Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000689-74.2019.4.03.6142

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: IVANETE DOS SANTOS VICENTINO 17403036875, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: YURI ANDERSON VICENTINO DA SILVA - SP422862-A

APELADO: SND DISTRIBUICAO DE PRODUTOS DE INFORMATICA S/A, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, IVANETE DOS SANTOS VICENTINO 17403036875

Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE RODRIGUES - SP100057-A, EVISLENE SOUZA DE OLIVEIRA - SP381397-A
Advogado do(a) APELADO: YURI ANDERSON VICENTINO DA SILVA - SP422862-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000689-74.2019.4.03.6142

RELATOR: Gab. 07 - DES. FED. NERY JÚNIOR

APELANTE: IVANETE DOS SANTOS VICENTINO 17403036875, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

Advogado do(a) APELANTE: YURI ANDERSON VICENTINO DA SILVA - SP422862-A

APELADO: SND DISTRIBUICAO DE PRODUTOS DE INFORMATICA S/A, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, IVANETE DOS SANTOS VICENTINO 17403036875

Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE RODRIGUES - SP100057-A, EVISLENE SOUZA DE OLIVEIRA - SP381397-A
Advogado do(a) APELADO: YURI ANDERSON VICENTINO DA SILVA - SP422862-A

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R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de apelação interposta por Ivanete dos Santos Vicentino e pela União Federal contra sentença que julgou improcedente o pedido de danos morais e homologou o acordo formulado entre a autora e a corré SND Distribuição de Produtos de Informática S.A., para determinar o cancelamento definitivo dos protestos lavrados junto ao 1º e ao 3º Tabelião de Protestos de Letras e Títulos de São Paulo.

A presente ação declaratória de inexistência de relação jurídica, cominada com pedido de sustação de protesto e indenização por danos morais, foi movida por Ivanete dos Santos Vicentino contra a União Federal e a empresa SND Distribuição de Produtos de Informática S.A., objetivando a declaração de inexigibilidade de débito tributário e a fixação da reparação civil por danos morais.

Narra a inicial que a autora se registrou como microempresa individual na área de artesanato, desde 08/07/2014, na cidade de Lins/SP, auferindo renda mensal de, aproximadamente, R$ 1.250,00.

Relata que, em 14/10/2019, ao renovar sua licença municipal para continuar exercendo suas atividades, foi surpreendida com a constatação de que seu cadastro junto ao Município de Lins/SP (alvará de licença) e à Receita Federal (cadastro de inscrição e situação cadastral da microempresa) haviam sido alterados, passando a indicar que a autora seria proprietária de uma papelaria, denominada “Aquarela Papelaria e Presentes”, localizada no Município de São Paulo, onde nunca residiu.

Conforme apurado em consulta cartorária, a sua microempresa teria, contra si, três protestos de títulos no 1º e no 3º Cartório de Protesto da Comarca de São Paulo/SP, originários de duplicatas mercantis por indicação (DMI) emitidas em decorrência de uma suposta compra parcelada, realizada em 12/05/2017, entre a autora e a SND Distribuidora de Produtos de Informática S.A., empresa localizada em Barueri/SP.

Sustenta que entrou em contato com a referida empresa e esta forneceu tanto a Nota Fiscal da compra, como o comprovante de entrega da mercadoria, a partir da qual se constou que o recebimento foi consumado por terceira pessoa, denominada Joice dos Santos Vicentino (RG nº 52.589.722-9) - a qual desconhece -, no endereço situado rua Projetada, 29A, Jardim dos Pereiras, em São Paulo/SP.

Aduz que providenciou o registro do boletim de ocorrências (BO nº 7078/2019) para a apuração das irregularidades relatadas, bem assim, propôs a presente demanda com o fito de buscar o provimento jurisdicional direcionado à reparação civil das lesões perpetradas em seu desfavor.

Foi deferido os pedidos de justiça gratuita e de tutela de urgência para o fim de suspender a exigibilidade do débito indicado nos protestos lavrados junto ao 1º e ao 3ª Tabeliães de Protesto de Letras e Títulos de São Paulo, em razão da DMI nº 69410, bem como a publicidade destes protestos, até segunda ordem (ID 144103068).

Regularmente processado o feito, sobreveio sentença que:

a) homologou o acordo firmado entre a autora e a corré SND Distribuição de Produtos de Informática S.A., pelo que determinou o cancelamento definitivo dos protestos lavrados junto ao 1º e ao 3º Tabelionato de Protestos de Letras e Títulos de São Paulo em razão da DMI nº 69410;

b) julgou improcedente o pedido de reparação de dano moral formulado em face da União Federal, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, I do CPC/15.

Foi concedido o benefício da justiça gratuita à parte autora, porém, o juízo a quo deixou de condená-la em custas e honorários advocatícios, em razão da gratuidade.

Opostos embargos de declaração pela União, foi negado o seu conhecimento (ID 144103257).

Irresignada, apela a demandante, alegando, preliminarmente, a nulidade da r. sentença, eis que o juízo de origem, ao não intimar a autora para se manifestar sobre a contestação, violou os princípios do contraditório e da ampla defesa.

No mérito, pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que restou demonstrado a responsabilidade civil objetiva da União, em face da má prestação dos serviços de administração e fiscalização dos registros de microempreendedor, no site criado pela Receita Federal do Brasil, omissão esta que permitiu a alteração fraudulenta, por terceiro, em seu registro empresarial, e, consequentemente, o protesto de títulos extrajudiciais em desfavor da empresa da autora.

Sustenta que também restou comprovado o dano moral da autora, na medida em que o próprio juízo a quo deferiu a suspensão da exigibilidade e publicidade da dívida, reconhecendo que “esta se encontrava prejudicada, pois, com o seu CNPJ inscrito em órgãos de proteção ao crédito, portanto, no rol dos inadimplentes, teria dificuldades em celebrar negócios jurídicos em geral”.

Alega que, embora o microempreendedor não seja considerado pessoa jurídica, nos termos do art. 44 do CC/02, para fins tributários possui inscrição no CNPJ e o próprio STJ já sumulou entendimento no sentido de que “a pessoa jurídica pode sofrer danos morais”, a teor do Enunciado sumular nº 227.

Pugna pela reforma da sentença para anulação da r. sentença ou, subsidiariamente, a condenação da União a título de danos morais.

Com contrarrazões da União (ID 144103288).

Por sua vez, apela a União Federal, pugnando pelo arbitramento de honorários advocatícios em desfavor da parte autora, vencida nesta demanda, ao fundamento de que a concessão da justiça gratuita não impede a sua fixação, embora o legislador tenha condicionado a sua exigibilidade à demonstração da alteração na situação financeira do condenado, nos termos do art. 98, §3º do CPC/15.

Contrarrazões da parte autora (ID 144103277).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000689-74.2019.4.03.6142

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APELANTE: IVANETE DOS SANTOS VICENTINO 17403036875, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

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Advogado do(a) APELADO: YURI ANDERSON VICENTINO DA SILVA - SP422862-A

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V O T O

 

 

O cerne da controvérsia diz respeito aos seguintes pontos: a) cerceamento de defesa, em razão da falta de intimação da demandante para se manifestar sobre a contestação; b) à configuração ou não da responsabilidade civil objetiva da União Federal por danos morais perpetrados contra a autora em razão de omissão na fiscalização e na administração do cadastro empresarial no Portal do Microempreendedor (MEI), o que permitiu a alteração fraudulenta do registro empresarial da recorrente, por terceiros, no site da Receita Federal do Brasil e posterior protesto de três títulos executivos extrajudiciais por dívidas indevidas contraídas em seu desfavor; e, c) a possibilidade de arbitramento da verba honorária nos casos que a parte autora, mesmo vencida na origem, é beneficiária da gratuidade de justiça.

Passo ao exame da preliminar de cerceamento de defesa levantado pela parte autora.

1. Da preliminar de nulidade processual por error in procedendo :

Preliminarmente, pugna, a recorrente, pela nulidade da r. sentença, ao fundamento de que o juízo de origem, ao não intimar a parte autora para se manifestar sobre a contestação, incorreu em erro in procedendo e violou os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Não merece acolhida a preliminar de cerceamento de defesa decorrente da não abertura de prazo para apresentação de réplica, nos moldes dos arts. 350, 351 e 373, II, todos do CPC/15.

Isto porque, quando não alegadas em contestação quaisquer das matérias previstas no artigo 337 do CPC/2015 ou qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autor, não há necessidade de abertura de prazo para réplica.

Nesse sentido, remansosa a jurisprudência desta Corte Regional:

“APELAÇÃO. CAUTELAR. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CAUÇÃO. BEM IMÓVEL. VALOR INFERIOR À DÍVIDA. POSSIBILIDADE DE RECUSA PELA UNIÃO FEDERAL. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Não prospera a preliminar de cerceamento de defesa suscitada pelo apelante. Com efeito, a obrigatoriedade de abrir prazo para réplica, nos termos do artigo 327, do Código de Processo Civil de 1973, só se dava em caso de alegação, pelo réu, de alguma das matérias preliminares elencadas o no artigo 301, do mesmo estatuto, o que não se verifica nos autos.

(...)

5. Apelação desprovida.”

(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 20266397 - 0002733-53.2014.4.03.6102, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO CEDENHO, julgado em 05/07/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/07/2017)

“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. MILITAR. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA RÉPLICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR AFASTADA. REFORMA POST MORTEM. NEOPLASIA MALIGNA. DOENÇA SEM RELAÇÃO DE CAUSA E EFEITO COM O SERVIÇO MILITAR. INVÁLIDO. ART. 108, V, DA LEI N. 6880/80. PENSÃO MILITAR. COMPANHEIRA. UNIÃO ESTÁVEL DEMONSTRADA. SENTENÇA JUDICIAL PROFERIDA EM AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DESCABIDA. ATUALIZAÇÃO DO DÉBITO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. APELAÇÃO DA AUTORA PROVIDA.

1. Apelação interposta pela parte autora contra sentença que julgou improcedente o pedido de anulação do ato de licenciamento com posterior reforma ex officio por incapacidade pós mortem e pensão militar e indenização por dano moral. Condenada a parte autora ao pagamento de honorários, no importe de 10% (dez por cento) sobre o valor da causa.

2. Preliminar de cerceamento de defesa. Não alegadas em contestação, como no caso dos autos, quaisquer das matérias previstas atualmente no artigo 337 do CPC/2015 ou qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito autor, não há necessidade de abertura de prazo para réplica. Preliminar afastada.

(...)

12. Recurso parcialmente provido.”

(TRF-3 - Ap: 00002270420144036103 SP, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, Data de Julgamento: 04/09/2018, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial 1 DATA:12/09/2018)

No caso dos autos, dentre as matérias contidas no art. 337 do CPC/15, somente a impugnação à gratuidade de justiça e a preliminar de falta de interesse agir foram levantadas pela União, em sede de contestação, sendo que ambas as matérias foram afastadas pelo juízo de origem, não havendo prejuízo ao autor.

A propósito, confira-se (grifei):

“PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO PARA RÉPLICA. NULIDADE INEXISTENTE. EX-COMBATENTE. REVERSÃO. LEI DE REGÊNCIA. LEIS 6592/78 E 7424/85. FILHA MAIOR. IMPROCEDÊNCIA. ORIENTAÇÃO DO STJ. TUTELA RECURSAL INDEFERIDA. RECURSO DESPROVIDO. -Cinge-se a controvérsia à anulação da sentença, ao reconhecimento do direito à autora ao recebimento da pensão de ex-combatente, por reversão, além da possibilidade de concessão da tutela recursal -Quanto à nulidade da sentença, não assiste razão à apelante. É que, como, na espécie, a questão envolvida é estritamente de direito, já estando presentes os elementos necessários à formação do convencimento do Juiz, desnecessária a apresentação de réplica. Precedente do STJ: REsp 1051652/TO, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/09/2011, DJe 03/10/2011. Ademais, não há falar em nulidade sem demonstração de prejuízo -No tocante ao mérito, verifica-se que, de acordo com o entendimento pacificados nas Cortes Superiores, a pensão conferida a dependente de ex-combatente é regida pela legislação vigente à época do falecimento de seu instituidor -In casu, o ex-combatente, pai da autora, faleceu em 01/06/1985 (fl. 32), quando então vigente a Lei 6592, de 17 de novembro de 1978, que concedeu amparo aos ex-combatentes julgados incapazes definitivamente para o serviço militar. A referida legislação, no artigo 1º, estipulou que a concessão seria no valor de duas vezes o maior salário mínimo vigente no país e que "Art. 2º. A pensão especial de que trata esta Lei é intransferível e inacumulável com quaisquer rendimentos recebidos dos cofres públicos, inclusive pensão previdenciária, ressalvado o direito de opção" -Posteriormente, foi editada a Lei 7424, de 17 de dezembro de 1985, que, dispondo sobre a pensão especial de que trata a Lei 6592, revogou o artigo 2º da Lei 6592/78 e estabeleceu, em seus artigos 1º e 2º, a possibilidade de a pensão ser transferida, na hipótese de falecimento do titular, à viúva e aos filhos menores ou interditos ou inválidos e sua acumulação com benefícios previdenciários. -E, na espécie, tendo a autora nascido em 31/05/1961 (fl. 15), era maior de 21 anos quando do óbito do instituidor da pensão, além de não ter sido comprovada a situação de interdição ou invalidez, não faz jus à reversão da pensão -A propósito, orientação do STJ:RESP 1171258, Ministra LAURITA VAZ, 09/12/2011 -No tocante à concessão da tutela recursal, tendo restado evidenciada a inexistência da verossimilhança da pretensão autoral, conforme fundamentação supra, não há como acolher tal postulação -Recurso desprovido.”

(TRF-2 - AC: 00021278420104025102 RJ 0002127-84.2010.4.02.5102, Relator: VERA LÚCIA LIMA, Data de Julgamento: 05/06/2013, 8ª TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: 12/06/2013)

Deste modo, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa.

Passo à apreciação do mérito.

2. Do mérito:

Antes de se adentrar na questão de fundo trazida à lume, cumpre ressaltar que o juízo de origem homologou o acordo extrajudicial de reconhecimento da inexistência da relação jurídica firmado entre a parte autora e a corré SND Distribuição de Produtos de Informática S.A., bem assim, determinou o cancelamento definitivo dos protestos lavrados junto ao 1º e ao 3º Tabeliães de Protestos de Letras e Títulos de São Paulo, em razão da DMI nº 69410.

Inicialmente, cumpre mencionar que o presente caso apresenta nítidos contornos de responsabilidade civil objetiva, a qual prescinde da comprovação da culpa do agente ou da má prestação do serviço, à luz do art. 37, §6º da CF/88, encampada pela teoria do risco administrativo, ora adotada pelo ordenamento jurídico pátrio.

Vejamos:

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:     

(...)

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”

No mesmo sentido, o Código Civil estabelece que a responsabilidade civil do ente público se afigura objetiva, senão vejamos:

“Art. 43. As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo.”

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito ( arts. 186 e 187 ), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”

Nos casos de omissão da Administração Pública, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 841.526/RS, com repercussão geral reconhecida, estabeleceu que a responsabilidade civil do Estado por omissão também está fundamentada no art. 37, §6º da Constituição Federal, ou seja, a configuração do nexo causal impõe o dever de indenizar, independente da prova da culpa administrativa.

Assim, tanto as ações comissivas ou omissivas das pessoas jurídicas de direito público requerem a verificação do preenchimento do nexo de causalidade, embora existam situações que rompem este nexo, quais sejam: o caso fortuito, a força maior e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiros.

Acerca do tema versado nos autos, a Lei Complementar nº 123/2006 estabelece que cabe ao Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM), vinculado à Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, regulamentar a inscrição, cadastro, abertura, alvará, arquivamento, licenças, permissão, autorização, registros e demais atos relativos à abertura, legalização e funcionamento dos empresários e de pessoa jurídica de pequeno porte, nos moldes de seu art. 2º, III e §7º, senão vejamos:

“Art. 2º O tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte de que trata o art. 1o desta Lei Complementar será gerido pelas instâncias a seguir especificadas:

III - Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios - CGSIM, vinculado à Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, composto por representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal, dos Municípios e demais órgãos de apoio e de registro empresarial, na forma definida pelo Poder Executivo, para tratar do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas. 

§ 7 º   Ao Comitê de que trata o inciso III do caput deste artigo compete, na forma da lei, regulamentar a inscrição, cadastro, abertura, alvará, arquivamento, licenças, permissão, autorização, registros e demais itens relativos à abertura, legalização e funcionamento de empresários e de pessoas jurídicas de qualquer porte, atividade econômica ou composição societária.”

Ainda, segundo a referida Lei Complementar, o processo de abertura, registro, alteração e baixa da microempresa e empresa de pequeno porte, bem como qualquer exigência para o início do seu funcionamento deverão ter trâmite simplificado e, preferencialmente, eletrônico, nos moldes do seu art. 4º, §1º e I, confira-se:

“Art. 4o  Na elaboração de normas de sua competência, os órgãos e entidades envolvidos na abertura e fechamento de empresas, dos 3 (três) âmbitos de governo, deverão considerar a unicidade do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas, para tanto devendo articular as competências próprias com aquelas dos demais membros, e buscar, em conjunto, compatibilizar e integrar procedimentos, de modo a evitar a duplicidade de exigências e garantir a linearidade do processo, da perspectiva do usuário.

§ 1o  O processo de abertura, registro, alteração e baixa da microempresa e empresa de pequeno porte, bem como qualquer exigência para o início de seu funcionamento, deverão ter trâmite especial e simplificado, preferencialmente eletrônico, opcional para o empreendedor, observado o seguinte:                       

I - poderão ser dispensados o uso da firma, com a respectiva assinatura autógrafa, o capital, requerimentos, demais assinaturas, informações relativas ao estado civil e regime de bens, bem como remessa de documentos, na forma estabelecida pelo CGSIM; (...)”

Cumpre ressaltar que, para disciplinar o procedimento especial de registro, licenciamento, alteração, baixa, cancelamento, suspensão, anulação e legalização do MEI, o CGSIM editou a Resolução nº 48, de 11 de outubro de 2018, por meio da qual dispõe que o referido procedimento se perfaz por meio do Portal do Empreendedor, dispensando o uso de formulários, papel e aposição de assinaturas, in verbis:

“Art. 1 º O procedimento especial de registro, licenciamento, alteração, baixa, cancelamento, suspensão, anulação e legalização do MEI, por meio do Portal do Empreendedor, obedecerá ao disposto nesta Resolução, devendo ser observado pelos órgãos e entidades federais, estaduais, distritais e municipais responsáveis pelo registro, alteração, baixa e concessão de inscrições tributárias, alvarás e licenças de funcionamento.”

(...)

“Art. 3º O processo de registro, alteração, licenciamento, anulação, suspensão, baixa e legalização do MEI observará as disposições da Lei nº 11.598, de 3 de dezembro de 2007, da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006 e suas alterações, assim como as seguintes diretrizes específicas:

I - constituir-se a implementação da formalização e da legalização do MEI por meio do Portal do Empreendedor, observando-se as fases e etapas da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios - REDESIM;

II - incorporar automação intensiva, alta interatividade e integração dos processos e procedimentos dos órgãos e entidades envolvidos;

III - integrar, de imediato, ao Portal do Empreendedor, processos, procedimentos e instrumentos referentes à inscrição do MEI na Secretaria da Receita Federal do Brasil - RFB e nas Juntas Comerciais;

IV - integrar, gradualmente, ao Portal do Empreendedor, processos, procedimentos e instrumentos referentes à inscrição do MEI no Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, e à obtenção de inscrição, alvarás e licenças para funcionamento nos órgãos e entidades estaduais e municipais responsáveis pela sua emissão;

V - deverá ser simples e rápido, de forma que o MEI possa efetuar seu registro, alteração, licenciamento, desenquadramento, baixa e legalização por meio do Portal do Empreendedor, dispensando-se completamente o uso de formulários em papel e a aposição de assinaturas autografas;

VI - não haver custos para o MEI relativamente à prestação dos serviços de apoio à formalização, assim como referentes às ações dos órgãos e entidades pertinentes à inscrição e legalização necessárias ao início de funcionamento de suas atividades, conforme estabelecido no § 3º do art. 4º da Lei Complementar nº 123, de 2006;

VII - possibilitar o funcionamento do MEI imediatamente após as inscrições eletrônicas na Junta Comercial e no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), mediante a sua manifestação, por meio eletrônico, de concordância com o conteúdo do Termo de Ciência e de Responsabilidade com Efeito de Alvará e Licença de Funcionamento Provisório; e

VIII - disponibilizar ao empreendedor, para impressão, via eletrônica do Certificado da Condição de Microempreendedor Individual - CCMEI, documento hábil para comprovar suas inscrições, alvarás, licenças e sua situação de enquadramento na condição de MEI perante terceiros, possibilitando a verificação de sua autenticidade na Internet, no endereço http://www.portaldoempreendedor.gov.br.”

Depreende-se da leitura dos referidos dispositivos, que a inscrição na Junta Comercial e no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas ocorre de forma imediata, mediante a manifestação de concordância do MEI, por meio eletrônico, com o conteúdo do Termo de Ciência e de Responsabilidade com Efeito de Alvará e Licença de Funcionamento Provisório.

Isto posto, embora o procedimento tenha sido criado para simplificar e desburocratizar a formalização do registro do microempreendedor individual, de fato, dá margens à ocorrência de fraudes, tal como a verificada na espécie, na medida em que realizado totalmente em ambiente virtual, através do Portal do Empreendedor, o qual somente requer o preenchimento de dados no sistema, não sendo necessário, sequer, a exigência de assinaturas ou o envio de cópia de documento que comprovem a autenticidade do empresário.

Nesse sentido, confira-se o seguinte precedente jurisprudencial:

 “ADMINISTRATIVO. ANULAÇÃO DE REGISTRO DE MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL PERANTE A JUNTA COMERCIAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS. RESPONSABILIDADE DA JUNTA E DA UNIÃO. DANOS MORAIS CONFIGURADOS.

1. Uma vez constatado que a autora teve seu nome e CPF vinculados à microempresa que não criou, tendo um terceiro se utilizado do Portal do Empreendedor (www.portaldoempreendedor.gov.br), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, integrante da Administração Pública Federal, para formalizar a existência da uma empresa em seu nome, deve a União e a Junta Comercial de Minas Gerais cancelar todos os registros relacionados ao Certificado de Microempresário e CNPJ desta microempresa.

2. O sistema criado pelo Governo Federal para criação da pessoa jurídica do microempreendedor, no Portal do Empreendedor (www.portaldoempreendedor.gov.br), dá margem à realização de fraudes, eis que para formalizar a criação da empresa basta o fornecimento de dados sem necessidade de assinaturas ou envio de documentos e cópias. Tudo é feito eletronicamente. Portanto, tal sistema não resguarda, por meio de certificação digital ou outros métodos, que o real interessado se utilize de seu nome para criar uma pessoa jurídica. 

3. Considerando que a sistemática desburocratizada e simplificada para a criação da pessoa jurídica do microempreendedor individual foi idealizada e colocada em prática pelo Governo Federal, verifica-se a legitimidade passiva da União para responder a ação, bem como a responder pelas conseqüências danosas de tal sistemática. À Junta Comercial, por seu turno, compete o recebimento, armazenamento dos dados e fornecimento do número de inscrição e, eventualmente, ao final da lide, comprovado o direito da autora, efetuar a baixa nos registros da empresa, pelo que deve permanecer no polo passivo da lide.

4. A falha no serviço por parte da União e da JUCEMG causou dano moral à autora, que deve ser compensado.”

(TRF4, AC 5000887-62.2016.4.04.7218, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 05/09/2018).

Na hipótese em comento, a parte autora foi vítima de atos fraudulentos em seu registro cadastral de microempresa individual, por terceiros, no site do Portal do Empreendedor, conforme Certificado da Condição de Microempreendedor Individual extraído do site da Receita Federal (ID 144103055), no qual consta alteração do ramo de atividade empresarial e a adulteração do respectivo nome fantasia para “Aquarela Papelaria e Presentes”, quando, originariamente, atuava no ramo de artesanato, conforme Certificado MEI (ID 144103046), comprovado nos autos.

Em decorrência disso, também restou incontroverso que a autora contraiu dívidas indevidas em razão do protesto por falta de pagamento de três títulos executivos extrajudiciais, no 1º e no 3º Cartório de Letras e Títulos de São Paulo, no valor de R$ 936,82, respectivamente (ID 144103053).

Ressalte-se que o modus operandi dos fraudadores foi facilitado pela exigência de requisitos simplificados pouco relevantes para a segurança dos dados e da veracidade do registro das informações cadastrais por meio do Portal do Empreendedor do Governo Federal, implementado e gerido pela União, do que se extrai a sua responsabilidade civil objetiva na espécie, ante a flagrante ausência de conferência de dados e informações relativas à alteração cadastral da recorrente.

Sobreleva anotar que a responsabilidade civil de terceiro pela fraude perpetrada, não afasta a responsabilidade civil da União, pois a sua participação no evento danos decorre do gerenciamento, fiscalização e administração do serviço digital oferecido na plataforma virtual para o cadastramento do microempresário.

A propósito, confira-se:

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DANOS MORAIS. CRIAÇÃO FRAUDULENTA DE PESSOA JURÍDICA. PORTAL DO EMPREENDEDOR. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA UNIÃO FEDERAL. VALOR DA INDENIZAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA.

- Preliminar de falta de interesse de agir sustentada pela União não conhecida: os pedidos referentes à declaração de inexistência e consequente desconstituição da empresa foram extintos sem exame do mérito, justamente porque reconhecidos administrativamente.

- No mérito, o pedido de danos morais é procedente. Consta nos autos que, em 24 de maio de 2016, a autora foi surpreendida ao tentar adquirir um automóvel e ser informada pelo vendedor de que seu CPF estava vinculado a empresa com débitos comerciais na praça.

- A prova documental carreada aos autos demostra que houve a constituição fraudulenta de empresa em nome da autora. Tanto que, por intermédio de Ato Declaratório publicado em 24/06/2016, a Receita Federal do Brasil declarou a nulidade da inscrição no CNPJ da empresa, com efeitos a partir de 14/10/2013 (ID 923340).

- Ressalto que a Secretaria da Receita Federal do Brasil é um órgão específico, singular, subordinado ao Ministério da Fazenda, exercendo funções essenciais para que o Estado possa cumprir seus objetivos, logo, aplica-se, na espécie, o § 6º, do art. 37, da Constituição Federal.

- É evidente que a autora foi vítima de fraudes perpetradas por terceiros e quanto a isso não há discussão. No entanto, a responsabilidade da União está presente na administração e fiscalização do procedimento que permite a abertura do MEI.

- Com relação ao valor da indenização, embora certo que a condenação por dano moral não deve ser fixada em valor excessivo, gerando enriquecimento sem causa, não pode, entretanto, ser arbitrada em valor irrisório, incapaz de propiciar reparação do dano sofrido e de inibir o causador do dano a futuras práticas da mesma espécie.

- Na hipótese, diante das circunstâncias constantes nos autos, o valor da indenização deve ser mantido em R$ 15.000,00 (quinze mil reais).

- Apelação da União parcialmente conhecida e, na parte conhecida, improvida.”

(TRF3, ApCiv 5000194-82.2017.4.03.6115, Rel. Des. Federal MÔNICA NOBRE, QUARTA TURMA, J. 08/11/2019, DJe 14/11/2019)

Além disso, são direitos básicos do consumidor, nos termos do art. 6º, X do CDC, “a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral”, a serem fornecidos pelos órgãos públicos, sendo que o descumprimento desse dever legal enseja a reparação civil dos danos causados, na forma do art. 22 do diploma consumerista, in verbis:

“Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste código."

Logo, a negligência da União na conferência dos dados cadastrais, aliado à sistemática simplificada e despida de certificação digital ou outro elemento de segurança da informação, contribuíram para a configuração da responsabilidade civil da União.

3. Do dano moral:

Com efeito, a Constituição Federal assegura, em seu art. 5º, inciso X, o direito à indenização por dano moral ou material decorrente de violação à honra ou imagem das pessoas, objetivando atenuar sofrimento físico ou psíquico decorrente de ato danoso que atinge aspectos íntimos ou sociais da personalidade humana.

Em se tratando de pessoa jurídica, a jurisprudência consolidada da Corte Superior admite a possibilidade deste ente público sofrer dano moral, entendimento este consolidado pelo Enunciado da Súmula 227 do STJ, senão vejamos:

“Súmula 227: A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”.

Contudo, para a caracterização do dano moral da pessoa jurídica é necessário que a ofensa atinja a sua imagem ou a sua identidade no âmbito comercial, bem como se afigura imprescindível a efetiva comprovação do dano, pois o fato suscitado como danoso, o protesto de títulos em Cartório de Protestos, conquanto indevido, não é apto a causar, por si só, dano moral à pessoa jurídica, não gerando, necessariamente, o dever de indenizar.

Consoante lições de Nelson Rosenvald, a personificação das pessoas jurídicas não se confunde com os direitos da personalidade, de maneira que eventuais lesões à reputação destes entes repercutem em sua atividade econômica, podendo-se cogitar de um dano institucional, mas não de dano moral, propriamente dito, confira-se:

“Não se pode confundir a personificação das pessoas jurídicas – pela concessão de capacidade de direito e de fato pelo ordenamento para a aquisição de direitos patrimoniais – com a personalidade, que é um valor próprio do ser humano, que antecede mesmo ao direito. As lesões atinentes à reputação da pessoa jurídica, face à perda de sua credibilidade no mercado, repercutem em sua atividade econômica (quando não atingem os sócios). Poder-se-ia, mesmo, cogitar de um dano institucional contra a pessoa jurídica, mas não do dano moral propriamente dito.”

(In, Direito das obrigações. Rio de Janeiro: Impetus, 3ª ed., 2004, p. 283)

Sobreleva anotar que o Enunciado 286 da IV Jornada de Direito Civil do CJF, ao interpretar o art. 52 do Código Civil, reafirmou o entendimento doutrinário no sentido de que “os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos”.

Desse modo, é possível concluir que o dano moral eventualmente sofrido pela pessoa jurídica não é idêntico àquele suportado pela pessoa natural, na medida que o “patrimônio moral” desta é diferente daquela, pois apresentam repercussões diferenciadas, ensejando tratamento distinto no que pertine à questão probatória.

Cumpre mencionar que o entendimento jurisprudencial do STJ é pela inadmissão de que o dano moral seja considerado in re ipsa para as pessoas jurídicas, vejamos os seguintes precedentes:

“CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PROTESTO INDEVIDO. PAGAMENTO EM ATRASO. DANOS MORAIS. PESSOA JURÍDICA.

1. Ação ajuizada em 14/01/2011. Recurso especial interposto em 11/02/2015 e atribuído a este gabinete em 25/08/2016.

2. Para a pessoa jurídica, o dano moral não se configura in re ipsa, por se tratar de fenômeno muito distinto daquele relacionado à pessoa natural. É, contudo, possível a utilização de presunções e regras de experiência no julgamento.

3. Afigura-se a ilegalidade no protesto de título cambial, mesmo quando pagamento ocorre em atraso.

4. Nas hipóteses de protesto indevido de cambial ou outros documentos de dívida, há forte presunção de configuração de danos morais. Precedentes.

5. Recurso especial provido.”

(REsp 1564955/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 06/02/2018, DJe 15/02/2018)

“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA A DISPOSITIVO DA CF. COMPETÊNCIA DA SUPREMA CORTE. VULNERAÇÃO A VERBETE SUMULAR. SÚMULA 518/STJ. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA FIRMADA COM BASE EM FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE DANOS MORAIS IN RE IPSA À PESSOA JURÍDICA. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.

1. Apreciação de vulneração de artigo da Constituição Federal é de competência da Suprema Corte e texto de súmula não viabiliza recurso especial, conforme Súmula 518/STJ.

2. O Tribunal de Justiça firmou que, segundo as provas dos autos, a mensagem veiculada no site da Adecon pelo recorrido não teve o condão de macular a honra da recorrente, pessoa jurídica. Portanto, com base em provas e fatos, o julgado afastou a indenização por danos morais, atraindo a aplicação da Súmula 7/STJ por ambas as alíneas do permissivo constitucional.

3. Para a pessoa jurídica, "o dano moral é fenômeno distinto daquele relacionado à pessoa natural. Não se aceita, assim, o dano moral em si mesmo, isto é, como uma decorrência intrínseca à existência de ato ilícito. Necessidade de demonstração do prejuízo extrapatrimonial" (REsp 1.497.313/PI, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 07/02/2017, DJe 10/02/2017).

4. Agravo interno desprovido.”

(AgInt no AREsp 1295421/SC, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/09/2018, DJe 18/09/2018)

Embora não se desconheça alguns posicionamentos do STJ sobre a possibilidade da utilização de presunções e regras de experiência, pelo julgador, para a configuração do dano, de fato, estas medidas não representam a hipótese versada nestes autos, porquanto, não restou efetivamente comprovado o dano moral na espécie.

Nesse contexto, a jurisprudência pátria tem exigido a necessidade de demonstração da efetiva lesão à honra objetiva da empresa para fins de condenação por danos morais da pessoa jurídica, na linha dos precedentes do STJ, o qual, por sua vez, não admite a mera alegação do dissabor, devendo, isto sim, atingir a esfera dos direitos da personalidade, notadamente, a sua imagem, identidade, respeito e credibilidade no âmbito comercial.

Vejamos os seguintes precedentes:

“RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. INSCRIÇÃO CADIN. PESSOA JURÍDICA INOCORRÊNCIA. Restou comprovado de que a parte autora estava apontada no cadastro por inúmeras outras inscrições. Também não restou demonstrado que a parte autora, pessoa jurídica, tenha experimentado dano moral, especialmente porque desde 2002 está inativa e no período anterior nada indica que as inscrições tenham afetado sua imagem perante terceiros. Em relação às pessoas jurídicas, a jurisprudência entende que para a caracterização do dano moral necessário que a ofensa atinja a sua imagem ou a sua identidade no âmbito comercial, bem como imprescindível a efetiva comprovação do dano. Diversamente da alegação do demandante, havendo inscrição nos órgão de proteção ao crédito preexistente, inexiste dano moral a ser indenizado, exceto o cancelamento da dívida inexistente.”

(TRF-4 - AC: 50038293120154047112 RS 5003829-31.2015.404.7112, Relator: LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, Data de Julgamento: 14/12/2016, QUARTA TURMA)

“ADMINISTRATIVO. INSCRIÇÃO EM CADASTROS DE INADIMPLÊNCIA. NOTIFICAÇÃO DO ART. 2º, PARÁGRAFO 2º, DA LEI Nº 10.522/02. INOBSERVÂNCIA. REGISTRO. NULIDADE. PRECEDENTES DO COL. STF. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. 1. Acerca da inscrição no CADIN, o art. 2º da lei 10.522/2002, preceitua: "parágrafo 2º. A inclusão no Cadin far-se-á 75 (setenta e cinco) dias após a comunicação ao devedor da existência do débito passível de inscrição naquele Cadastro, fornecendo-se todas as informações pertinentes ao débito. (...)" 2. Não houve prova nos autos da notificação. Dessa forma, o devido processo legal, especificamente o contraditório e ampla defesa, não foi atendido, razão pela qual se impõe a anulação da inscrição no CADIN. 3. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou no sentido de ser possível indenização por danos morais à pessoa jurídica, conforme a Súmula 227. Entretanto, a empresa apelante não colaciona aos autos qualquer prova capaz de demonstrar que houve ofensa a sua honra objetiva ou perda na credibilidade da empresa, não sendo então cabível o seu reconhecimento. 4. O provimento de parte dos pedidos altera a sucumbência e justifica a incidência das disposições do caput do Artigo 21 do CPC, devendo as partes suportar, reciprocamente, as custas e honorários de sucumbência. 5. Apelação parcialmente provida.”

(TRF5, AC 200883000130370, Desembargador Federal Marcelo Navarro, TERCEIRA TURMA, DJE - Data::26/06/2012 - Página::144.)

“DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. PESSOA JURÍDICA. DÉBITO EQUIVOCADO DA CONTA BANCÁRIA. MERO ABORRECIMENTO. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. INEXISTÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO OU PUBLICIDADE. 1. O acórdão recorrido, com base na soberana análise das provas, entendeu inexistir dano moral no caso em apreço, uma vez que "não houve abalo de crédito, negativação perante os órgãos de restrição, mas apenas aborrecimento de ter de regularizar situação que lhe era inesperada". Com efeito, a conclusão a que chegou o Tribunal a quo não se desfaz sem incursão no acervo probatório, providência vedada pela Súmula 7/STJ. 2. Toda a edificação da teoria acerca da possibilidade de pessoa jurídica experimentar dano moral está calçada na violação de sua honra objetiva, consubstanciada em atributo externalizado, como uma mácula à sua imagem, admiração, respeito e credibilidade no tráfego comercial. Assim, a violação à honra objetiva está intimamente relacionada à publicidade de informações potencialmente lesivas à reputação da pessoa jurídica. 3. Agravo regimental não provido.”

(STJ - AgRg no AREsp: 389410 SP 2013/0290944-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 18/12/2014, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/02/2015)

O compulsar dos autos revela que as alegações recursais são restritas a meros aborrecimentos, despidas de elementos de prova que demonstrem a ofensa à reputação da pessoa jurídica autora, tal como a inscrição do nome da microempresa autora no CADIN e se, desta negativação, lhe resultou em ofensa à sua honra objetiva, notadamente porque, para se atingir a imagem ou a identidade no âmbito comercial, necessário se faz a prova de que as atividades econômico-financeiras foram atingidas, seja por impedi-la de renovar contratos, seja para realizar operações de crédito com instituições financeiras, nenhuma delas demonstradas na espécie.

Da análise dos autos, verifica-se que não houve a prova efetiva de prejuízos financeiros ou do abalo creditício, ocasionado pelo protesto de títulos ou pela impossibilidade de realização de negócios jurídicos, mas, apenas, o aborrecimento pela regularização de situação de inadimplência indevida e inesperada.

Cabia à apelante comprovar, concretamente, os danos morais ocasionados à sua honra objetiva, inocorrente na espécie.

Desse modo, embora configurada a responsabilidade civil da União, à luz do ordenamento jurídico pátrio e pelo cotejo de provas amealhadas aos autos, não há como reconhecer o dano moral indenizável.

Prosseguindo, pleiteia a União o arbitramento de honorários advocatícios em desfavor da parte autora, vencida nesta demanda, ao fundamento de que a concessão da justiça gratuita não impede a sua fixação, embora o legislador tenha condicionado a sua exigibilidade à demonstração da alteração na situação financeira do condenado.

Diante a sucumbência integral da demandante nesta via recursal, considerando a manutenção do resultado do julgamento, fixo os honorários advocatícios em 10% do valor atualizado da causa, à luz do art. 85, §4º, III do CPC/15, sopesando as balizas do art. 85, §2º do CPC/15, com a ressalva de que a exigibilidade do pagamento resta suspensa, à luz do art. 98, §3º do CPC/15.

Ante o exposto, nego provimento à apelação da parte autora e dou provimento ao apelo da União, mantendo, na íntegra, a r. sentença.

É COMO VOTO.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PROTESTO DE TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDICIAIS. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. ALTERAÇÃO FRAUDULENTA CADASTRAL. PORTAL DO MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL. RESPONSABILIADE CIVIL DA UNIÃO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DANO À IMAGEM OU À IDENTIDADE NO ÂMBITO PRORISSIONAL. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. APELO DA PARTE AUTORA IMPROVIDO. APELO DA UNIÃO PROVIDO.

01. O cerne da controvérsia diz respeito aos seguintes pontos: a) cerceamento de defesa, em razão da falta de intimação da demandante para se manifestar sobre a contestação; b) à configuração ou não da responsabilidade civil objetiva da União Federal por danos morais perpetrados contra a autora em razão de omissão na fiscalização e na administração do cadastro empresarial no Portal do Microempreendedor (MEI), o que permitiu a alteração fraudulenta do registro empresarial da recorrente, por terceiros, no site da Receita Federal do Brasil e posterior protesto de três títulos executivos extrajudiciais por dívidas indevidas contraídas em seu desfavor; e, c) a possibilidade de arbitramento da verba honorária nos casos que a parte autora, mesmo vencida na origem, é beneficiária da gratuidade de justiça.

02. A ausência de intimação da parte autora para apresentação de réplica não implica, necessariamente, em cerceamento de defesa. Na hipótese, embora a União tenha arguido duas das matérias dispostas no art. 337 do CPC/15, em sede de contestação, ambas as preliminares foram afastadas pelo juízo de origem, não havendo que se falar em prejuízo para o demandante. Preliminar afastada.

03. Inicialmente, cumpre mencionar que o art. 37, § 6º, da Carta Política consagra a responsabilidade civil objetiva do Estado, calcada na teoria do risco administrativo, ora adotada pelo ordenamento jurídico pátrio. Para a sua configuração, é necessário a comprovação dos seguintes requisitos: conduta lesiva imputável a um de seus agentes, dano indenizável e nexo de causalidade, restando dispensada a prova da culpa.

04. No vertente caso, a parte autora (microempresa individual) foi vítima de atos fraudulentos em seu registro cadastral, por terceiros, no site do Portal do Empreendedor, conforme Certificado anexo (ID 144103055), no qual consta alteração do ramo de atividade empresarial e a adulteração do nome fantasia para “Aquarela Papelaria e Presentes”, quando, originariamente, atuava no ramo de artesanato, conforme Certificado MEI (ID 144103046), comprovado nos autos. Em decorrência disso, também restou incontroverso que a autora contraiu dívidas indevidas em razão do protesto por falta de pagamento de três títulos executivos extrajudiciais, no 1º e no 3º Cartório de Letras e Títulos de São Paulo, no valor de R$ 936,82, respectivamente (ID 144103053).

05. Ressalte-se que o modus operandi dos fraudadores foi facilitado pela exigência de requisitos simplificados pouco relevantes para a segurança dos dados e da veracidade do registro das informações cadastrais por meio do Portal do Empreendedor do Governo Federal, implementado e gerido pela União, do que se extrai a sua responsabilidade civil objetiva na espécie, ante a flagrante ausência de conferência de dados e informações relativas à alteração cadastral da recorrente.

06. Em se tratando de pessoa jurídica, a jurisprudência consolidada da Corte Superior admite a possibilidade deste ente público sofrer dano moral, entendimento este consolidado pelo Enunciado da Súmula 227 do STJ.

07. Contudo, para a caracterização do dano moral da pessoa jurídica é necessário que a ofensa atinja a sua imagem ou a sua identidade no âmbito comercial, bem como se afigura imprescindível a efetiva comprovação do dano, pois o fato suscitado como danoso, o protesto de títulos em Cartório de Protestos, conquanto indevido, não é apto a causar, por si só, dano moral à pessoa jurídica, não gerando, necessariamente, o dever de indenizar.

05. Consoante lições de Nelson Rosenvald, a personificação das pessoas jurídicas não se confunde com os direitos da personalidade, de maneira que eventuais lesões à reputação destes entes repercutem em sua atividade econômica, podendo-se cogitar de um dano institucional, mas não de dano moral, propriamente dito.

06. Sobreleva anotar que o Enunciado 286 da IV Jornada de Direito Civil do CJF, ao interpretar o art. 52 do Código Civil, reafirmou o entendimento doutrinário no sentido de que “os direitos da personalidade são direitos inerentes e essenciais à pessoa humana, decorrentes de sua dignidade, não sendo as pessoas jurídicas titulares de tais direitos”. Desse modo, é possível concluir que o dano moral eventualmente sofrido pela pessoa jurídica não é idêntico àquele suportado pela pessoa natural, na medida que o “patrimônio moral” desta é diferente daquela, pois apresentam repercussões diferenciadas, ensejando tratamento distinto no que pertine à questão probatória.

07. Ressalte-se que a jurisprudência do STJ não admite o dano moral in re ipsa para as pessoas jurídicas - tal como aplicável às pessoas físicas -, sendo necessário, para a configuração do dano moral, a demonstração da efetiva lesão a direitos da personalidade, notadamente, a sua imagem ou identidade no âmbito comercial, na linha dos precedentes do STJ, o qual, por sua vez, não admite a mera alegação do dissabor, devendo, isto sim, atingir a esfera dos direitos personalíssimos.

08. No presente caso, o compulsar dos autos revela que as alegações recursais são restritas a meros aborrecimentos, despidas de elementos de prova que demonstrem a ofensa à reputação da pessoa jurídica autora, tal como a inscrição do nome da microempresa autora no CADIN e se, desta negativação, lhe resultou em ofensa à sua honra objetiva, notadamente porque, para se atingir a imagem ou a identidade no âmbito comercial, necessário se faz a prova de que as atividades econômico-financeiras foram atingidas, seja por impedi-la de renovar contratos, seja para realizar operações de crédito com instituições financeiras, nenhuma delas demonstradas na espécie.

09. Da análise dos autos, verifica-se que não houve a prova efetiva dos prejuízos financeiros ou do abalo de crédito, ocasionado pelo protesto de títulos ou pela impossibilidade de realização de negócios jurídicos, mas, apenas, o aborrecimento pela regularização de situação de inadimplência indevida e inesperada. Cabia à apelante comprovar, concretamente, os danos morais ocasionados à sua honra objetiva, inocorrente na espécie. Desse modo, embora configurada a responsabilidade civil da União, à luz do ordenamento jurídico pátrio e pelo cotejo de provas amealhadas aos autos, não há como reconhecer o dano moral indenizável.

10. Sucumbência integral da recorrente. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, à luz do art. 85, §4º, III do CPC/15, em observância às balizas do art. 85, §2º do CPC/15, com a ressalva de que a exigibilidade do pagamento resta suspensa, à luz do art. 98, §3º do CPC/15.

11. Apelação da parte autora improvido. Apelação da União provida.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação da parte autora e deu provimento ao apelo da União, mantendo, na íntegra, a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.