APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031909-56.2018.4.03.6100
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: JS ADMINISTRACAO DE RECURSOS S/A
Advogados do(a) APELANTE: RODRIGO BATISTA DOS SANTOS - SP296932-A, FABRICIO RIBEIRO FERNANDES - SP161031-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031909-56.2018.4.03.6100 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: JS ADMINISTRACAO DE RECURSOS S/A Advogados do(a) APELANTE: RODRIGO BATISTA DOS SANTOS - SP296932-A, FABRICIO RIBEIRO FERNANDES - SP161031-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação à sentença que denegou mandado de segurança impetrado para afastar a incidência de IRPJ e CSL sobre correção monetária decorrente de aplicações financeiras. Alegou-se que: (1) a base de cálculo do IRPJ e CSL é o efetivo acréscimo patrimonial, não incidindo sobre atualização monetária ante a desvalorização da moeda devido à inflação; (2) a correção monetária não implica aumento de patrimônio e não deve compor o conceito de lucro, pois objetiva somente evitar a corrosão da moeda; e (3) a jurisprudência dos Tribunais Superiores é uníssona em vedar a tributação do “lucro inflacionário”. Houve contrarrazões e parecer do Ministério Público pelo prosseguimento do feito. É o relatório.
O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal Antonio Cedenho: Trata-se de recurso de apelação em face da sentença que negou a segurança pleiteada por concluir que a tributação isolada e autônoma do imposto de renda sobre os rendimentos auferidos pelas pessoas jurídicas em aplicações financeiras de renda fixa, bem como sobre os ganhos líquidos em operações realizadas nas bolsas de valores, de mercadorias, de futuros ou assemelhadas, à luz dos artigos 29 e 36 da Lei 8.541/92, é legítima e não constitui violação ao conceito de renda delineado no artigo 43 do Código Tributário Nacional. Adoto o relatório do e. Relator. Peço vênia, contudo, para divergir do bem lançado voto, no tocante a interpretação da composição da base de cálculo para fins de tributação de IRPJ e de CSLL sobre a parcela correspondente à recomposição inflacionária computada nos rendimentos de aplicações financeiras. Conforme o art. 146, III, "a", da Constituição Federal, cabe ao Código Tributário Nacional a definição das bases de cálculo dos impostos. O Código Tributário Nacional, em seus artigos 43 e 44, assim estabelece: Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: Art. 44. A base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis. O STF já pacificou o entendimento de que o fato gerador do imposto de renda depende da ocorrência de acréscimo patrimonial. Confira-se a ementa do julgado: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. RENDA - CONCEITO. Lei n. 4.506, de 30.XI.64, art. 38, C.F./46, art. 15, IV; CF/67, art. 22, IV; EC 1/69, art. 21, IV. CTN, art. 43. I. - Rendas e proventos de qualquer natureza: o conceito implica reconhecer a existência de receita, lucro, proveito, ganho, acréscimo patrimonial que ocorrem mediante o ingresso ou o auferimento de algo, a título oneroso. C.F., 1946, art. 15, IV; CF/67, art. 22, IV; EC 1/69, art. 21, IV. CTN, art. 43. II. - Inconstitucionalidade do art. 38 da Lei 4.506/64, que institui adicional de 7% de imposto de renda sobre lucros distribuídos. (RE 117887, Relator(a): CARLOS VELLOSO, Tribunal Pleno, julgado em 11/02/1993, DJ 23-04-1993 PP-06923 EMENT VOL-01700-05 PP-00786 RTJ VOL-00150-02 PP-00578) grifou-se A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento no sentido de que a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido e o Imposto de Renda Pessoa Jurídica devem incidir sobre o lucro real, e não sobre o lucro inflacionário, que constitui mera atualização das demonstrações financeiras do balanço patrimonial. Por certo, a correção monetária não se enquadra em nenhum dos conceitos de renda ou proventos supracitados, já que serve para preservar o valor da moeda, não configurando acréscimo patrimonial. Nesse sentido, a recomposição inflacionária não pode ser incluída da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, uma vez que não representa um acréscimo patrimonial de fato, mas apenas um instrumento para evitar a corrosão da moeda pela inflação. O princípio da legalidade exige uma definição taxativa dos elementos essenciais da obrigação tributária. O art. 150, I, da Constituição Federal veda “exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça”, e, com detalhamento, o art. 97 do CTN exige que a lei, formalmente considerada, defina todos os elementos capazes de fazer surgir a obrigação tributária válida. Por certo, o crédito decorrente de aplicações financeiras repercute positivamente nas demonstrações financeiras das empresas. Todavia, não pode ser tributada a parcela que corresponde a mera recomposição inflacionária. Assim, considerando que é vedada a tributação de parcela que reflete a atualização monetária, os arts. 57, 65 e 73 da Lei nº 8.981/1995 devem ser interpretados em consonância com os arts. 43 e 44 do CTN, de modo que apenas as parcelas dos rendimentos financeiros que constituam real acréscimo patrimonial devem ser tributadas, ficando excluída a parcela relativa à atualização monetária das aplicações. Em decisão monocrática proferida no REsp nº 1.574.231/RS, a Ministra Regina Helena Costa, do STJ, concedeu a segurança para excluir da incidência do IRPJ e da CSLL a parcela relativa à inflação dos rendimentos de aplicações financeiras, no seguinte sentido: “a parcela correspondente à inflação (lucro inflacionário) dos rendimentos oriundos de aplicações financeiras não se expõe à incidência do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL” (grifou-se) Por fim, importante também destacar precedentes desta c. Turma: ApCiv - 5005004-33.2018.4.03.6126, julgado em 07/08/2020 e ApCiv - 347103 - 0002580-60.2013.4.03.6100, julgado em 18/10/2017. Ante o exposto, com a devida vênia, divirjo do entendimento manifestado pelo i. Relator para dar provimento ao recurso de apelação do contribuinte, declarando a não-incidência de IRPJ e de CSLL sobre a parcela de rendimentos financeiros que corresponde a recomposição inflacionária, reconhecendo o direito à compensação, conforme o art. 170-A do CTN, com tributos da mesma espécie (art. 66 da Lei nº 8.383/1991) ou com outros administrados pela Receita Federal do Brasil, à exceção das contribuições previdenciárias (artigo 74 da Lei nº 9.430/1996), respeitado o prazo prescricional de 5 (cinco) anos, acrescidos de juros pela Taxa SELIC. Nada impede, todavia, que o apelante opte por realizar a compensação pela via administrativa, de acordo com a lei vigente à data do encontro de contas, desde que preenchidos os requisitos próprios, conforme jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, julgada sob o rito do artigo 543-C do CPC/1973 - REsp nº 1.137.738/SP (Tema nº 265). É como voto.
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.
§ 1° A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção.
§ 2° Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que sedará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo.
III. - R.E. conhecido e provido.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031909-56.2018.4.03.6100
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V O T O
Senhores Desembargadores, embora o contribuinte defenda a aplicação de precedentes da Corte Superior, referentes à inexigibilidade de IRPJ/CSL sobre "lucro inflacionário", evidencia-se do exame fático do caso concreto que não se submete a espécie ao paradigma jurisprudencial invocado.
Pela clareza, eis o julgado referido (grifos nossos):
AgRg nos EREsp 436.302 Rel. Min. LUIZ FUX, DJ 17/09/2007: "TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO - CSSL. CORREÇÃO MONETÁRIA . BASE DE CÁLCULO. LEI 7.689/88. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. DISSENSO JURISPRUDENCIAL SUPERADO. SÚMULA 168/STJ. INCIDÊNCIA. 1. É cediço na Corte que: "Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado" (Súmula n.º 168/STJ). 2. O Superior Tribunal de Justiça, em reiterados precedentes, firmou entendimento segundo o qual a base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro é o lucro real, excluído o lucro inflacionário (Precedentes das Turmas integrantes da Primeira Seção: REsp 415761/PR, Primeira Turma, publicado no DJ de 21.10.2002; AgRg no REsp 636344/PB, Primeira Turma, publicado no DJ de 04.12.2006; REsp 409300/PR, Segunda Turma, publicado no DJ de 01.08.2006; REsp 610963/CE, Segunda Turma, publicado no DJ de 05.09.2005; e AgRg no REsp 409384/PR, Primeira Turma, publicado no DJ de 27.09.2004). 3. A correção monetária posto não ser um plus que se acrescenta, mas um minus que se evita, não traduz acréscimo patrimonial, por isso que sua aplicação não gera qualquer incremento no capital, mas tão-somente restaura dos efeitos corrosivos da inflação. 4. Os precedentes assentam que: (a) esta contribuição não pode incidir sobre o lucro inflacionário. A contribuição só pode incidir sobre o lucro real, o resultado positivo, o lucro líquido e não sobre a parte correspondente à mera atualização monetária das demonstrações financeiras; (b) o chamado lucro inflacionário não realizado não é lucro real. A correção monetária não representa qualquer acréscimo ao valor corrigido e visa preservar o valor aquisitivo da moeda através do tempo; (c) o artigo 43, do CTN, estabelece que o imposto de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza, tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda e de proventos de qualquer natureza, sendo certo que lucro inflacionário não é renda, não é aumento de capital; (d) não se confunde lucro inflacionário com lucro real. O primeiro engloba no seu quantitativo os ganhos reais da empresa devidamente atualizados. O ganho real, diferentemente, é unicamente o resultado da atividade econômica; (e) as demonstrações financeiras devem refletir a situação patrimonial da empresa, com o lucro efetivamente apurado, que servirá de base de cálculo para a cobrança do imposto de renda, da contribuição social sobre o lucro e do imposto sobre o lucro líqüido; e (f) a correção monetária não traduz acréscimo patrimonial. Sua aplicação não gera qualquer incremento no capital, mas tão-somente o restaura dos efeitos corrosivos da inflação. Por este prisma, não há como fazer incidir, sobre a mera atualização monetária, Imposto de Renda, sob pena de tributar-se o próprio capital. 5. Agravo regimental desprovido."
A narrativa do apelante assenta que foram firmados outros tantos julgados no Superior Tribunal de Justiça, associando "lucro inflacionário" à “inflação” ou “correção monetária”, para então concluir, categoricamente, no sentido da impossibilidade de incidência de imposto de renda ou contribuição social sobre o lucro líquido sobre tais atualizações.
Contudo, “lucro inflacionário”, conforme aludido no precedente transcrito por sua ementa, não corresponde à correção monetária, nos termos como foi estabelecida tal equivalência. Isto porque a Corte Superior, na ocasião, apreciava controvérsia centrada nos específicos conceitos dos artigos 21 e 22, combinado com o previsto no artigo 4º da Lei 7.799/1989, que estabeleciam:
"Art. 4° Os efeitos da modificação do poder de compra da moeda nacional sobre o valor dos elementos do patrimônio e os resultados do período-base serão computados na determinação do lucro real mediante os seguintes procedimentos:
I - correção monetária, na ocasião da elaboração do balanço patrimonial:
a) das contas do ativo permanente e respectiva depreciação, amortização ou exaustão, e das provisões para atender a perdas prováveis na realização do valor de investimentos;
b) das contas representativas do custo dos imóveis não classificados no ativo permanente;
c) das contas representativas das aplicações em ouro;
d) das contas representativas de adiantamentos a fornecedores de bens sujeitos à correção monetária, salvo se o contrato previr a indexação do crédito;
e) das contas integrantes do patrimônio líquido;
f) de outras contas que venham a ser determinadas pelo Poder Executivo, considerada a natureza dos bens ou valores que representem;
II - registro, em conta especial, das contrapartidas dos ajustes de correção monetária de que trata o item I;
III - dedução, como encargo do período-base, do saldo da conta de que trata o item II, se devedor;
IV - observado o disposto na Seção III deste Capítulo, cômputo no lucro real do saldo da conta de que trata o item II, se credor.
(...)
Art. 21. Considera-se lucro inflacionário, em cada período-base, o saldo credor da conta de correção monetária ajustado pela diminuição das variações monetárias e das receitas e despesas financeiras computadas no lucro líquido do período-base.
§ 1° O ajuste será procedido mediante a dedução, do saldo credor da conta de correção monetária, de valor correspondente a diferença positiva entre a soma das despesas financeiras com as variações monetárias passivas e a soma das receitas financeiras com as variações monetárias ativas.
§ 2° Lucro inflacionário acumulado é a soma do lucro inflacionário do período-base com o saldo de lucro inflacionário a tributar transferido do período-base anterior.
§ 3° O lucro inflacionário a tributar será registrado em conta especial do Livro de Apuração do Lucro Real, e o saldo transferido do período-base anterior será corrigido monetariamente, com base na variação do valor do BTN Fiscal entre o dia do balanço de encerramento do período-base anterior e o dia do balanço do exercício da correção.
Art. 22. Em cada período-base considerar-se-á realizada parte do lucro inflacionário acumulado proporcional ao valor, realizado no mesmo período, dos bens e direitos do ativo sujeitos à correção monetária.
§ 1° O lucro inflacionário realizado no período será calculado de acordo com as seguintes normas:
a) será determinada a relação percentual entre o valor dos bens e direitos do ativo sujeitos à correção monetária, realizados no período-base, e a soma dos seguintes valores:
1 - a média do valor contábil do ativo permanente no início e no fim do período-base;
2 - a média do saldo das demais contas do ativo sujeitas à correção monetária (art. 4°, inciso I, alíneas b, c, d e f no início e no fim do período-base;
b) o valor dos bens e direitos do ativo sujeitos à correção monetária realizado no período-base será a soma dos seguintes valores.
1 - custo contábil dos imóveis existentes no estoque no início do período-base e baixados no curso deste;
2 - valor contábil, corrigido monetariamente até a data da baixa, dos demais bens e direitos do ativo sujeitos à correção monetária baixados no curso do período-base;
3 - quotas de depreciação, amortização e exaustão computadas como custo ou despesa operacional do período-base;
4 - lucros ou dividendos, recebidos no período-base, de quaisquer participações societárias registradas como investimento;
c) o montante do lucro inflacionário realizado no período-base será determinado mediante a aplicação da percentagem de que trata a alínea a sobre o lucro inflacionário acumulado (art. 21 § 2°).
§ 2° O contribuinte que optar pelo diferimento da tributação do lucro inflacionário não realizado deverá computar na determinação do lucro real o montante do lucro inflacionário realizado (§ 1°) ou o valor determinado de acordo com o disposto no art. 23, e excluir do lucro líquido do período-base o montante do lucro inflacionário do período-base (art. 21)."
Como se vê, o “lucro inflacionário”, conforme referido no precedente, era composto por atualização monetária de demonstração financeira de todos os bens do contribuinte, daí porque havia, naquele caso, tributação sobre patrimônio, refugindo ao fato gerador legalmente previsto do imposto de renda.
Tal sistemática não mais existe, por expressa disposição, contida na Lei 9.249/1995:
"Art. 4º Fica revogada a correção monetária das demonstrações financeiras de que tratam a Lei nº 7.799, de 10 de julho de 1989, e o art. 1º da Lei nº 8.200, de 28 de junho de 1991.
Parágrafo único. Fica vedada a utilização de qualquer sistema de correção monetária de demonstrações financeiras, inclusive para fins societários."
A matéria dos autos pouco tem a ver com o cenário examinado no AgRg nos EREsp 436.302. Aqui fala-se, propriamente, de inflação, na acepção de perda de poder aquisitivo da moeda nacional, em espécie, como unidade de valor, e sua respectiva recomposição mediante atualização monetária.
É certo que a consagrada premissa de que a atualização monetária não configura acréscimo patrimonial segue aplicável. Porém, a distinta configuração do caso concreto induz decisão diversa da obtida pela aplicação mecânica do julgado acima ou de outros tantos indicados da Corte Superior.
Com efeito, há vasto leque de investimentos financeiros à disposição do contribuinte. Estes são formatados segundo regras distintas de correção, de alíquotas exacionais e, mais importante para o caso, de momento de incidência da tributação.
Assim, apenas seria possível excluir a tributação da atualização monetária ante a demonstração de que esta não incidiu, em qualquer parte, sobre o valor que foi acrescido ao investimento inicial como rendimento, segundo o referencial próprio. Ou seja, se houvesse correção monetária simples do investimento (e não composta), aplicada apenas sobre o valor de entrada, excluída dos acréscimos percebidos.
A razão é linear: o rendimento do investimento é o acréscimo patrimonial que constitui fato gerador do imposto de renda, logo se há diferimento entre o momento em que este acréscimo ocorre e a tributação respectiva é exigida, há necessidade de atualização monetária desta base de cálculo para correto dimensionamento do tributo. Do contrário, a tributação incidiria sobre valor corroído pela inflação.
Assim, pela mesma ótica manejada pelo recurso, porém em desfavor da pretensão, a correção da base de cálculo da tributação não configura um plus, mas mera recomposição do valor tributável, não representando majoração de tributo, segundo disposição literal do Código Tributário Nacional (grifos nossos):
"Art. 97. Somente a lei pode estabelecer:
(...)
§ 2º Não constitui majoração de tributo, para os fins do disposto no inciso II deste artigo, a atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo."
Trata-se, de resto, de distinguishing, inclusive, já reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça (grifos nossos):
REsp 1.385.164, Rel. Min. MAURO CAMPBELL, DJe 19/12/2016: "RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535, CPC. IMPOSTO DE RENDA. RENDA FIXA. INCIDÊNCIA SOBRE OS RENDIMENTOS DE LETRAS FINANCEIRAS TESOURO - LFT'S. BASE DE CÁLCULO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. ART. 65, §§1º E 2º, DA LEI N. 8.981/95. (...).3. As Letras Financeiras do Tesouro - LFT possuem fluxo de pagamento simples, ou seja, o investidor faz a compra e recebe o rendimento apenas uma vez, quando o devedor faz o resgate na data de vencimento do título, junto com o valor do principal, incidindo aí o Imposto de Renda. Sendo assim, no vencimento do título há, inexoravelmente, o seu resgate ou a sua repactuação (manutenção do investimento) e ambas as situações estão previstas no art. 65, §§1º e 2º, da Lei n. 8.981/95 como hipóteses de incidência do Imposto de Renda, pois nelas há a disponibilidade jurídica e econômica dos valores correspondentes aos títulos. (...) 5. Impossível deduzir a inflação do período do investimento da base de cálculo do imposto. Isto porque a inflação corresponde apenas à atualização do valor monetário da respectiva base de cálculo, que é permitida pelo art. 97, §2º, do CTN, independente de lei, já que não constitui majoração de tributo. 6. Quanto à responsabilidade tributária, registra o art. 65, §8º, da Lei n. 8.981/95 que é responsável pela retenção do imposto a pessoa jurídica que efetuar o pagamento do rendimento (situação que, no caso, ocorre em sua liquidação quando do vencimento do título), não sendo o caso de incidência do art. 54, da Lei n. 7.799/89, porque não se trata de cessão do título, mas de vencimento do título com nova aplicação posterior. 7. Recurso especial não provido."
Pertinente a transcrição do seguinte excerto do voto do relator:
“De observar que o caso dos autos não guarda qualquer semelhança com a tributação do lucro inflacionário, vedada pela jurisprudência deste STJ (v.g.AgRg nos ERESP Nº 436.302 - PR, Primeira Seção, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 22.08.2007). Isto porque a tributação do lucro inflacionário é aquela estabelecida especificamente nos arts. 4º e 21 a 26, da Lei n. 7.799/89, que levava em consideração a incidência de correção monetária nas demonstrações financeiras das pessoas jurídicas envolvendo não apenas seus rendimentos, mas todos os seus bens, a saber (...)”
O que seria eventualmente cabível discutir, em oposição, seria o momento em que exsurge o fato gerador em cada tipo de investimento, para aferir, caso a caso, a necessidade de atualização da base de cálculo. Tal debate, contudo, não foi sequer cogitado no origem e supera, em tudo, o escopo desta apelação.
Ante ao exposto, nego provimento à apelação.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. RENDIMENTOS DE APLICAÇÕES FINANCEIRAS. NÃO INCIDÊNCIA SOBRE PARCELA CORRESPONDENTE À RECOMPOSIÇÃO INFLACIONÁRIA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. A questão posta nos autos diz respeito à composição da base de cálculo de IRPJ e de CSLL, incidentes rendimentos de aplicações financeiras.
2. Entendimento pacífico do C. Supremo Tribunal Federal no sentido de que o fato gerador do imposto de renda depende da ocorrência de acréscimo patrimonial. Entendimento pacífico do C. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a CSLL e o IRPJE incidir sobre o lucro real, e não sobre o lucro inflacionário, que constitui mera atualização das demonstrações financeiras do balanço patrimonial.
3. A correção monetária não se enquadra em nenhum dos conceitos de renda ou proventos supracitados, já que serve para preservar o valor da moeda, não configurando acréscimo patrimonial. Nesse sentido, a recomposição inflacionária não pode ser incluída da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, uma vez que não representa um acréscimo patrimonial de fato, mas apenas um instrumento para evitar a corrosão da moeda pela inflação.
4. Considerando que é vedada a tributação de parcela que reflete a atualização monetária, os art. 57, 65 e 73 da Lei 8.981/95 devem ser interpretados em consonância com os art. 43 e 44 do Código Tributário Nacional, de modo que apenas as parcelas dos rendimentos financeiros que constituam real acréscimo patrimonial devem ser tributadas, ficando excluída a parcela relativa à atualização monetária das aplicações.
5. Apelação provida.