APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008541-46.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: GERALDA DE SOUZA BITTENCOURT LOBO
Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO ANTONIO ROCHA - SP110782-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008541-46.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: GERALDA DE SOUZA BITTENCOURT LOBO Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO ANTONIO ROCHA - SP110782-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ajuizada por Geralda de Souza Bittencourt Lobo em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão do benefício de pensão por morte em decorrência do óbito de seu companheiro, Jackson Egídio Lopes, ocorrido em 06/11/2015. A sentença julgou improcedente o pedido sob o fundamento de que a autora já é titular de benefício de pensão por morte de seu ex-marido, não sendo possível a cumulação. Apela a parte autora alegando, preliminarmente, a nulidade da sentença que deixou de apreciar a possibilidade de escolha do benefício mais vantajoso. No mérito, sustenta, em síntese, que o art. 124 da Lei n. 8.213/91 não veda a cumulação de duas pensões por morte recebidas por segurados diversos. Subsidiariamente, requer a concessão da pensão por morte instituída pelo companheiro. Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0008541-46.2018.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES APELANTE: GERALDA DE SOUZA BITTENCOURT LOBO Advogado do(a) APELANTE: CLAUDIO ANTONIO ROCHA - SP110782-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. PRELIMINAR Verifica-se da leitura da petição inicial que a autora sequer mencionou que já recebia pensão por morte de seu ex-marido, não havendo como se falar que a sentença incorreu em nulidade, decidindo pretensão aquém daquela pleiteada nos presentes autos. Desta forma, rejeito a preliminar e passo ao exame do mérito. MÉRITO Os requisitos a serem observados para concessão da pensão por morte estão previstos nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/91, sendo necessária a comprovação, cumulativamente: a) do óbito ou morte presumida da pessoa que seja segurada (obrigatória ou facultativa) da Previdência Social; b) da existência de beneficiário dependente do de cujus, em idade hábil ou preenchendo outras condições previstas em lei; c) da qualidade de segurado do falecido. A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.110.565 SE, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, fixou que o deferimento do benefício de pensão por morte está vinculado ao cumprimento da condição de segurado do falecido, salvo na hipótese prevista na Súmula 461/STJ: “É devida a pensão por morte aos dependentes do segurado que, apesar de ter perdido essa qualidade, preencheu os requisitos legais para a obtenção de aposentadoria até a data do seu óbito” A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes. O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Por sua vez, o §4º desse dispositivo legal estabelece que haverá a perda da qualidade de segurado no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado. Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independentemente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários. Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado. Nesse passo, importa consignar que a redação original do inciso I do artigo 26 da Lei de Benefícios, bem como aquela que lhe foi dada pela Lei nº 9.786/99, mantida pela Lei nº 13.135/2015, dispensa o cumprimento de carência para fins de concessão do benefício de pensão por morte. No tocante aos dependentes do segurado falecido, o direito à pensão por morte encontra-se disciplinado na Lei n. 8.213/91, art. 16 in verbis: "Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente." Por sua vez, o §4º desse mesmo artigo estabelece que “a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.” Vale lembrar que esse benefício é devido ao conjunto de dependentes do de cujus que reúnam as condições previstas nos artigos 77 da Lei nº 8.213/91, obviamente cessando para o dependente que não mais se enquadre nas disposições desse preceito normativo. Nem mesmo a constatação de dependente ausente obsta a concessão da pensão, cabendo sua habilitação posterior (art. 76 da Lei nº 8.213/91). A dependência econômica não precisa ser exclusiva, de modo que persiste ainda que a parte autora tenha outros meios de complementação de renda. Interpretação abrangente do teor da Súmula 229, do extinto E. TRF. Nesse sentido, também não impede a concessão do benefício tem tela o fato de o dependente receber aposentadoria, pois o art. 124 da Lei nº 8.213/91 não veda a acumulação da pensão por morte com aposentadoria, quando presentes os requisitos legais. Nega, apenas, a acumulação de mais de uma pensão, deixada por cônjuge ou companheiro, assegurado o direito de se optar pelo pagamento da mais vantajosa. Caso concreto Comprovado o óbito de Jackson Egídio Lopes, ocorrido em 08/11/2016, conforme certidão de óbito acostada aos autos. A qualidade de segurado do falecido restou incontroversa tendo em vista que era beneficiários de aposentadoria por tempo de contribuição, conforme consulta ao CNIS. Quanto à dependência econômica, a sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido sob os seguintes fundamentos: "A união estável restou comprovada nos autos às fls. 21 e nos depoimentos orais. A dependência econômica das pessoas elencadas na classe 01 é presumida e a das demais deve ser comprovada. Outrossim, a existência de dependentes da classe anterior exclui do direito às prestações os dependentes da classe posterior, o que significa dizer, por exemplo, que para haver dependente na classe 03 não poderá haver dependente na classe 02 e 01. O valor mensal da pensão por morte deverá corresponde a 100% do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela que faria jus se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento. Na hipótese dos autos, estão preenchidos os requisitos para a concessão do beneficio. A dependência econômica vem materializada nos depoimentos orais colhidos em instrução, que são firmes e coerentes, acerca da dependência econômica, demonstrando que o segurado era responsável financeiramente pela família. Apesar de se fazer presente todos os requisitos exigidos por lei para a concessão do beneficio de pensão por morte, tal beneficio não poderá ser concedido a autora, visto que já recebe pensão por morte do ex-marido, Sr. Paulo Fernandes Lobo. De acordo com o artigo 124, inciso VI, da Lei 8.213/91, acumulação de mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro é vedada." Dispõe o artigo 124, inciso VI da Lei n. 8.213/91, in verbis: "Salvo no caso de direito adquirido, não é permitido o recebimento conjunto dos seguintes benefícios da Previdência Social: (...) VI - mais de uma pensão deixada por cônjuge ou companheiro, ressalvado o direito de opção pela mais vantajosa" Da leitura do dispositivo descrito extrai-se a conclusão que é permitida a percepção de mais de um benefício previdenciário do regime geral nos casos em que não há vedação expressa. Em outras palavras, não é possível o recebimento conjunto de duas pensões por morte, deixadas por ex-marido e companheiro, como pretende a autora. No entanto, a autora poderá optar pelo recebimento do benefício mais vantajoso, que conforme a autora afirma em sua razões recursais, é a pensão deixada por seu companheiro. Incabível, porém, a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais, uma vez que a Autarquia deu ao fato uma das interpretações possíveis, não se extraindo do contexto conduta irresponsável ou inconsequente diante do direito controvertido apresentado, não sendo devida, portanto, a pretendida indenização. Nestes termos, suficientemente comprovada a união estável entre a autora e o Sr. Jackson Egídio Lopes, de acordo com o conjunto probatório produzido nos autos, o pedido deve ser julgamento parcialmente procedente. O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (08/11/2016), conforme o preceituado no artigo 74, II, da Lei n. 8.213/91. Anote-se a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado ao benefício concedido, a mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei (art. 124 da Lei n. 8.213/91). As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019. Nesse passo, no que tange aos honorários de advogado, verifico que ambas as partes foram vencedoras e vencidas na causa em proporção semelhante. Contudo, considerando a vedação à compensação em caso de sucumbência recíproca, conforme critérios do artigo 85, §14, do Código de Processo Civil/2015, condeno cada parte ao pagamento de honorários ao patrono da parte contrária, ora arbitrados em R$ 500,00 (quinhentos reais) para cada um. Ante o exposto, rejeito a preliminar e, no mérito, dou parcial provimento à apelação da parte autora para determinar ao INSS a concessão do benefício de pensão por morte à autora, fixando os consectários nos termos da fundamentação. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. NULIDADE DA SENTENÇA AFASTADA. PENSÃO POR MORTE. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. UNIÃO ESTÁVEL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. Não se trata de sentença citra petita. Nulidade afastada. Preliminar rejeitada.
2. O benefício de pensão por morte está disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei nº 8.213/91, sendo requisitos para sua concessão a qualidade de segurado do de cujus e a comprovação de dependência do pretenso beneficiário.
3. Conjunto probatório suficiente para comprovar a união estável entre a autora e o segurado falecido de modo a preencher os requisitos para concessão do benefício.
4. Termo inicial do benefício fixado na data do requerimento administrativo, nos termos do art. 74 da Lei n. 8.213/91.
5. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20/09/2017, Relator Ministro Luiz Fux, observado quanto a este o termo inicial a ser fixado pela Suprema Corte no julgamento dos embargos de declaração.
6. Incabível a condenação do INSS ao pagamento de indenização por danos morais, uma vez que a Autarquia deu ao fato uma das interpretações possíveis ao pedido administrativo, não se extraindo do contexto conduta irresponsável ou inconsequente diante do direito controvertido apresentado.
7. Sucumbência recíproca.
8. Preliminar rejeitada. No mérito, apelação da parte autora parcialmente provida.