Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002277-96.2020.4.03.6105

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: CARLOS ALVES DIAS

Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA REGINA MARTINS - SP264854-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002277-96.2020.4.03.6105

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: CARLOS ALVES DIAS

Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA REGINA MARTINS - SP264854-A

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação e remessa necessária,  tida por submetida, à sentença que, em mandado de segurança, concedeu a ordem para determinar que o INSS cumpra acórdão proferido pela 3ª Câmara de Julgamento do CRPS, com a implantação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, por estar pendente há mais de trinta dias, em descumprimento ao artigo 49 da Lei 9.874/1999 e aos princípios da eficiência, razoabilidade e razoável duração do processo.

Houve informação, comunicando o cumprimento do acórdão proferido pela 3ª Câmara de Julgamento do CRPS, com a implantação do benefício NB 42/165.779.266-5 (Id 133310137). 

Alegou o INSS que: (1) há necessidade de atribuição de efeito suspensivo à apelação; (2) o gerente da APS em Campinas é parte ilegítima para figurar no pólo passivo, vez que a Instrução Normativa 77/2015 que disciplina o processo administrativo previdenciário é ato da Presidência do INSS, não tendo o gerente da Agência da Previdência Social "competência para normatizar o processo administrativo previdenciário de outra forma"; (3) tem dificuldades administrativas e para minorá-las adotou medidas para solucionar atrasos nas análises de benefícios; (4) "a razoabilidade deve pautar eventuais excessos extremos no prazo de análise. Ou seja, algum excesso de prazo embora não exagerado, como no caso dos autos, não se deve permitir que o segurado 'passe na frente' de outros"; (5) a sentença ofende os princípios da isonomia e impessoalidade, devendo ser reformada "objetivando evitar seja 'FURADA A FILA' do INSS, em desrespeito aos demais administrados, tendo com base a aplicação dos arts. 12 e 15 do CPC supletivamente ao processo administrativo"; e (6) o prazo aplicável é o de 180 dias, conforme estabelecido na Deliberação 26 do Fórum Interestadual Previdenciário Regional.

Houve apresentação de  contrarrazões.

Inicialmente distribuído à 7ª Turma, o relator originário determinou a redistribuição do feito à 2ª Seção, sendo os autos encaminhados a esta relatoria, designada por sorteio.

Com parecer do MPF vieram os autos para análise da apelação e do reexame necessário tido por submetido.

É o relatório.

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002277-96.2020.4.03.6105

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: CARLOS ALVES DIAS

Advogado do(a) APELADO: ANDRESSA REGINA MARTINS - SP264854-A

 

  

 

V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, cabível a remessa oficial, que se tem por submetida, em razão do disposto no artigo 14, § 1º, da Lei 12.016/2009.

Prejudicado o pedido de concessão de efeito suspensivo à apelação diante do exame diretamente do próprio recurso. 

Quanto à alegação de ilegitimidade passiva da autoridade da agência local, não pode ser acolhida, pois nos termos do artigo 18 do Decreto 9.746/2019, são atribuições das Agências da Previdência Social, coordenadas pelos Gerentes Executivos:

 

"Art. 18.  Aos Diretores, ao Procurador-Geral, ao Chefe de Gabinete, ao Chefe da Assessoria de Comunicação Social, ao Auditor-Geral, ao Corregedor-Geral, ao Subprocurador-Chefe, aos Coordenadores-Gerais, aos Superintendentes Regionais, aos Gerentes-Executivos, aos Auditores Regionais, aos Corregedores Regionais, aos Procuradores Regionais, aos Procuradores Seccionais, aos Gerentes de Agência da Previdência Social e aos demais dirigentes incumbe planejar, dirigir, coordenar, orientar, acompanhar e avaliar a execução das atividades relacionadas às suas unidades e exercer outras atribuições que lhe forem cometidas pelo Presidente do INSS (grifamos)".

 

Ademais, não se pleiteou na impetração qualquer modificação de ato normativo afeto à Presidência do INSS, pois restou impugnada, especificamente, apenas a demora na implantação de benefício previdenciário, o que se insere na competência funcional da autoridade impetrada. 

No mérito, o princípio da duração razoável do processo, elevado à superioridade constitucional, elenca não apenas a garantia da prestação administrativa célere, como a da eficiência, razoabilidade e moralidade, de acordo com o previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei 9.784/1999:

 

“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (...)”

“Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.”

 

Com efeito, tem-se dado materialidade ao entendimento de que é dever do Poder Público, parte de sua própria finalidade e do interesse público, que suas funções sejam exercidas de maneira célere e satisfatória, sob pena, caso contrário, de ineficácia. Não por outro motivo foram promulgadas as Emendas Constitucionais 19 e 45, bem como, em nível infraconstitucional, editada a própria Lei 9.784/1999, supracitada.

Neste sentido tem decidido a Corte:

 

ApCiv 5000897-78.2019.4.03.6103, Rel. Des. Fed. CECILIA MARCONDES, intimação via sistema 06/03/2020: “ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO. REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. DECURSO DO PRAZO LEGAL PARA ANÁLISE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DESPROVIDAS. 1. Na hipótese dos autos, o impetrante formulou requerimento de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição em 06.07.2018, o qual permaneceu pendente de apreciação pelo INSS, além do prazo legal.  2. Cumpre ressaltar que a duração razoável dos processos é garantia constitucionalmente assegurada aos administrados, consoante expressa disposição do art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/04. 3. Com efeito, a Administração Pública tem o dever de analisar em prazo razoável os pedidos que lhe são submetidos, sob pena de causar prejuízo ao administrado e de descumprir o princípio da celeridade processual, também assegurado constitucionalmente aos processos administrativos (art. 5º, LXXVIII, da CF/88). 4. Consoante preconiza o princípio constitucional da eficiência, previsto no art. 37, caput, da Constituição da República, o administrado não pode ser prejudicado pela morosidade excessiva na apreciação de requerimentos submetidos à Administração Pública. Assim, a via mandamental é adequada para a garantia do direito do administrado. 5. O art. 49 da Lei nº 9.784/1999 fixa o prazo de até 30 dias para que a Administração Pública decida a questão posta em processo administrativo, salvo se houver motivo que justifique de maneira expressa a prorrogação do referido lapso temporal. 6. Além do aludido prazo legal, o art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8.213/1991 e o art. 174 do Decreto nº 3.048/1999, que dispõem especificamente sobre a implementação de benefícios previdenciários, preveem o prazo de 45 dias para o primeiro pagamento, contados a partir da data da apresentação dos documentos necessários pelo segurado. 7. No caso vertente, resta evidenciado que a autoridade impetrada desrespeitou os prazos estabelecidos em legislações ordinárias, que regulam tanto o processo administrativo em geral, como os processos administrativos de requerimentos de benefícios no âmbito da Previdência Social. 8. Inexiste amparo legal para a omissão administrativa da autarquia previdenciária, que, pelo contrário, enseja descumprimento de normas legais e violação aos princípios da legalidade, razoável duração do processo, proporcionalidade, eficiência na prestação de serviço público, segurança jurídica e moralidade, sujeitando-se ao controle jurisdicional visando a reparar a lesão a direito líquido e certo infringido. 9. Não há condenação em honorários advocatícios em sede de mandado de segurança, nos termos do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009 e das Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. 10. Apelação e remessa necessária, tida por interposta, não providas.”

 

Prevê, com efeito, a Lei 9.784/1999 os prazos de tramitação administrativa em fases processuais relevantes, sujeitos à prorrogação até o dobro em caso de comprovada justificação, sendo de cinco dias para atos em geral, quando inexistente outra previsão legal específica, e de trinta dias para julgamento, seja do pedido, seja do recurso:

 

"Art. 24. Inexistindo disposição específica, os atos do órgão ou autoridade responsável pelo processo e dos administrados que dele participem devem ser praticados no prazo de cinco dias, salvo motivo de força maior.

Parágrafo único. O prazo previsto neste artigo pode ser dilatado até o dobro, mediante comprovada justificação. 

“Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.”

"Art. 59. (...)

§ 1º Quando a lei não fixar prazo diferente, o recurso administrativo deverá ser decidido no prazo máximo de trinta dias a partir do recebimento dos autos pelo órgão competente."

 

Como se observa, o INSS não se exclui da incidência da legislação citada que, ao fixar prazo de trinta dias para proferir decisão e para julgar recurso administrativo, não permite que nas fases intermediárias possa ser consumido prazo indefinido, protraindo, de forma abusiva, prazo para conclusão do procedimento administrativo, prejudicando cumprimento das etapas finais, em que ainda mais peremptórios os prazos fixados. Logo, dificuldades de estrutura e pessoal não podem ser invocadas em detrimento do princípio constitucional e legal da eficiência e celeridade na prestação do serviço público.

Na espécie, o recurso administrativo foi baixado à APS em Campinas para cumprimento do acórdão 8.419/2019 e implantação do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição em 20/01/2020 (Id 133310112 - f. 06) e até a concessão da liminar, em 18/03/2020, não havia sido cumprido, o que somente ocorreu em 01/04/2020, conforme informado na origem (Id 133310137), revelando evidente violação aos prazos da Lei 9.784/1999, bem como à razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade.

O reconhecimento de direito líquido e certo não viola os princípios da isonomia e da impessoalidade, pois não pode a Administração preconizar que a Constituição Federal autoriza a prática de ilegalidade desde que seja de forma igual e impessoal. Quem se vê tolhido de direito líquido e certo deve buscar amparo judicial e o remédio é o restabelecimento do regime jurídico da legalidade, e não o contrário. 

Nem se invoque, em defesa, o tratado no RE 631.240, que originou, em repercussão geral, o Tema 350 cuja impertinência com o caso é manifesta, vez que referente, exclusivamente, à exigência de prévio requerimento administrativo como condição para acesso ao Judiciário sem nada dispor sobre a validade de atrasos praticados pela autarquia previdenciária no exercício de suas atribuições e deveres legais. A previsão de intimação para o INSS manifestar-se em até noventa dias nas ações ajuizadas sem prévio requerimento administrativo e antes da conclusão do julgamento do precedente em 03/09/2014, não revoga o preceito legal, mas busca apenas resolver o destino das demandas judiciais em curso, bem diferente do verificado, nos autos, em que já foi previamente acionada a administração e esta, ainda assim, descumpriu prazo legal para a prestação do serviço público. 

Ante o exposto, conheço em parte da apelação e, nesta extensão, nego-lhe provimento e nego provimento à remessa oficial, tida por submetida.

É como voto.

 

 



E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. LEGITIMIDADE PASSIVA. RECURSO ADMINISTRATIVO. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INSS. PRAZO. DEMORA INJUSTIFICADA. ARTS. 5º, LXXVIII E 37, CF. LEI 9.784/1999. 

1. Cabível a remessa oficial, que se tem por submetida, em razão do disposto no artigo 14, § 1º, da Lei 12.016/2009.

2. Prejudicado o pedido de atribuição de efeito suspensivo à apelação diante do exame diretamente do próprio recurso.

3. Quanto à alegação de ilegitimidade passiva da autoridade da agência local, não pode ser acolhida, pois o artigo 18 do Decreto 9.746/2019 define as atribuições das Agências da Previdência Social, coordenadas pelos Gerentes Executivos, sendo que, na espécie, não se pleiteou modificação de ato normativo afeto à Presidência do INSS, pois restou impugnada, especificamente, apenas a demora na implantação de benefício previdenciário, o que se insere na competência funcional da autoridade impetrada. 

4. O princípio da duração razoável do processo, elevado à superioridade constitucional, elenca não apenas a garantia da prestação administrativa célere, como a da eficiência, razoabilidade e moralidade, de acordo com o previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei 9.784/1999.

5. Prevê, com efeito, a Lei 9.784/1999 os prazos de tramitação administrativa em fases processuais relevantes, sujeitos à prorrogação até o dobro em caso de comprovada justificação, sendo de cinco dias para atos em geral, quando inexistente outra previsão legal específica, e de trinta dias para julgamento, seja do pedido, seja do recurso (artigos 24, 49 e 59).

6. O INSS não se exclui da incidência da legislação citada que, ao fixar prazo de trinta dias para proferir decisão e para julgar recurso administrativo, não permite que nas fases intermediárias possa ser consumido prazo indefinido, protraindo, de forma abusiva, prazo para conclusão do procedimento administrativo, prejudicando cumprimento das etapas finais, em que ainda mais peremptórios os prazos fixados. Logo, dificuldades de estrutura e pessoal não podem ser invocadas em detrimento do princípio constitucional e legal da eficiência e celeridade na prestação do serviço público.

7. Na espécie, o recurso administrativo foi enviado à APS em Campinas para cumprimento do acórdão e implantação do benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição em 20/01/2020 e até a concessão da liminar, em 18/03/2020, não havia sido cumprido, o que somente ocorreu em 01/04/2020, conforme informado na origem, revelando evidente violação aos prazos da Lei 9.784/1999, bem como à razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade.

8. O reconhecimento de direito líquido e certo não viola os princípios da isonomia e da impessoalidade, pois não pode a Administração preconizar que a Constituição Federal autoriza a prática de ilegalidade desde que seja de forma igual e impessoal. Quem se vê tolhido de direito líquido e certo deve buscar amparo judicial e o remédio é o restabelecimento do regime jurídico da legalidade, e não o contrário. 

9. Nem se invoque, em defesa, o tratado no RE 631.240, que originou, em repercussão geral, o Tema 350 cuja impertinência com o caso é manifesta, vez que referente, exclusivamente, à exigência de prévio requerimento administrativo como condição para acesso ao Judiciário sem nada dispor sobre a validade de atrasos praticados pela autarquia previdenciária no exercício de suas atribuições e deveres legais. A previsão de intimação para o INSS manifestar-se em até noventa dias nas ações ajuizadas sem prévio requerimento administrativo e antes da conclusão do julgamento do precedente em 03/09/2014, não revoga o preceito legal, mas busca apenas resolver o destino das demandas judiciais em curso, bem diferente do verificado, nos autos, em que já foi previamente acionada a administração e esta, ainda assim, descumpriu prazo legal para a prestação do serviço público. 

10. Apelação conhecida em parte e, nesta extensão, desprovida e remessa oficial, tida por submetida, desprovida. 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, conheceu em parte da apelação e, nesta extensão, negou-lhe provimento e negou provimento à remessa oficial, tida por submetida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.