APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007921-78.2019.4.03.6000
RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: DILZA DE SOUZA OLIVEIRA
Advogados do(a) APELANTE: LUDHIANA DA CRUZ GUIMARAES RINALDI NETTO - MS16451-A, CAROLINA ALVES MUNIZ DE FREITAS - MS16141-A, RENATA PAULA POSSARI MENDONCA - MS7178-A
APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007921-78.2019.4.03.6000 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. TORU YAMAMOTO APELANTE: DILZA DE SOUZA OLIVEIRA Advogados do(a) APELANTE: LUDHIANA DA CRUZ GUIMARAES RINALDI NETTO - MS16451-A, CAROLINA ALVES MUNIZ DE FREITAS - MS16141-A, RENATA PAULA POSSARI MENDONCA - MS7178-A APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Desembargador Federal Toru Yamamoto: Trata-se ação anulatória de multa decorrente de auto de infração. A r. sentença (fls. 01/10, ID 123390583) julgou o pedido inicial improcedente, nos termos do 487, I, Código de Processo Civil. Condenou os embargantes ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa. Apelação da autora (fls. 17/23, ID 123390584), na qual aduz o reconhecimento superveniente da nulidade do auto de infração pela administração. Afirma a inexistência de desmatamento ilegal. Haveria, também, nulidade por ausência de intimação e inobservância do duplo grau de jurisdição. Alega que a penalidade acessória foi cobrada indevidamente. Contrarrazões (ID 123390586). É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007921-78.2019.4.03.6000 RELATOR: Gab. 19 - DES. FED. TORU YAMAMOTO APELANTE: DILZA DE SOUZA OLIVEIRA Advogados do(a) APELANTE: LUDHIANA DA CRUZ GUIMARAES RINALDI NETTO - MS16451-A, CAROLINA ALVES MUNIZ DE FREITAS - MS16141-A, RENATA PAULA POSSARI MENDONCA - MS7178-A APELADO: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Desembargador Federal Toru Yamamoto: A Lei Federal nº 9.784/1999: Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito. § 1º O recurso será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, o encaminhará à autoridade superior. § 2º Salvo exigência legal, a interposição de recurso administrativo independe de caução. § 3º Se o recorrente alegar que a decisão administrativa contraria enunciado da súmula vinculante, caberá à autoridade prolatora da decisão impugnada, se não a reconsiderar, explicitar, antes de encaminhar o recurso à autoridade superior, as razões da aplicabilidade ou inaplicabilidade da súmula, conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 11.417, de 2006). Vigência No caso concreto, a empresa executada foi autuada em 04 de outubro de 2003 (fls. 26, ID 123387763). A conduta imputada à apelante: “Desmatamento de 638 hectares em área de preservação permanente. A referida área está contida no processo de desmatamento nº 02014.000565/03-25 não obedece o Item 5 da Autorização nº 169/2003(...)” De maneira quase simultânea à prolação da sentença, em 18 de maio de 2018, a autoridade administrativa (Serviço de Normatização do Processo Sancionador Ambiental) proferiu Manifestação Técnica nos seguintes termos (fls. 03/05, ID 123390585): “(…) O presente processo trata de auto de infração lavrado na ata de 04/10/2003, pelo desmatamento de 638 hectares de área de preservação permanente, infração enquadrada no artigo 25 do Decreto 3.1179/99, com multa indicada no valor de R$ 957.00,00. Além da autuação, observa-se que a área suprimida foi embargada através do termo e nº 201619/C (…) Entretanto, apesar dos autos terem sido remetidos para avaliar o pedido de conversão da multa pela adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), cabe de ofício, nos termos do artigo 53 da Lei 9.784/1999, reconhecer a nulidade procedimental na homologação da sanção, uma vez que não foi proferida decisão recursal pela autoridade competente, pois o Superintendente do Ibama em Mato Grosso do Sul já havia julgado a pasta em 1ª instância, e mesmo entendendo que a sua decisão não era passível de ser alterada, deveria encaminhar o processo à autoridade superior (Presidente do Ibama) para julgar a petição com característica de recurso, conforme determina o artigo 56, §1º, da citada lei, em vez de determinar o prosseguimento da cobrança do débito. De fato, o parecer jurídico que acolheu não enfatizou as etapas que deveriam ser seguidas, recomendando apenas a manutenção do julgamento proferido e a comunicação do evento ao Ministério Público (fls. 48/50). Desse modo, o erro de procedimento acabou por suprimir uma etapa processual prevista em lei (art. 57) e na Instrução Normativa vigente à época, tolhendo da parte autuada o exercício da ampla defesa, o que leva a concluir que todos os atos praticados no processo, desde a deliberação que determinou a evolução da cobrança em 08/08/2007 (fls. 53), são nulos, devendo o feito retroagir à fase recursal. (…) Assim, diante dos fundamentos e fatos expostos, recomenda-se, em nome da autotutela administrativa e em razão da patente nulidade procedimental, que a Autoridade Competente para o exame processual profira decisão, nos termos do artigo 65 da Lei nº 9784/1999, determinando o cancelamento do auto de infração nº 371455/D e a baixa do débito. No mesmo julgamento deverá manter os efeitos do embargo aplicado através do termo de nº 201619/C, até que a parte autuada demonstre a regularidade ambiental plena, conforme explanado. Comunicar a Procuradoria Federal para baixar o débito da dívida ativa, em virtude da ocorrência da prescriçao que afeta os autos, ao retornar o feito à fase processual não maculada pela nulidade. (...)” Após a Nota Técnica, a Procuradoria Federal Especializada Junto ao IBAMA em Campo Grande/MS (fls. 06, ID 123390585): “(…) Tendo em vista que o débito já foi constituído, ainda que se entenda pela nulidade em sua constituição, sua desconstituição é vedada ao IBAMA, conforme arts. 5º e 6º do Decreto 9.194/17, cabendo à PGF, por meio da SCRC manifestar-se sobre a ocorrência da nulidade e prescrição apontadas e pela desconstituição do auto de infração. (...)” e “Apesar de apontar a nulidade, A Manifestação Técnica entendeu que por o auto já estar em cobrança, caberia à Procuradoria Federal, responsável pela cobrança, manifestar-se sobre a nulidade não cabendo ao IBAMA. Em razão disso, quando do retorno dos autos, encaminhamos os mesmos à SCRC/PF/MS que se manifestou de forma contrária, entendendo caber à autarquia rever seus próprios atos e assim anular o processo. Entendo que já houve manifestação da autarquia pela nulidade na referida manifestação técnica, já que a Procuradoria Federal diz que cabe à autarquia essa análise e manifestação, ela é válida e deve ser adotada. (...)” Por sua vez, o Núcleo de Cobrança e Recuperação de Créditos da Procuradoria Federal em Mato Grosso do Sul (fls. 08, ID 123390585): “Não cabe ao setor de cobrança da PF/MS se imiscuir no princípio da autotutela, ora em questão, e nem mesmo a gestão dos créditos lhe atribui tal prerrogativa (Decreto 9.194/2017), posto que cabe a este setor gerir o que o ente público considera devido e enquanto assim o considere, além do que não está embutido no termo gestão a disponibilidade do que está sendo gerido. Caso não considere devido, pelo exercício do princípio da autotutela (art. 53 da Lei 9.784/99), não restará outra alternativa à PF/MS que não os procedimentos necessários para cumprir a decisão administrativa, seja pela extinção da execução fiscal, seja pelo cancelamento da inscrição em dívida ativa. No entento, é facultado ao IBAMA, caso assim entenda, se valer, em caso de dúvida objetiva, de parecer da Procuradoria responsável pela consultoria de seus atos, que é a PFE/IBAMA. Por fim, não tendo o Decreto 9.194/2017 o alcance de afastar o princípio da autotutela dos atos pela Administração Pública, até porque, como se disse alhures, tal prerrogativa está prevista em lei formal, não se pode invocar tal fato para o encaminhamento a esta PF/MS (...)” Em seguida, a Superintendência do IBAMA no Estado do Mato Grosso do Sul: “Considerando o contido na manifestação técnica – sei 2387798 e demais peças posteriores. Considerando o critério de competência processual previsto pela IN 10/2012, atribuído conforme o valor do AI. Encaminha-se os autos à autoridade julgadora competente, para conhecimento e demais providências.” A demora no estabelecimento da autoridade competente para efetuar a autotutela não posterga a nulidade verificada pela própria administração. Ademais, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal em processo análogo: EMENTA: RECUSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. REVOGAÇÃO DE PERMISSÃO PARA EXECUTAR SERVIÇO ESPECIAL DE RETRANSMISSÃO SIMULTÂNEA DE TELEVISÃO (PORTARIA N. 131/1990). NULIDADE DA DECISÃO PROFERIDA EM SEDE RECURSAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A circunstância de a Recorrente reiterar os argumentos esposados na petição inicial do mandado de segurança não caracteriza, por si só, ausência de impugnação dos fundamentos do acórdão recorrido. A Recorrente buscou demonstrar de que modo teria havido afronta ao seu direito líquido e certo quanto à necessidade de apreciação de seu recurso administrativo por autoridade administrativa diversa da que julgou sua defesa inicial nos autos do processo administrativo n. 53.000.002491/2001. 2. Impossibilidade de a mesma pessoa, embora ocupando cargos distintos, julgar validamente o pedido de reconsideração (Secretário Executivo do Ministério das Comunicações) e o recurso administrativo (Ministro do Ministério das Comunicações) interposto nos autos do Processo Administrativo n. 53.000.002491/2001. Afronta aos princípios da impessoalidade, da imparcialidade e do duplo grau. 3. Recurso ordinário em mandado de segurança parcialmente provido. O processo administrativo nº 02014.003304/2003-56 é nulo. Considerado o trabalho adicional realizado pelos advogados, em decorrência da interposição de recurso, majoro os honorários advocatícios para 11% (onze por cento), nos termos do artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil. Por estes fundamentos, dou provimento à apelação. É o voto.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
(RMS 26029, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 11/03/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-076 DIVULG 22-04-2014 PUBLIC 23-04-2014)
E M E N T A
ADMINISTRATIVO – IBAMA – MULTA – NULIDADE – RECONHECIMENTO EM NOTA TÉCNICA ADMINISTRATIVA – PENDÊNCIA DE AUTOTUTELA.
1. Trata-se ação anulatória de multa decorrente de auto de infração.
2. A Lei Federal nº 9.784/1999: “Art. 56. Das decisões administrativas cabe recurso, em face de razões de legalidade e de mérito. § 1º O recurso será dirigido à autoridade que proferiu a decisão, a qual, se não a reconsiderar no prazo de cinco dias, o encaminhará à autoridade superior. (...)”.
3. A autoridade administrativa (Serviço de Normatização do Processo Sancionador Ambiental) proferiu Manifestação Técnica nos seguintes termos (fls. 03/05, ID 123390585): “(…) O presente processo trata de auto de infração lavrado na ata de 04/10/2003, pelo desmatamento de 638 hectares de área de preservação permanente, infração enquadrada no artigo 25 do Decreto 3.1179/99, com multa indicada no valor de R$ 957.00,00. Além da autuação, observa-se que a área suprimida foi embargada através do termo e nº 201619/C (…) Entretanto, apesar dos autos terem sido remetidos para avaliar o pedido de conversão da multa pela adesão ao Programa de Regularização Ambiental (PRA), cabe de ofício, nos termos do artigo 53 da Lei 9.784/1999, reconhecer a nulidade procedimental na homologação da sanção, uma vez que não foi proferida decisão recursal pela autoridade competente, pois o Superintendente do Ibama em Mato Grosso do Sul já havia julgado a pasta em 1ª instância, e mesmo entendendo que a sua decisão não era passível de ser alterada, deveria encaminhar o processo à autoridade superior (Presidente do Ibama) para julgar a petição com característica de recurso, conforme determina o artigo 56, §1º, da citada lei, em vez de determinar o prosseguimento da cobrança do débito. De fato, o parecer jurídico que acolheu não enfatizou as etapas que deveriam ser seguidas, recomendando apenas a manutenção do julgamento proferido e a comunicação do evento ao Ministério Público (fls. 48/50). Desse modo, o erro de procedimento acabou por suprimir uma etapa processual prevista em lei (art. 57) e na Instrução Normativa vigente à época, tolhendo da parte autuada o exercício da ampla defesa, o que leva a concluir que todos os atos praticados no processo, desde a deliberação que determinou a evolução da cobrança em 08/08/2007 (fls. 53), são nulos, devendo o feito retroagir à fase recursal. (…)
Assim, diante dos fundamentos e fatos expostos, recomenda-se, em nome da autotutela administrativa e em razão da patente nulidade procedimental, que a Autoridade Competente para o exame processual profira decisão, nos termos do artigo 65 da Lei nº 9784/1999, determinando o cancelamento do auto de infração nº 371455/D e a baixa do débito. No mesmo julgamento deverá manter os efeitos do embargo aplicado através do termo de nº 201619/C, até que a parte autuada demonstre a regularidade ambiental plena, conforme explanado. Comunicar a Procuradoria Federal para baixar o débito da dívida ativa, em virtude da ocorrência da prescrição que afeta os autos, ao retornar o feito à fase processual não maculada pela nulidade. (...)”
4. Após a Nota Técnica, constam encaminhamentos entre a Procuradoria Federal e o IBAMA nos quais discutem a competência interna para a anulação do processo nº 02014.003304/2003-56. A demora no estabelecimento da autoridade competente para efetuar a autotutela não posterga a nulidade verificada pela própria administração.
5. Apelação provida.