Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5001085-26.2018.4.03.6000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

PARTE AUTORA: MARCELA DE OLIVEIRA PALO ESCUDERO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: MAURO SANDRES MELO - MS15013-A, STEPHANIA ABRAHAO HAOVILA NAKASONE - MS20408-A

PARTE RE: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5001085-26.2018.4.03.6000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

PARTE AUTORA: MARCELA DE OLIVEIRA PALO ESCUDERO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: MAURO SANDRES MELO - MS15013-A, STEPHANIA ABRAHAO HAOVILA NAKASONE - MS20408-A

PARTE RE: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de reexame necessário em face de sentença que julgou procedentes os pedidos formulados na inicial e concedeu a segurança.

Não houve interposição de recurso.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela ausência de interesse público a justificar a sua intevenção.

Os autos subiram a esta Corte.

É o relatório.

 

 


REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5001085-26.2018.4.03.6000

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. VALDECI DOS SANTOS

PARTE AUTORA: MARCELA DE OLIVEIRA PALO ESCUDERO

Advogados do(a) PARTE AUTORA: MAURO SANDRES MELO - MS15013-A, STEPHANIA ABRAHAO HAOVILA NAKASONE - MS20408-A

PARTE RE: UNIÃO FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

O mandado de segurança é ação constitucional que obedece a procedimento célere e encontra regulamentação básica no art. 5º, LXIX, da Constituição Federal: "Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público".

Percebe-se, portanto, que, dentre outras exigências, é necessário que o direito cuja tutela se pretende seja líquido e certo.

Todavia, a conceituação de direito líquido e certo não se relaciona com a existência ou não de dúvida ou controvérsia, sob o prisma jurídico, em relação a existência do direito.

Assim, é líquido e certo o direito apurável sem a necessidade de dilação probatória, ou seja, quando os fatos em que se fundar o pedido puderem ser provados de forma incontestável no processo.

Portanto, a presença de prova pré-constituída a amparar a pretensão do impetrante impõe aqui o exame do mérito.

Da estabilidade da gestante

No presente caso, a impetrante serviu à Força Aérea Brasileira no período compreendido entre 01/02/2010 a 30/01/2018, data em que foi licenciada do serviço ativo, por conclusão do tempo a que se obrigou servir. Por conseguinte, foi incluída na Reserva da Aeronáutica, nos termos do artigo 94, §1°, da Lei nº 6.880/80.

Contudo, a controvérsia diz respeito à legalidade do ato de licenciamento tendo em vista que, desde 2014, ela realizava tratamento gestacional pelo método de fertilização por transferência de embriões a uma doadora temporária de útero (sua irmã), obtendo êxito em setembro de 2017. Diante disso, em 02/01/2018, requereu administrativamente a estabilidade provisória, sendo-lhe negada, com fundamento de inexistência de previsão legal.

Nos termos do artigo 10, II, “b”, do ADCT, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

Tal instituto jurídico, ao garantir a estabilidade provisória no emprego, visa à proteção da família e, especialmente, da criança, atendendo ao estabelecido nos artigos 226 e 227 da CF, não se tratando, portanto, de um benefício concedido à mãe.

Ademais, a condição de servidora provisória ostentada pela impetrante não pode ser fator limitante ao referido direito, ante à relevância da proteção à maternidade e ao nascituro. Nesse sentido, é a jurisprudência:

“ADMINISTRATIVO. MILITAR GESTANTE. ESTABILIDADE TEMPORÁRIA. DIREITO. EXISTÊNCIA. PRECEDENTES DO STF E DO STJ. ESTABILIDADE DECENAL. ART. 50, IV, "A", DA LEI 6.880/80. CONTAGEM DO TEMPO DE LICENÇA MATERNIDADE. POSSIBILIDADE. REINTEGRAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. As praças das Forças Armadas que completarem 10 (dez) anos de serviço automaticamente adquirem estabilidade no serviço ativo das Forças Armadas. Inteligência do art. 50, IV, "a", da Lei 6.880/80.

Precedente do STJ.

2. "O Supremo Tribunal Federal tem aplicado a garantia constitucional à estabilidade provisória da gestante não apenas às celetistas, mas também às militares e servidoras públicas civis" (RMS 22.361/RJ, minha relatoria, Quinta Turma, DJ 7/2/08).

3. Reconhecido pelo Tribunal de origem a estabilidade temporária em favor da militar gestante, deve o respectivo período ser computado para fins de obtenção da estabilidade decenal prevista no art. 50, IV, "a", da Lei 6.880/80.

4. Recurso especial conhecido e provido para reformar o acórdão recorrido e julgar procedente o pedido formulado na inicial.”(REsp 1200549/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/09/2010, DJe 11/10/2010)

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. SOLDADO DA POLÍCIA MILITAR TEMPORÁRIO. GRAVIDEZ. ESTABILIDADE. ART. 4º, XVIII, DA CF/88. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC/73. INEXISTÊNCIA. REINTEGRAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.

I. Agravo interno aviado decisão monocrática que julgara recursos interpostos contra decisão e acórdão publicados na vigência do CPC/73.

II. Na origem, trata-se de Mandado de Segurança, impetrado pela ora agravada, contra ato imputado ao Diretor de Pessoal da Polícia Militar do Estado de São Paulo, objetivando sua reintegração no cargo de Soldado PM Temporário e prorrogação do contrato de trabalho, em razão da superveniência de gravidez, até o término do período de estabilidade de 180 (cento e oitenta) dias após o nascimento do filho. O acórdão recorrido reformou a sentença que denegara a segurança e concedeu parcialmente a ordem, garantindo, à impetrante, o "direito à licença gestante pelo prazo de 120 dias constitucionais e, consequentemente, à estabilidade provisória até o término da licença, sem prejuízo de seus vencimentos". Interposto, assim, Recurso Especial, pela Fazenda do Estado de São Paulo, que, inadmitido, ensejou a interposição de Agravo em Recurso Especial.

III. Não há falar, na hipótese, em violação ao art. 535 do CPC/73, porquanto a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do acórdão que julgou os Embargos Declaratórios apreciaram, fundamentadamente, as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida. IV. Na forma da jurisprudência desta Corte, "a servidora designada precariamente para o exercício de função pública faz jus, quando gestante, à estabilidade provisória de que trata o art. 10, II, 'b', do ADCT, que veda, até adequada regulamentação, a dispensa arbitrária ou sem justa causa de empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Pacificada, também, a orientação segundo a qual ainda que os efeitos secundários de eventual concessão da ordem impliquem o pagamento da remuneração devida à parte autora em relação ao período do seu afastamento do serviço público em decorrência do ato de sua demissão/exoneração, este fato não tem o condão de transformar o mandado de segurança em ação de cobrança. Não incidência, na hipótese, das Súmulas n. 269 e n. 271 do Supremo Tribunal Federal" (STJ, AgRg no RMS 29.616/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, DJe de 29/06/2015). Em igual sentido: STJ, RMS 26.107/MG, Rel. Ministro ROGÉRIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, DJe de 08/09/2014; RMS 25.555/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (Desembargador convocado do TJ/RS), SEXTA TURMA, DJe de 09/11/2011.

V. Agravo interno improvido.” (AgInt no AREsp 1067476/SP, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/09/2018, DJe 13/09/2018)

"ADMINISTRATIVO. MILITAR GESTANTE. LICENCIAMENTO. ANULAÇÃO DO ATO. ADIDO MILITAR. ART. 7º, XVIII E 142, PARÁGRAFO 3º, VIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ARTS. 7º, I, E ART. 10, II, B, DO ADCT. PROTEÇÃO AOS DIREITOS DA MULHER GESTANTE. SENTENÇA MANTIDA. 1. A sentença recorrida concedeu a segurança para anular o ato administrativo que licenciou a impetrante do serviço militar temporário e determinar à autoridade coatora que mantenha a impetrante como adido da respectiva organização militar, preservada sua remuneração e demais direitos, até o prazo de 5(cinco) meses após o parto, nos termos do art. 10, II, b, do ADCT. 2. A União Federal interpôs recurso de apelação, alegando, ter havido julgamento ultra petita, vez que na petição inicial foi requerido a anulação do ato administrativo e a permanência da impetrante no exército, até 120 dias após a data de nascimento de seu filho; enquanto que no comando sentencial teria sido deferida a anulação do ato administrativo, assim como reconhecido o direito de permanência da militar até 5(cinco) meses após o parto; que o pedido da demandante requer a demonstração de prova pericial, o que revelaria a inadequação na utilização do mandamus; a legalidade do ato de licenciamento; a inaplicabilidade do art. 10, II, "b", do ADCT da CF/88 aos militares; inexistência de obrigatoriedade do Exército prorrogar o tempo de serviço por mais 120 dias. 3. Não se configura a hipótese de julgamento ultra petita nos presentes autos, vez que o julgador apenas adequou o pedido da demandante aos termos da legislação aplicável ao presente caso. 4. As perícias constantes dos autos, realizadas no Hospital Geral do Recife e na unidade militar, são suficientes para comprovar o estado gravídico da impetrante à época do licenciamento, o que demonstra a impropriedade do referido ato. 5. A impetrante/militar faz jus à licença gestante, nos termos do art. 7º, inciso XVIII, e art. 142, parágrafo 3º, inciso VIII, da Constituição Federal de 1988. 6. Faz jus, ainda, ao direito da estabilidade provisória no período gestacional, conforme o disposto nos arts. 7º, I, e art. 10, II, b, do ADCT. 7. Apelação improvida." (TRF 5ª Região – Primeira Turma – AC n. 2009.83.00.011121-4, Relator Desembargador Federal Manoel Erhardt, DJE - Data::19/04/2012)

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MILITAR TEMPORÁRIA. LICENÇA À GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. CABIMENTO. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO. I - Deixa-se de conhecer do agravo retido, quando não requerida expressamente sua apreciação preliminar, na forma do art. 523, § 1o, do Código de Processo Civil. II - A teor dos arts. 7º, XVIII e 142, VIII da Constituição Federal e do art. 10, II, •b– do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), e da Portaria 470/00 do Comandante do Exército e do Parecer 187/CONJUR-MD/07 (aprovado pelo Despacho Decisório 013/MD/09, do Ministro de Estado da Defesa), decerto que, inobstante a condição de militar temporária, em ficando constatado o estado gestacional, faz jus a militar à licença à gestante com duração de 120 (cento e vinte) dias e à estabilidade provisória nas fileiras da Força Armada desde a confirmação da gravidez até 5 (cinco) meses após o parto; restando íntegra à Administração a faculdade de proceder ao licenciamento ex officio da militar, ao término desse prazo. III - A estabilidade provisória advinda de licença maternidade decorre de proteção constitucional às trabalhadoras em geral, donde as servidoras públicas e empregadas gestantes, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, conforme o art. 7º, XVIII, da Constituição e o art. 10, II, b, do ADCT; aplicando-se o mesmo direito às militares temporárias, por força do 142, VIII da Constituição Federal. Nesse sentido, vem se consagrando a diretriz jurisprudencial do Colendo Supremo Tribunal Federal. Precedentes: AI 804.574-AgR/DF, RE 597.989 AgR/PR, AI 811376 AgR/SC e RE 523572 AgR/PR. Na mesma direção, também esta 8ª Turma já teve oportunidade de se manifestar. Precedentes: AMS 65.061 e APELREEX 487.483. IV - Reexame necessário desprovido." (TRF 2ª Região – REO n. 0001669-70.2010.402.5101, Relator Desembargador Federal SERGIO SCHWAITZER, D.E. 24/04/2012)

Ressalte-se, ainda, que a interpretação restritiva do texto constitucional, no sentido de que a garantia provisória de emprego é um direito somente da gestante, não se aplicando, no caso, à mãe biológica, por se tratar de “barriga de aluguel”, não se coaduna com o princípio da igualdade, bem como viola a própria finalidade da norma, que é o bem-estar da criança.

Nesse sentido, cumpre assinalar que o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, no julgamento do Recurso Ordinário nº 0002715-88.2011.5.02.0053, reconheceu a estabilidade provisória no emprego a um homem, em relação homoafetiva, cujos filhos foram gerados através de “barriga de aluguel” (TRT 2ª Região - 17ª Turma, Recurso Ordinário n° 0002715-88.2011.502.0053 Desembargadora MARIA DE LOURDES ANTONIO, publicação em 06/02/2015).

Diante do exposto, nego provimento ao reexame necessário, para manter a sentença, nos termos da fundamentação acima.

É o voto.



E M E N T A

CIVIL. PROCESSO CIVIL. MILITAR. LICENÇA GESTANTE. ESTABILIDADE. “BARRIGA DE ALUGUEL”. ISONOMIA. REEXAME NECESSÁRIO NEGADO.

1. No presente caso, a impetrante serviu à Força Aérea Brasileira no período compreendido entre 01/02/2010 a 30/01/2018, data em que foi licenciada do serviço ativo, por conclusão do tempo a que se obrigou servir. Por conseguinte, foi incluída na Reserva da Aeronáutica, nos termos do artigo 94, §1°, da Lei nº 6.880/80.

2. Contudo, a controvérsia diz respeito à legalidade do ato de licenciamento tendo em vista que, desde 2014, ela realizava tratamento gestacional pelo método de fertilização por transferência de embriões a uma doadora temporária de útero (sua irmã), obtendo êxito em setembro de 2017. Diante disso, em 02/01/2018, requereu administrativamente a estabilidade provisória, sendo-lhe negada, com fundamento de inexistência de previsão legal.

3. Nos termos do artigo 10, II, “b”, do ADCT, é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto.

4. Tal instituto jurídico, ao garantir a estabilidade provisória no emprego, visa à proteção da família e, especialmente, da criança, atendendo ao estabelecido nos artigos 226 e 227 da CF, não se tratando, portanto, de um benefício concedido à mãe.

5. Ademais, a condição de servidora provisória ostentada pela impetrante não pode ser fator limitante ao referido direito, ante à relevância da proteção à maternidade e ao nascituro. Nesse sentido, é a jurisprudência.

6. essalte-se, ainda, que a interpretação restritiva do texto constitucional, no sentido de que a garantia provisória de emprego é um direito somente da gestante, não se aplicando, no caso, à mãe biológica, por se tratar de “barriga de aluguel”, não se coaduna com o princípio da igualdade, bem como viola a própria finalidade da norma, que é o bem-estar da criança.

7. Nesse sentido, cumpre assinalar que o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, no julgamento do Recurso Ordinário nº 0002715-88.2011.5.02.0053, reconheceu a estabilidade provisória no emprego a um homem, em relação homoafetiva, cujos filhos foram gerados através de “barriga de aluguel” (TRT 2ª Região - 17ª Turma, Recurso Ordinário n° 0002715-88.2011.502.0053 Desembargadora MARIA DE LOURDES ANTONIO, publicação em 06/02/2015).

8. Reexame necessário a que se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, negou provimento ao reexame necessário, para manter a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.