Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008338-28.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: ARNALDO MATHEUS BASTOS

Advogado do(a) APELANTE: ELAINE D AVILA COELHO - SP97759-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008338-28.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: ARNALDO MATHEUS BASTOS

Advogado do(a) APELANTE: ELAINE D AVILA COELHO - SP97759-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

Trata-se de apelação interposta por ARNALDO MATHEUS BASTOS, em ação ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, objetivando a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.

A r. sentença de fls. 220/225 julgou improcedente o pedido. Sem condenação em custas e em honorários advocatícios em razão da concessão da Justiça Gratuita.

Embargos de declaração da parte autora (fls. 230/231) rejeitados pela decisão de fls. 235/236.

A parte autora, em seu recurso de apelação (fls. 241/248), requer a reforma da r. sentença, uma vez comprovada a especialidade do labor, em razão da periculosidade da atividade desenvolvida pelo autor.

Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008338-28.2014.4.03.6183

RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: ARNALDO MATHEUS BASTOS

Advogado do(a) APELANTE: ELAINE D AVILA COELHO - SP97759-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

Verifico que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.

Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).

Cumpre salientar que o Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.

Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.

Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.

Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.

A propósito do tema:

"(...) Por fim, como afirmado pelo Tribunal de origem, o fundamento sustentado pela Autarquia, de que a exposição aos agentes biológicos era eventual, não é suficiente para descaracterização da especialidade.

Não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, visto que habitualidade e permanência hábeis para os fins visados pela norma - que é protetiva - devem ser analisadas à luz do serviço cometido ao trabalhador, cujo desempenho, não descontínuo ou eventual, exponha sua saúde à prejudicialidade das condições físicas, químicas, biológicas ou associadas que degradam o meio ambiente do trabalho.

Tem-se, assim, que a avaliação no caso dos autos se torna qualitativa, independendo do tempo de exposição"

(STJ, REsp. nº 1.610.099 - RS (2016/0168867-2), Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 02/08/2016). (grifos nossos).

Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior (STJ, AgRg no AREsp 295.495/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 15/04/2013).

Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.

O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.

O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.

De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.

A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.

Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.

Assim, temos o seguinte quadro:

Período Trabalhado

Enquadramento

Limites de Tolerância

Até 05/03/1997

1. Anexo do Decreto nº 53.831/64. 2. Decretos nºs 357/91 e 611/92

80 dB

De 06/03/1997 a 18/11/2003

Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, redação original

90dB

A partir de 19/11/2003

Anexo IV do Decreto nº 3.048/99, com a alteração do Decreto nº 4.882/03

85 dB

Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.

Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).

Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:

"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete";

(...)

a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (STF, ARE 664.335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJe n. 29, de 11.02.2015, public. 12.02.2015)" (grifos nossos).

Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.

Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.

Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.

No mais, restou superada a questão relacionada à supressão do agente "eletricidade" do rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça.

Do caso concreto.

O período a ser analisado em razão do recurso voluntário é: 01/02/1993 a 03/03/2004.

Em relação ao período de 01/02/1993 a 03/03/2004, laborado para “Bayer S/A”, nas funções de “encarregado de depósito de produtos acabados” e de “supervisor de depósito e expedição”, no setor de “logística de produção”, o autor apresentou laudo técnico (fls. 26-verso/50-verso), efetuado pelo perito judicial (em 09/05/2003) no bojo de ação trabalhista, que analisou as condições de trabalho da parte autora, informando, primeiramente, que não consta a utilização de EPI pelo autor (fl. 40), em segundo lugar, que o setor é uma área de risco, uma vez que “ocorre a estocagem no local de volumes superiores a 200 litros de inflamáveis líquidos” e que “na área de estocagem de gases GLP também há mais de 135 Kg. Desta forma, qualquer atividade exercida no interior destes recintos ou áreas se caracteriza como em condição de periculosidade, até mesmo a de simples permanência” (fl. 42), e concluindo que o autor faz jus ao adicional de periculosidade (30%), em razão de exposição a agentes inflamáveis (fl. 45-verso).

Ressalte-se que apesar do laudo técnico ter sido emitido em 09/05/2003, em consulta ao CNIS, verifica-se que o autor exerceu a mesma função na mesma empresa. Portanto, excepcionalmente, é possível o reconhecimento da especialidade do labor de 10/05/2003 a 03/03/2004.

Desta forma, por ser considerada perigosa, com risco à integridade física em razão do contato habitual e permanente com produtos inflamáveis, reputo demonstrada a especialidade da atividade no período questionado (01/02/1993 a 03/03/2004).

Anote-se, por oportuno, que a questão da supressão de agentes perigosos do rol do Decreto n.º 2.172/97 restou superada, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, cabendo ressaltar a menção feita naquele julgado quanto ao caráter exemplificativo das atividades nocivas elencadas na legislação previdenciária e a possibilidade de caracterização da especialidade com base em elementos técnicos e na legislação trabalhista.

Saliente-se que embora a perícia tenha sido realizada em outra demanda, referida prova técnica merece total credibilidade, sendo admissível no caso em apreço como prova emprestada, eis que atendidos os requisitos da prova atípica previstos no art. 372 do CPC/2015.

Aliás, esta Colenda 7ª Turma tem admitido referida prova, inclusive, em casos nos quais o INSS não participa da ação na qual foi produzido o exame pericial: AgL em AC n. 0027116-49.2011.4.03.9999/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, DJ 02/03/2015; AgL em ACReex n. 0010952-04.2014.4.03.9999/SP, Rel. Juiz Fed. Conv. Valdeci dos Santos, DJ 08/09/2014

Ainda neste sentido:

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA. REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.

(...)

3. Esclareço que, embora o laudo técnico juntado aos autos seja emprestado, foi elaborado por engenheiro de segurança do trabalho a pedido do Sindicato dos Empregados nas Indústrias de Calçados de Franca, dele se extraindo a efetiva exposição dos trabalhadores em setores idênticos ao do autor, onde foi caracterizada insalubridade por exposição a tolueno e acetona muito acima dos limites de tolerância permitidos.

4. E, sendo a prova emprestada documento hábil a demonstrar potencial insalubridade decorrente do uso de produtos químicos que envolvem todo o processo de fabricação em indústria de calçados, uma vez que foi realizada in loco nos mesmos setores em que o autor trabalhou, devem os períodos ora indicados como atividade especial, ser averbados pelo INSS, nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91.

5. Portanto, entendo ser o laudo técnico apresentado aos autos documento hábil a demonstrar potencial insalubridade decorrente do uso de produtos químicos que envolvem todo o processo de fabricação em indústria de calçados, uma vez que foi realizada in loco em empresas ainda ativas e por "similaridade" à atividade exercida pelo autor, devem os períodos ser computados como atividade especial , nos termos dos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91. Nesse sentido decidiu o Colendo STJ, in verbis:

"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. OMISSÃO INEXISTENTE. DEVIDO ENFRENTAMENTO DAS QUESTÕES RECURSAIS.

1. Não há violação do art. 535 do CPC quando a prestação jurisdicional é dada na medida da pretensão deduzida, com enfrentamento e resolução das questões abordadas no recurso.

2. Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica.

3. Em casos análogos, é pacífico o entendimento do Superior Tribunal de Justiça quanto à legalidade da prova emprestada, quando esta é produzida com respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Recurso especial improvido." (RESP 1.397.415/RS, Min. Humberto Martins, DJe: 20/11/2013)

(...)

9. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS improvida. Apelação da parte autora parcialmente provida. Remessa oficial parcialmente provida."

(TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1949966 - 0002356-88.2010.4.03.6113, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, julgado em 12/03/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/03/2018)

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REMESSA OFICIAL. APOSENTADORIA ESPECIAL NÃO COMPROVADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL COMPROVADA. REQUISITOS PREENCHIDOS. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA OFICIAL PROVIDAS PARCIALMENTE.

1. No presente caso, da análise dos Perfis Profissiográficos Previdenciários juntados aos autos e laudo técnico, e de acordo com a legislação previdenciária vigente à época, a parte autora comprovou o exercício de atividades especiais nos períodos de:

- 03/02/1982 a 31/10/1987, vez que trabalhava como "tipógrafo", realizando serviços de impressão offset, atividade descrita no código 2.5.5, Anexo III do Decreto nº 53.831/64 e código 2.5.8 do anexo II do Decreto 83.080/79 (Perfil Profissiográfico Previdenciário - fls. 23/25).

- e de 01/06/1992 a 09/11/2006, vez esteve trabalhou como "tipógrafo", ficando exposto de modo habitual e permanente a produtos químicos (hidrocarbonetos) graxa óleo mineral, solventes, gasolina, querosene, entre outros, enquadradas nos códigos 1.2.11, Anexo III do Decreto nº 53.831/64, códigos 1.2.10, Anexo I do Decreto nº 83.080/79, código 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e código 1.0.17, Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 (laudo técnico, fls. 32/35)

2. Note-se que a jurisprudência tem se inclinado pela admissibilidade da denominada prova emprestada, isto é, aquela transplantada de determinado processo, no qual regularmente produzida, com vista à demonstração de fatos constitutivos, impeditivos, modificativos ou extintivos de direito reclamado em diversa relação processual, sendo assentado pelo STJ que, observado o contraditório no processo de destino da prova trasladada, não é imprescindível que haja identidade de partes entre ele e a demanda de origem da prova emprestada.

3. Assim, positivados os requisitos legais, reconhece-se o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de serviço na forma integral, incluído o abono anual, a ser implantada a partir da citação, conforme fixado na r. sentença.

4. Apelação do INSS e remessa oficial providas em parte.

(Apelação/Remessa Necessária nº 0039373-38.2013.4.03.9999, Relator Des. Fed. TORU YAMAMOTO, j. 21/08/2017, v.u., p. e-DJF3, 31/08/2017).

Devida, portanto, a revisão da RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (17/06/2008 – fl. 18), respeitada a prescrição quinquenal.

A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.

Diante do exposto, dou provimento à apelação da parte autora, para reconhecer como especial o período de 01/02/1993 a 03/03/2004, para condenar o INSS a revisar a RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (17/06/2008), respeitada a prescrição quinquenal, sendo que sobre os valores em atraso incidirão correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora, até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, bem como para condenar a autarquia no pagamento de honorários advocatícios, fixados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença.

É como voto.



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES INFLAMÁVEIS. COMPROVAÇÃO. REVISÃO DA RMI DEVIDA. JUROS DE MORA. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA.

1 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de Benefícios.

2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp 493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº 3.048/1999).

3 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova.

4 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.

5 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.

6 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.

7 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.

8 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.

9 - O período a ser analisado em razão do recurso voluntário é: 01/02/1993 a 03/03/2004.

10 - Em relação ao período de 01/02/1993 a 03/03/2004, laborado para “Bayer S/A”, nas funções de “encarregado de depósito de produtos acabados” e de “supervisor de depósito e expedição”, no setor de “logística de produção”, o autor apresentou laudo técnico (fls. 26-verso/50-verso), efetuado pelo perito judicial (em 09/05/2003) no bojo de ação trabalhista, que analisou as condições de trabalho da parte autora, informando, primeiramente, que não consta a utilização de EPI pelo autor (fl. 40), em segundo lugar, que o setor é uma área de risco, uma vez que “ocorre a estocagem no local de volumes superiores a 200 litros de inflamáveis líquidos” e que “na área de estocagem de gases GLP também há mais de 135 Kg. Desta forma, qualquer atividade exercida no interior destes recintos ou áreas se caracteriza como em condição de periculosidade, até mesmo a de simples permanência” (fl. 42), e concluindo que o autor faz jus ao adicional de periculosidade (30%), em razão de exposição a agentes inflamáveis (fl. 45-verso).

11 - Por ser considerada perigosa, com risco à integridade física em razão do contato habitual e permanente com produtos inflamáveis, reputa-se demonstrada a especialidade da atividade no período questionado (01/02/1993 a 03/03/2004).

12 - Anote-se, por oportuno, que a questão da supressão de agentes perigosos do rol do Decreto n.º 2.172/97 restou superada, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC, representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, cabendo ressaltar a menção feita naquele julgado quanto ao caráter exemplificativo das atividades nocivas elencadas na legislação previdenciária e a possibilidade de caracterização da especialidade com base em elementos técnicos e na legislação trabalhista.

13 - Embora a perícia tenha sido realizada em outra demanda, referida prova técnica merece total credibilidade, sendo admissível no caso em apreço como prova emprestada, eis que atendidos os requisitos da prova atípica previstos no art. 372 do CPC/2015. Precedentes.

14 - Devida, portanto, a revisão da RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a data do requerimento administrativo (17/06/2008 – fl. 18), respeitada a prescrição quinquenal.

15 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.

16 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.

17 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.

18 - Apelação da parte autora provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.