APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004098-80.2016.4.03.6100
RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA
APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP
Advogados do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES - SP181374-A, RENATA VALERIA PINHO CASALE COHEN - SP225847-A
APELADO: RAFAEL AUGUSTO CISCON, VINICIUS MARETTI DE CARVALHO
Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A
Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004098-80.2016.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP Advogados do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES - SP181374-A, RENATA VALERIA PINHO CASALE COHEN - SP225847-A APELADO: RAFAEL AUGUSTO CISCON, VINICIUS MARETTI DE CARVALHO Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de Ação Ordinária, com pedido de antecipação de tutela, ajuizada por RAFAEL AUGUSTO CISCON e outro, em face do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia-CREA/SP, objetivando os autores provimento judicial que reconheça seu direito de prescrever receituários para utilização de agrotóxicos. Requereram a condenação da Apelante ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios. Deram valor à causa de R$ 1.000,00 (mil reais). Deferiu-se a tutela antecipada para reconhecer o direito dos autores de prescreverem receituários agrônomos (agrotóxicos). A r. sentença acolheu o pedido e extinguiu o processo com resolução do mérito, na forma do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para reconhecer aos Autores de o direito de prescreverem receituários agrônomos (agrotóxicos, inclusive). Condenou o Réu ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 2.000,00 (dois mil reais), por equidade, nos termos do art. 85, § 8°, do CPC/2015, haja vista que o valor da causa era irrisório. Inconformado, recorreu o CREA. Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. É o relatório.
Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004098-80.2016.4.03.6100 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. MARLI FERREIRA APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO ESTADO DE SAO PAULO - CREA SP Advogados do(a) APELANTE: DENISE RODRIGUES - SP181374-A, RENATA VALERIA PINHO CASALE COHEN - SP225847-A APELADO: RAFAEL AUGUSTO CISCON, VINICIUS MARETTI DE CARVALHO Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Lei nº 5.524/1968, que dispõe sobre o exercício da profissão de Técnico Industrial de nível médio, estabelece em seus artigos 2º e 6º, verbis: " Art. 2º A atividade profissional do Técnico Industrial de nível médio efetiva-se no seguinte campo de realizações: I - conduzir a execução técnica dos trabalhos de sua especialidade; II - prestar assistência técnica no estudo e desenvolvimento de projetos e pesquisas tecnológicas; III - orientar e coordenar a execução dos serviços de manutenção de equipamentos e instalações; IV - dar assistência técnica na compra, venda e utilização de produtos e equipamentos especializados; V - responsabilizar-se pela elaboração e execução de projetos, compatíveis com a respectiva formação profissional." " Art. 6º Esta Lei será aplicável, no que couber, aos técnicos agrícolas de nível médio." Por outro lado, o Decreto nº 90.922/85, ao regulamentar a Lei nº 5.524/1968 dispôs em seu artigo 6º, inciso XIX: "Art. 6º As atribuições dos técnicos agrícolas de 2º grau em suas diversas modalidades, para efeito do exercício profissional e da sua fiscalização, respeitados os limites de sua formação, consistem em: (...) XIX - selecionar e aplicar métodos de erradicação e controle de vetores e pragas, doenças e plantas daninhas, responsabilizando-se pela emissão de receitas de produtos agrotóxicos;" Infere-se da leitura dos dispositivos legais e regulamentares, bem como dos documentos juntados aos autos, que deve ser reconhecida aos Apelados, a prerrogativa de prescrever receituários agronômicos de produtos agrotóxicos, sem as restrições impostas pela autarquia. Ressalte-se não se configurar razoável que, tendo realizado os cursos técnicos para a obtenção de competências funcionais, os Autores vejam reduzidas suas possibilidades profissionais, em razão da atuação do Conselho profissional. Nesse sentido, trago a colação precedentes do Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO 3/STJ. EXERCÍCIO PROFISSIONAL. TÉCNICO AGRÍCOLA. NÍVEL MÉDIO. EXPEDIÇÃO DE RECEITUÁRIO PARA VENDA DE AGROTÓXICO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Necessário consignar que o presente recurso atrai a incidência do Enunciado Administrativo 3/STJ: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC". 2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que os técnicos agrícolas possuem habilitação legal para expedir receituário agronômico, inclusive de produtos agrotóxicos, nos termos da Lei nº 5.524/68 e Decreto nº 90.922/85, com redação dada pelo Decreto nº 4.560/2002. 3. Agravo interno não provido.” (grifo nosso) (AgInt nos EDcl no AREsp 1235116/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 18/09/2018) “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. TÉCNICOS AGRÍCOLAS DE NÍVEL MÉDIO. EXPEDIÇÃO DE RECEITUÁRIO PARA VENDA DE AGROTÓXICOS. HABILITAÇÃO LEGAL. SÚMULA 83/STJ. 1. A Primeira Seção do STJ firmou orientação no sentido de que os técnicos agrícolas de segundo grau possuem habilitação legal para expedir receitas de agrotóxicos. 2. Agravo Regimental não provido.” (grifo nosso) (AgRg no REsp 1457431/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 26/08/2014, DJe 25/09/2014) "ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. TÉCNICOS AGRÍCOLAS DE NÍVEL MÉDIO. EXPEDIÇÃO DE RECEITUÁRIO PARA VENDA DE AGROTÓXICOS. HABILITAÇÃO LEGAL. DISSÍDIO PRETORIANO. SÚMULA N. 83/STJ. PRECEDENTES. 1. A Primeira Seção desta Corte, interpretando a Lei n. 5.524/68, o Decreto n. 90.922/85, com a redação introduzida pelo recente Decreto n. 4.560/2002, e a Lei n. 7.802/89, pacificou o entendimento de que os técnicos agrícolas possuem habilitação legal para prescrever receituário agronômico, inclusive produtos agrotóxicos. 2. "Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida" (Súmula n. 83/STJ). 3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não-provido." (grifo nosso) (STJ, REsp n.º 278.026/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Segunda Turma, j. 17/11/2005, DJ 13/03/2006) "PROCESSUAL CIVIL. TÉCNICOS AGRÍCOLAS DE SEGUNDO GRAU. PRESCRIÇÃO DE RECEITUÁRIO AGRONÔMICO. VENDA DE AGROTÓXICOS. POSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. I - Os embargos de declaração constituem recurso de rígidos contornos processuais, consoante disciplinamento imerso no artigo 535 do Código de Processo Civil, exigindo-se, para seu acolhimento, que estejam presentes os pressupostos legais de cabimento. Inocorrentes as hipóteses de obscuridade, contradição, omissão, ou ainda erro material, não há como prosperar o inconformismo, cujo real intento é a obtenção de efeitos infringentes. II - Restou decidido, de acordo com precedentes desta Corte Superior, que o técnico agrícola de nível médio possui habilitação para expedir receituário destinado ao uso de produtos agrotóxicos. III - Embargos rejeitados." (grifo nosso) (STJ, EDcl no AgRg no REsp n.º 203.083/SC, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, Primeira Turma, j. 23/08/2005, DJ 07/11/2005) No mesmo sentido, precedentes proferidos por esta C. Corte: "DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO LEGAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LIVRE EXERCÍCIO PROFISSIONAL. TÉCNICO AGROPECUÁRIO. EXPEDIÇÃO DE RECEITUÁRIO PARA VENDA DE AGROTÓXICOS. HABILITAÇÃO LEGAL. AGRAVO LEGAL IMPROVIDO. - Cabível na espécie o art. 557 do Código de Processo Civil. - Na espécie, pelos fatos narrados na inicial, o exposto na peça contestatória (fls. 80/85), bem como pelas alegações postas nas contrarrazões recursais (fls. 194/198) observa-se a resistência dessa autarquia ao pleito deduzido nos autos. Desse modo, não há que se falar em falta de interesse processual. - Compulsando os autos observo que a questão central cinge-se em verificar se restou demonstrado, nos presentes autos, o alegado impedimento do apelante, portador do título de técnico em agropecuária (fls. 13), assinar receituários, prescrevendo a utilização de agrotóxico. Cabe lembrar que o livre exercício profissional é um direito fundamental assegurado pela Constituição da Republica em seu artigo 5º, inciso XIII, nos seguintes termos: "XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;" Trata-se, portanto, de norma de eficácia contida, ou seja, possui aplicabilidade imediata, podendo, contudo, ter seu âmbito de atuação restringido por meio de lei que estabeleça quais os critérios que habilitam o profissional ao desempenho de determinada atividade, visando, assim, por meio do aferimento de sua capacitação profissional, a garantir a proteção da sociedade. - A Lei n.º 5.524/1968, que trata do exercício da profissão de técnico industrial e aplicável, igualmente, nos termos de seu artigo 6º, aos técnicos agrícolas de nível médio, prevê, em seu artigo 2º, como uma das atribuições dos profissionais em comento, "dar assistência técnica na compra, venda e utilização de produtos e equipamentos especializados." - A fim de garantir a execução da Lei nº 5.524/1968, foi editado o Decreto n.º 90.922/85, cujo inciso XIX, do artigo 6º, com a redação conferida pelo Decreto n.º 4.560, de 30/12/2002, prevê: "Art 6º As atribuições dos técnicos agrícolas de 2º grau em suas diversas modalidades, para efeito do exercício profissional e da sua fiscalização, respeitados os limites de sua formação, consistem em: (...) XIX - selecionar e aplicar métodos de erradicação e controle de vetores e pragas, doenças e plantas daninhas, responsabilizando-se pela emissão de receitas de produtos agrotóxicos;". - Da análise da documentação apresentada na exordial, mormente da carteira de profissional habilitado pela Escola Técnica Agrícola Estadual "Professor Urias Ferreira" (fls. 15), nota-se que o apelante concluiu o curso Técnico em Agropecuária em 19/12/1998, possuindo, portanto, a prerrogativa de prescrever receituários agronômicos, inclusive de produtos agrotóxicos, sendo ilegal e abusivo o ato do Conselho de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo (CREA/SP) de impedir a revisão das atribuições profissionais do apelante, conforme se observa pelos documentos acostados às fls. 14 e 18/20, nos quais requereu o andamento do seu pedido de revisão em 12/06/2003 (fls. 14 - Processo nº 227.6557 - PR 200013/03). Entendimento pacificado do C. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte. - Procedente o pleito do autor com o fim de ter garantido seu direito de exercer a atividade profissional como técnico agrícola, nos moldes da legislação vigente, inclusive podendo aviar receituário, conforme previsto no Decreto n.º 90.922/85, inciso XIX, do artigo 6º, com a redação conferida pelo Decreto n.º 4.560, de 30/12/2002, devendo, portanto, ser reformada a r. sentença. - As razões recursais não contrapõem e não trazem qualquer fundamento de ordem legal ou constitucional capaz de desafiar o r. decisum a ponto de desconstituí-lo, limitando-se a reproduzir argumentos já apresentados. - Agravo legal improvido." (grifo nosso) (Agr em AC - 0005758-77.2005.4.03.6106/SP, Rel. Des. Federal MÔNICA NOBRE, Quarta Turma, j. 10/07/2014, D.E. 24/07/2014) "ADMINISTRATIVO. AGRAVO RETIDO NÃO CONHECIDO. TÉCNICOS AGRÍCOLAS DE SEGUNDO GRAU. PRESCRIÇÃO DE RECEITUÁRIO AGRONÔMICO. VENDA DE AGROTÓXICOS. POSSIBILIDADE. DELIBERAÇÃO NORMATIVA DO CREAA N. 11-C E RESOLUÇÃO N. 344/90. ILEGALIDADE. PRECEDENTES DO E. STJ E DESTA TURMA. I - Agravo retido não conhecido, uma vez não reiterado em sede de contrarrazões. II - Os técnicos agrícolas de segundo grau possuem habilitação legal pra expedir receitas de agrotóxicos, conforme exigido pelo art. 13, da Lei n. 7.802/89, consoante reconhecido pelos art. 2º, inciso IV e 6º, da Lei n. 5.524/68, art. 6º, inciso XIX, do Decreto n. 90.922/85, com a redação dada pelo Decreto n. 4.560/02, e art. 51, § 2º, do Decreto n. 98.816/90. III - Nos termos do art. 5º, inciso XIII, da Constituição Federal, somente lei em sentido formal pode estabelecer os critérios que habilitam uma pessoa ao desempenho da atividade escolhida, objetivando, com essas limitações do direito individual, a proteção da sociedade, garantindo formas para se aferir a capacitação profissional. IV - Incabível, mediante ato administrativo (Deliberação Normativa do CREAA n. 11-C e Resolução n. 344/90), impor vedação não prevista na legislação aplicável à matéria. Ofensa ao princípio da legalidade. V - Apelação provida." (grifo nosso) (AMS 2006.61.00.012780-5, Rel. Des. Federal REGINA COSTA, Sexta Turma, j. 23/09/2010, DE. 05/10/2010) Dessa forma, mantenho os termos da sentença proferida pelo MM Juízo de 1º grau, tal como proferida. Ante o exposto, nego provimento à apelação do CREA/SP, nos termos da fundamentação. É como voto.
Advogado do(a) APELADO: JAIR CUSTODIO DE OLIVEIRA FILHO - SP276687-A
E M E N T A
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. AÇÃO ORDINÁRIA. AUTORES TÉCNICOS EM AGRICULTURA E AGROPECUÁRIA. PRESCRIÇÃO DE RECEITUÁRIOS AGRONÔMICOS. POSSIBILIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.
1. Infere-se da leitura dos dispositivos legais e regulamentares, bem como dos documentos juntados aos autos, que deve ser reconhecida a prerrogativa dos Autores de prescreverem receituários agronômicos de produtos agrotóxicos, sem as restrições impostas pela Autarquia.
2. Não se configura razoável que, tendo os Autores realizado os referidos cursos técnicos para a obtenção de competências funcionais, vejam reduzidas as suas possibilidades profissionais, em razão da atuação do Conselho.
3. Precedentes do C. STJ e deste Tribunal.
4. Apelação do CREA/SP desprovida.