ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever de indenizar.

A Constituição Federal, em seu art. 37, §6º, consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa, in verbis:

“Art. 37. (...)

(...)

§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável no caso de dolo ou culpa”.

O aspecto característico da responsabilidade civil objetiva do Estado reside na desnecessidade da prova de dolo ou culpa do agente público ou do serviço, a qual fica restrita à hipótese de direito de regresso contra o responsável (responsabilidade civil subjetiva dos agentes).

Assim, para que o ente público responda objetivamente, suficiente que se comprovem a conduta da Administração - o ato comissivo, o resultado danoso e o nexo causal entre ambos, porém com possibilidade de exclusão da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva da vítima. Trata-se da adoção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, da teoria do risco administrativo.

Por sua vez, a conduta omissiva requer, necessariamente, a comprovação do dolo ou da culpa, bem como do nexo de causalidade. Desse modo, a situação posta nos autos deve ser elucidada sob a égide da responsabilidade civil subjetiva, de modo que, para que fique caracterizada a responsabilidade omissiva dos réus e, consequentemente, o seu dever de indenizar, de rigor a presença dos elementos que a configuram.

A propósito, colaciono aresto do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MORAIS. "CASO MALATHION". PRESCRIÇÃO. NEXO DE CAUSALIDADE. NORMAS TÉCNICAS DE SEGURANÇA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA. REVISÃO DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. QUANTIFICAÇÃO DOS DANOS MORAIS NÃO EXCESSIVA OU IRRISÓRIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO NÃO CONHECIDO.

Omissis

4. Na responsabilidade objetiva, como é óbvio, desnecessária a prova de dolo ou culpa na conduta do agente. Longa e minuciosa instrução probatória indica participação determinante de preposto da Funasa no evento danoso, com ampla fundamentação da sentença e do acórdão recorrido a respeito.

Omissis

11. Recurso Especial não conhecido.

(STJ, REsp 1236863/ES, Rel. Ministro Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 27/02/2012)

A Doutrina e a Jurisprudência não são unânimes quanto ao trato da natureza da responsabilidade do Estado em caso de omissão. Embora assente ser objetiva a responsabilidade estatal por ato comissivo, relevante divergência tem sido levantada quando se trata de ato omissivo, para a qual exigida a comprovação do nexo de causalidade e do dolo ou da culpa, elementos atrelados à responsabilidade subjetiva.

Conforme julgados abaixo colacionados, prevalece, no âmbito do c. Supremo Tribunal Federal, o entendimento de que o referido princípio constitucional se refere tanto à ação quanto à omissão.

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS PÚBLICAS. ATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: LATROCÍNIO PRATICADO POR APENADO FUGITIVO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA : CULPA PUBLICIZADA: FALTA DO SERVIÇO. C.F., art. 37, § 6º.

I. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, a responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, esta numa de suas três vertentes, a negligência, a imperícia ou a imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a falta do serviço.

II. - A falta do serviço - faute du service dos franceses - não dispensa o requisito da causalidade, vale dizer, do nexo de causalidade entre a ação omissiva atribuída ao poder público e o dano causado a terceiro.

III. - Latrocínio praticado por quadrilha da qual participava um apenado que fugira da prisão tempos antes: neste caso, não há falar em nexo de causalidade entre a fuga do apenado e o latrocínio. Precedentes do STF: RE 172.025/RJ, Ministro Ilmar Galvão, "D.J." de 19.12.96; RE 130.764/PR, Relator Ministro Moreira Alves, RTJ 143/270.

IV. - RE conhecido e provido.

(STF, RE 369820/RS, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, DJ 27/02/2004).

 ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. QUEDA DE ÁRVORE. DANO EM VEÍCULO ESTACIONADO NA VIA PÚBLICA. NOTIFICAÇÃO DA PREFEITURA ACERCA DO RISCO. INÉRCIA. NEGLIGÊNCIA ADMINISTRATIVA COMPROVADA. DEVER DE INDENIZAR MANTIDO. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA ENTRE OS ARESTOS CONFRONTADOS.

1. A jurisprudência desta Corte se firmou no sentido de ser subjetiva a responsabilidade civil do Estado nas hipóteses de omissão, devendo ser demonstrada a presença concomitante do dano, da negligência administrativa e do nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do Poder Público. Precedentes.

...

4. Recurso especial conhecido em parte e não provido.

(STJ - REsp 1230155/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, 2ª Turma, DJe 17/09/2013)

RECURSO ESPECIAL. DNER. RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE CAUSADO EM RODOVIA FEDERAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. OMISSÃO DO ESTADO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. MÁ CONSERVAÇÃO DA RODOVIA FEDERAL. CULPA DA AUTARQUIA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REDUÇÃO. 300 SALÁRIOS MÍNIMOS. PRECEDENTES.

(...)

No campo da responsabilidade civil do Estado, se o prejuízo adveio de uma omissão do Estado, invoca-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Como leciona Celso Antonio Bandeira de Mello, "se o Estado não agiu, não pode logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo" ("Curso de direito administrativo", Malheiros Editores, São Paulo, 2002, p. 855).

(...)

(STJ, REsp 549812/CE, Rel. Min. Franciulli Neto, 2ª Turma, DJ 06.05.2004)

Em suma, para se configurar a responsabilidade subjetiva do Estado pela falta do serviço, basta à demonstração do dano, da negligência administrativa e do nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento ilícito do Poder Público.

No que tange ao pedido de indenização por danos morais, em especial, quanto à responsabilidade civil por atos típicos do Poder Judiciário, a jurisprudência dominante no Excelso Supremo Tribunal Federal, tem se posicionado no sentido de não reconhecer a responsabilidade do Estado, salvo nos casos expressamente previstos, como a referência ao condenado ou preso por tempo superior ao fixado na sentença (art. 5°, LXXV, da CF), como na hipótese de dolo, fraude ou má-fé do juiz.

Nesse sentido:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO PELOS ATOS DOS JUÍZES. C.F., art. 37, § 6º.

I - A responsabilidade objetiva do Estado não se aplica aos atos dos juízes, a não ser nos casos expressamente declarados em lei. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. I. - RE provido. Agravo improvido.

(RE 228035 AgR SC, AG.REG.NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator Ministro CARLOS VELLOSO, 2ª Turma, Publicação: 05/03/2004)

Tal entendimento decorre não só em razão da independência da Magistratura no desempenho da atividade judicial para a pacificação dos conflitos apresentados, mas também pela possibilidade de tais decisões serem modificadas pelo próprio Poder Judiciário, mediante a utilização dos recursos previstos na legislação processual.

In casu, tenho que a inobservância do julgador acerca das peculiaridades inerentes às circunstâncias fáticas já citadas, não está revestida de dolo, fraude ou culpa grave.

Forçoso convir que a seriedade do Juízo não pode ser discutida, haja vista que inexiste nos autos, qualquer indício de má-fé ou irresponsabilidade na condução do processo, capaz de ensejar o dano moral pretendido.

Ademais, de rigor reconhecer que não restou comprovado qualquer dano moral suportado, a evidenciar o deferimento da indenização pretendida, a não ser o aborrecimento justificável por tudo quanto ocorrido.

Assim, de rigor afastar a pretensão indenizatória no tocante aos danos morais.

De outra banda, no que tange aos danos materiais, diante das circunstâncias já aventadas, o ressarcimento do valor de R$ 19.566,23 (dezenove mil, quinhentos e sessenta e seis reais vinte e três centavos), a título de danos materiais, se mostra justo, considerando as circunstâncias já aventadas.

Os juros moratórios devem incidir a partir do evento danoso, a teor da Súmula 54, do c. STJ.

A correção monetária incide desde o efetivo prejuízo e deve ser calculada com base no Manual de Cálculos da Justiça Federal.

O Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional o artigo 5º, da Lei Federal nº 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei Federal nº 9.494/97, quanto à atualização monetária.

Portanto, a regra do artigo 1º-F, da Lei Federal nº 9.494/97 que vinculava o índice oficial da caderneta de poupança ao critério de correção monetária, não mais tem eficácia.

Deve-se observar, quanto à aplicação dos índices de correção monetária e juros de mora, os recentes julgamentos do Pleno do Supremo Tribunal Federal (RE n.º 870.947) e da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em regime de repercussão geral (Resp n.º 1.495.146/MG).

Por fim, invertida a sucumbência, de rigor o afastamento da condenação do apelante em honorários, impondo-se a condenação da UNIÃO FEDERAL nesse tocante, fixado o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.

Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação, reformando a sentença para determinar a condenação da UNIÃO FEDERAL ao pagamento de indenização por dano material ao apelante, no montante de R$ 19.566,23, atualizados nos critérios expostos e condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos da fundamentação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

 

Apelação interposta por FÁBIO DANIELE FILHO contra sentença que, em sede de ação indenizatória, foi proferida nos seguintes termos:

“(...) julgo improcedentes os pedidos, nos termos do  artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno o autor nas custas e nos honorários advocatícios de R$ 1.200,00 (mil e duzentos reais), com correção monetária a partir desta data, na forma da Resolução n° 134/2010, do Conselho da Justiça Federal, ou da que a substituir, pelos índices da tabela das ações condenatórias em geral. (...)”.

O Desembargador Federal relator decidiu dar parcial provimento à apelação, a fim de reformar a sentença para condenar a UNIÃO ao pagamento de indenização por dano material ao apelante, no montante de R$ 19.566,23, atualizados nos critérios expostos e bem como aos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos da fundamentação. Divirjo, todavia, no que toca ao desprovimento do recurso em relação aos danos morais.

A Constituição Federal de 1988 impõe ao Estado o dever de indenizar os danos causados a terceiros por seus servidores, independentemente da prova do dolo ou culpa, verbis:

Art. 37 § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Consoante o artigo 175, parágrafo único, inciso IV, da CF:

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

Parágrafo único. A lei disporá sobre:

(...)

IV - a obrigação de manter serviço adequado.

No mesmo sentido é o artigo 22 do CDC:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código.

Assim, com base nessas normas, é evidente que a responsabilidade do Estado é objetiva quando a má prestação do serviço público, incluído o judicial, causar dano ao cidadão. Claro que no caso não se incluem as decisões judiciais proferidas com base na livre convicção do juízo, porquanto existem meios legais de sua revisão, por meio de recurso, e também porque o magistrado não pode ser responsabilizado pelo exercício legal de suas atribuições.

Na espécie, não se trata de responsabilizar o juízo, cuja responsabilidade é subjetiva, mas sim, de responsabilidade objetiva do Estado em razão de erro do Judiciário, conforme mencionado.

No caso, além das questões relacionadas às ilegalidades ocorridas na execução trabalhista, em razão de determinação de penhora de bem impenhorável (artigo 649, X, do CPC/73) de pessoa que não era sócia da empresa no período da dívida, o fato de maior gravidade, ao meu entender, é que a constrição atingiu bem de  terceiro menor de idade, eis que o autor, à época dos fatos (abril de 2010), tinha apenas 9 anos.

A maior gravidade do ato se refere à circunstância de se tratar de indivíduo que, em razão de sua reconhecida vulnerabilidade, tem garantido pela Constituição Federal e pelo ECA proteção integral, o que inclui sua dignidade e seu patrimônio, que foram claramente violados na espécie por ato do poder público.

É notório o sofrimento impingido ao apelante, na medida em que se violou a sua condição de vulnerabilidade e também de cidadão/jurisdicionado, consumidor de um serviço público essencial, como é o prestado pelo Judiciário, ainda mais se se considerar que o dinheiro fruto de poupança é inviolável, conforme previsto no CPC. Desse modo, são evidentes a dor e o sofrimento causados em razão da omissão da ré, que claramente feriu a dignidade e os direitos do requerente.

Configurou-se o nexo causal, liame entre a conduta da ré (fato danoso) e a lesão acarretada, porquanto os danos morais e materiais causados ao apelante decorreram da ineficiência do serviço prestado pela apelada. Ademais, o ente estatal não provou causa excludente de responsabilidade e se cingiu a sustentar a inexistência do dano.

Acresça-se que a ilicitude da conduta do agente público não é pressuposto da responsabilidade estatal, a qual, como visto, é objetiva. Nesse sentido, transcrevo trecho da doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo o qual:

"Responsabilidade objetiva é a obrigação de indenizar que incumbe a alguém em razão de um procedimento lícito ou ilícito que produziu uma lesão na esfera juridicamente protegida de outrem. Para configurá-la basta, pois, a mera relação causal entre o comportamento e dano" (Curso de Direito Administrativo, 28ª edição, Ed. Malheiros, São Paulo, 2011, p. 1014) - Grifei.

Segundo doutrina e jurisprudência pátrias, a indenização por dano moral tem duplo conteúdo: de sanção e compensação. Na espécie, ficou provado o sofrimento do autor causado desnecessariamente e sem justificativa plausível pela recorrida. Em virtude dos fatos demonstrados, a indenização por danos morais no montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) se mostra adequada, na medida em que atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e cumpre os critérios mencionados.

No que tange aos consectários, acompanho o voto do relator, com a ressalva de que a correção monetária em relação ao ressarcimento por danos morais incide a partir da condenação.

Não divirjo também no que tange à verba honorária fixada pelo relator.

Ante o exposto, dou provimento à apelação, para reformar a sentença, a fim de condenar a União ao pagamento de indenização por danos morais ao autor no valor de R$ 20.000,00 e consignar que a correção monetária em relação a esse montante incidirá a partir da condenação. No mais acompanho o voto do relator.

É como voto.

DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

 

 

APC

 

 

 


E M E N T A

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. CONSTRIÇÃO DE VALORES. ERRO JUDICIÁRIO. PENHORA. CONTA POUPANÇA. INDEVIDA. RELAÇÃO JURÍDICA SOCIETÁRIA. INEXISTENTE. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE DANO, FRAUDE OU MA-FÉ. DANOS MATERIAIS. OCORRÊNCIA. APELO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Trata-se de ação de indenização, por danos materiais e morais, intentada contra a UNIÃO FEDERAL, por indevida constrição judicial nos autos da ação trabalhista nº 01425.2007.087.02.00.2.

2. Esta Corte já decidiu, que possível a condenação da União por indevido bloqueio de ativos financeiros, determinado em processo judicial, quando se tratar de responsabilidade por erro inescusável a partir de relação de causalidade firmada em função da prestação de serviços inequivocamente deficiente.

3. Resta comprovado que a genitora do autor, menor incapaz, FÁBIA ALESSANDRA DANIELE, fez parte do quadro societário da empresa no período de 29.11.1994 até 16.09.1998, logo, não há que se falar em responsabilidade acerca do débito trabalhista em questão.

4. É bem de ver, às regras pertinentes à impenhorabilidade da conta poupança, que não pode exceder 40 salários mínimos, montante que, à época dos fatos, totalizava R$ 20.400,00, considerando que o valor em questão é de R$ 19.566,23.

5. A ocorrência dos equívocos é incontroversa, decorrendo de decisão tomada em sede de reclamação trabalhista, resultando penhora de valores indevidos, seja pela inexistência de relação societária contemporânea aos fatos, seja pelo descumprimento das regras acerca da impenhorabilidade de montante depositado em conta poupança.

6. São elementos da responsabilidade civil em geral, a ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever de indenizar.

7. A Constituição Federal, em seu art. 37, §6º, consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa.

8. O aspecto característico da responsabilidade civil objetiva do Estado reside na desnecessidade da prova de dolo ou culpa do agente público ou do serviço, a qual fica restrita à hipótese de direito de regresso contra o responsável (responsabilidade civil subjetiva dos agentes).

9. Assim, para que o ente público responda objetivamente, suficiente que se comprovem a conduta da Administração - o ato comissivo, o resultado danoso e o nexo causal entre ambos, porém com possibilidade de exclusão da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva da vítima. Trata-se da adoção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, da teoria do risco administrativo.

10. Por sua vez, a conduta omissiva requer, necessariamente, a comprovação do dolo ou da culpa, bem como do nexo de causalidade. Desse modo, a situação posta nos autos deve ser elucidada sob a égide da responsabilidade civil subjetiva, de modo que, para que fique caracterizada a responsabilidade omissiva dos réus e, consequentemente, o seu dever de indenizar, de rigor a presença dos elementos que a configuram.

11. No que tange à   responsabilidade civil por atos típicos do Poder Judiciário a jurisprudência dominante no Excelso STF, tem se posicionado no sentido de não reconhecer a responsabilidade do Estado, salvo nos casos expressamente previstos, como a referência ao condenado ou preso por tempo superior ao fixado na sentença (art. 5°, LXXV, da CF), como na hipótese de dolo, fraude ou má-fé do juiz, o que inexiste no caso em tela.

12. De rigor reconhecer que não restou comprovado qualquer dano moral suportado, a evidenciar o deferimento da indenização pretendida, a não ser o aborrecimento justificável por tudo quanto ocorrido.

13. Na hipótese, diante das circunstâncias constantes nos autos, o ressarcimento do valor de R$ 19.566,23 (dezenove mil, quinhentos e sessenta e seis reais vinte e três centavos), a título de danos materiais, se mostra justo, considerando as circunstâncias já aventadas.

14. Deve-se observar, quanto à aplicação dos índices de correção monetária e juros de mora, os recentes julgamentos do Pleno do Supremo Tribunal Federal (RE n.º 870.947) e da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em regime de repercussão geral (Resp n.º 1.495.146/MG).

15.Invertida a sucumbência, de rigor o afastamento da condenação do apelante em honorários, impondo-se a condenação da UNIÃO FEDERAL nesse tocante, fixado o percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.

16. Apelo parcialmente  provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, por maioria, decidiu dar parcial provimento à apelação, reformando a sentença para determinar a condenação da UNIÃO FEDERAL ao pagamento de indenização por dano material ao apelante, no montante de R$ 19.566,23, atualizados nos critérios expostos e condenar a ré ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram as Des. Fed. MARLI FERREIRA e MÔNICA NOBRE. Vencidos os Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e SOUZA RIBEIRO, que davam provimento à apelação, para reformar a sentença, a fim de condenar a União ao pagamento de indenização por danos morais ao autor no valor de R$ 20.000,00 e consignar que a correção monetária em relação a esse montante incidirá a partir da condenação, acompanhando o Relator no mais. Fará declaração de voto o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. A Des. Fed. MÔNICA NOBRE votou na forma do art. 942, § 1.º do CPC. O Des. Fed. SOUZA RIBEIRO votou na forma dos artigos 53 e 260, § 1.º do RITRF3 , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.