Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019330-72.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

AGRAVANTE: MARIA ZILDA TOMAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: HELIO RAMOS DA SILVA - SP394864-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019330-72.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

AGRAVANTE: MARIA ZILDA TOMAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: HELIO RAMOS DA SILVA - SP394864-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Exma. Sra. Desembargadora Federal INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Trata-se de agravo de instrumento interposto por MARIA ZILDA TOMAZ, contra decisão proferida em sede de cumprimento de sentença pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Taquaritinga/SP, que não reconheceu o descumprimento de decisão judicial por parte do INSS e consequentemente aplicação de multa.

Sustenta a agravante que em 06/06/2018, no Cumprimento de Sentença sob nº 0002267-04.2018.8.26.0619, foi publicada decisão no DJE em que o juízo “a quo” determinou que o INSS implantasse o benefício de aposentadoria rural por idade em favor da agravante, no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), limitada a 30 (trinta) dias.

Todavia, alega que o benefício da aposentadoria rural por idade só fora implantado após 645 dias da decisão judicial proferida, o que ensejaria a aplicação da multa diária acima referida, por estar configurado o descumprimento da decisão judicial.

Nesse sentido, requer o provimento do recurso, a fim de que seja reformada a decisão agravada para ser  reconhecido o descumprimento da obrigação por parte do INSS, compelindo-o a pagar a multa no valor de R$ R$ 42.585,09 (quarenta e dois mil, quinhentos e oitenta e cinco reais e nove centavos).

Efeito suspensivo indeferido.

Contrarrazões não apresentadas.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019330-72.2020.4.03.0000

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

AGRAVANTE: MARIA ZILDA TOMAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: HELIO RAMOS DA SILVA - SP394864-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

A Exma. Sra. Desembargadora Federal INÊS VIRGÍNIA (Relatora): Consultando os autos por meio do e-SAJ - Tribunal de Justiça de SP, consta que, em fase de cumprimento de sentença,  foi determinado que a Agência da Previdência Social de Atendimentos das Demandas Judiciais – APSADJ em Araraquara/SP deveria implantar o benefício de aposentadoria Rural, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00(um mil reais), limitada a 30 dias. E para sua ciência, foi determinado que o representante legal da agravante encaminhasse cópia da decisão à referida Agência, comprovando o ato em juízo, no prazo de 10 dias.

Consta também, que após a apresentação da impugnação da Procuradoria Federal e concordância do Autor, os cálculos foram homologados e, em 11/03/209 foi proferida sentença extinguindo a ação.

Consta ainda, que 28/03/2019 foi encaminhada mensagem eletrônica ao Setor de Demandas Judiciais, sendo reiterada em 12/08/2019, não havendo, contudo, resposta e/ou confirmação de recebimento do destinatário. Então, foi proferida nova decisão ordenando a imediata implantação do benefício e que a comunicação à Autarquia fosse feita pelo Portal Eletrônico.

O benefício foi implantado em 31/01/2020. Ato contínuo, a agravante apresentou em Juízo, segundo seu parecer, cálculo referente a multa de descumprimento judicial, no valor de R$ 42.585,09(quarenta e dois mil, quinhentos e oitenta e cinco reais e nove centavos).

Consta por fim, que o Juízo “a quo” entendeu que não houve descumprimento da ordem judicial, afastando a aplicação da multa. Observou que o representante legal da agravante deixou de encaminhar a decisão ao Setor de Demandas Judiciais de Araraquara/SP e que a Carta Precatória expedida tinha como finalidade intimar a Procuradoria Federal, conforme prescreve os artigos 534, 535, ambos do CPC. Concluiu ser razoável que haja algum tipo de atraso, diante da grande demanda junto ao órgão federal, retirando, assim, a presunção de resistência dolosa e abolindo a aplicação de multa, conforme prevê o artigo 537, do CPC.

Pois bem. 

 

As ações previdenciárias nas quais o INSS é vencido acarretam duas obrigações distintas. A obrigação de implantar o benefício (Obrigação de Fazer) e a obrigação de pagar os valores atrasados (Obrigação de Pagar Quantia Certa). Embora não seja possível falar em execução provisória relativa ao pagamento das parcelas atrasadas por parte da Fazenda Pública, pela aplicação do artigo 100 da Constituição Federal, que prevê uma ordem cronológica de pagamento de precatórios, nada impede que se cumpra a obrigação de fazer, com a implantação do benefício então concedido.

Não há dúvida de que seja possível fixar multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, em razão de tratar-se de obrigação de fazer, não existindo qualquer ilegalidade quanto à sua aplicação, já que se trata de meio coercitivo autorizado por lei, que visa assegurar a efetividade no cumprimento da ordem expedida (art. 536, §1º, do CPC), desde que respeitado o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, podendo ser modificada, tanto no valor quanto no prazo, até mesmo de ofício pelo Magistrado, se se mostrar excessiva, conforme art. 537, § 1º do CPC, in verbis:

"Art. 537. A multa independe de requerimento da parte e poderá ser aplicada na fase de conhecimento, em tutela provisória ou na sentença, ou na fase de execução, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para cumprimento do preceito.

§ 1º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento, modificar o valor ou a periodicidade da multa vincenda ou excluí-la, caso verifique que: I - se tornou insuficiente ou excessiva; II - o obrigado demonstrou cumprimento parcial superveniente da obrigação ou justa causa para o descumprimento."

Anote-se que “o ato de implantação de benefício consubstancia procedimento afeto, exclusivamente, à Gerência Executiva de Demandas Judiciais do INSS, órgão de natureza administrativa e que não se confunde com a Procuradoria do INSS, a qual possui a finalidade de defender os interesses do ente público em Juízo. Tanto assim o é, que eventual desatendimento de ordem judicial relativamente à implantação de benefícios previdenciários atrai a responsabilização do agente público diretamente envolvido em seu cumprimento.” (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5027854-92.2019.4.03.0000, Des. Fed. CARLOS DELGADO)

Nesse passo, necessário constar que, em consulta aos autos, não foi possível confirmar o recebimento, pelo ente previdenciário, das comunicações eletrônicas encaminhadas pela vara de origem, de sorte que, à míngua de tal dado, não há que se cogitar em descumprimento do prazo para implementação da ordem judicial.

Sob outro aspecto, é de se observar que, somente passado mais de 01(um) ano da determinação de implantação do benefício, o autor trouxe a notícia de que a aposentadoria ainda não havia sido colocada em manutenção. Aliás, já havia sentença que extinguia o feito. 

A esse respeito, consigno que, se por um lado, há possibilidade da aplicação de multa ao INSS, sobretudo por se tratar de verba de caráter alimentar, por outro, não se pode aceitar, em nenhuma circunstância, que eventual atraso sirva de base para o benefício econômico indevido do credor. E sobre esse cuidado, o artigo 537, §1º, do CPC/2015 confere ao magistrado a possibilidade de modificar e até mesmo excluir o valor e a periodicidade da multa.

Importa explicitar que é dever do credor mitigar o próprio prejuízo, em respeito ao princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil), que se aplica, igualmente, na esfera processual. É o que se denomina “duty to mitigate the loss”, princípio por meio do qual o aumento do próprio prejuízo, seja por ação ou por omissão do credor, constitui inequívoco abuso de direito, e implica vulneração à boa-fé.

Dito isso, entendo que competia à parte autora comunicar ao Juízo “a quo” acerca da ausência de implantação do benefício, com a presteza necessária a fim de assegurar o recebimento dos proventos e evitar a indevida incidência da penalidade, cujo montante, como é de sabença, provem dos cofres públicos, custeados por toda a coletividade.

Trago precedente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região:

 “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MULTA COERCITIVA POR ATRASO NA IMPLANTAÇÃO. POSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. TITULARIDADE DA MULTA É DO CREDOR PREJUDICADO. VALOR DA MULTA DIÁRIA. QUANTIA FINAL EXORBITANTE, CAUSADA, EM PARTE, PELA INÉRCIA DO CREDOR. REDUÇÃO. POSSIBILIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

(...)  6. O dever da parte de mitigar o próprio prejuízo ("duty to mitigate the loss" ou "obligation de minimiser son propre dommage", como é chamado no direito estrangeiro) é corolário do princípio da boa-fé (objetiva) processual previsto no art. 14, II, do CPC/1973 (correspondente ao art. 5º do CPC/2015).

7. A inércia do autor da demanda, ante o crescente prejuízo da parte contrária, é incompatível com a boa-fé objetiva e deve ser sancionada com a redução do valor total da multa coercitiva.

8. No caso concreto, a multa diária já tinha sido fixada em valor elevado (superior ao valor mensal do benefício previdenciário a ser implantado) e a inércia da exequente/embargada contribuiu para que o valor final da multa atingisse o patamar exorbitante de R$135.000,00. Valor reduzido para R$10.000,00 (em valores de hoje), de acordo com o postulado da proporcionalidade e a fim de evitar o enriquecimento sem causa da embargada.

9. Apelação do embargante (INSS) parcialmente provida.

(AC nº 0001539-45.2011.4.01.3817/MG, Relator Juiz Fed. Alexandre Ferreira Infante Vieira, 2ª Câmara Regional Previdenciária de MG, e-DJF1 24/03/2017).

 

Portanto, do todo analisado, nego provimento ao agravo de instrumento, mantendo a decisão guerreada que pôs fim a aplicação de multa à Autarquia ré.

É COMO VOTO.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. MULTA POR ATRASO NO CUMPRIMENTO. GERÊNCIA EXECUTIVA DO INSS. COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA. IMPOSSIBILIDADE DE CONFIRMAÇÃO DE RECEBIMENTO. SEM COMPROVAÇÃO. NOVA INTIMAÇÃO. RECURSO DA PARTE AUTORA DESPROVIDO.

- Não há dúvida de que é  possível fixar multa diária por atraso na implantação de benefício previdenciário, em razão de tratar-se de obrigação de fazer, não existindo qualquer ilegalidade quanto à sua aplicação, já que se trata de meio coercitivo autorizado por lei, que visa assegurar a efetividade no cumprimento da ordem expedida (art. 536, §1º, do CPC),  desde que respeitado o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, podendo ser modificada, tanto no valor quanto no prazo, até mesmo de ofício pelo Magistrado, se se mostrar excessiva, nos termos do art. 537, § 1º do atual CPC.

- O ato de implantação de benefício consubstancia procedimento afeto, exclusivamente, à Gerência Executiva do INSS, órgão de natureza administrativa e que não se confunde com a Procuradoria do INSS, a qual possui a finalidade de defender os interesses do ente público em Juízo. Tanto assim o é, que eventual desatendimento de ordem judicial relativamente à implantação de benefícios previdenciários atrai a responsabilização do agente público diretamente envolvido em seu cumprimento. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5027854-92.2019.4.03.0000, Des. Fed. CARLOS DELGADO)

- Observado que o autor trouxe a notícia de que a aposentadoria ainda não havia sido implantada, depois de passado mais de 01(um) ano da determinação de implantação.

- Se por um lado, há possibilidade da aplicação de multa ao INSS, por outro, não se pode aceitar, em nenhuma circunstância, que eventual atraso sirva de base para o benefício econômico indevido do credor. E sobre esse cuidado, o artigo 537, §1º, do CPC/2015 confere ao magistrado a possibilidade de modificar e até mesmo excluir o valor e a periodicidade da multa.

- É  dever do credor mitigar o próprio prejuízo, em respeito ao princípio da boa-fé objetiva (art. 422 do Código Civil), que se aplica, igualmente, na esfera processual. É o que se denomina “duty to mitigate the loss”, princípio por meio do qual o aumento do próprio prejuízo, seja por ação ou por omissão do credor, constitui inequívoco abuso de direito, e implica vulneração à boa-fé.

- Competia à parte autora comunicar ao Juízo “a quo” acerca da ausência de implantação do benefício, com a presteza necessária a fim de assegurar o recebimento dos proventos e evitar a indevida incidência da penalidade, cujo montante, como é de sabença, provem dos cofres públicos, custeados por toda a coletividade.

- Do todo analisado, nego provimento ao gravo de instrumento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.