AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019880-04.2019.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: JOSE ROBERTO PRETEL PEREIRA JOB
Advogado do(a) AGRAVANTE: CLAUDIO JOSE DIAS BATISTA - SP133153-A
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019880-04.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: JOSE ROBERTO PRETEL PEREIRA JOB Advogado do(a) AGRAVANTE: CLAUDIO JOSE DIAS BATISTA - SP133153-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por JOSE ROBERTO PRETEL PEREIRA JOB contra decisão proferida nos autos da execução que lhes é movida pela UNIÃO FEDERAL. A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos: “Trata-se de execução fiscal ajuizada em 24/05/1999 destinada à cobrança de dívidas relacionadas a contribuições previdenciárias. Houve diversas tentativas de penhoras de imóveis, sendo certo que houve a desconstituição da penhora do imóvel de matrícula 46.767, restando, apenas a penhora sobre vaga da garagem vinculada ao apartamento. Em cumprimento ao despacho de fls. 1105 houve a pesquisa de bens por meio dos sistemas BACENJUD e RENAJUD. A pesquisa INFOJUD revelou não apenas o alto volume de renda dos executados e a posse de grande quantidade de dinheiro em espécie, mas a ausência de outros bens em seus nomes. O resultado da pesquisa BACENJUD foi parcial (fls. 1106/1111. A pesquisa RENAJUD indicou apenas um veículo marca GM/Kadett 1993 e um VW/Golf 2001.Às fls. 1153/1155 houve a liberação parcial dos valores bloqueados da executada Edith Maria. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir. Inicialmente, constata-se que houve o bloqueio do valor de R$ 83.644,42 do executado JOSÉ ROBERTO PRETEL PEREIRA JOB, valor este insuficiente para a garantia da dívida, a qual remonta a R$ 1.377.490,58.Alega o executado que os valores são referentes a verbas salariais. Conforme dispõe o artigo 833 do CPC:Art. 833. São impenhoráveis:...IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o 2o;...X - a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos;... Acerca do tema, o Colendo STJ tem proferido o seguinte entendimento: ".EMEN: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VALORES BLOQUEADOS EM CADERNETA DE POUPANÇA. IMPENHORABILIDADE. ART. 649, INCISO X, DO CPC. ALCANCE. LIMITE DE IMPENHORABILIDADE DO VALOR CORRESPONDENTE A 40 (QUARENTA) SALÁRIOS MÍNIMOS. MÁ-FÉ NÃO ANALISADA PELO TRIBUNAL LOCAL. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. "É possível ao devedor, para viabilizar seu sustento digno e de sua família, poupar valores sob a regra da impenhorabilidade no patamar de até quarenta salários mínimos, não apenas aqueles depositados em cadernetas de poupança, mas também em conta-corrente ou em fundos de investimento, ou guardados em papel-moeda." (REsp 1340120/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 19/12/2014). 2. "Reveste-se, todavia, de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em caderneta de poupança propriamente dita, CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que a única reserva monetária em nome do recorrente, e ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias do caso concreto (inciso X)." (REsp 1230060/PR, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/08/2014, DJe 29/08/2014). 3. A ressalva para aplicação do entendimento mencionado somente ocorre quando comprovado no caso concreto o abuso, a ma-fé ou a fraude da cobrança, hipótese sequer examinada nos autos pelo Colegiado a quo. 4. Agravo interno não provido. ..EMEN:" (Tipo Acórdão Número 2018.01.57959-7, 201801579597, Classe AINTARESP - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL - 1315033, Relator(a) LUIS FELIPE SALOMÃO, Origem STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Órgão julgador QUARTA TURMA Data 06/11/2018 Data da publicação 19/11/2018, Fonte da publicação DJE DATA:19/11/2018.) No caso dos autos, a pesquisa INFOJUD indica que o executado não obstante ostentar renda anual superior a R$ 500.000,00, não possui bens outros que não um pequeno apartamento, contas correntes com pequenos valores e pequenas cotas em cooperativas médicas. Outrossim, há a indicação de dinheiro em espécie em poder do declarante no total de R$ 150.000,00.No mais, observa-se que não houve a localização de bens em nome dos executados ao longo de todo o trâmite, sendo certo que o principal bem localizado (o pequeno apartamento) para garantia da dívida, ainda que insuficiente para a garantia da dívida, foi reconhecido como bem de família e houve a determinação de liberação da penhora. Não houve a localização de veículos para uma mínima satisfação da dívida. Considerando a renda dos executados informada nos autos, bem como o valor significativo bloqueado em depósitos bancários indicam a eventual possibilidade de patrimônio oculto, já que não se mostra crível que pessoas com a renda indicada e os valores depositados em conta bancária não tenham bens suficientes para a garantia da dívida. Há assim nítidos elementos comprovando a má-fé dos executados em burlar a satisfação do débito contraída perante a previdência social.No mais, o executado mantém em sua posse a quantia de R$ 150.000,00 em espécie, valor absolutamente penhorável. Conforme se observa pelos extratos bancários, em conjunto com as informações do INFOJUD, que o executado percebe renda superior aos seus gastos com a subsistência básica, de forma que parcela significativa de seu salário se transforma em investimentos. Tais verbas perdem sua natureza salarial na medida em que não são consumidas para o atendimento de sua subsistência. Outrossim, os valores somados ultrapassam e bastante o limite de 40 salários-mínimos. Igualmente, observa-se que da conta do executado são debitados diversos valores mês a mês como forma de investimento em títulos de capitalização, demonstrando a sobra salarial do executado. Pode-se seguramente concluir que a penhora dos R$ 83.644,42 não agride a subsistência do devedor, sendo certo que ele dispunha de R$ 150.000,00 em espécie, valor mais que suficiente para ao seu sustento e sua família. Neste sentido é a clara Jurisprudência do C. STJ: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EFEITO MODIFICATIVO NO ÂMBITO DE RECURSO ACLARATÓRIO. POSSIBILIDADE. IMPENHORABILIDADE DE SALÁRIO. CABIMENTO DE SUA RELATIVIZAÇÃO. MANUTENÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. PRESERVAÇÃO DA DIGNIDADE DO DEVEDOR E DA DE SEUS DEPENDENTES. DIREITO À SATISFAÇÃO DO CRÉDITO PELA PARTE EXEQUENTE.1. Os embargos de declaração, nos moldes em que trazidos pelo art.1.022 do CPC/15, destinam-se a provocar o magistrado a esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou, ainda, corrigir erro material. Nesse contexto, faz-se possível que, a partir da correção do vício apontado, advenha modificação capaz de alterar visceralmente o resultado do julgamento.2. Na hipótese vertente, foi constata omissão acerca dos fundamentos levantados em sede de contrarrazões ao recurso especial, os quais, de fato, demonstraram a existência de entendimento jurisprudencial diverso daquele adotado pela decisão monocrática, que havia dado provimento ao recurso especial. Assim, plenamente viável o acolhimentos dos declaratórios, com efeito modificativo, para negar provimento ao agravo em recurso especial.3. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do EREsp 1.582.475/MG, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, firmou compreensão no sentido de que "A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73; art.833, IV, do CPC/2015), pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família".4. Tal orientação consulta ao direito das partes em receber tratamento processual isonômico, de modo a resguardar tanto o direito fundamental do credor à satisfação do crédito executado quanto o direito fundamental do devedor a satisfazer o débito com a preservação de sua dignidade. 5. A regra da impenhorabilidade de vencimentos incide apenas quanto à fração do patrimônio pecuniário do devedor que se revele efetivamente necessária à manutenção de seu mínimo existencial, bem como à preservação de sua dignidade e da de seus dependentes. 6. Tendo a Corte local expressamente afirmado que a penhora de percentual da remuneração não comprometeria o mínimo vital do devedor e tampouco o reduziria à condição indigna, deve ser mantida a medida constritiva determinada pela instância ordinária. 7. Agravo interno a que se nega provimento. (AgInt nos EDcl no AREsp 1389818 / MS - AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2018/0285830-0 Relator(a) Ministro SÉRGIO KUKINA (1155) Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Data do Julgamento 04/06/2019 Data da Publicação/Fonte DJe 07/06/2019.) PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSOESPECIAL. PENHORA. POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE DEMONSTRADA.REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE.INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO.1. "A regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73; art. 833, IV, do CPC/2015),pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família". (EREsp 1582475/MG, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, CORTEESPECIAL, julgado em 03/10/2018, DJe 16/10/2018).2. Considerando o substrato fático descrito pelo eg. Tribunal a quo, que consignou expressamente que "há grande movimentação financeira na conta-corrente do agravante, de modo que o saldo existente no momento do bloqueio judicial é proveniente de inúmeros resgates de investimentos e depósitos bancários creditados em sua conta-corrente [...]", a constrição não comprometerá a sua subsistência digna do ora agravante, nem a de sua família.3. Ademais, nota-se os argumentos utilizados para fundamentar a violação ao art. 833, IV, do CPC/2015 somente poderiam ter sua procedência verificada mediante reexame das circunstâncias fáticas e das provas carreadas aos autos. Não cabe a esta Corte, portanto, rediscutir se os valores depositados na conta-corrente n. 52.716-5possuem natureza salarial, nem se os valores bloqueados na conta-corrente n. 7.522 seriam ao pagamento de funcionários da parte ora agravante, ante o óbice da Súmula 7/STJ.4. Agravo interno a que se nega provimento. Ainda que se considerasse possível a liberação dos valores alegados como verbas salariais, considerando que não houve a penhora do numerário em espécie é plenamente possível a substituição de um pelo outro. O executado encontra-se na disponibilidade de seus investimentos mantidos em seu poder e que não foram objeto de constrição e que podem funcionar em substituição ao valor bloqueado. Em face do exposto, indefiro o pedido de liberação dos valores bloqueados. Proceda-se à transferência dos valores para conta judicial, uma vez que já houve a preclusão para defesa por meio de embargos. Quanto ao pedido formulado pela União às fls. 1230/1231, o pedido merece parcial acolhimento nesta oportunidade. Conforme dispõe o artigo 139, IV, do Código de Processo Civil, cabe ao Juiz determinar as medidas indutivas e coercitivas destinadas à satisfação do crédito do exequente. Conforme já relatado, os executados, não obstante ostentar fluxo de renda extraordinário, tem se furtado ao dever de pagar suas dívidas. Outrossim, revela-se notável a ocultação de patrimônio e a má-fé na sua tentativa de afastar sua responsabilidade pelos débitos para com a previdência social. Em atenção ao princípio do contraditório, intimem-se os executados para manifestação no prazo de 15 (quinze) dias acerca das medidas coercitivas indicas pela União. Fica, outrossim, aberta a oportunidade para que os executados indiquem as medidas que entendam mais adequadas que contribuam para o pagamento de suas dívidas. Sem prejuízo, proceda a Secretaria a inclusão da restrição dos executados no sistema SERASAJUD conforme artigo 782, 3º, do CPC. Proceda-se a transferência dos valores bloqueados para conta judicial. Decorrido o prazo de 15 (quinze) dias, tornem os autos conclusos. Sem prejuízo, tendo em vista que já houve o ajuizamento de embargos e que foram rejeitados, intime-se a União para que forneça os dados necessários para conversão em renda dos valores bloqueados e destinados à quitação parcial do débito. Oficie-se ao Banco Itaú requisitando sejam detalhados os ativos bloqueados indicados no ofício de fls. 1156. Publique-se. Intime-se.” Alega o agravante, em síntese, que os valores bloqueados nas contas correntes são provenientes de verbas salariais, não sendo passíveis de penhora, nos termos do artigo 883 do Código de Processo Civil. Foi deferido em parte o pedido de efeito suspensivo ao recurso (ID. 137493508). Inconformado, o recorrente interpôs agravo interno (ID. 142024270). A parte agravada apresentou contrarrazões (ID. 142890570). É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5019880-04.2019.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: JOSE ROBERTO PRETEL PEREIRA JOB Advogado do(a) AGRAVANTE: CLAUDIO JOSE DIAS BATISTA - SP133153-A AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Dispondo sobre a cobrança judicial da dívida ativa da administração pública direta e indireta, a Lei nº 6.830/1980 se assenta em vários objetivos legítimos que forçam o cumprimento de obrigações pecuniárias pelo devedor, dentre eles as finalidades fiscais e extrafiscais de tributos, a observância de regramentos de administrativos e a imperatividade da legislação vigente em áreas de interesse socioeconômico. O objeto da ação de execução fiscal é o montante em dinheiro não pago pelo devedor a tempo e modo (art. 2º da Lei nº 6.830/1980), compreendendo tanto dívidas ativas tributárias (e respectivas multas) e quanto a dívidas ativas não tributárias (demais créditos da Fazenda Pública, tais como multa de qualquer origem ou natureza, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, FGTS, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, etc.). Essas dívidas fiscais estão devidamente anotadas em registros públicos, e são dotadas de liquidez e certeza nos moldes constantes do título executivo extrajudicial manuseado, motivo pelo qual o executado não é surpreendido pela execução fiscal. Há sempre medidas antecedentes à propositura da ação executiva, à disposição do conhecimento do devedor, começando pelo surgimento da própria obrigação e de suas inerentes responsabilidades (do credor e do devedor), passando por medidas de formalização de quantitativos (p. ex., DCTFs, GFIPs, e obrigações tributárias acessórias atribuídas pela lei a contribuintes, e autos de infração lavrados pela administração pública), chegando à inscrição nos registros de dívida ativa. Mesmo tendo como finalidade a satisfação do direito do credor-exequente, as medidas forçadas não podem ser adotadas a qualquer custo, devendo respeitar o modo menos gravoso para o devedor-executado. Porém, a menor onerosidade quanto ao devedor-executado deve ser também contextualizada com a efetividade da medida alternativa àquela mais gravosa, sob pena de serem relegados os válidos interesses do credor-exequente. Assim, a compreensão jurídica da menor onerosidade deve ser construída na área de convergência entre os interesses legítimos do credor e a excessiva privação do patrimônio e das atividades do devedor, daí significando que, havendo diversos meios executivos igualmente eficientes, deve-se trilhar aquele que implique em menor sacrifício para o devedor. No âmbito da menor onerosidade é também imprescindível considerar as determinações legais, sobre o que emerge a ordem de preferência de bens penhoráveis e os instrumentos para as correspondentes efetivações. Sobre a ordem de bens penhoráveis, tratando-se de execuções fiscais, o critério da especialidade induz à aplicação preferencial da lista fixada pelo art. 11 da Lei nº 6.830/1980, mas porque é necessário que fontes normativas dialoguem entre si, excepcionalmente, e possível impor a ordem descrita no art. 835 do Código de Processo Civil (não obstante se trate de diploma normativo geral, ainda que posterior à lei de execuções fiscais). De todo modo, para o que importa a este feito, tanto o art. 11 da Lei nº 6.830/1980 quanto o art. 835 do Código de Processo Civil partem do dinheiro como o primeiro item a ser penhorado, dada sua intrínseca liquidez. O termo “dinheiro” deve ser compreendido como moeda escritural (saldos em instituições financeiras) ou manual (na espécie em papel ou metálica), alcançando aplicações múltiplas (fundos de investimentos, p ex.). Sobre os instrumentos para a efetivação da penhora, meios eletrônicos para localizar recursos financeiros (em conta corrente, aplicações em bancos etc.) são, por certo, apenas formas ou procedimentos destinados à constrição dos mesmos objetos indicado pelo art. 11 da Lei nº 6.830/1980 e pelo art. 835 da lei processual civil. A correta compreensão do contido no art. 837 do Código de Processo Civil e no art. 185-A do Código Tributário Nacional permite a imediata utilização de meios eletrônicos para a penhora de bens nas ordens indicadas no art. 11 da Lei nº 6.830/1980 e no art. 835 da lei processual civil notadamente o dinheiro (primeiro item das listas legais de preferência), inexistindo mácula à menor onerosidade justamente porque essa é a determinação legal para equilibrar os interesses legítimos do credor com os ônus possíveis do devedor. Por tudo isso, a compreensão jurídica da menor onerosidade não pode comprometer o resultado útil do processo executivo, sendo viáveis meios eletrônicos para a efetivação de penhoras (notadamente o BACEN-JUD, e agora o SISBAJUD, que o substituiu), em favor da prestação jurisdicional célere e eficaz. Sobre o assunto, confira-se: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. RECUSA DE NOMEAÇÃO À PENHORA DE SEGURO GARANTIA. INOBSERVÂNCIA DA GRADAÇÃO LEGAL PREVISTA NO ARTIGO 11 DA LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS. PLEITO DE PENHORA POR MEIO DO SISTEMA BACENJUD. RECURSO PROVIDO. 1. Não obstante as alterações trazidas pela Lei nº 13.043/14, é uma realidade da vida que o dinheiro e seguro garantia ou fiança não são a mesma coisa e por isso a aceitação destes no lugar daquele só é cabível em situações excepcionais, o que não se verifica "in casu". 2. Do STJ colhe-se que "Esta Corte firmou posicionamento, em recurso repetitivo, segundo o qual é legítima a recusa ou a substituição, pela Fazenda Pública, de bem nomeado à penhora em desacordo com a gradação legal prevista nos arts. 11 da Lei n. 6.830/80, e 655 do CPC, devendo a parte executada apresentar elementos concretos que justifiquem a incidência do princípio da menor onerosidade para afastar a ordem legal, não demonstrados na espécie" (AgInt no REsp 1605001/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 25/10/2016). 3. Na gradação do artigo 835 do CPC de 2015 o "dinheiro" figura em primeiro lugar, de modo que o uso do meio eletrônico para localizá-lo é medida "preferencial", como soa o artigo 837 do CPC/2015 inexistindo na lei qualquer condicionamento no sentido de que "outros bens" devem ser perscrutados para fins de constrição "antes" do dinheiro. Precedente: (REsp 1184765/PA, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/11/2010, DJe 03/12/2010). 4. É certo que a execução deve ser feita de modo menos gravoso para o executado; mas isso não quer dizer - ao contrário de "interpretação" que os executados em geral dão ao artigo 805 do CPC/2015 (artigo 620 do CPC/73) - que a execução deve ser "comandada" pelos interesses particulares do devedor. O princípio da menor onerosidade não legitima que o executado "dite as regras" do trâmite da execução. 5. Agravo de instrumento provido.” (TRF3. AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO / SP 5000311-17.2019.4.03.0000. Órgão Julgador: Sexta Turma. Relator: Desembargador Federal Johonson di Salvo. Data do Julgamento: 20/09/2019. Data da Publicação/Fonte: e - DJF3 Judicial 1, 25/09/2019). Postas as balizas, passo a apreciar os bloqueios efetivamente realizados nos autos em 04.04.2019 (id. 8714330, fls.03/04) e os argumentos do agravante. Com efeito, os documentos apresentados indicam que foram bloqueados valores em contas correntes junto ao Banco Santander (R$ 41.856,80), Banco CECM Vale do Paraíba (R$ 41.514,98) e Banco Itaú (R$ 272,64). O agravante suscita a impenhorabilidade somente em relação aos dois primeiros montantes bloqueados, que totalizam R$ 83.371,78. A legislação e a jurisprudência procuram evitar imposições excessivas do credor em face do devedor, mas a regra geral é a possibilidade de penhora de bens para o cumprimento de obrigações válidas e legítimas, daí porque as hipóteses legais de impenhorabilidade representam exceção e, por isso, devem ser interpretadas restritivamente. É nesse contexto que emerge o art. 833, IV, e §2º do CPC/2015 (antes, do art. 649, IV, e §2º do CPC/1973), pelo qual o objeto impenhorável é o ganho do trabalho (vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, ganhos de trabalhador autônomo, e honorários de profissional liberal), o benefício previdenciário (proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios) e também quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família: “Art. 833. São impenhoráveis: (...) IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º ; (...) § 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º.” Pela literalidade do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015, todas as receitas do trabalho e de benefícios previdenciários, auferidos pelo devedor, são penhoráveis para pagamento de suas dívidas concernentes a “prestação alimentícia” (independentemente de sua origem), mas no caso de obrigações de outra natureza, a penhora somente pode recair sobre o que exceder a 50 salários mínimos mensais. A mera subsunção do fato ao conteúdo abstrato do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015, poderia levar à desproporcional proteção de ganhos do devedor até 50 salários mínimos mensais, em detrimento do direito de credores de verbas trabalhistas ou alimentares (exceto de prestações de alimentos), de empréstimos, de responsabilidade civil ou de qualquer outra natureza. Pela mesma simples subsunção, a literalidade do art. 833, X, e §2º do CPC/2015 (antes, do art. 649, X, e §2º do CPC/1973), levaria à impenhorabilidade apenas do saldo em conta poupança até 40 salários mínimos, desprotegendo o devedor apenas por manter o montante em conta corrente ou em outro investimento. Na vigência do art. 649, IV e X, e §2º do CPC/1973, e agora em face do art. 833, IV e X, e §2º do CPC/2015, a jurisprudência admite que o magistrado faça ponderações sobre casos e limites quantitativos da impenhorabilidade, procurando o ponto de convergência desse regramento com primados, direitos, garantias e deveres fundamentais do sistema jurídico (notadamente a boa-fé, a valorização do trabalho e da livre iniciativa e a subsistência familiar) visando à efetividade dos legítimos interesses do credor e às proteções elementares do devedor. Em relação especificamente aos honorários médicos, oportuna a transcrição do seguinte procedente desta E. Corte: AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. DESBLOQUEIO DE VALORES PENHORADOS PELO SISTEMA BACENJUD. IMPENHORABILIDADE. HONORÁRIOS MÉDICOS RECEBIDOS ATRAVÉS DA EMPRESA INDIVIDUAL. IMPENHORABILIDADE. CPC/2015, ART. 833, IV. 1. A Lei nº 9.841/99 instituiu o Estatuto da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, dispondo sobre o tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido previsto nos arts. 170 e 179 da Constituição Federal, assinalando, em seu bojo, as condições de enquadramento de microempresa ou empresa de pequeno porte. 2. Em se tratando de empresa individual, como é o caso dos autos, o entendimento adequado é no sentido de que há confusão entre a pessoa jurídica individual e a pessoa física, tanto que é pacífica a possibilidade da inclusão da pessoa física no polo passivo de execução fiscal processada contra a empresa individual. 3. É admissível a impenhorabilidade dos valores recebidos pela pessoa física através da empresa individual, a título de ganhos de trabalhador autônomo e honorários de profissional liberal, nos termos do inc. IV, art. 833 do CPC/2015. 4. No caso, a cópia do extrato da conta corrente da empresa individual demonstra que os créditos depositados no período de 1/7/2016 a 6/9/2016 (contemporâneo à penhora on line ocorrida em 3/8/2016) são decorrentes de transferência eletrônica disponível – TED efetuado pelo tomador de serviços Sociedade Beneficente São Camilo. 5. Ao menos em exame de cognição sumária, houve comprovação de que tais valores foram recebidos a título de honorários médicos, portanto, impenhoráveis, nos termos do inciso IV do art. 833 do CPC/2015, devendo ser determinado o desbloqueio dos valores depositados na conta bancária de titularidade da empresa individual. 6. Agravo de instrumento provido. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5001112-98.2017.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 31/08/2017, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 05/09/2017) (grifos meus) Nesse passo, verifica-se que o montante de R$ 13.374,33 (Banco Santander, agência 4203, c.c. 010005397 - ID. 87143330, fl. 10) refere-se ao salário percebido da “Fundação São Paulo” e o valor de R$ 20.423,73 (CECM Vale do Paraíba, SICOOB, coop. 5052-00, c.c. 200.843-2 - ID. 87163332, fl. 01) corresponde aos honorários médicos recebidos da “Unimed Sorocaba Cooperativa de Trabalho Médico”, não sendo passíveis, portanto, de penhora. No que tange aos valores restantes (R$ 49.573,72), necessário tecer algumas considerações. Para fins do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015, salários, demais ganhos do trabalho e benefícios previdenciários não se confundem com as correspondentes sobras, assim entendido o montante remanescente após pagamento das despesas necessárias mensais do devedor e de sua família. Cabe ao devedor o ônus de provar que o último ganho (periódico e regular, ou inconstante, variável e incerto) está comprometido com despesas indispensáveis à sua subsistência e de sua família, para que seja garantida a impenhorabilidade nos termos do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015. O magistrado deve analisar o caso concreto para aferir as receitas sucessivas do devedor (assalariado, autônomo, comissionado ou beneficiário da previdência) e os correspondentes gastos pessoais necessários, e, ainda, eventual abuso, má-fé, ou fraude. Uma vez caracterizada a sobra, o montante perde a impenhorabilidade até 50 salários mínimos e se converte em reserva de capital ou economia, razão pela qual a penhora somente pode recair sobre o que exceder a 40 salários mínimos, dada a proteção legal conferida às cadernetas de poupança, extensível à conta corrente e outras aplicações (art. 833, X, e §2º do CPC/2015, antes, art. 649, X, e §2º do CPC/1973). A esse respeito, trago à colação os seguintes julgados do E.STJ: AgInt no AgInt no AREsp 935.156/MS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/10/2019, DJe 30/10/2019; REsp 1766876/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe 19/11/2018; AgRg nos EDcl no REsp 1537626/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/02/2017, DJe 23/02/2017; REsp 1452204/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 13/12/2016; REsp 1230060/PR, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/08/2014, DJe 29/08/2014; e REsp 1330567/RS, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/05/2013, DJe 27/05/2013. No caso dos autos, diante do conjunto probatório produzido, entendo que restou configurada a sobra em relação ao montante de R$ 49.573,72 (sendo irrelevante o tempo na qual foi formada), devendo a constrição permanecer somente em relação ao que exceder R$ 39.920,00, valor correspondente a 40 salários mínimos à época da constrição (04.04.2019). Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO, para determinar o desbloqueio do montante de R$ 73.718,06, depositados no Banco Santander, agência 4203, c.c. 010005397 e no CECM Vale do Paraíba, SICOOB, coop. 5052-00, c.c. 200.843-2, julgando prejudicado o agravo interno. É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. BLOQUEIO DE ATIVOS FINANCEIROS POR MEIO DO SISTEMA BACENJUD E SISBAJUD. GANHOS DO TRABALHO E HONORÁRIOS MÉDICOS DEPOSITADOS EM CONTA-CORRENTE. IMPENHORABILIDADE. SOBRAS SALARIAIS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
- A compreensão jurídica da menor onerosidade deve ser construída na área de convergência entre os interesses legítimos do credor e a excessiva privação do patrimônio e das atividades do devedor, daí significando que, havendo diversos meios executivos igualmente eficientes, deve-se trilhar aquele que implique em menor sacrifício para o devedor. No âmbito da menor onerosidade é também imprescindível considerar as determinações legais, sobre o que emerge a ordem de preferência de bens penhoráveis e os instrumentos para as correspondentes efetivações.
- Meios eletrônicos para localizar recursos financeiros (em conta corrente, aplicações em bancos etc.), tais como BACENJUD e o SISBAJUD, são instrumentos legítimos destinados à constrição dos mesmos objetos indicados na ordem de penhora do art. 11 da Lei nº 6.830/1980 e do art. 835 da lei processual civil (cujas listas devem dialogar entre si, não obstante o critério da especialidade). O art. 837 do Código de Processo Civil e art. 185-A do Código Tributário Nacional permitem a imediata utilização desses meios eletrônicos, inexistindo mácula à menor onerosidade porque essa é a determinação legal para equilibrar os interesses legítimos do credor com os ônus possíveis do devedor.
- Sobre a ordem de bens penhoráveis, tratando-se de execuções fiscais, o critério da especialidade induz à aplicação preferencial da lista fixada pelo art. 11 da Lei nº 6.830/1980, mas porque é necessário que fontes normativas dialoguem entre si, excepcionalmente, e possível impor a ordem descrita no art. 835 do Código de Processo Civil (não obstante se trate de diploma normativo geral, ainda que posterior à lei de execuções fiscais).
- De todo modo, tanto o art. 11 da Lei nº 6.830/1980 quanto o art. 835 do Código de Processo Civil partem do dinheiro como o primeiro item a ser penhorado, dada sua intrínseca liquidez. O termo “dinheiro” deve ser compreendido como moeda escritural (saldos em instituições financeiras) ou manual (na espécie em papel ou metálica), alcançando aplicações múltiplas (fundos de investimentos, p ex.).
- Na vigência do art. 649, IV e X, e §2º do CPC/1973, e agora em face do art. 833, IV e X, e §2º do CPC/2015, a jurisprudência admite que o magistrado faça ponderações sobre casos e limites quantitativos da impenhorabilidade, procurando o ponto de convergência desse regramento com primados, direitos, garantias e deveres fundamentais do sistema jurídico (notadamente a boa-fé, a valorização do trabalho e da livre iniciativa e a subsistência familiar) visando à efetividade dos legítimos interesses do credor e às proteções elementares do devedor.
- Para fins do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015, salários, demais ganhos do trabalho e benefícios previdenciários não se confundem com as correspondentes sobras, assim entendido o montante remanescente após pagamento das despesas necessárias mensais do devedor e de sua família. Cabe ao devedor o ônus de provar que o último ganho (periódico e regular, ou inconstante, variável e incerto) está comprometido com despesas indispensáveis à sua subsistência e de sua família, para que seja garantida a impenhorabilidade nos termos do art. 833, IV, e §2º do CPC/2015. O magistrado deve analisar o caso concreto para aferir as receitas sucessivas do devedor (assalariado, autônomo, comissionado ou beneficiário da previdência) e os correspondentes gastos pessoais necessários, e, ainda, eventual abuso, má-fé, ou fraude.
- Uma vez caracterizada a sobra, o montante perde a impenhorabilidade até 50 salários mínimos e se converte em reserva de capital ou economia, razão pela qual a penhora somente pode recair sobre o que exceder a 40 salários mínimos, dada a proteção legal conferida às cadernetas de poupança, extensível à conta corrente e outras aplicações (art. 833, X, e §2º do CPC/2015, antes, art. 649, X, e §2º do CPC/1973).
- No caso dos autos, parte do valor bloqueado na conta corrente do executado refere-se ao salário percebido, bem como aos honorários decorrentes do exercício da medicina, sendo dotados, portanto, da impenhorabilidade estatuída no art. 833, IV, do CPC. No que tange ao montante restante, caracterizada a sobra (sendo irrelevante o tempo na qual foi formada), a constrição deve permanecer somente em relação ao que exceder aos 40 salários mínimos vigentes à época do bloqueio.
- Agravo de instrumento parcialmente provido.
- Agravo interno prejudicado.