Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000405-60.2017.4.03.6102

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: MARCIA UCHOA LINS

Advogados do(a) APELANTE: SILVIO CESAR ORANGES - SP132356-A, SILVIO CESAR PASQUINI ORANGES - SP376560

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000405-60.2017.4.03.6102

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: MARCIA UCHOA LINS

Advogado do(a) APELANTE: SILVIO CESAR PASQUINI ORANGES - SP376560

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

   

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de Mandado de Segurança, impetrado por Marcia Uchoa Lins contra ato do Delegado da Receita Federal do Brasil em Ribeirão Preto/SP, pelo qual objetiva o reconhecimento de direito à isenção de IRPF a partir do termo inicial de sua aposentadoria, haja vista ser portadora de moléstia inclusa no rol do art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88 – no caso, perda de visão monocular.

 

Prestadas informações pela autoridade coatora (ID 1780059); indeferida a liminar (ID 1780060).

 

Na sentença (ID 1780070), o MM Juízo a quo denegou a segurança e julgou improcedente o pedido, assinalando que a perda de visão constatada em exames é ínfima, não podendo ser equiparada à cegueira para os fins do art. 6º da Lei 7.713/1988. Sem condenação em honorários advocatícios.

 

Em suas razões de Apelação (ID 1780079), a impetrante reitera a inicial, argumentando ainda que sua aposentadoria se deu justamente em razão do reconhecimento de sua deficiência; que o INSS não periciou a autora, havendo apenas análise de exames; alternativamente, requer a conversão do rito mandamental para o ordinário, caso se faça necessária produção de provas.

 

A União Federal apresentou contrarrazões (ID 1780088).

 

O Ministério Público Federal opinou (ID 2052450) meramente pelo prosseguimento do feito.

 

É o relatório.

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000405-60.2017.4.03.6102

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: MARCIA UCHOA LINS

Advogado do(a) APELANTE: SILVIO CESAR PASQUINI ORANGES - SP376560

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

V O T O

 

 

 

O art. 6º da Lei 7.713/88 – alteradora da legislação do Imposto de Renda – previu hipóteses de isenção em relação ao tributo, aí incluídos os proventos de aposentadoria ou pensão, nos termos que seguem:

 

Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:

(...)

XIV – os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004)

 

Por sua vez, para a constatação da moléstia é exigido laudo emitido por serviço médico oficial, conforme determina o art. 30, da Lei 9.250/95:

 

Lei 9.250/95

Art. 30. A partir de 1º de janeiro de 1996, para efeito do reconhecimento de novas isenções de que tratam os incisos XIV e XXI do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pelo art. 47 da Lei nº 8.541, de 23 de dezembro de 1992, a moléstia deverá ser comprovada mediante laudo pericial emitido por serviço médico oficial, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 1º O serviço médico oficial fixará o prazo de validade do laudo pericial, no caso de moléstias passíveis de controle.

 

Consolidou-se, porém, o entendimento de que a norma exposta no art. 30 da Lei 9.250/95 não vincula a apreciação na via judicial, sendo livre a apreciação das provas (art. 130 do CPC - STJ: EDcl no AgRg no AgRg nos EAREsp 258.835/PE, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 20/08/2014, DJe 01/09/2014; AgRg no AREsp 126.555/MS, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2014, DJe 01/09/2014); desse modo, basta a comprovação da doença mediante diagnóstico especializado.

 

Nesse sentido:

 

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TERMO INICIAL. ISENÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. MOLÉSTIA GRAVE COMPROVADA. MAL DE ALZHEIMER. COMPROVAÇÃO DA DOENÇA.

1. O acórdão recorrido está em dissonância com a jurisprudência do STJ, porquanto o entendimento da Corte é no sentido de que o termo inicial da isenção do imposto de renda sobre proventos de aposentadoria, para as pessoas com moléstias graves, é a data da comprovação da doença mediante diagnóstico especializado. Precedentes: AgRg no AREsp 312.149/SC, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 18/9/2015 e AgRg no REsp 1.364.760/CE, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 12/6/2013.

2. Recurso Especial provido.

(STJ, REsp 1596045/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, DJe 01.06.2016)

 

Oportuno rememorar que, para a concessão ou manutenção da isenção, não é exigida a contemporaneidade dos sintomas ou sua recidiva, segundo consolidado entendimento que veio a merecer a edição da Súmula 627/STJ:

 

Súmula 627/STJ: O contribuinte faz jus à concessão ou à manutenção da isenção do imposto de renda, não se lhe exigindo a demonstração da contemporaneidade dos sintomas da doença nem da recidiva da enfermidade.

 

No caso em tela, não estão presentes os requisitos necessários à concessão da isenção pleiteada.

 

Diversamente do ventilado no apelo, a Carta de Concessão do benefício previdenciário menciona que a impetrante requereu, em 19.01.2016, e lhe foi concedida Aposentadoria por Idade, não havendo qualquer referência à moléstia ou reconhecimento de invalidez (ID 1780045); ademais, conforme é possível constatar a partir dos documentos carreados aos autos (ID 1780047, 1780048, 1780044) e consoante assinalado na sentença, “a impetrante apresentou um atestado médico de clínica particular datado de 17/02/2016, nos quais há descrição dos olhos direito e esquerdo, porém, sem apontamento de perda total ou parcial da visão. Há, ainda, outro exame médico datado de 04/02/2016 onde consta acuidade visual do olho direito em 20/40 e do olho esquerdo em 20/20. Com base nestes documentos, a perícia médica oficial do INSS concluiu que a parte impetrante teria eficiência visual no olho direito de 83,6% e no olho direito de 100%”.

 

É pacífica a jurisprudência quanto a se considerar a cegueira monocular como abrangida pela norma isentiva da Lei 7.713/1988; no caso em tela, porém, a avaliação é de que ac impetrante conta com 83,6% de sua visão no olho direito, ou seja, teria perda de apenas 16,4% no olho afetado.

 

Oportuno rememorar que o Mandado de Segurança é recurso voltado para a defesa de direito líquido e certo comprovável de plano, não comportando dilação probatória.

 

A jurisprudência:

 

ADMINISTRATIVO. TERRA INDÍGENA. DEMARCAÇÃO. ALEGAÇÃO DE AMPLIAÇÃO DA ÁREA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA, INVIÁVEL EM MANDADO DE SEGURANÇA. DENEGAÇÃO. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DO DIREITO.
(...)
VIII - É pressuposto da ação mandamental que o alegado direito se apresente delimitado de plano, apto a ser exercido no momento da impetração, daí a expressão sobre ser "líquido e certo". Descabe, desse modo, qualquer tipo de dilação probatória na ação mandamental. A despeito da importância das questões de naturezas indígena e pública  envolvidas nos autos, o fato é que a controvérsia demanda, sem sombra de dúvida, a necessidade de dilação probatória, devendo ser analisada no âmbito do procedimento comum ordinário. No sentido: MS 21.593/DF, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/02/2017, DJe 17/04/2017; MS 15.822/DF, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/12/2012, DJe 01/02/2013)

(...)

(STJ, AgInt no AgInt no MS 22072/DF, Rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Seção, DJ 29.09.2020)

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. MATÉRIA QUE EXIGE DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO.

1. Para fazer jus à ordem de segurança, o impetrante deve demonstrar a presença dos seus pressupostos específicos, que em última análise se resolvem na existência de direito líquido e certo.

2. A segurança somente será concedida quando comprovado de plano o direito líquido e certo, não se admitindo dilação probatória. Precedentes do STJ.

3. Ademais, como os impetrantes se insurgem, na verdade, contra a aplicação da Lei nº 6.830/80, Lei de Execuções Fiscais, incide a vedação da Súmula 266 do Supremo Tribunal Federal, "Não cabe mandado de segurança contra lei em tese".

4. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, AC 0004172-56.2016.4.03.6126, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, 3ª Turma, DJe 28.11.2018)

 

Ainda a esse respeito, mostra-se inadmissível o pedido alternativo de conversão do procedimento mandamental para o ordinário.

 

A legislação pertinente, além de prever casos em que deverá ocorrer a conversão do rito, de modo geral não abriga vedação explícita à alteração. A fungibilidade procedimental igualmente encontra espaço na jurisprudência, em homenagem aos princípios da instrumentalidade e economia processual, sintetizados no brocardo “pas de nullité sans grief”.

 

Situação diversa se verifica quando há prejuízo à defesa e/ou vedação legal expressa; é o que ora ocorreria. No atual momento da relação processual, a alteração do rito mandamental para ordinário para atendimento ao pedido de dilação probatória equivaleria a “zerar” o processo, tornando nulos todos os atos posteriores à propositura da ação, em movimento semelhante ao ajuizamento de nova demanda, sequer havendo que se falar em economia processual. Portanto, não se trataria de mera determinação de ato, possibilidade inviável por constituir grosseiro cerceamento de defesa.

 

Oportuno rememorar que, embora o pedido e a causa de pedir possam ser aditados, nos termos do art. 329 do CPC, inadmissível qualquer alteração posterior ao saneamento do feito, sendo vedada a rediscussão, consoante art. 507 do CPC:

 

Art. 329. O autor poderá:

I - até a citação, aditar ou alterar o pedido ou a causa de pedir, independentemente de consentimento do réu;

II - até o saneamento do processo, aditar ou alterar o pedido e a causa de pedir, com consentimento do réu, assegurado o contraditório mediante a possibilidade de manifestação deste no prazo mínimo de 15 (quinze) dias, facultado o requerimento de prova suplementar.

(...)

Art. 507. É vedado à parte discutir no curso do processo as questões já decididas a cujo respeito se operou a preclusão.

 

Face ao exposto, nego provimento à Apelação, conforme fundamentação.

 

É o voto.

 



E M E N T A

 

 

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO. ART. 6º, XIV, DA LEI 7.713/88. ISENÇÃO. CEGUEIRA MONOCULAR. NÃO COMPROVAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE. CONVERSÃO DE RITO MANDAMENTAL PARA ORDINÁRIO. INADMISSIBILIDADE NO CASO EM TELA.

1. O art. 6º da Lei 7.713/88 – alteradora da legislação do Imposto de Renda – previu hipóteses de isenção em relação ao tributo, aí incluídos os proventos de aposentadoria ou pensão.

2. Consolidou-se o entendimento de que a norma exposta no art. 30 da Lei 9.250/95 não vincula a apreciação na via judicial, sendo livre a apreciação das provas. Precedentes do STJ.

3.  No caso em tela, não estão presentes os requisitos necessários à concessão da isenção pleiteada.

4. O Mandado de Segurança é recurso voltado para a defesa de direito líquido e certo comprovável de plano, não comportando dilação probatória.

5. Mostra-se inadmissível o pedido alternativo de conversão do procedimento mandamental para o ordinário.

6. A legislação pertinente, além de prever casos em que deverá ocorrer a conversão do rito, de modo geral não abriga vedação explícita à alteração. A fungibilidade procedimental igualmente encontra espaço na jurisprudência, em homenagem aos princípios da instrumentalidade e economia processual, sintetizados no brocardo “pas de nullité sans grief”.

7. Situação diversa se verifica quando há prejuízo à defesa e/ou vedação legal expressa; é o que ora ocorreria. No atual momento da relação processual, a alteração do rito mandamental para ordinário para atendimento ao pedido de dilação probatória equivaleria a “zerar” o processo, tornando nulos todos os atos posteriores à propositura da ação, em movimento semelhante ao ajuizamento de nova demanda, sequer havendo que se falar em economia processual. Portanto, não se trataria de mera determinação de ato, possibilidade inviável por constituir grosseiro cerceamento de defesa.

8. Apelo improvido.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram os Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE e MARLI FERREIRA., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.