APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007538-76.2019.4.03.6105
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
APELADO: SÓ GELO INDÚSTRIA E COMÉRCIO EIRELI
Advogado do(a) APELADO: OCTAVIO TEIXEIRA BRILHANTE USTRA - SP196524-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007538-76.2019.4.03.6105 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SÓ GELO INDÚSTRIA E COMÉRCIO EIRELI Advogados do(a) APELADO: OCTAVIO TEIXEIRA BRILHANTE USTRA - SP196524-A, MARIANA SOARES OMIL - SP397158-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (RELATOR): Trata-se de embargos de declaração opostos pela União Federal contra acórdão que, à unanimidade, negou provimento ao seu apelo e à remessa oficial, mantendo a sentença que concedeu a segurança, para afastar a incidência das contribuições à Seguridade Social, ao SAT e daquelas devidas a terceiros, sobre as verbas pagas sob as rubricas de aviso prévio indenizado, primeira quinzena de auxílio-doença e auxílio-acidente, férias indenizadas e adicional de férias indenizadas (terço constitucional), autorizando a impetrante a proceder à compensação dos valores indevidamente recolhidos a tal título, não atingidos pela prescrição, após o trânsito em julgado da sentença. A embargante sustenta que o acórdão, ao afastar a incidência da exação sobre aviso prévio indenizado – entidades terceiras e SAT, 1/3 de férias, 15 primeiros dias que antecedem o auxílio-doença e férias indenizadas, deixou de analisar o tema 20 (RE 565.160), bem como os dispositivos legais que menciona, especialmente os arts. 22, I, e 28, § 9º, da Lei 8.212/91, art. 60 da Lei 8213/91, art. 214 do Decreto 3048 e arts. 7°, XVII, 103-A, 149, 195, I, ‘a’, e §5, bem como o art. 201 §11º da CF. Aduz que o julgado deixou de se pronunciar sobre a decisão acerca da repercussão geral no RE 611.505/SC, em cujos autos encontram-se pendentes embargos de declaração, não tendo ocorrido o trânsito em julgado. Alega, ainda, ofensa aos seguintes princípios constitucionais: a) Diversidade Da Base De Financiamento Da Seguridade Social (artigo 194, VI e 195, caput, da CF); b) Preservação do Equilíbrio Financeiro do Sistema (artigo 201 da CF); c) Presunção De Constitucionalidade Das Normas e d) Princípio Da Separação Dos Poderes e que o acórdão foi omisso quanto à ausência de ato coator comprovado. Pugna pelo prequestionamento dos dispositivos legais que menciona, de modo a viabilizar a interposição de recurso às Cortes superiores. A parte embargada apresentou contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007538-76.2019.4.03.6105 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL APELADO: SÓ GELO INDÚSTRIA E COMÉRCIO EIRELI Advogados do(a) APELADO: OCTAVIO TEIXEIRA BRILHANTE USTRA - SP196524-A, MARIANA SOARES OMIL - SP397158-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (RELATOR): O ordenamento constitucional de 1988 (notadamente a partir da Emenda Constitucional nº 45/2004) deu maior impulso aos efeitos de decisões judiciais a partir da ampliação de vinculações (em controle abstrato de constitucionalidade) e obrigatoriedades (firmadas em mecanismos de precedentes). No plano infraconstitucional, há múltiplos atos legislativos implementando esses mecanismos, com destaque para o Código de Processo Civil assegurando o distinguishing e o overruling (art. 489, § 1º, VI,), bem como prevendo observância obrigatória de Súmulas Vinculantes e de Teses fixadas em Temas por todas as instâncias judiciárias (art. 932 e art. 1.030), revisão das mesmas ao Tribunal que as pronunciou (no rito do art. 927), reclamações (art. 988), retratações (art. 1.041), impugnações ao cumprimento de sentença (art. 525) e ações rescisórias (art. 966), dentre outras medidas possíveis. Todas essas providências vão ao encontro de primados do processo como a igualdade, a segurança e a eficiência da prestação jurisdicional. Por isso, os embargos de declaração servem para que o mesmo órgão judiciário prolator retifique seu pronunciamento visando ajustá-lo àquele consolidado pelo obrigatório sistema de precedentes do E.STJ ou do E.STF (repetitivo ou repercussão geral) ou pelo vinculante entendimento do Pretório Excelso, ainda que supervenientes à decisão embargada. O mesmo não ocorre se a orientação de tribunais superiores for desprovida de força obrigatória ou vinculante, quando então efeitos infringentes em embargos de declaração somente podem ser conferidos em casos de erro, obscuridade, omissão ou contradição (art. 1022 do CPC). Há firme orientação do E.STJ nesse sentido, como se nota nos seguintes julgados: EDcl no REsp 734.403/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 14/03/2017, DJe 17/03/2017; EDcl no AgRg no AREsp 655.033/RJ, Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 21/06/2016, DJe 28/06/2016; EDcl no AgRg no REsp 1461864/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 05/04/2016, DJe 25/05/2016; e EDcl no AgRg no REsp 1349604/SC, Segunda Turma, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/03/2015, DJe 23/03/2015. Os embargos de declaração discutem a incidência de contribuições sobre valores pagos a título de terço constitucional de férias. No caso dos autos, a decisão recorrida foi proferida em 26/05/2020 e, posteriormente, o E.STF mudou sua orientação ao julgar o RE 1072485 (Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020, tendo sido a ata de julgamento nº 24, de 31/08/2020, publicada no DJE nº 228, divulgado em 14/09/2020), ao fundamento de que o terço constitucional de férias usufruídas (art. 7º, XVII, da Constituição) é de verba periódica auferida como complemento à remuneração do trabalho, e que por isso, está no campo de incidência de contribuições incidentes sobre a folha de salários, firmando a seguinte Tese no Tema 985: “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”. É imperativo que a decisão recorrida seja ajustada, em favor da unificação do direito e da celeridade processual, sendo necessário conferir efeitos infringentes aos presentes embargos de declaração nesse ponto. No demais pontos, a argumentação da embargante revela a pretensão de rediscussão de teses e provas, com clara intenção de obter efeitos infringentes. Conforme entendimento jurisprudencial, o recurso de embargos de declaração não tem por objeto instauração de nova discussão sobre a matéria já apreciada. Também são incabíveis os embargos de declaração para fins de prequestionamento a fim de viabilizar a interposição de recurso às superiores instâncias, se não evidenciados os requisitos do art. 1.022 do Código de Processo Civil. No caso em apreciação, verifica-se que o acórdão está devidamente fundamentado, conforme o teor da ementa abaixo colacionada: "CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS PATRONAIS E AQUELAS DESTINADAS AO RAT E A TERCEIROS. SALÁRIO E GANHOS HABITUAIS DO TRABALHO. VERBAS INDENIZATÓRIAS. - O texto constitucional confiou à União Federal amplo campo de incidência para exercício de sua competência tributária no tocante à contribuição previdenciária patronal, compreendendo o conjunto das verbas remuneratórias habituais (salários e demais rendimentos do trabalho), cuja conformação normativa está essencialmente consolidada na Lei 8.212/1991 (notadamente em seu art. 22). Todavia, não estão no campo constitucional de incidência e nem nas imposições legais verbas com conteúdo indenizatório, em face das quais não pode incidir contribuição previdenciária. - Cada uma das contribuições “devidas a terceiros” ou para o “Sistema S” possui autonomia normativa, mas a União Federal as unificou para fins de delimitação da base tributável (p. ex., na Lei 2.613/1955, na Lei 9.424/1996, na Lei 9.766/1999 e na Lei 11.457/2007, regulamentadas especialmente no art. 109 da IN RFB 971/2009, com alterações e inclusões), razão pela qual as conclusões aplicáveis às contribuições previdenciárias também lhes são extensíveis. - O auxílio-doença e o auxílio-acidente pagos ao empregado, nos quinze primeiros dias do afastamento, constituem verbas de caráter previdenciário (mesmo quando pagas pelo empregador), o que descaracteriza a natureza salarial para fins de incidência de contribuição social. - Não integram o salário-de-contribuição os pagamentos a título de férias indenizadas e o respectivo terço constitucional, em face do disposto no art. 28, § 9º, alínea "d", da Lei 8.212/1991, sendo indevida, portanto, a incidência da contribuição previdenciária. - A verba recebida pelo empregado a título de aviso prévio indenizado (integral ou proporcional) não é pagamento habitual, nem mesmo retribuição pelo seu trabalho, mas indenização imposta ao empregador que o demitiu sem observar o prazo de aviso, sobre ela não podendo incidir a contribuição previdenciária. - Observada a prescrição quinquenal (art. 168 do CTN), a recuperação do indébito tem os acréscimos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, e as regras para compensar são as vigentes no momento do ajuizamento da ação, assegurado o direito de a parte-autora viabilizá-la na via administrativa segundo o modo lá aplicável (REsp 1.137.738/SP, Rel. Min. Luiz Fux, v.u., DJe: 01/02/2010, Tese no Tema 265). Portanto, cumpridos os termos do art. 170 e do art. 170-A, ambos do CTN, e os critérios fixados por atos normativos da Receita Federal do Brasil (notadamente o art. 84 e seguintes da IN SRF 1.717/2017 e alterações, legitimados pelos padrões suficientes fixados na legislação ordinária da qual derivam), utilizando a GFIP, os indébitos poderão ser compensados apenas com contribuições previdenciárias; utilizando o eSocial e a DCTFWeb, os indébitos podem se valer da compensação “unificada” ou “cruzada” entre créditos e débitos previdenciários ou fazendários, nos termos do art. 74 da Lei 9.430/1996, com as restrições do art. 26-A, §1º, da Lei 11.457/2007 (introduzido pela Lei 13.670/2018). - Apelação e remessa oficial às quais se nega provimento." Constata-se que a fundamentação do acórdão embargado está completa e suficiente, tendo apreciado a matéria trazida a juízo, a despeito de ter sido adotada tese contrária ao interesse do embargante. Ademais, frise-se que “o órgão julgador não é obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa da tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as questões relevantes e imprescindíveis à sua resolução. Precedentes: AgInt nos EDcl no AREsp 1.290.119/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 30.8.2019; AgInt no REsp 1.675.749/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 23.8.2019; REsp 1.817.010/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20.8.2019; AgInt no AREsp 1.227.864/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20.11.2018” (AREsp 1535259/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 07/11/2019, DJe 22/11/2019). Acrescente-se que no julgamento do RE 611.505/SC assentou-se que "a discussão sobre a incidência, ou não, de contribuição previdenciária sobre valores pagos pelo empregador nos primeiros quinze dias de auxílio-doença situa-se em âmbito infraconstitucional, não havendo questão constitucional a ser apreciada". Os embargos de declaração opostos pela União Federal foram rejeitados, sendo que o E.STF, por maioria, considerou irreparável a decisão que assentou inexistente repercussão geral na matéria debatida no recurso extraordinário (Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020, tendo sido a ata de julgamento nº 24, de 31/08/2020, publicada no DJE nº 228, divulgado em 14/09/2020). Anote-se, por fim, que inexiste nos autos qualquer determinação para sobrestamento dos feitos em que se discute a matéria. Posto isso, tem-se que o acórdão é claro, não havendo qualquer omissão, obscuridade ou contradição a ser suprida em relação às demais verbas discutidas. Ante o exposto, acolho parcialmente os embargos de declaração para dar parcial provimento ao apelo da União Federal e à remessa oficial, a reconhecer devida a incidência da contribuição previdenciária sobre o terço constitucional de férias, nos termos da fundamentação. É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SUPERVENIENTE TESE FIRMADA EM SISTEMA DE PROCEDENTES. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. TERÇO CONSTITUCIONAL DE FÉRIAS. UNIFICAÇÃO DO DIREITO. CELERIDADE PROCESSUAL. EFEITOS INFRINGENTES. POSSIBILIDADE. 15 PRIMEIROS DIAS QUE ANTECEDEM O AUXÍLIO-DOENÇA E AUXÍLIO ACIDENTE. AVISO PRÉVIO. FÉRIAS INDENIZADAS. OMISSÃO. INEXISTÊNCIA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PROVIDOS EM PARTE.
- Primados do processo como a igualdade, a segurança e a eficiência da prestação jurisdicional impõem que os embargos de declaração sirvam para que o mesmo órgão judiciário prolator retifique seu pronunciamento visando ajustá-lo àquele consolidado pelo obrigatório sistema de precedentes do E.STJ ou do E.STF (repetitivo ou repercussão geral) ou pelo vinculante entendimento do Pretório Excelso, ainda que supervenientes à decisão embargada. O mesmo não ocorre se a orientação de tribunais superiores for desprovida de força obrigatória ou vinculante, quando então efeitos infringentes em embargos de declaração somente podem ser conferidos em casos de erro, obscuridade, omissão ou contradição (art. 1022 do CPC).
- No caso dos autos, a decisão recorrida foi proferida em 26/05/2020 e, posteriormente, o E.STF mudou sua orientação ao julgar o RE 1072485 (Sessão Virtual de 21/08/2020 a 28/08/2020, tendo sido a ata de julgamento nº 24, de 31/08/2020, publicada no DJE nº 228, divulgado em 14/09/2020), ao fundamento de que o terço constitucional de férias usufruídas (art. 7º, XVII, da Constituição) é de verba periódica auferida como complemento à remuneração do trabalho, e que por isso, está no campo de incidência de contribuições incidentes sobre a folha de salários, firmando a seguinte Tese no Tema 985: “É legítima a incidência de contribuição social sobre o valor satisfeito a título de terço constitucional de férias”.
- É imperativo que a decisão recorrida seja ajustada, em favor da unificação do direito e da celeridade processual, sendo necessário conferir efeitos infringentes aos presentes embargos de declaração.
- Conforme entendimento jurisprudencial, o recurso de embargos de declaração não tem por objeto instauração de nova discussão sobre a matéria já apreciada.
- Também são incabíveis os embargos de declaração para fins de prequestionamento a fim de viabilizar a interposição de recurso às superiores instâncias, se não evidenciados os requisitos do art. 1.022 do Código de Processo Civil.
- Embargos de declaração parcialmente acolhidos. Apelo da União Federal e remessa oficial providas em parte.