Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6078449-54.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: ALBINA APARECIDA ZANUSSO ORTOLAN

Advogados do(a) APELANTE: CAMILA AGUSTINI SCARLATTI RICCI - SP364938-N, GIOVANA PASTORELLI NOVELI - SP178872-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6078449-54.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: ALBINA APARECIDA ZANUSSO ORTOLAN

Advogados do(a) APELANTE: CAMILA AGUSTINI SCARLATTI RICCI - SP364938-N, GIOVANA PASTORELLI NOVELI - SP178872-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

 

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez, “desde a data da constatação da incapacidade definitiva”, ou de auxílio-doença previdenciário, “a partir de seu indeferimento indevido, ou seja, 15/02/2019, em caso de invalidez temporária”.

O juízo a quo extinguiu a demanda, sem apreciação do mérito, acolhendo a preliminar de coisa julgada, com fundamento no art. 485, inciso V, do Código de Processo Civil. Regovou os benefícios da gratuidade e condenou a autora, reconhecendo a litigância de má-fé, ao pagamento de multa arbitrada em dez salários-mínimos, nos termos do art. 80, inciso II, c.c. art. 81, § 2.º, do CPC.

Apela, a parte autora, pleiteando a anulação da sentença e a concessão de benefício por incapacidade, sustentando, em síntese, o cumprimento dos requisitos legais à concessão em questão.

Com contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 6078449-54.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: ALBINA APARECIDA ZANUSSO ORTOLAN

Advogados do(a) APELANTE: CAMILA AGUSTINI SCARLATTI RICCI - SP364938-N, GIOVANA PASTORELLI NOVELI - SP178872-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

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­V O T O

 

 

RECONHECIMENTO DA COISA JULGADA

Preliminarmente, no tocante ao reconhecimento da coisa julgada, anote-se que a autora ajuizou demanda em 3/7/2017, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença previdenciário (n.º 1003830-79.2017.8.26.0189).

À época, a perita atestou que “A pessoa periciada encontra-se incapaz para o labor Total e Permanentemente, devido à senilidade apenas” (f. 10-14, Id. 98005743).

Acórdão da 8.ª Turma deste Tribunal reformou a sentença, julgando improcedente o pedido, “já que a preexistência da doença incapacitante é fator impeditivo à concessão dos benefícios pretendidos” (f. 22-27, Id. 98005743).

Em 14/5/2019, ajuizou a presente demanda, argumentando terem sido alteradas suas condições laborativas.

Nos termos do art. 505 do Código de Processo Civil, tratando-se de relação jurídica continuativa, caso sobrevenha modificação no estado de fato ou de direito a parte pode pedir revisão do disposto na sentença.

De acordo com o laudo médico pericial atual, a “periciada é portadora de doença classificada no CID - 10 como G30.1 (Doença de Alzheimer de início tardio), E78.0 (Hipercolesterolemia pura), M81.0 (Osteoporose pós-menopáusica) e M51.1 (Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia).” “A data de início da doença é maio de 2017.” “Limitado pelos documentos apresentados a data de início da incapacidade é abril de 2019.” (f. 5-6, Id. 98005729).

In casu, com o agravamento do estado de saúde da autora, demonstrado pelos exames periciais acima referidos, houve nítida alteração no estado de fato, razão pela qual não há que se falar na ocorrência de coisa julgada, muito menos de litigância de má-fé.

De rigor, portanto, a anulação da sentença, com o reconhecimento da manutenção dos benefícios da assistência judiciária gratuita.

Possível, outrossim, o prosseguimento da demanda, com espeque no permissivo constante do art. 1.013, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil (“§ 3.º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: (...) I - reformar sentença fundada no art. 485”, ou seja, “O juiz não resolverá o mérito quando: (...) V - reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada”), em atendimento aos princípios da celeridade e da economia processual.

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

 

DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA

Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida.

O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.

Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 1/3/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/6/2012).

Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios.

"Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:

I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;

II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;

III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;

IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;

V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;

VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.

§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.

§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.

§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.

§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."

A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa.

Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível o recolhimento de, pelo menos, seis meses, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios.

Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma lei, a saber:

“Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26:

I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;”

Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida.

 

DO CASO DOS AUTOS (PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO)

Objetivando comprovar o requisito da qualidade de segurado, a autora juntou consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), comprovando recolhimentos como segurada facultativa de 1.º/3/2013 a 31/3/2015, de 1.º/5/2015 a 31/3/2016 e de 1.º/5/2016 a 31/5/2016; ainda, registrando o recebimento de auxílio-doença (NB 6172019329) de 5/1/2017 a 5/3/2017, com a anotação de aposentadoria por invalidez (NB 1814483494) de “28/4/2017 a 28/4/2017” (Id. 98005672).

Verifica-se que o prazo de 12 meses, previsto no art. 15, inciso II, da Lei n.° 8.213/91, foi extrapolado, considerando que o último recolhimento foi registrado em 31/5/2016 e a ação proposta em 14/5/2019, não sendo hipótese de dilação nos termos dos §§ 1.º e 2.º do dispositivo retromencionado.

Registre-se, ainda, a inexistência de qualquer elemento de prova apto a retroagir a incapacidade da autora ao trabalho a momento em que detinha a qualidade de segurado.

Com efeito, o laudo pericial concluiu ser a “incapacidade provocada pela doença classificada no CID-10 como M51.1 (Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia)” (f. 6, Id. 98005729), havendo incapacidade para o trabalho de forma total e permanente. “Para fixar a data de início da incapacidade foi utilizado o Atestado Médico, datado em 15 de abril de 2019, assinado pelo Dr. Ricardo Naoto Sano, CRM SP 101156, solicito afastamento por 06 (seis) meses. Consta CID 10 M51.1 (Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia)” (f. 8, Id. 98005729).

Dentre os documentos médicos particulares, apresentados pela apelante ao perito, destaca-se, que "Para fixar a data de início da doença foi utilizada a Ressonância Magnética da Coluna Lombar, datada em 15 de maio de 2017, assinado pelo Dr. Ariovaldo J. do Nascimento Junior, médico radiologista, CRM 112523 SP, evidenciando sinais de espondilodiscoartrose lombar, com alterações mais proeminentes em L4-L5, protrusão discal foraminal à esquerda em L1-L2, que determina estenose foraminal moderada, extrusão discal posterior centro- lateral à esquerda em L3-L4, com leve migração superior, que determina compressão moderada no saco dural, tocando as raízes da cauda equina, abaulamentos discais difusos em L4-L5 e L5-S1, que promove leve compressão no saco dural e leve estenose foraminal bilateral e sinais de doença de Baastrup de L3- L4 a L5-S1." (f. 7-8, Id. 98005729).

O conjunto probatório, porém, é insuficiente a comprovar que a incapacidade laborativa tenha ocorrido enquanto o autor mantinha a condição de segurado.

Forçoso, portanto, o reconhecimento da improcedência do pedido, em razão da perda da qualidade de segurado da autora.

Condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do art. 98, § 3.º, do CPC, por se tratar de beneficiária da gratuidade da justiça.

Posto isso, dou parcial provimento à apelação, para reconhecer a nulidade da sentença, diante da inexistência do óbice da coisa julgada e, considerando o disposto no art. 1.013, § 3.º, inciso II, do Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido formulado, nos termos da fundamentação, supra.

É o voto.

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. AFASTAMENTO DO ÓBICE DA COISA JULGADA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. PROSSEGUIMENTO DO JULGAMENTO (CPC, ART. 1.013, § 3.º, INCISO II, C.C. ART. 485, INCISO V). PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- Reconhecido o agravamento do estado de saúde da autora, houve alteração no estado de fato, razão pela qual não há que se falar na ocorrência de coisa julgada ou mesmo de litigância de má-fé, sendo mantidos os benefícios da assistência judiciária gratuita.

- Os requisitos à aposentadoria por invalidez, conforme preceituam os arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistem na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, nas hipóteses em que exigida. O auxílio-doença, por sua vez, é concedido nos casos de incapacidade temporária.

- Não ocorre a perda da qualidade de segurado quando a cessação dos recolhimentos das contribuições se dá em razão de incapacidade temporária ou definitiva.

- Inexistência de prova de que a parte autora deixou de contribuir em virtude das patologias que a acometiam.

- Reconhecimento da improcedência do pedido formulado.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.