Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318153-73.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES

APELANTE: LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL

Advogado do(a) APELADO: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318153-73.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES

APELANTE: LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL

Advogado do(a) APELADO: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

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R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de apelações interpostas por LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL e pelo INSS em face da r. sentença, não submetida ao reexame necessário, que julgou parcialmente procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a restabelecer o auxílio-doença à parte autora, desde a cessação administrativa, em 05/06/2018, encaminhando-a ao programa de reabilitação profissional. Determinada a correção monetária das prestações em atraso, de acordo com o prescrito na Lei n. 6.899/1981, legislação superveniente, Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal e decisão proferida no RE n. 870.947, acrescidas de juros de mora, além de arbitrados os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação (art. 85, § 3º, do CPC e Súmula n. 111 do STJ). Concedida a tutela provisória.

Em razões recursais, a parte autora requer a reforma da sentença para que lhe seja assegurada a concessão de aposentadoria por invalidez.

Por sua vez, o INSS sustenta que o autor não faz jus ao benefício deferido, pois está apto para o exercício de outras atividades. Subsidiariamente, pugna pelo afastamento da determinação de reabilitação profissional e aplicação da Lei n. 11.960/2009, quanto à correção monetária.

Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5318153-73.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES

APELANTE: LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIO MAURO MARTINS RAFAEL

Advogado do(a) APELADO: SILVIA WIZIACK SUEDAN - SP119119-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

Afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.

De fato, o artigo 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de direito público.

No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença, quando houve a concessão da tutela provisória, em 02/09/2019. Atenho-me ao teto para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da benesse. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.

Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à análise dos recursos em seus exatos limites, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual.

Discute-se o direito da parte autora a benefício por incapacidade.

Nos termos do artigo 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.

Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, pág. 128).

Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) ou a incapacidade temporária (auxílio-doença), observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 - cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão.

No caso dos autos, realizada a perícia médica, em 02/04/2019, o laudo apresentado considerou o autor, nascido em 12/06/1976, motorista, com ensino superior completo em engenharia da computação, total e permanentemente incapacitado para a sua atividade habitual, por ser portador de “amaurose do olho esquerdo (CID H54.4 cegueira de um olho) (Id 141502061, p. 1/6).

O perito destacou que o autor apresenta incapacidade total e definitiva para atividade de motorista profissional, mas pode ser reabilitado para o exercício de labor que não exija visão binocular, porquanto jovem e sem doenças associadas.

Assim, não apresentada incapacidade total e definitiva (ou seja, invalidez) para o trabalho, a aposentadoria pretendida é indevida. De outro lado, deve ser mantida a concessão de auxílio-doença, na esteira dos seguintes precedentes:

 

"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS NECESSÁRIOS. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais. Assentando o Tribunal a quo estarem demonstrados os requisitos necessários à concessão do benefício previdenciário, a alegação em sentido contrário, em sede de recurso especial, exige o exame do acervo fático-probatório, procedimento vedado a teor da Súmula 7/STJ. 2. Agravo regimental a que se nega provimento."

(STJ - AGARESP 201201772363, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJE 12/11/2012)

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 42 A 47 e 59 A 62 DA LEI Nº 8.213, DE 24.07.1991. PRELIMINAR. REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA. DESNECESSIDADE. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE LABORATIVA APENAS PARA A ATIVIDADE HABITUAL. POSSIBILIDADE DE REBILITAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS MANTIDOS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

(...) Omissis

- O benefício de aposentadoria por invalidez está disciplinado nos artigos 42 a 47 da Lei nº 8.213/1991. Para sua concessão deve haver o preenchimento dos requisitos: a) incapacidade plena e definitiva para atividade laborativa; b) cumprimento da carência mínima de doze meses, à exceção das hipóteses previstas no artigo 151 da lei em epígrafe; c) qualidade de segurado da Previdência Social à época do início da incapacidade ou, então, a demonstração de que deixou de contribuir ao RGPS em decorrência dos problemas de saúde que o incapacitaram; d) ausência de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas. - No benefício de auxílio-doença, a incapacidade há de ser temporária ou, embora permanente, que seja apenas parcial para o exercício de suas atividades profissionais habituais, ou ainda, que haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o sustento do segurado, nos termos dos artigos 59 e 62 da Lei nº 8.213/1991. - O laudo pericial informa a incapacidade laborativa total e permanente da parte autora, apenas para a atividade habitual, com possibilidade de reabilitação, o que afasta a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, vez que não preenchidos os requisitos exigidos para tal benefício. - A data de início do benefício por incapacidade deve ser a do momento em que devidamente comprovada a incapacidade laborativa da parte autora, podendo coincidir com a data do requerimento e/ou indeferimento administrativo, ou cessação administrativa indevida, com a data da perícia judicial, ou mesmo com a data da citação, em caso de não haver requerimento administrativo.

(...) Omissis

- Preliminar que se rejeita. - Apelação a que se dá parcial provimento."

(TRF3, AC 00000975820174039999, Relator Desembargador Federal Fausto De Sanctis, Sétima Turma, e-DJF3 31/03/2017, grifos meus)

"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REEXAME NECESSÁRIO INCABÍVEL. AUXÍLIO-DOENÇA. ART. 59 e 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. 1. Incabível o reexame necessário, nos termos do inciso I do § 3º do artigo 496 do Código de Processo Civil, já que a condenação não ultrapassa o limite de 1.000 (mil) salários mínimos, considerado o valor do benefício, o termo estabelecido para o seu início e o lapso temporal que se registra de referido termo até a data da sentença. 2. Diante da ausência de comprovação da incapacidade total e permanente da parte autora para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e sendo requisito essencial à concessão da aposentadoria por invalidez, nos termos do artigo 42 da Lei nº 8.213/91, tal benefício não deve ser concedido. 3. Comprovada a incapacidade total e temporária para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença. 4. Reexame necessário não conhecido. Apelações do INSS e da parte autora não providas."

(TRF3, ApReeNec 00394622220174039999, Relatora Desembargadora Federal Lucia Ursaia, Décima Turma, e-DJF3 28/02/2018, grifos meus)

 

No mesmo sentido, os seguintes julgados da E. Nona Turma desta Corte: ApReeNec 00309707520164039999, Relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, v.u., e-DJF3 30/10/2017; Ap 00227306320174039999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, v.u., e-DJF3 02/10/2017; Ap 00414239520174039999, Relator Juiz Federal Convocado Otavio Port, v.u, e-DJF3 07/03/2018; ApReeNec 00364137020174039999, Relator Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias, v.u., e-DJF3 07/03/2018.

Quanto à reabilitação profissional, o laudo pericial atestou que desde 2007 o autor exerce a atividade de motorista, todavia, após o diagnóstico de cicatrizes de coreorretinite em olho esquerdo (CID H31), que o levou a perda de uma visão, teve rebaixada sua CNH em 26/09/2014, e reconhecida incapacidade laboral pelo INSS em 13/11/2014.

Assim, considerando que no exame médico-pericial foi atestado que a lesão incapacitante que acomete o requerente interfere no desempenho de sua atividade laborativa habitual, porquanto gera a inaptidão total e definitiva, a reabilitação profissional determinada na sentença deve ser mantida, pois indispensável para que o demandante possa exercer outra função que lhe assegure a subsistência.

Passo à análise da correção monetária.

Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."

Por derradeiro, assinale-se que o STF, por maioria, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes, decidiu não modular os efeitos da decisão anteriormente proferida, rejeitando todos os embargos de declaração opostos, conforme certidão de julgamento da sessão extraordinária de 03/10/2019.

Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere à correção monetária não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.

Nesse cenário, sobre os valores em atraso, incidirá correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E DOU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS apenas para explicitar os critérios de incidências da correção monetária, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, § 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. LEI Nº 8.213/1991. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO MANTIDO.

- A hipótese em exame não excede 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial, nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.

- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.

- Constatada pelo laudo pericial a incapacidade total e permanente apenas para a atividade habitual, com possibilidade de reabilitação profissional, é devido o auxílio-doença.

- Reabilitação profissional necessária para que o demandante possa exercer outra função que lhe assegure subsistência.

- Correção monetária na forma explicitada.

-Apelação da parte autora desprovida e apelação do INSS parcialmente provida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e dar parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.