Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001699-96.2017.4.03.6119

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

APELADO: BRUNA GUERINO DA CONCEICAO

Advogado do(a) APELADO: ELIANE ROSA FELIPE - SP111477-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001699-96.2017.4.03.6119

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

 

APELADO: BRUNA GUERINO DA CONCEICAO

Advogado do(a) APELADO: ELIANE ROSA FELIPE - SP111477-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de ação ordinária ajuizada em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a parte autora a cobrança das parcelas devidas à título de benefício de auxílio-reclusão, devidas entre a data da prisão e a data da implantação do benefício, previsto no artigo 80 da Lei nº 8.213/91.

A sentença prolatada em 06.12.2017 julgou procedente o pedido inicial nos seguintes termos: “Por todo o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para condenar o INSS ao pagamento dos valores relativos ao auxílio reclusão no período de maio de 2012 a abril de 2015, incluindo abono anual, acrescidas de correção monetária e juros moratórios, calculados nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Em consequência, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Condeno a parte ré ao reembolso de eventuais despesas e ao pagamento de honorários advocatícios, que fixo no percentual mínimo do § 3º do art. 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação/proveito econômico obtido pela parte autora, de modo a possibilitar sua eventual majoração, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo, e observado, ainda, seu § 5º, por ocasião da apuração do montante a ser pago. O valor da condenação fica limitado ao valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ). Sem condenação do INSS ao pagamento de custas, haja vista sua isenção. Sentença NÃO sujeita ao reexame necessário (art. 496, §3º, CPC). Registre-se. Publique-se. Intimem-se.”

Apela o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, requerendo preliminarmente a suspensão do processo até a decisão do STF, que reconheceu a existência de repercussão geral nos autos do RE n° 870.947/SE. No mérito, sustenta que a parte autora tem direito ao benefício pleiteado, contudo, não tem direito ao pagamento das parcelas vencidas, por ter mais de 16 anos por ocasião do requerimento administrativo e formulado tal pedido fora do prazo prescricional do art. 74, II, da Lei de Benefícios. Subsidiariamente, caso mantida a sentença, requer a reforma quanto à correção monetária, para que seja aplicada com base nos índices previstos na Lei n. 11.960/2009.

Requer, ainda, para fins de pré-questionamento, a expressa manifestação a respeito das normas legais e constitucionais aventadas.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001699-96.2017.4.03.6119

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL

 

APELADO: BRUNA GUERINO DA CONCEICAO

Advogado do(a) APELADO: ELIANE ROSA FELIPE - SP111477-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.

A questão preliminar se confunde com o mérito, e com ele será apreciado.

Passo ao exame do mérito.

O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço (art. 80 da Lei nº 8.213/91). O art. 26, I, da Lei 8.213/91, por sua vez, prevê que a concessão do auxílio-reclusão independe de carência, e o artigo 40 declara devido o abono anual.

De acordo com as normas dos artigos 116 a 119 do Decreto nº 3.048/99, o benefício é devido apenas durante o período em que o segurado permanecer recluso, sob regime fechado ou semi-aberto, sendo que, no caso de fuga, o auxílio-reclusão será suspenso e seu restabelecimento ocorrerá se houver a recaptura do fugitivo, desde que mantida sua qualidade de segurado.

Dessa forma, para fins de manutenção do benefício, deve ser apresentado trimestralmente atestado de que a detenção ou reclusão do segurado ainda persiste.

A legislação atinente à matéria estabeleceu, assim, quatro critérios para a concessão do auxílio reclusão, quais sejam: a) prova do efetivo recolhimento do segurado à prisão, por meio de certidão firmada pela autoridade competente; b) qualidade de segurado do recluso, c) preexistência de dependência econômica do beneficiário, e d) condição de baixa renda do segurado.

A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.

O art. 15 da Lei 8.213/91 prevê circunstâncias nas quais é possível manter a condição de segurado independentemente de contribuições (em regra fixando prazos para tanto), sendo também considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.

No que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.

Sobre a dependência econômica do beneficiário em relação ao recluso, a Lei 8.213/1991, art. 16, prevê que "são beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado: I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido". Por sua vez, o § 4º desse mesmo artigo estabelece que "a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada."

Por fim, observo que o requisito de condição de baixa renda do segurado foi estabelecido após a edição da Emenda Constitucional nº 20/98, com fulcro no inciso IV, do artigo 201 da Constituição Federal. Dispõe o artigo 13 dessa Emenda que o auxílio-reclusão será concedido apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), valor periodicamente atualizado através de Portarias Interministeriais.

Esta limitação é aplicável à renda do segurado, não podendo seu último salário-de-contribuição ser superior ao limite imposto para que seus dependentes façam jus ao benefício.

Nesse sentido, confira-se o seguinte julgado do C. STF:

"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO . ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO- RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão , a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários. III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade. IV - Recurso extraordinário conhecido e provido." (STF, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, RE N. 587.365, data do julgamento: 25.03.2009, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI).

Acresça-se que conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, para a concessão de auxílio-reclusão o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição.

Confira-se:

“RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036 DO CPC/2015) E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.  AUXÍLIO-RECLUSÃO.  SEGURADO DESEMPREGADO OU SEM RENDA EM PERÍODO  DE  GRAÇA.  CRITÉRIO ECONÔMICO.  MOMENTO DA RECLUSÃO. AUSÊNCIA DE   RENDA.  ÚLTIMO  SALÁRIO  DE  CONTRIBUIÇÃO  AFASTADO. CONTROVÉRSIA  SUBMETIDA  AO  RITO  DO  ART. 543-C DO CPC/1973 (ATUAL 1.036  DO  CPC/2015)

1.  A controvérsia submetida ao regime do art. 543-C  do  CPC/1973  (atual  1.036  do  CPC/2015) e da Resolução STJ 8/2008  é:  "definição  do critério de renda (se o último salário decontribuição  ou  a  ausência  de  renda) do segurado que não exerce atividade remunerada abrangida pela Previdência Social no momento do recolhimento à prisão para a concessão do benefício auxílio-reclusão (art.   80   da   Lei  8.213/1991)".

FUNDAMENTOS  DA  RESOLUÇÃO  DA CONTROVÉRSIA.

 2.  À luz dos arts. 201, IV, da Constituição Federal e 80  da  Lei  8.213/1991,  o  benefício  auxílio-reclusão consiste na prestação  pecuniária  previdenciária  de  amparo aos dependentes do segurado  de  baixa  renda  que  se  encontra  em regime de reclusão prisional.

3. O Estado, através do Regime Geral de Previdência Social, no caso, entendeu por bem amparar os que dependem do segurado preso e definiu como critério para a concessão do benefício a "baixa renda".

4.   Indubitavelmente  o  critério  econômico  da  renda  deve  ser constatado  no  momento  da reclusão, pois nele é que os dependentes sofrem o baque da perda do seu provedor.

5.  O art. 80 da Lei 8.213/1991 expressa que o auxílio-reclusão será devido quando o segurado recolhido à prisão "não receber remuneração da empresa".

6.  Da mesma forma o § 1º do art. 116 do Decreto 3.048/1999 estipula que  "é  devido  auxílio-reclusão aos dependentes do segurado quando não   houver   salário-de-contribuição   na   data  do  seu  efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado", o que  regula  a situação fática ora deduzida, de forma que a ausência de renda deve ser considerada para o segurado que está em período de graça pela falta do exercício de atividade remunerada abrangida pela Previdência Social. (art. 15, II, da Lei 8.213/1991).

7. Aliada a esses argumentos por si sós suficientes ao desprovimento do Recurso Especial, a jurisprudência do STJ assentou posição de que os requisitos para a concessão do benefício devem ser verificados no momento do recolhimento à prisão, em observância ao princípio tempus regit  actum.  Nesse sentido: AgRg no REsp 831.251/RS, Rel. Ministro Celso  Limongi  (Desembargador convocado do TJ/SP), Sexta Turma, DJe 23.5.2011; REsp 760.767/SC, Rel. Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ  24.10.2005,  p.  377;  e REsp 395.816/SP, Rel. Ministro Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJ 2.9.2002, p. 260.

TESE  PARA  FINS  DO  ART.  543-C DO CPC/1973

8. Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991), o critério de aferição de  renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento  do  recolhimento  à  prisão  é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição.

CASO CONCRETO 

9.  Na  hipótese dos autos, o benefício foi deferido pelo acórdão recorrido no mesmo sentido do que aqui decidido.

10.  Recurso  Especial  não  provido. Acórdão submetido ao regime do art. 1.036 do CPC/2015 e da Resolução 8/2008 do STJ.

(Processo REsp 1485417 / MS,  RECURSO ESPECIAL 2014/0231440-3, Relator(a) Ministro HERMAN BENJAMIN (1132), STJ, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento: 22/11/2017, Data da Publicação/Fonte: DJe 02/02/2018)”

Assim, se comprovados os requisitos exigidos para sua concessão, o auxílio-reclusão é devido a partir da data do efetivo recolhimento do segurado à prisão, se requerido no prazo de 30 (trinta) dias a contar daquela, ou, se fora dele, desde a data do requerimento.

Os critérios de fixação da renda mensal inicial decorrem de lei, competindo ao INSS tão apenas observar as regras vigentes.

NO CASO CONCRETO

A parte é filha do segregado (ID. 2467904), e sendo esta menor de idade na época em que seu genitor foi preso, sua dependência em relação a ele é presumida (art. 16, I, da Lei 8213/91).

A certidão de Recolhimento Prisional expedida pela Secretaria da Administração Penitenciária (ID. 2467910) comprova que o pai da parte autora foi preso em 02.11.2013.

O extrato do sistema CNIS (ID. 2467911) revela a existência de vínculo empregatício no momento da prisão, restando evidenciado o preenchimento do requisito de qualidade de segurado.

Quanto à condição de baixa renda do segurado recluso, o extrato CNIS (id. 2467914) indica que seu salário à época do encarceramento era de R$ 946,53, valor inferior ao limite de R$ 971,78, estabelecido para o período pela Portaria MPS nº 15, de 01/01/2013.

A cópia da Carta de Concessão/Memória de Cálculo emitida dela Previdência Social (ID. 2467908), demonstra que o pedido administrativo foi requerido em 26/05/2015 e o ofício n° 1171/2018/APSADJ Guarulhos/GEX-SP/INSS informa que o auxilio reclusão foi concedido administrativamente com data de início de pagamento em 26/05/2015.

Todavia, no que concerne as parcelas devidas à título de benefício de auxílio-reclusão, devidas entre a data da prisão e a data da implantação do benefício, não faz jus a autora, tendo em vista que o pedido administrativo foi formulado fora do prazo prescricional do art. 74, II, da Lei de Benefícios e, ao tempo do requerimento administrativo a autora tinha mais de 16 anos de idade (ID. 2467904), sendo, relativamente incapaz, não fazendo jus as parcelas vencidas.  

Por outro lado, a Lei Civil não exime o menor relativamente incapaz das suas consequências, na medida em que lhe confere o direito de ação contra os respectivos assistentes ou representantes legais, a quem compete a preservação de seus interesses, que tenham dado causa ao prejuízo patrimonial causado pela inércia ou omissão (art. 195 do Código Civil atual).

Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §4º do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973, considerando que o recurso foi interposto na sua vigência, não se aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.

Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo INSS e, DOU PROVIMENTO à sua apelação, nos termos da fundamentação exposta.

 É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

 

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PRELIMINAR REJEITADA. AUXÍLIO RECLUSÃO. AUTOR RELATIVAMENTE INCAPAZ À ÉPOCA DO REQUERIMENTO DO BENEFÍCIO. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA.

1. Preliminar de suspensão arguida pela autarquia rejeitada.

2. O auxílio-reclusão é benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado nos termos do artigo 80 da Lei n° 8.213/1991.

3. A renda a ser aferida é a do detento e não a de seus dependentes. (RE 587365, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, DJe 08/05/2009).

3. Termo inicial do beneficio fixado na data do pedido administrativo. Menor relativamente incapaz.

4. Inversão do ônus da sucumbência.

5. Apelação do INSS provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar arguida pelo INSS e, DAR PROVIMENTO à sua apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.