APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5354664-70.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILBERTO BARBOSA
Advogado do(a) APELANTE: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N
APELADO: GILBERTO BARBOSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5354664-70.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILBERTO BARBOSA Advogado do(a) APELANTE: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N APELADO: GILBERTO BARBOSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N R E L A T Ó R I O Cuida-se de apelações interpostas pelas partes em face de sentença que julgou procedente o pedido de auxílio-acidente, desde a propositura da ação, discriminados os consectários legais. Decisão não submetida ao reexame necessário. O autor requer a concessão de auxílio-doença desde a cessação administrativa até a reabilitação profissional. Requer a concessão de auxílio-acidente após ser submetido ao processo de reabilitação. Subsidiariamente, impugna o termo inicial do auxílio-acidente. A autarquia alega a ausência dos requisitos legais para a concessão do auxílio-acidente e exora a reforma integral do julgado. Subsidiariamente, alega ser devido apenas o auxílio-doença. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5354664-70.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILBERTO BARBOSA Advogado do(a) APELANTE: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N APELADO: GILBERTO BARBOSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS Advogado do(a) APELADO: ADRIANA BEAZINI DE SOUZA BAHIA - SP243790-N V O T O Conheço das apelações, em razão da satisfação de seus requisitos. Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por incapacidade à parte autora. A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da CF/1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor: “Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada (...)” Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício. A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo 59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128). Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho. São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social. Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei). O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil. Contudo, o juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos. Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema: Súmula 33 da TNU: Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o termo inicial da concessão do benefício. Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez. Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social. Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual. No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada em 20/8/2019, constatou a incapacidade laboral parcial e permanente do autor (nascido em 1973, qualificado como tratorista), em razão de transtorno não especificado de disco intervertebral, dor lombar baixa e espondilose, desde fevereiro de 2012. O perito esclareceu: "De acordo com a perícia realizada, concluo o trabalho a que fui designada, com a constatação de incapacidade parcial e permanente para a atividade laboral habitual. Porém, apto para a realização de outra atividade que respeite as limitações físicas do periciado. Não houve perda de autonomia para a realização das atividades da vida diária." Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial. Contudo, os demais elementos de prova não autorizam convicção em sentido diverso. Os relatórios médicos colacionados aos autos declaram a incapacidade laboral do autor e corroboram a conclusão do perito. Contudo, entendo não ser devido o auxílio-acidente. Na realidade, o auxílio-acidente, de cunho compensatório, é devido somente quando comprovada a existência de sequela resultante de acidente de qualquer natureza e esta tenha provocado redução da capacidade laborativa do segurado, dificultando-lhe a realização do trabalho. É o que expressamente prevê o artigo 86 da Lei n. 8.213/1991 (g. n.): “Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.” Por consequência, se as limitações são decorrentes de doenças adquiridas, e não de acidente, não há direito à percepção de auxílio-acidente. No caso, em momento algum, foi relatada a ocorrência de acidente de qualquer natureza, ou mesmo doença do trabalho. Trata-se, pois, de caso típico de auxílio-doença, em que o segurado não está inválido, mas não pode mais realizar suas atividades habituais. Os demais requisitos para a concessão do benefício - filiação e período de carência - também estão cumpridos (vide dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS) e não foram impugnados nas razões recursais. Em decorrência, é devido o auxílio-doença, na esteira dos precedentes que cito: "RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO HABITUAL. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais. 2. Recurso improvido". (REsp 501267 / SP RECURSO ESPECIAL 2003/0018983-4 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA Data do Julgamento 27/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 28/06/2004 p. 427) "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO. COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORÁRIA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO A CONTAR DO LAUDO PERICIAL. I - A consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS comprova o preenchimento da carência exigida por Lei e a manutenção da qualidade de segurado da autora quando do ajuizamento da ação. II - As conclusões obtidas pelo laudo pericial comprovam a incapacidade total e temporária da autora para o exercício de atividade laborativa, devendo ser concedido o auxílio-doença . III - Não houve fixação do início da incapacidade, razão pela qual a data de início do benefício deve corresponder à data do laudo pericial. IV - Remessa oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Tutela antecipada". (APELREE - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1497185 Processo: 2010.03.99.010150-5 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:13/09/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/09/2010 PÁGINA: 836 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS). Quanto ao termo inicial, cabe destacar que o E. Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a prova técnica prestar-se-ia unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do novo benefício, mas não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se instalou. Nesse sentido: "PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CITAÇÃO VÁLIDA. MATÉRIA JÁ DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. 1. O tema relativo ao termo inicial de benefício proveniente de incapacidade laborativa já foi exaustivamente debatido nesta Corte, a qual, após oscilações, passou a rechaçar a fixação da Data de Início do Benefício - DIB a partir do laudo pericial, porquanto a prova técnica prestar-se-ia unicamente para nortear o convencimento do juízo quanto à pertinência do novo benefício, mas não para atestar o efetivo momento em que a moléstia incapacitante se instalou. 2. Atualmente a questão já foi decidida nesta Corte sob o rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), restando pacificada a jurisprudência no sentido que "A citação válida informa o litígio, constitui em mora a autarquia previdenciária federal e deve ser considerada como termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida na via judicial quando ausente a prévia postulação. (REsp 1.369.165/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, Primeira Seção, DJe 7/3/2014). 3. Recurso especial parcialmente provido." (REsp 1311665/SC, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, Rel. p/ Acórdão Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/09/2014, DJe 17/10/2014) Nesse passo, considerada a percepção de auxílio-doença em razão das mesmas doenças no período de 19/2/2012 a 6/6/2018 (vide CNIS), o termo inicial fica fixado no dia imediatamente posterior ao da cessação do referido benefício, por estar em consonância com os elementos de prova dos autos e com a jurisprudência dominante. Confira-se, a propósito, o seguinte julgado: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. TERMO INICIAL. 1. O termo inicial da concessão do benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez é a prévia postulação administrativa ou o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença. Ausentes a postulação administrativa e o auxílio-doença, o termo a quo para a concessão do referido benefício é a citação. Precedentes do STJ. 2. Agravo Regimental não provido." (AgRg no REsp 1418604/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 11/02/2014) Segundo o artigo 62 da Lei n. 8.213/1991, o segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para a sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade, devendo ser mantido o benefício até a conclusão de tal prestação. Considerado o parcial provimento aos recursos interpostos pelas partes, não incide no caso a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal. Diante do exposto, dou parcial provimento às apelações para conceder o auxílio-doença, desde 7/6/2018, até a reabilitação profissional. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE NÃO CONFIGURADO.. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE. REQUISITOS PREENCHIDOS. TERMO INICIAL. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência - doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.
- Não há direito à percepção de auxílio-acidente se as limitações são decorrentes de doenças adquiridas.
- Comprovada a incapacidade laboral da parte autora para as atividades laborais habituais por meio da perícia médica judicial e preenchidos os demais requisitos para a concessão do benefício – qualidade de segurado e carência –, é devido auxílio-doença.
- O termo inicial da concessão do benefício previdenciário por incapacidade laboral é o dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença. Precedentes do STJ.
- O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá ser submetido a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade, a teor do artigo 62 da Lei n. 8.213/1991.
- Considerado o parcial provimento aos recursos interpostos, não incide no caso a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
- Apelações providas em parte.