Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000222-11.2002.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: TANIA INES NANTES GONZAGA FERREIRA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA JOSE LACERDA - SP152228

APELADO: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000222-11.2002.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: TANIA INES NANTES GONZAGA FERREIRA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA JOSE LACERDA - SP152228

APELADO: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 Apelação contra sentença que julgou improcedente a ação. 

Sustenta-se que: 

a) houve violação dos artigos 5º, XII, e 22, XVI, da Constituição. Só a lei ordinária pode disciplinar o exercício de qualquer profissão; 

b) a lei federal que regulamenta a atividade de enfermagem no Brasil não faz qualquer referência à instrumentação cirúrgica; 

c) com a oficialização de cursos profissionalizantes na área de instrumentação cirúrgica, somente os portadores de diploma poderão exercer a atividade, inclusive os vinculados a outras áreas da saúde; 

d) estão provados os danos que lhe foram causados; 

e) não se confundem o instrumentador cirúrgico e o enfermeiro (fls. 284/286)

 

Contrarrazões às fls. 290/293.

 

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000222-11.2002.4.03.6100

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: TANIA INES NANTES GONZAGA FERREIRA

Advogado do(a) APELANTE: MARIA JOSE LACERDA - SP152228

APELADO: CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SAO PAULO

Advogado do(a) APELADO: GIOVANNA COLOMBA CALIXTO DE CAMARGO - SP205514-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

A controvérsia centra-se na necessidade ou não de registro no COREN/SP para instrumentador cirúrgico. 

 

A respeito, transcrevem-se os artigos 2º e e 15, incisos I e II, da Lei 5.905/73: 

 

Art. 2º – O Conselho Federal e os Conselhos Regionais são órgãos disciplinadores do exercício da profissão de enfermeiro e das demais profissões compreendidas nos serviços de Enfermagem.

 

Art. 15 – Compete aos Conselhos Regionais;

I- deliberar sobre inscrição no Conselho e seu cancelamento;

II – disciplinar e fiscalizar o exercício profissional, observadas as diretrizes gerais do Conselho Federal;

 

Também relevante a citação dos artigo 2º, caput, e 13 da Lei nº 7.498/86:

 

Art. 2º A enfermagem e suas atividades auxiliares somente podem ser exercidas por pessoas legalmente habilitadas e inscritas no Conselho Regional de Enfermagem com jurisdição na área onde ocorre o exercício.

Art. 13. O Auxiliar de Enfermagem exerce atividades de nível médio, de natureza repetitiva, envolvendo serviços auxiliares de enfermagem sob supervisão, bem como a participação em nível de execução simples, em processos de tratamento, cabendo-lhe especialmente:

a) observar, reconhecer e descrever sinais e sintomas;

b) executar ações de tratamento simples;

c) prestar cuidados de higiene e conforto ao paciente;

d)  participar da equipe de saúde.

 

 

Como se verifica, a lei não trata da instrumentação cirúrgica, inclusive não a atribui exclusivamente ao profissional de enfermagem, o que remete às disposições dos artigos 5º, XIII, e 22, XVI, da Constituição.

Por sua vez, o Decreto 94.406/87 dispões nos artigos 1º e 11, caput, III, "j", verbis

 

 

Art. 1º – O exercício da atividade de Enfermagem, observadas as disposições da Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986, e respeitados os graus de habilitação, é privativo de Enfermeiro, Técnico de Enfermagem, Auxiliar de Enfermagem e Parteiro e só será permitido ao profissional inscrito no Conselho Regional de Enfermagem da respectiva região.

 

Art. 11 – O Auxiliar de Enfermagem executa as atividades auxiliares, de nível médio atribuídas à equipe de Enfermagem, cabendo-lhe:

(...)

III – executar tratamentos especificamente prescritos, ou de rotina, além de outras atividades de Enfermagem, tais como:

(...)

 circular em sala de cirurgia e, se necessário, instrumentar;

 

Constata-se que o decreto regulamentador ultrapassa o que as leis mencionadas disciplinaram. De qualquer forma, não dá ao profissional de enfermagem exclusividade na instrumentação cirúrgica. De forma mais explícita, a Resolução COFEN - 214/98, no seu artigo 1º, afirma: 

 Art. 1º – A Instrumentação Cirúrgica é uma atividade de Enfermagem, não sendo entretanto, ato privativo da mesma.

A jurisprudência do STJ, embora tratando de cobertura dos planos de saúde relativamente aos honorários de instrumentados cirúrgico, é reiterada no sentido de que "a legislação de regência e a interpretação e orientação dos órgãos de fiscalização da atividade profissional de enfermagem são no sentido de não se tratar a atividade de instrumentador cirúrgico de um munus de exercício exclusivo do profissional de enfermagem, em que pese a este caber a supervisão da execução das tarefas (...). Nessa senda, também cumpre destacar que a atividade não está inserta no Decreto nº 94.406, de 08 de junho de 1987, que trata do exercício da atividade de enfermagem: (...) Ainda, a Resolução COFEN 214/98 traz alguns esclarecimentos que devem ser mencionados. A Resolução nos informa que a instrumentação cirúrgica é matéria administrada na grade curricular dos Cursos de Enfermagem, não havendo lei que regulamente a atividade de instrumentador cirúrgico. Em seu artigo 1º, declara que a instrumentação cirúrgica é atividade de enfermagem, não sendo, entretanto, ato privativo da mesma". (AREsp 1089913/PR, REsp 1.806.136/PR, REsp 1.806.156/PR, REsp 1480822/PR). 

Posto que o entendimento é de que o instrumentador cirúrgico não precisa ser profissional de enfermagem para exercer sua atividade, também é certo que não se lhe pode exigir a inscrição no COREN/SP. 

Quanto à ocorrência de dano moral à recorrente, afigura-se proceder. A autora tem formação específica de instrumentadora cirúrgica e ministra cursos na área, conforme documentação juntada. O boletim de ocorrência e outros documentos policiais demonstram o sofrimento que lhe vem sendo causado em função de suas atividades, o que tem apoio no artigo 37, § 6º, da Constituição. Considera-se razoável e justo que o valor indenizatório seja fixado em R$ 20.000,00 (vinte mil reais). A quantificação pecuniária do dano moral não se confunde com os ganhos que a requerente eventualmente deixou de receber em razão dos fatos narrados. 

Fixam-se honorários advocatícios ao réu em R$ 2.000,00 (dois mil reais), à vista do valor efetivo da condenação (R$ 20.000,00), o trabalho que o advogado realizou, o tempo transcorrido, ex vi do artigo 20, §§ 3º e 4º, do CPC/73, vigente à época da prolação da sentença. Aos valores de ressarcimento e honorários advocatícios incidirão correção monetária e juros de mora, segundo critérios previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal. Custas ex lege. 

Ante o exposto, voto para prover a apelação e julgar parcialmente procedente a ação, para condenar o Conselho Regional de Enfermagem/SP a se abster de impedir a autora do exercício regular a atividade de instrumentadora cirúrgica por não possuir registro na autarquia, a indenizá-la em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por danos morais e a pagar honorários advocatícios de R$ 2.000,00 (dois mil reais). 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. INSTRUMENTADOR CIRÚRGICO. Atividade profissional  que não é um munus de exercício exclusivo do profissional de enfermagemDESNECESSIDADE DE INSCRIÇÃO NO COREN.

- O decreto regulamentador (Nº 94.406/87) ultrapassa o que as leis Nº 5.905/73 e 7.498/86 disciplinaram. De qualquer forma, não dá ao profissional de enfermagem exclusividade na instrumentação cirúrgica. De forma mais explícita, é o que a Resolução COFEN - 214/98, no seu artigo 1º, afirma. Precedentes do STJ.

- Posto que o entendimento é de que o instrumentador cirúrgico não precisa ser profissional de enfermagem para exercer sua atividade, também é certo que não se lhe pode exigir a inscrição no COREN/SP.

-  Quanto à ocorrência de dano moral à recorrente, afigura-se proceder. A autora tem formação específica de instrumentadora cirúrgica e ministra cursos na área, conforme documentação juntada. O boletim de ocorrência e outros documentos policiais demonstram o sofrimento que lhe vem sendo causado em função de suas atividades, o que tem apoio no artigo 37, § 6º, da Constituição. Considera-se razoável e justo que o valor indenizatório seja fixado em R$ 20.000,00 (vinte mil reais). A quantificação pecuniária do dano moral não se confunde com os ganhos que a requerente eventualmente deixou de receber em razão dos fatos narrados.

- Fixados honorários advocatícios de dois mil reais. 

- Juros e correção monetária nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Custas ex lege. 

Apelação provida. Ação julgada procedente em parte. 


  ACÓRDÃO
 
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu prover a apelação e julgar parcialmente procedente a ação, para condenar o Conselho Regional de Enfermagem/SP a se abster de impedir a autora do exercício regular a atividade de instrumentadora cirúrgica por não possuir registro na autarquia, a indenizá-la em R$ 20.000,00 (vinte mil reais) por danos morais e a pagar honorários advocatícios de R$ 2.000,00 (dois mil reais), nos termos do voto do Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (Relator), com quem votaram as Des. Fed. MARLI FERREIRA e MÔNICA NOBRE., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.