Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5012977-50.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI

AUTOR: MARIA TEREZA PACHECO DOS SANTOS, MARIA TEREZA PACHECO DE ASSIS
CURADOR: RUBENS GOBO BARRENCE

Advogados do(a) AUTOR: BRUNO SANTOS DO NASCIMENTO - SP372794-A, CARLOS MOLTENI JUNIOR - SP15155-N,

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5012977-50.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI

AUTOR: MARIA TEREZA PACHECO DOS SANTOS, MARIA TEREZA PACHECO DE ASSIS
CURADOR: RUBENS GOBO BARRENCE

Advogados do(a) AUTOR: BRUNO SANTOS DO NASCIMENTO - SP372794, CARLOS MOLTENI JUNIOR - SP15155-N,

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de ação rescisória ajuizada por MARIA TEREZA PACHECO DE ASSIS, em face do INSS, visando desconstituir o V. acórdão da Oitava Turma desse E. Tribunal, nos autos da Apelação Cível nº 0035344-81.2009.4.03.9999/SP (Processo de origem 368/91 – 2ª Vara Cível da Comarca de Suzano - TJ/SP), que negou provimento ao agravo legal da parte autora, mantendo a r. decisão monocrática que negara seguimento à apelação da parte autora, interposta em face da r. decisão prolatada nos Embargos à Execução (Processo 368/91 – 2ª VC da comarca de Suzano/SP) que julgou parcialmente procedentes os embargos à execução interpostos pelo executado (INSS), reconhecendo excesso de execução, consolidando o valor do crédito em R$19.323,52 para março/2007.

A presente ação rescisória está fundamentada em ofensa à coisa julgada - artigo 966, IV, do CPC.

Alega a autora que houve ofensa à coisa julgada, uma vez que os cálculos homologados não respeitaram o título judicial, o qual concedeu revisão da renda mensal inicial do benefício da autora, determinando a equivalência salarial na ordem de 4,52 salários mínimos.   

Requer, pois, a procedência desta ação para que, em juízo rescisório, seja declarado o correto índice de 4,52 salários mínimos para a revisão da renda mensal inicial, em respeito à coisa julgada.

Devidamente citado, o réu apresentou contestação – ID 98215126 -, arguindo, preliminarmente, que a ação rescisória não tem caráter recursal e no mérito que não houve violação à coisa julgada.

Réplica da parte autora (ID 107729725).

Alegações finais das partes (ID 126557735 e ID 133454997).

Em parecer, a E. Procuradoria Regional da República opinou pelo regular prosseguimento do feito, sem se pronunciar sobre o mérito (ID 135164260).

É o relatório.

 

 

 


AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº 5012977-50.2019.4.03.0000

RELATOR: Gab. 29 - DES. FED. LUIZ STEFANINI

AUTOR: MARIA TEREZA PACHECO DOS SANTOS, MARIA TEREZA PACHECO DE ASSIS
CURADOR: RUBENS GOBO BARRENCE

Advogados do(a) AUTOR: BRUNO SANTOS DO NASCIMENTO - SP372794, CARLOS MOLTENI JUNIOR - SP15155-N,

REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Por primeiro, verifico a tempestividade da presente ação, tendo em vista que o trânsito em julgado no feito subjacente deu-se em 25/05/2017 (ID 63890207), e a inicial desta ação rescisória foi distribuída nesta Corte em 22/05/2019 (ID 63885700), sendo cumprido, pois, o prazo decadencial.

 

DO JUÍZO RESCINDENDO. OFENSA À COISA JULGADA. ARTIGO 966, INCISO IV, DO CPC.

 

A rescisória é ação que objetiva derrubar a coisa julgada já formada. Busca impugnar decisão atingida pela coisa julgada material. Passada em julgado e a salvo de qualquer recurso. Sua finalidade não é rescindir todo e qualquer julgado. As hipóteses são restritas e taxativas, por se estar diante da autoridade da coisa julgada, de decisão que produziu, a todas as luzes, eficácia completa, no dizer de Pontes de Miranda, "como se não fosse rescindível" (In: Comentários ao código de processo civil, t. VI. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 177). Medida excepcional e cabível apenas dentro das hipóteses restritas trazidas pela lei processual (Ada Pellegrini Grinover, Ação rescisória e divergência de interpretação em matéria constitucional, Revista de Processo 87/37), porquanto esgotados os recursos, chega-se à imutabilidade da decisão de mérito, sem que se possa declará-la justa ou injusta, daí se permitindo, tudo isso, no dizer de Sálvio de Figueiredo Teixeira, "um imperativo da própria sociedade para evitar o fenômeno da perpetuidade dos litígios, causa de intranqüilidade social que afastaria o fim primário do Direito, que é a paz social" (In: Ação rescisória, Apontamentos, RT 646/7).

E a ação rescisória, remarque-se, não se presta à rediscussão do julgado quando a questão tenha sido apreciada no processo originário, não se permitindo seu manejo, com o intento do mero reexame de provas, não ensejando a desconstituição sua má apreciação, apesar de injusta.

Nesse sentido, in verbis:

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. DEPÓSITO PRÉVIO. JUSTIÇA GRATUITA. DESNECESSIDADE. INCISO V DO ART. 485 DO CPC. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. REVOLVIMENTO DO MATERIAL PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1. O autor da ação rescisória que for beneficiário da justiça gratuita não está compelido a fazer o depósito prévio previsto no art. 488, inciso II, do Código de Processo Civil.

2. O cabimento da ação rescisória fundada no inciso V do art. 485 do Código de Processo Civil, pressupõe que o julgado rescindendo, ao aplicar determinada norma na decisão da causa, tenha violado sua literalidade, seu sentido, seu propósito. Tal infringência deve ser evidente e direta, dispensando-se o reexame dos fatos da causa. Precedentes.

3. Ação julgada improcedente."

(STJ, AR 2.968/SC, rel. Ministra Laurita Vaz, j. 12.12.2007, unânime, DJ de 01.02.2008, p. 1)

 

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. RURÍCOLA. APOSENTADORIA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DEPÓSITO. PRÉVIO. DESNECESSIDADE. OFENSA LITERAL DE LEI (ART. 485, V) E ERRO DE FATO (ART. 485, IX). INOCORRÊNCIA. SÚMULA 149/STJ E ART. 55, § 3º DA LEI 8.213/91. CORRETA APLICAÇÃO.

I - É pacífico o entendimento desta Eg. Corte de que a parte beneficiária da Justiça Gratuita não está obrigada a fazer o depósito de que trata o artigo 488, II do Código de Processo Civil.

II - Na rescisória fundada no art. 485, inciso V, do CPC, a violação de dispositivo de lei deve ser literal, frontal, evidente, dispensando o reexame dos fatos da causa. Precedente.

III - Melhor sorte não se reserva quanto ao inconformismo com fundamento no artigo 485, IX do Estatuto Processual, já que a autora não trouxe aos autos qualquer documento que não tenha sido regularmente apreciado pelo acórdão rescindendo, e, possa, eventualmente, ser tido como início razoável de prova material. Ao revés, busca-se na ação assentar o entendimento da suficiência da prova exclusivamente testemunhal para a concessão da aposentadoria rurícola. Note-se, ademais, que a r. decisão rescindenda se limitou a aplicar corretamente, a disposição do verbete de Súmula 149/STJ, acrescida da regra inscrita no artigo 55, § 3º da Lei 8.213/91.

IV - Ação rescisória improcedente."

(STJ, AR 2.452/SP, rel. Ministro Gilson Dipp, j. 08.09.2004, unânime, DJ de 11.10.2004, p. 232)

 

"AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. JURA NOVIT CURIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. DOCUMENTO NOVO. ERRO DE FATO. BENEFÍCIO INDEFERIDO. RESCISÓRIA IMPROCEDENTE. I- Não havendo indicação expressa dos incisos do art. 485, do CPC com fundamento nos quais se pretende a desconstituição do julgado, mas podendo o julgador depreendê-los da leitura da exordial, é de ser aplicado o princípio jura novit curia. II - Para que haja violação à literal disposição de lei, a infração deve decorrer, exclusivamente, da inadequada aplicação do preceito legal a um fato tido por verdadeiro pelo julgador, sem facultar-se ao autor da demanda problematizar ou se insurgir contra os fatos e provas já valorados pelo magistrado. Inadmissível o reexame do conjunto probatório ou um novo pronunciamento judicial sobre os fatos da causa. Precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça. III - A alegação de violação a literal disposição de lei importa, no caso concreto, nova análise das provas produzidas nos autos da ação originária, o que é incompatível com a ação rescisória proposta com fulcro no art. 485, inc. V, do CPC. IV - A rescisão do julgado com fundamento em erro de fato exige que não tenha existido "pronunciamento judicial" (art. 485, § 2º, do CPC) sobre o fato ou elemento de prova em relação ao qual existiu o equívoco quando do julgamento. Tendo havido a efetiva apreciação dos elementos de prova juntados na ação subjacente fica afastado o erro de fato. V - A decisão transitada em julgado poderá ser desconstituída com base em documento novo que seja capaz, por si só, de assegurar pronunciamento favorável àquele que o apresenta. VI - O documento apresentado pela autora é inábil para conduzir à rescisão do julgado, dada a fragilidade da prova. Além disso, um dos fundamentos adotados para que a ação originária fosse julgada improcedente foi o da debilidade e imprecisão da prova testemunhal produzida. Assim, a juntada do referido "cartão de identificação" nos autos da presente rescisória não seria suficiente, por si só, para "assegurar pronunciamento favorável", motivo pelo qual o pedido rescindente formulado com fulcro no art. 485, VII, do CPC, também deve ser julgado improcedente. VII - Rescisória improcedente."

(AR 2005.03.00.077910-2, rel. Desembargador Federal Newton de Lucca, j. em 25.8.2011, unânime, DJF3 de 13.9.2011)

 

No caso em tela, aduz a parte autora que houve ofensa à coisa julgada, alegando que foram homologados os cálculos da Contadoria Judicial, os quais já foram pagos pela Autarquia, em valor menor do que os realmente devidos (ID 63885700).

Todavia, a decisão atacada na presente ação não merece ser rescindida, pelos fatores a seguir expostos:

 

Em primeiro lugar, a sentença transitada em julgado determinou a aplicação da Súmula 260 do TFR para o cálculo da renda mensal inicial do autor (ID 63890205). 

Nos termos da referida Súmula:

 

No primeiro reajuste do benefício previdenciário deve-se aplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente do mês da concessão, considerando, nos reajustes subsequentes, o salário-mínimo então atualizado”.

 

Portanto, a coisa julgada determinou tão somente a aplicação da Súmula 260 do TFR, sem determinar a alteração da renda mensal inicial do autor de outro modo, como aduz a autora na presente ação. 

Ora, respeitando a Súmula 260 do TFR, a Contadoria Judicial apurou o valor da renda mensal inicial, no importe de 4,07 salários mínimos (ID 63890191),  fato esse novamente esclarecido na r. sentença de embargos à execução (ID 63860204), ressaltando que o cálculo da autora não utilizou o valor correto da renda mensal inicial (ID 63890204, p. 02).  

Ademais, a própria parte autora concordou expressamente com os cálculos homologados pelo MM. Juízo de origem, assentindo que o valor devido era de R$ 19.323,52, atualizado até março de 2007, solicitando para que lhe fosse expedido o ofício requisitório (ID 63890197).

Afirmou o autor na referida petição:

"que o INSS insiste em seu requerimento de fls. 182, para que seja requisitado o valor inicial de R$ 19.323,52, logicamente, com o própósito de efetuar o pagamento dentro do prazo da Lei e de forma corrigida. Que a parte autora concorda com o pedido e esclarece que pretendeu que o valor fosse atualizado porque se encontra em uma cadeira de rodas e necessitando muito desse seu crédito de natureza alimentar e que protesta por eventuais diferenças caso o INSS proceda ao pagamento de forma defasada". 

É aplicável ao presente caso o princípio do “venire contra factum proprium”, sendo vedada a parte o comportamento contraditório durante o processo. Não pode a parte concordar com os cálculos e depois querer rescindir a coisa julgada após sua concordância.

Tal princípio está consagrado na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS INFRINGENTES. SEGUROS. INCÊNDIO. CÓDIGO CIVIL DE 1916. PERDA TOTAL. VALOR DA APÓLICE. PERDA PARCIAL. VALOR DOS DANOS EFETIVAMENTE SOFRIDOS. 1. São cabíveis embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente a ação rescisória (CPC/1973, art. 530). 2. No contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados (CC, art. 757). É, pois, ajuste por meio do qual o segurador assume obrigação de pagar ao segurado certa indenização, caso o risco a que está sujeito o segurado, futuro, incerto e especificamente previsto, venha a se realizar. 3. O Superior Tribunal de Justiça, à luz do Código Civil de 1916 (art. 1.438), consagrou o entendimento de que, em caso de perda total de imóvel segurado, decorrente de incêndio, será devido o valor integral da apólice. Dessarte, em havendo apenas a perda parcial, a indenização deverá corresponder aos prejuízos efetivamente suportados. 4. Na hipótese, o voto vencedor concluiu que houve perda apenas parcial do imóvel. Somado a isso, a requerente, de forma espontânea, declarou que houve a perda parcial no momento em que realizou acordo sobre o valor das mercadorias perdidas. Ao intentar, posteriormente, ação aduzindo a ocorrência da perda total da coisa para fins de indenização integral, a autora acaba por incorrer em evidente venire contra factum proprium, perfazendo comportamento contraditório, de quebra da confiança, em nítida violação a boa-fé objetiva. 5. Recurso especial não provido (STJ -  QUARTA TURMA - RESP 1245645 - Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO - data de julgamento: 24/05/2016  - data de publicação: 23/06/2016) - grifei.

 

AÇÃO RESCISÓRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DESTINADA A REPARAR OS PREJUÍZOS DECORRENTES DA EXTINÇÃO DO CONTRATO VERBAL DE DISTRIBUIÇÃO DE BEBIDAS (CONCESSÃO COMERCIAL) ESTABELECIDO ENTRE AS PARTES DURANTE QUASE DUAS DÉCADAS. CONDENAÇÃO, TRANSITADA EM JULGADO, DA FORNECEDORA A RESTITUIR AO DISTRIBUIDOR, DENTRE OUTROS, OS VALORES DISCRIMINADOS NAS NOTAS FISCAIS DE COMPRA E VENDA, SOB A RUBRICA 'FRETES'. ERRO DE FATO E VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS GERAIS DE DIREITO QUE PRECONIZAM A BOA-FÉ CONTRATUAL E A VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. VERIFICAÇÃO. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. NECESSIDADE. 1. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. 2. ERRO DE FATO. CONCEITUAÇÃO PARA EFEITO DE RESCINDIBILIDADE DO JULGADO. 3. CONTRATO DE CONCESSÃO COMERCIAL. PACTO DE COLABORAÇÃO. AJUSTE REALIZADO ENTRE PROFISSIONAIS, COM AUTONOMIA JURÍDICA E LIBERDADE PARA CONTRATAR. 4. DESCONSIDERAÇÃO DE FATOS EXISTENTES (RELACIONADOS À NATUREZA, ÀS CARACTERÍSTICAS, AO OBJETO E À FINALIDADE DO AJUSTE) E ADMISSÃO DE FATOS INEXISTENTES (PREJUÍZO DO DISTRIBUIDOR). VERIFICAÇÃO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO RESCISÓRIO. NECESSIDADE. 5. RECURSO ESPECIAL DA FORNECEDORA PROVIDO; INSURGÊNCIA RECURSAL DO DISTRIBUIDOR PREJUDICADA. 1. O Tribunal de origem, ao julgar improcedente a ação rescisória, considerou que o acórdão rescindendo conferiu pronunciamento judicial suficiente à causa, na medida em que reconheceu o dever do fornecedor de restituir ao distribuidor os valores cobrados a título de fretes, constantes nas notas fiscais de aquisição das mercadorias, ante a constatação de que quem fazia o transporte era justamente o distribuidor. Segundo o entendimento adotado, o enfrentamento da questão na ação rescindenda evidencia o descabido propósito inserto na ação rescisória de, em verdade, reexaminar as questões de fato e provas devidamente analisadas na ação indenizatória. Este entendimento - ainda que não se revele correto -, não encerra, a toda evidência, negativa de prestação jurisdicional. 2. Na esteira da sedimentada jurisprudência desta Corte de Justiça e de autorizada doutrina nacional sobre o tema, o erro de fato que confere lastro à rescisão de um julgado pressupõe que a sentença rescindenda admita um fato inexistente ou considere inexistente um fato efetivamente ocorrido, essencial ao deslinde da causa, sendo indispensável, em qualquer dos casos, que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento judicial a esse respeito. 3. No contrato de distribuição (concessão comercial), concebido, inegavelmente, como um destacado pacto de colaboração (destinando- se a conferir maior efetividade à cadeia de consumo dos produtos fabricados pela concedente, tornando ainda mais viável a atividade econômica desenvolvida pela fabricante), o distribuidor desempenha relevante função, consistente na efetiva aquisição - e não na mera intermediação, ressalta-se -, das mercadorias produzidas pela fabricante com a exclusiva finalidade de, numa determinada localidade, revendê-las, extraindo-se daí (da diferença entre o valor da compra e o obtido com a revenda) sua margem de lucro. 3.1 Trata-se de contrato celebrado entre empresários, a fim de dar consecução a operações comerciais de compra e venda, para posterior revenda, a viabilizar o desenvolvimento da atividade econômica empreendida por cada contratante. Deve-se, pois, peremptoriamente, afastar a ideia de hipossuficiência do distribuidor (concessionário), ou mesmo de dependência jurídica deste em relação ao fabricante (concedente). O que há, nessa relação contratual, na verdade, é um justificado e, portanto, legítimo poder de controle exercido pela fornecedora quanto à atividade desempenhada pelo distribuidor, a considerar o seu envolvimento direto com a clientela, a imagem e a marca daquela, com repercussão no próprio êxito de seu negócio. Tampouco a existência de dependência econômica, inegavelmente ocorrente em ajustes dessa natureza, própria das inter-relações empresariais, encerra desequilíbrio contratual. 3.2 Infere-se, no ponto, a adoção, pelo Tribunal de origem, de premissa fática absolutamente inexistente, ao assentar que o distribuidor não teria alternativa ao ajustar o valor da compra dos produtos da fornecedora, no que estaria indevidamente inserido o custo pelo frete. Tal compreensão, além de desconsiderar a aludida liberdade de contratação, própria das relações empresariais, afasta-se, sobremaneira, do próprio objeto efetivamente ajustado pelas partes (compra e venda, para revenda), no que, é certo, não se insere o serviço de transporte. 3.3 A partir do momento em que o distribuidor/comprador adquire as mercadorias produzidas pela fabricante, com a efetiva tradição (ocasião em que o vendedor não mais se responsabiliza pela higidez da coisa vendida), cabe a ele (distribuidor) envidar todos os esforços necessários para concretizar a revenda, valendo-se, para tanto, de sua expertise e de sua estrutura empresarial, no que se insere, naturalmente, o transporte de tais mercadorias. Portanto, a obrigação do distribuidor cinge-se a pagar o preço pela aquisição da mercadoria, para posteriormente revenda, em observância aos comandos do fornecedor. 3.4 Na hipótese dos autos, era, e sempre foi, consabido pelas partes contratantes, em especial pelo próprio distribuidor, que o valor por ele despendido, independente da discriminação inserta na nota fiscal da correlata operação (de compra e venda, ressalta-se), consubstanciava o preço pela aquisição da mercadoria. E, de acordo com a própria dinâmica do contrato de distribuição, os gastos com a aquisição da mercadoria efetuados pelo distribuidor, assim como os da revenda são naturalmente repassados aos setores varejistas ou atacadistas, extraindo-se dessa operação, como assinalado, a sua margem de lucro, e não de prejuízo. Eventual discriminação de serviços nas notas fiscais, especificamente aquela sob a rubrica de frete (pairando a discussão, inclusive, se este seria o valor cobrado pela carga e descarga feita nos caminhões do distribuidor), com o questionável propósito de fazer incidir menor carga tributária à operação, a beneficiar os contratantes, de parte à parte, não tem o condão de modificar o objeto do contrato efetivamente estabelecido entre as partes, qual seja o de compra e venda, para a revenda. 3.5 A pretensão do distribuidor, após a extinção do contrato, de reaver parte dos valores expendidos pela aquisição dos produtos (e não por qualquer outro serviço, que, é certo, refugiria dos limites ajustados), consubstancia comportamento absolutamente contrário ao proceder contratual adotado por este, durante os quase vinte anos de relação, a revelar verdadeiro venire contra factum proprium, vertente do princípio da boa-fé objetiva, norteador da relação contratual como um todo (antes, durante e após a sua execução). 4. Ressai evidenciado, assim, que o Tribunal de origem, ao reconhecer o dever do fornecedor de indenizar o distribuidor por valores que compuseram o preço pago pela mercadoria adquirida, a um só momento, desconsiderou fatos existentes, incontroversos e absolutamente relevantes ao deslinde da controvérsia, relacionados ao objeto, à dinâmica, à natureza e à própria finalidade do contrato de distribuição, bem como admitiu fato inexistente, consistente na presunção de prejuízo do distribuidor, propiciando-lhe, desse modo, verdadeiro enriquecimento sem causa. 5. Recurso especial da Fornecedora provido, para julgar procedente a ação rescisória e desconstituir, em parte, o julgado rescindendo; Recurso especial do Distribuidor prejudicado. (STJ - TERCEIRA TURMA - RESP 1403272 - Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE - data de julgamento: 10/03/2015 - data de publicação: 18/03/2015) - grifei.

 

Portanto, resta clara a improcedência da presente ação rescisória.

 

DISPOSITIVO

 

Ante o exposto, em juízo rescindendo, julgo improcedente a presente ação rescisória.

Condeno a parte autora em honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), conforme entendimento desta E. Seção, devendo ser observado que a parte autora é benefíciária da Justiça Gratuita.  

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

AÇÃO RESCISÓRIA. OFENSA A COISA JULGADA. AFASTAMENTO. AÇÃO RESCISÓRIA IMPROCEDENTE.

1 - No caso em tela, aduz a parte autora que houve ofensa à coisa julgada, alegando que foram homologados os cálculos da Contadoria Judicial, os quais já foram pagos pela Autarquia, em valor menor do que os realmente devidos (ID 63885700).

2 - Todavia, a decisão atacada na presente ação não merece ser rescindida, pelos fatores a seguir expostos: Em primeiro lugar, a sentença transitada em julgado determinou a aplicação da Súmula 260 do TFR para o cálculo da renda mensal inicial do autor (ID 63890205).  Nos termos da referida Súmula: “No primeiro reajuste do benefício previdenciário deve-se aplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente do mês da concessão, considerando, nos reajustes subsequentes, o salário-mínimo então atualizado”.

3 - Portanto, a coisa julgada determinou tão somente a aplicação da Súmula 260 do TFR, sem determinar a alteração da renda mensal inicial do autor de outro modo, como aduz a autora na presente ação. 

4 - Ora, respeitando a Súmula 260 do TFR, a Contadoria Judicial apurou o valor da renda mensal inicial, no importe de 4,07 salários mínimos (ID 63890191),  fato esse novamente esclarecido na r. sentença de embargos à execução (ID 63860204), ressaltando que o cálculo da autora não utilizou o valor correto da renda mensal inicial (ID 63890204, p. 02).  

5 - Ademais, a própria parte autora concordou expressamente com os cálculos homologados pelo MM. Juízo de origem, concordando que o valor devido era R$ 19.323,52, atualizado até março de 2007, solicitando para que lhe fosse expedido o ofício requisitório (ID 63890197).

6 - É aplicável ao presente caso o princípio do “venire contra factum proprium”, sendo vedada a parte o comportamento contraditório durante o processo. Não pode a parte concordar com os cálculos e depois querer rescindir a coisa julgada após sua concordância. Portanto, resta clara a improcedência da presente ação rescisória.

7 - Ação rescisória improcedente.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por unanimidade, decidiu, em juízo rescindendo, julgar improcedente a ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.