Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002945-45.2017.4.03.6114

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: DIRCEU MIRANDA LUTA, MARIA APARECIDA MOTTA

Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A
Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002945-45.2017.4.03.6114

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: DIRCEU MIRANDA LUTA, MARIA APARECIDA MOTTA

Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A
Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Cuida-se de ação de obrigação de fazer com reparação de danos materiais ajuizada por DIRCEU MIRANDA LUTA e sua esposa, em face da Caixa Econômica Federal – CEF, objetivando a concessão da tutela de urgência para obrigar o réu a efetuar os descontos dos empréstimos pactuados em valores que não excedem os limites legais de 30% sobre sua renda líquida, bem como para obstar os descontos na sua conta corrente, permitindo apenas em folha de pagamento. Ao final, requer a condenação do Réu a revisar os contratos de empréstimos, para adequar os descontos ao limite de 30% sobre o salário líquido, conforme previsão da Lei 10.820/2003; além da condenação na restituição dos valores descontados a título de seguros, no valor de R$ 17.004,93, com a proibição da cobrança de novos valores a esse título.

Decisão por cópia no ID Num. 46623797 - Pág. 1/3 indeferiu a tutela de urgência.

Interposto agravo de instrumento, o efeito suspensivo foi concedido em 01/02/2018, tendo sido provido o agravo em julgado de 23/05/2018, que determinou a  CEF que passe a descontar o limite de 30% sobre o rendimento mensal do agravante.

A sentença, datada de 26/11/2018, julgou improcedentes os pedidos. Custas e honorários advocatícios pelo Autor, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor da causa atualizado, sujeitando-se a exigência, todavia, ao disposto no art. 98, §3º do Código de Processo Civil.

Inconformado, apela o autor, reiterando, em síntese, seu pedido para que a limitação dos descontos dos contratos de mútuos, seja em folha de pagamento ou em conta corrente, fique no patamar máximo de 30% sobre o valor líquido do benefício previdenciário percebido.

Com contrarrazões.

 É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002945-45.2017.4.03.6114

RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO

APELANTE: DIRCEU MIRANDA LUTA, MARIA APARECIDA MOTTA

Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A
Advogado do(a) APELANTE: SIDIVALDO BENTO BORGES - SP358520-A

APELADO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: A questão controvertida, à luz da tese recursal e do próprio pedido e causa de pedir formulado na inicial, consiste em saber se há ilicitude no regular desconto (previsto em cláusula contratual tida por abusiva) de prestações de contrato de  mútuo de dinheiro condicionado com obrigações e alienação fiduciária,  firmados entre o correntista e o banco administrador da conta corrente - notadamente se é possível o estabelecimento da mesma limitação (30%) referente a consignações em folha de pagamento.

A regra protetiva de impenhorabilidade de salários e de valores em contas mantidas em instituições financeiras não pode ser interpretada de forma literal e irrestrita, em desproporcional benefício do executado, quando o mesmo firmou empréstimo com cláusula contratual expressa  autorizando desconto mensal.

No momento da celebração do contrato, o devedor teve plenas condições de avaliar o impacto financeiro do desconto, e aderiu ao acordo de livre e espontânea vontade, mostrando-se legítima e juridicamente correta a pretensão do credor em penhorar salários, ganhos do trabalho e de benefícios previdenciários nas proporções pactuadas, bem como montantes depositados em contas mantidas em instituições financeiras.

A recente jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que a modalidade de empréstimo com pagamento em débito na conta corrente mantida pela instituição financeira é distinta do empréstimo mediante consignação em folha de pagamento, não se sujeitando, assim, ao limite de 30% (trinta por cento) previsto no art. 1º, § 1º, da Lei nº 10.820/03.

Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÕES DE MÚTUO FIRMADO COM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. DESCONTO EM CONTA-CORRENTE. POSSIBILIDADE.  HIPÓTESE DISTINTA DO DESCONTO EM FOLHA. PRETENSÃO DE SE   APLICAR   A   LIMITAÇÃO   LEGAL   AO   EMPRÉSTIMO   CONSIGNADO. IMPOSSIBILIDADE.

1.  É lícito o  desconto de empréstimos celebrados com cláusula de desconto em conta corrente, hipótese distinta do desconto em folha de pagamento ou da conta-salário, cujo regramento sequer permite descontos facultativos ou a entrega de talão de cheques. Precedentes.

2. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1136156/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 18/12/2017)
 

No caso dos autos, Dirceu Miranda Luta e sua esposa, ajuizaram a presente ação em face da CEF aduzindo, em síntese, que possuem três contratos firmados com a Ré, de forma que o valor das prestações consignadas em pagamento superam o limite de 30% de seus rendimentos líquidos estabelecido pela Lei nº 10.820/2003. Bateu pela existência de venda casada na contratação do seguro vinculado ao contrato.

Em sua contestação, a CEF alegou que o autor possui conta corrente nº 00027066-0 na agência 0346 (Ag São Bernardo do Campo) e em 10/2014 firmou contrato CRÉDITO IMÓVEL CAIXA (modalidade Aporte), não se tratando, portanto, de empréstimo consignado em folha de pagamento. Quanto aos demais contratos mencionados na petição inicial, sustentou que tais avenças não foram firmadas com a CAIXA e sim com outras instituições financeiras, não tendo meios de prestar qualquer informação a respeito.

Conforme se verifica da inicial, o autor celebrou diversos contratos de empréstimo, com desconto em folha de pagamento e na conta corrente, a saber:

- Contrato por Instrumento Particular de Mútuo de Dinheiro Condicionada com Obrigações e Alienação Fiduciária, nº 155553238779 - firmado em 24/10/2014, no valor de R$ 70.500,00, com taxa de juros de 28,65% a.a. a ser pago em 180 prestações.

- Contrato nº 0029526259620160425 - firmado em 27/04/2016, no valor de R$ 5.832,70 (cinco mil, oitocentos e trinta e dois reais e setenta centavos), com taxa de juros de 2,527488% a.m. em 70 prestações mensais no valor de R$ 178,53;

-  Contrato nº 0037926801420160425 - firmado em 27/04/2016, no valor de R$ 21.096,78 (vinte e um mil, noventa e seis reais e setenta e oito centavos), com taxa de juros de 2,527488% a.m. em 70 prestações mensais no valor de R$ 645,76.

Trouxe cópia do contrato de mútuo firmado com a CEF, datado de 24/10/2014,  no qual consta sua qualificação de “aposentado” e a de sua esposa  “do lar”. Também juntou “Extrato de Empréstimos Consignados” emitidos pelo INSS, o qual aponta o  valor da sua aposentadoria de R$ 2.945,77, além de dois empréstimos contraídos com o Banco Itaú S/A em 05/2016, com previsão de encerramento em 05/2022, com parcelas nos valores de R$ 178,53 e R$ 645,76.

Os extratos emitidos pela CEF indicam que a prestação de mútuo pactuada com aquela instituição financeira na data do ajuizamento da ação tinha valor em torno de R$ 1.500,00. Apontam, ainda, o recebimento de crédito do INSS (a título de aposentadoria) no valor de R$ 2.121,48, já efetuados os descontos dos consignados junto ao Banco Itaú (ID Num. 46623790 - Pág. 1/5).

Todos os empréstimos, somados, totalizam mais que R$ 2.300,00 em descontos. A documentação juntada aos autos comprova que o rendimento bruto mensal do agravante é de R$ 2.945,77.

O grau de endividamento dos apelantes não é motivo juridicamente legítimo para afastar a cobrança de dívidas que os mesmos contraíram por livre e espontânea vontade, não sendo extensível a legislação pertinente a empréstimos consignados.

Por tais razões, nego provimento à apelação.

Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o percentual da verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017).

É como voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CONTRATOS BANCÁRIOS. EMPRÉSTIMO. DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO. DÉBITO EM CONTA-CORRENTE. LIMITAÇÃO. PERCENTUAL DE 30%. IMPOSSIBILIDADE.

- A questão controvertida consiste em saber se há ilicitude no regular desconto (previsto em cláusula contratual tida por abusiva) de prestações de contrato de  mútuo de dinheiro condicionado com obrigações e alienação fiduciária,  firmados entre o correntista e o banco administrador da conta corrente - notadamente se é possível o estabelecimento da mesma limitação (30%) referente a consignações em folha de pagamento.

- A regra protetiva de impenhorabilidade de salários e de valores em contas mantidas em instituições financeiras não pode ser interpretada de forma literal e irrestrita, em desproporcional benefício do executado, quando o mesmo firmou empréstimo com cláusula contratual expressa  autorizando desconto mensal. No momento da celebração do contrato, o devedor teve plenas condições de avaliar o impacto financeiro do desconto, e aderiu ao acordo de livre e espontânea vontade, mostrando-se legítima e juridicamente correta a pretensão do credor em penhorar salários, ganhos do trabalho e de benefícios previdenciários nas proporções pactuadas, bem como montantes depositados em contas mantidas em instituições financeiras.

- O grau de endividamento dos apelantes não é motivo juridicamente legítimo para afastar a cobrança de dívidas que os mesmos contraíram por livre e espontânea vontade, não sendo extensível o limite previsto para empréstimos consignados.

- Apelo desprovido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.