APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001195-61.2020.4.03.6127
RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDSON MAGELI DOS REIS SILVA
Advogado do(a) APELADO: SIMONE BARBOZA DE CARVALHO - MG107402-A
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APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001195-61.2020.4.03.6127 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: EDSON MAGELI DOS REIS SILVA Advogado do(a) APELADO: SIMONE BARBOZA DE CARVALHO - MG107402-A R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação e remessa necessária à sentença que, em mandado de segurança, concedeu a ordem para determinar que o INSS, em noventa dias, efetue o devido processamento do recurso administrativo interposto contra o indeferimento do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, por estar pendente há mais de trinta dias, em descumprimento ao artigo 49 da Lei 9.874/1999 e aos princípios da eficiência, razoabilidade e razoável duração do processo, sob pena de multa diária de um mil reais. Alegou o INSS que: (1) cabe tutela de urgência e efeito suspensivo ao recurso para afastar o cumprimento da sentença, que prejudica outros segurados, excluindo ou reduzindo a multa fixada; (3) inexistente direito líquido e certo, pois "à autoridade previdenciária é conferido prazo impróprio (45 dias) para o exercício de competência decisória, pode a mesma, justificadamente, como é o caso, adiar o seu cumprimento, não se configurando abuso de direito passível de controle jurisdicional"; (4) tem dificuldades administrativas e para minorá-las adotou medidas para solucionar atrasos nas análises de benefícios; (5) houve ofende aos princípios da isonomia e impessoalidade porque "apenas acarretaria o efeito 'fura-fila'"; (6) não pode o Judiciário substituir a atuação da autarquia previdenciária ou alterar a ordem cronológica de análise dos requerimentos, "porquanto a tutela jurisdicional deve limitar-se a garantir o controle da legalidade"; e (7) o prazo aplicável é o de 180 dias, conforme fixado na Deliberação 26 do Fórum Interestadual Previdenciário Regional. Houve apresentação de contrarrazões. Inicialmente distribuído à 8ª Turma, o relator originário determinou a redistribuição do feito à 2ª Seção, sendo os autos encaminhados a esta relatoria, designada por sorteio. Com parecer do MPF vieram os autos conclusos para análise da apelação e do reexame necessário. É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5001195-61.2020.4.03.6127 RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: EDSON MAGELI DOS REIS SILVA Advogado do(a) APELADO: SIMONE BARBOZA DE CARVALHO - MG107402-A V O T O Senhores Desembargadores, fica prejudicado o pedido de concessão de efeito suspensivo à apelação ou antecipação da tutela recursal diante do exame diretamente do próprio recurso. O princípio da duração razoável do processo, elevado à superioridade constitucional, elenca não apenas a garantia da prestação administrativa célere, como a da eficiência, razoabilidade e moralidade, de acordo com o previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei 9.784/1999: “Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte (...)” “Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.” Com efeito, tem-se dado materialidade ao entendimento de que é dever do Poder Público, parte de sua própria finalidade e do interesse público, que suas funções sejam exercidas de maneira célere e satisfatória, sob pena, caso contrário, de ineficácia. Não por outro motivo foram promulgadas as Emendas Constitucionais 19 e 45, bem como, em nível infraconstitucional, editada a própria Lei 9.784/1999, supracitada. Neste sentido tem decidido a Corte: ApCiv 5000897-78.2019.4.03.6103, Rel. Des. Fed. CECILIA MARCONDES, intimação via sistema 06/03/2020: “ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO PREVIDENCIÁRIO. REQUERIMENTO DE CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRINCÍPIO DA RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. DECURSO DO PRAZO LEGAL PARA ANÁLISE ADMINISTRATIVA. VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÃO DESPROVIDAS. 1. Na hipótese dos autos, o impetrante formulou requerimento de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição em 06.07.2018, o qual permaneceu pendente de apreciação pelo INSS, além do prazo legal. 2. Cumpre ressaltar que a duração razoável dos processos é garantia constitucionalmente assegurada aos administrados, consoante expressa disposição do art. 5º, inciso LXXVIII, da CF/88, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/04. 3. Com efeito, a Administração Pública tem o dever de analisar em prazo razoável os pedidos que lhe são submetidos, sob pena de causar prejuízo ao administrado e de descumprir o princípio da celeridade processual, também assegurado constitucionalmente aos processos administrativos (art. 5º, LXXVIII, da CF/88). 4. Consoante preconiza o princípio constitucional da eficiência, previsto no art. 37, caput, da Constituição da República, o administrado não pode ser prejudicado pela morosidade excessiva na apreciação de requerimentos submetidos à Administração Pública. Assim, a via mandamental é adequada para a garantia do direito do administrado. 5. O art. 49 da Lei nº 9.784/1999 fixa o prazo de até 30 dias para que a Administração Pública decida a questão posta em processo administrativo, salvo se houver motivo que justifique de maneira expressa a prorrogação do referido lapso temporal. 6. Além do aludido prazo legal, o art. 41-A, § 5º, da Lei nº 8.213/1991 e o art. 174 do Decreto nº 3.048/1999, que dispõem especificamente sobre a implementação de benefícios previdenciários, preveem o prazo de 45 dias para o primeiro pagamento, contados a partir da data da apresentação dos documentos necessários pelo segurado. 7. No caso vertente, resta evidenciado que a autoridade impetrada desrespeitou os prazos estabelecidos em legislações ordinárias, que regulam tanto o processo administrativo em geral, como os processos administrativos de requerimentos de benefícios no âmbito da Previdência Social. 8. Inexiste amparo legal para a omissão administrativa da autarquia previdenciária, que, pelo contrário, enseja descumprimento de normas legais e violação aos princípios da legalidade, razoável duração do processo, proporcionalidade, eficiência na prestação de serviço público, segurança jurídica e moralidade, sujeitando-se ao controle jurisdicional visando a reparar a lesão a direito líquido e certo infringido. 9. Não há condenação em honorários advocatícios em sede de mandado de segurança, nos termos do artigo 25 da Lei nº 12.016/2009 e das Súmulas 105 do STJ e 512 do STF. 10. Apelação e remessa necessária, tida por interposta, não providas.” Prevê, com efeito, a Lei 9.784/1999 os prazos de tramitação administrativa em fases processuais relevantes, sujeitos à prorrogação até o dobro em caso de comprovada justificação, sendo de cinco dias para atos em geral, quando inexistente outra previsão legal específica, e de trinta dias para julgamento, seja do pedido, seja do recurso: "Art. 24. Inexistindo disposição específica, os atos do órgão ou autoridade responsável pelo processo e dos administrados que dele participem devem ser praticados no prazo de cinco dias, salvo motivo de força maior. Parágrafo único. O prazo previsto neste artigo pode ser dilatado até o dobro, mediante comprovada justificação. “Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.” "Art. 59. (...) § 1º Quando a lei não fixar prazo diferente, o recurso administrativo deverá ser decidido no prazo máximo de trinta dias a partir do recebimento dos autos pelo órgão competente." Como se observa, o INSS não se exclui da incidência da legislação citada que, ao fixar prazo de trinta dias para proferir decisão e para julgar recurso administrativo, não permite que nas fases intermediárias possa ser consumido prazo indefinido, protraindo, de forma abusiva, prazo para conclusão do procedimento administrativo, prejudicando cumprimento das etapas finais, em que ainda mais peremptórios os prazos fixados. Logo, dificuldades de estrutura e pessoal não podem ser invocadas em detrimento do princípio constitucional e legal da eficiência e celeridade na prestação do serviço público. Na espécie, o recurso administrativo foi protocolado em 25/02/2019 (Id 142899801) e até a prolação da sentença, em 23/07/2020, não havia sido analisado, conforme informações prestadas em primeiro grau (Id 142899797), que apontou que seria conferida prioridade ao caso, porém sem que se saiba, até o presente momento, se houve decisão proferida, revelando evidente violação aos prazos da Lei 9.784/1999, bem como à razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade. O reconhecimento de direito líquido e certo não viola os princípios da isonomia e da impessoalidade, pois não pode a Administração preconizar que a Constituição Federal autoriza a prática de ilegalidade desde que seja de forma igual e impessoal. Quem se vê tolhido de direito líquido e certo deve buscar amparo judicial e o remédio é o restabelecimento do regime jurídico da legalidade, e não o contrário. Nem se invoque, em defesa, o tratado no RE 631.240, que originou, em repercussão geral, o Tema 350 cuja impertinência com o caso é manifesta, vez que referente, exclusivamente, à exigência de prévio requerimento administrativo como condição para acesso ao Judiciário sem nada dispor sobre a validade de atrasos praticados pela autarquia previdenciária no exercício de suas atribuições e deveres legais. A previsão de intimação para o INSS manifestar-se em até noventa dias nas ações ajuizadas sem prévio requerimento administrativo e antes da conclusão do julgamento do precedente em 03/09/2014, não revoga o preceito legal, mas busca apenas resolver o destino das demandas judiciais em curso, bem diferente do verificado, nos autos, em que já foi previamente acionada a administração e esta, ainda assim, descumpriu prazo legal para a prestação do serviço público. Por fim, a multa diária, por violação do prazo fixado para o cumprimento da decisão judicial, tem respaldo na jurisprudência como meio executivo de garantir o efetivo adimplemento da obrigação de fazer: A cominação judicial deve considerar critérios de razoabilidade, como, por exemplo, a natureza do direito discutido (no caso, alimentar e previdenciária), tempo decorrido de atraso até a prolação da sentença, prazo para regularização e o próprio valor fixado, além de outros fatores. No caso, o prazo de noventa dias para conclusão da análise do recurso administrativo, a partir da intimação da sentença, foi mais do que razoável, porém excessivo o valor fixado, mesmo a título de penalidade destinada a coibir a mora administrativa, pois, ainda que este seja o objetivo primordial e lícito, o resultado não pode gerar enriquecimento sem causa, razão pela qual se reduz, na espécie, o valor da multa diária para cem reais até o limite de dez mil reais. Ante o exposto, conheço em parte da apelação autárquica e, nesta extensão, dou-lhe parcial provimento e dou parcial provimento à remessa oficial apenas para reduzir a multa diária no caso de eventual descumprimento, nos termos supracitados. É como voto.
AIRESP 1.614.984, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJE de 15/08/2018: “PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. PREENCHIMENTO DAS CONDIÇÕES. JULGAMENTO EXTRA PETITA. NÃO OCORRÊNCIA. ASTREINTES. POSSIBILIDADE. I - Esta Corte Superior, em causas de natureza previdenciária, calcada no princípio da proteção social, não constitui julgamento extra ou ultra petita a decisão que, verificando a inobservância dos pressupostos para concessão do benefício pleiteado na inicial, concede benefício diverso, desde que preenchidos seus requisitos. Precedentes: REsp 1320820/MS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, julgado em 10/5/2016, DJe 17/5/2016; REsp 1296267/RS, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 1/12/2015, DJe 11/12/2015; AgRg no REsp 1.397.888/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 5/12/2013; e AgRg no REsp 1.320.249/RJ, Primeira Turma, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 2/12/2013. II - É possível a cominação de multa diária ao INSS por descumprimento de obrigação de fazer. Precedentes: AgRg no REsp 1457413/SE, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/8/2014, DJe 25/8/2014; AREsp 99.865/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha, DJe 15/3/2012; AREsp 134.571/MT, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 12/3/2012. III - Agravo interno improvido.” (g.n.)
E M E N T A
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ADMINISTRATIVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INSS. PRAZO. DEMORA INJUSTIFICADA. ARTS. 5º, LXXVIII E 37, CF. LEI 9.784/1999. CONDENAÇÃO EM ASTREINTES. POSSIBILIDADE.
1. Prejudicado o pedido de concessão de efeito suspensivo à apelação ou antecipação da tutela recursal diante do exame diretamente do próprio recurso.
2. O princípio da duração razoável do processo, elevado à superioridade constitucional, elenca não apenas a garantia da prestação administrativa célere, como a da eficiência, razoabilidade e moralidade, de acordo com o previsto no artigo 37, caput, da Constituição Federal e artigo 2º, caput, da Lei 9.784/1999.
3. Prevê, com efeito, a Lei 9.784/1999 os prazos de tramitação administrativa em fases processuais relevantes, sujeitos à prorrogação até o dobro em caso de comprovada justificação, sendo de cinco dias para atos em geral, quando inexistente outra previsão legal específica, e de trinta dias para julgamento, seja do pedido, seja do recurso (artigos 24, 49 e 59).
4. O INSS não se exclui da incidência da legislação citada que, ao fixar prazo de trinta dias para proferir decisão e para julgar recurso administrativo, não permite que nas fases intermediárias possa ser consumido prazo indefinido, protraindo, de forma abusiva, prazo para conclusão do procedimento administrativo, prejudicando cumprimento das etapas finais, em que ainda mais peremptórios os prazos fixados. Logo, dificuldades de estrutura e pessoal não podem ser invocadas em detrimento do princípio constitucional e legal da eficiência e celeridade na prestação do serviço público.
5. Na espécie, o recurso administrativo foi protocolado em 25/02/2019 e até a prolação da sentença, em 23/07/2020, não havia sido analisado, conforme informações prestadas em primeiro grau (Id 142899797), que apontou que seria conferida prioridade ao caso, porém sem que se saiba, até o presente momento, se houve decisão proferida, revelando evidente violação aos prazos da Lei 9.784/1999, bem como à razoável duração do processo, segundo os princípios da eficiência e da moralidade.
6. O reconhecimento de direito líquido e certo não viola os princípios da isonomia e da impessoalidade, pois não pode a Administração preconizar que a Constituição Federal autoriza a prática de ilegalidade desde que seja de forma igual e impessoal. Quem se vê tolhido de direito líquido e certo deve buscar amparo judicial e o remédio é o restabelecimento do regime jurídico da legalidade, e não o contrário.
7. Nem se invoque, em defesa, o tratado no RE 631.240, que originou, em repercussão geral, o Tema 350 cuja impertinência com o caso é manifesta, vez que referente, exclusivamente, à exigência de prévio requerimento administrativo como condição para acesso ao Judiciário sem nada dispor sobre a validade de atrasos praticados pela autarquia previdenciária no exercício de suas atribuições e deveres legais. A previsão de intimação para o INSS manifestar-se em até noventa dias nas ações ajuizadas sem prévio requerimento administrativo e antes da conclusão do julgamento do precedente em 03/09/2014, não revoga o preceito legal, mas busca apenas resolver o destino das demandas judiciais em curso, bem diferente do verificado, nos autos, em que já foi previamente acionada a administração e esta, ainda assim, descumpriu prazo legal para a prestação do serviço público.
8. Por fim, a multa diária, por violação do prazo fixado para o cumprimento da decisão judicial, tem respaldo na jurisprudência como meio executivo de garantir o efetivo adimplemento da obrigação de fazer. A cominação judicial deve considerar critérios de razoabilidade, como, por exemplo, a natureza do direito discutido (no caso, alimentar e previdenciária), tempo decorrido de atraso até a prolação da sentença, prazo para regularização e o próprio valor fixado, além de outros fatores. No caso, o prazo de noventa dias para conclusão da análise do recurso administrativo, a partir da intimação da sentença, foi mais que razoável, porém excessivo o valor fixado, mesmo a título de penalidade destinada a coibir a mora administrativa, pois, ainda que este seja o objetivo primordial e lícito, o resultado não pode gerar enriquecimento sem causa, razão pela qual se reduz, na espécie, o valor da multa diária para cem reais até o limite de dez mil reais.
9. Apelação parcialmente conhecida e, nesta extensão, parcialmente provida e remessa oficial parcialmente provida.