Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014641-53.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

AGRAVANTE: DOMINGOS MONTEIRO FERRAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: NAOKO MATSUSHIMA TEIXEIRA - SP106301-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014641-53.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

AGRAVANTE: DOMINGOS MONTEIRO FERRAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: NAOKO MATSUSHIMA TEIXEIRA - SP106301-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

Trata-se de agravo de instrumento interposto por Domingos Monteiro Ferraz em face de decisão proferida em sede de cumprimento de sentença, pela qual o juízo de origem determinou a devolução, nos próprios autos, dos valores pagos a maior, em virtude de equívoco do cartório na expedição da respectiva RPV – Requisição de Pequeno Valor.

Alega a parte agravante que a restituição das verbas de caráter alimentar recebidas a maior, por erro administrativo, e de boa-fé, contraria o entendimento do Superior Tribunal de Justiça consolidado no julgamento do REsp 1.244.182/SP, submetido ao rito do artigo 543-C do CPC. Aduz, ainda, que na eventual hipótese de cabimento de tal devolução, tal medida deveria ocorrer mediante a propositura de ação de cobrança específica para tal finalidade, sendo incabível a restituição de tal montante nos próprios autos da execução. Requer o provimento do recurso para reformar a decisão agravada com o fito de obstar o restituição dos citados valores dada a sua irrepetibilidade, além de ser inapropriado o meio processual eleito, bem como pugna pela condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais a serem arbitrados em 20% sobre o valor do débito exequendo atualizado, a teor do disposto no artigo 85, parágrafos 1º, 2º, 3º e 11 do CPC/2015.

Intimado, o INSS deixou de apresentar contraminuta.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5014641-53.2018.4.03.0000

RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES

AGRAVANTE: DOMINGOS MONTEIRO FERRAZ

Advogado do(a) AGRAVANTE: NAOKO MATSUSHIMA TEIXEIRA - SP106301-N

AGRAVADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

Em uma breve síntese dos fatos, trata-se de cumprimento de acórdão que determinou a concessão do benefício da aposentadoria rural por idade pelo INSS em favor da parte autora/agravante, bem como estabeleceu o pagamento dos atrasados da condenação acrescidos dos devidos consectários legais. Após regular liquidação do r. julgado, foi homologado o cálculo das diferenças no montante total de R$ 407.624.89 atualizado para 07/2015, tendo o juízo de origem autorizado a expedição dos respectivos ofícios requisitórios (fl. 50 do id 3410710).

Ocorre que, por equívoco do setor administrativo competente, constou no Precatório (oficio requisitório nº 20150074806), erroneamente, como sendo a data da conta homologada, o dia de 09/10/2006, ao invés do termo correto correspondente a 07/2015, o que acarretou o pagamento de quantia superior à devida (R$ 18.563,58, a título de honorários advocatícios, por meio de RPV, em 27/01/2016, e R$ 742.272,47, em relação ao crédito principal, mediante precatório, em 05/2017) – fls. 03 e 10 do id 3410718.

Intimada para se manifestar acerca de tal depósito, a parte autora/agravante procedeu ao levantamento das citadas quantias, deixando de de apontar os aludidos excessos (fl. 11, fls. 17/18 do id mencionado).

Requerida a repetição do importe pago a maior, no valor estimado pelo INSS em R$ 300.194,14, a título de verba principal, e em R$ 8.099,06, como honorários advocatícios (atualizado para 11/2017) – fls. 51/52, e efetuado o contraditório, o juízo de origem, ao proferir a decisão recorrida, deferiu a pretendida devolução do excesso mencionado, nos próprios autos, sob pena de execução forçada.

Pois bem. Este relator não desconhece os precedentes, no âmbito do STJ, citados pelo agravante, no entanto é cediço que a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça submeteu o REsp 1.381.734 à sistemática dos recursos repetitivos, delimitando a controvérsia nos seguintes termos (TEMA 979): “Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social”. Além disso, determinou a suspensão do processamento de todos os processos, individuais ou coletivos, que versem sobre a mesma matéria e tramitem no território nacional, nos termos do art. 1.037, II, do CPC/2015.

No caso concreto, apesar de evidente que o pagamento a maior ocorreu em virtude de erro cometido pela própria Administração Pública (no caso, da secretaria judiciária, quando do preenchimento dos ofícios requisitórios) não se pode presumir a boa-fé da parte credora, uma vez que estava ciente da importância requisitada judicialmente, não ignorando o seu excesso, de modo que a presente hipótese não se amolda à controvérsia submetida a julgamento no REsp 1.381.734 (Tema 979/STJ).

Ressalte-se que tal erro material ou procedimental acarretou o locupletamento  indevido, com implicação sobre os cofres públicos, os quais não devem ser acobertados pelo Poder Judiciário, ante a vedação ao enriquecimento sem causa e por força da supremacia do interesse público.

Ademais, a teor do disposto no artigo 115, inciso II, da Lei nº 8.213/1991, os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição.

Cumpre salientar que, no julgamento dos recursos de apelação interpostos nos autos da Ação Civil Pública n° 0005906-07.2012.403.6183 (DJF: 04/07/2017), realizado no âmbito da Sétima Turma deste Tribunal, tive a oportunidade de me manifestar sobre a devolução dos valores pagos ao segurado a título de benefício previdenciário ou assistencial em virtude de decisão judicial provisória ou sentença, posteriormente, revogada ou reformada, considerando, inclusive, o teor do entendimento fixado no REsp nº 1.401.560/MT (Tema nº 692/STJ).

Não obstante o trânsito em julgado ainda não tenha se aperfeiçoado (estando o feito suspenso, atualmente), é cabível, apenas no tocante ao meio processual apropriado para a aludida repetição, adotar a mesma linha de entendimento do citado precedente de minha Relatoria, qual seja: (...) Propor nova ação perante outro Juízo retira do Juiz da causa, por exemplo, a possibilidade de decidir se houve ou não má-fé ou boa-fé, se os valores, no caso concreto, devem ser devolvidos e como se deverá fazer essa devolução. Essas questões devem ser discutidas caso a caso, e são questões eminentemente processuais ligadas ao feito em que se debateu o mérito da causa. É também por isso que se veda a inscrição desses valores na dívida ativa e sua cobrança por execução fiscal: exige-se que haja discussão sobre o mérito da devolução. Somente o próprio Juízo que decidiu o mérito da ação poderá deliberar, no futuro, sobre as obrigações, decorrentes da lei ou da sentença, surgidas após o trânsito em julgado da decisão.

Portanto, é de rigor que os débitos decorrentes de pagamento a maior em favor do beneficiário da previdência social sejam cobrados e restituídos ao erário, mas não por meio de execução fiscal, nem por intermédio de uma nova ação de conhecimento. Basta a liquidação do valor a ser reposto, a ser realizada nos próprios autos em que tratada a questão de mérito.

Nesse sentido, destaco ainda os seguintes julgados:

ERRO PROCEDIMENTAL. DATA DA CONTA DE LIQUIDAÇÃO. OFÍCIO REQUISITÓRIO. PAGAMENTO A MAIOR. DESCONTOS NO VALOR DO BENEFÍCIO. DJ: 18/11/2019. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. EXPEDIÇÃO DE RPV. EQUÍVOCO DA SERVENTIA. DATA DA ELABORAÇÃO DA CONTA INFORMADA DE MANEIRA INCORRETA. PAGAMENTO A MAIOR. DEVOLUÇÃO. CABIMENTO. ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. VEDAÇÃO. LIQUIDAÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS. RECURSO DA AUTORA DESPROVIDO.

(...) 5 - Incontroversa a constatação de equívoco por parte da serventia de origem, ao preencher, na proposta de RPV, o campo destinado à aposição da “data da conta” como se fosse 02 de dezembro de 2014 quando, em verdade, a memória de cálculo ofertada pela Autarquia Previdenciária se encontra atualizada até a competência junho/2016. 6 - Corolário lógico, a situação gerou a atualização indevida do montante requisitado, com o pagamento de importância a maior. E, no ponto, registre-se que a autora sequer manifestou discordância em relação ao quantum apurado pelo INSS como pago indevidamente. 7 - Perfeitamente possível a resolução da controvérsia no bojo da demanda subjacente, por integrar o escopo da execução. Cuida-se, aqui, de impedir o enriquecimento ilícito da credora e seu patrono, pelo recebimento de valores provenientes dos cofres públicos, os quais, como é cediço, são custeados por toda a sociedade. 8 - Assim, a questão passa ao largo da existência ou não de boa-fé, como pretende a agravante. Constatado o pagamento indevido, os respectivos valores devem, sim, ser restituídos ao erário, inclusive com a possibilidade de desconto a incidir nas prestações mensais do benefício em manutenção, na exata compreensão do disposto no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91 (“pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância”). 9 - Para além disso, o acerto de contas, com a devolução dos valores recebidos a maior, pode – e deve – ser feito no bojo da própria execução, em respeito ao princípio do juiz natural, sendo descabida, a tanto, a propositura de demanda autônoma. 10 - A esse respeito, observe-se que, na hipótese de repetibilidade dos valores recebidos pela parte autora por força de tutela de urgência, esta somente pode ser vindicada pelo INSS nos próprios autos da ação em que foi concedida, após regular liquidação, não sendo admissível a cobrança administrativa, a execução fiscal ou o ajuizamento de nova ação de conhecimento para tal finalidade. É o que expressamente dispunha e dispõem os artigos 273, §3º combinado com o 475-O, I e II do CPC/73 e 297, parágrafo único combinado com o 302, I e parágrafo único e 520, I e II do CPC/15. 11 - É o que também restou decidido na Ação Civil Pública autuada sob o nº 0005906-07.2012.4.03.6183, promovida pelo Ministério Público Federal e pelo Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos da Força Sindical, objetivando a condenação do INSS a abster-se da cobrança de valores referentes aos benefícios previdenciários ou assistenciais concedidos por meio de liminar, tutela antecipada e sentença, que foram revogadas ou reformadas por decisão judicial posterior. 12 – A efetivação da cobrança dos valores recebidos a maior deve corresponder, necessariamente, à liquidação do débito nos próprios autos da ação em que concedido o benefício, com a execução das parcelas em atraso. 13 – Agravo de instrumento interposto pela autora desprovido (TRF 3ª Região, 7ª Turma, AI 5006255-34.2018.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 13/06/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/06/2020).

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO REQUISITÓRIO. ERRO MATERIAL NÃO ABATIMENTO DE VALORES RECEBIDOS ADMINISTRATIVAMENTE. RECEBIMENTO INDEVIDO. DEVOLUÇÃO DE VALORES NOS PRÓPRIOS AUTOS.  EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. 1. É evidente a ocorrência de erro material no ofício requisitório, vez que não houve o abatimento dos valores recebidos administrativamente pelo exequente, ensejando o pagamento a maior. 2. Evidenciado o pagamento equivocado, é devida a restituição do valor excedente ao erário público, em observância aos princípios da supremacia do interesse público, da indisponibilidade do patrimônio do Estado e da vedação de enriquecimento sem causa, considerando, ainda, que erros materiais podem ser corrigidos a qualquer tempo, inclusive de ofício, sem que se coloque em risco a autoridade da coisa julgada, garantindo, ao contrário, a eficácia material da decisão judicial. 3. Assim sendo, deve ser efetuada a devolução dos valores recebidos a maior pela parte exequente, nos próprios autos. 4. Apelação do INSS provida. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv. 5000456-54.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 09/10/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 15/10/2020)

Logo, é de rigor a restituição do valor pago a maior em favor da parte agravante, a fim de recompor o prejuízo causado ao erário, devendo a execução prosseguir nos próprios autos, quando baixados à Primeira Instância.

Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. ERRO PROCEDIMENTAL. DATA DA CONTA DE LIQUIDAÇÃO. OFÍCIO REQUISITÓRIO. PAGAMENTO A MAIOR. BOA-FÉ NÃO CONFIGURADA. RESTITUIÇÃO DO MONTANTE EXCEDENTE NOS PRÓPRIOS AUTOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. FIXAÇÃO. JUSTIÇA GRATUITA

1. No caso concreto, apesar de evidente que o pagamento a maior ocorreu em virtude de erro cometido pela própria Administração Pública (no caso, da secretaria judiciária, quando do preenchimento dos ofícios requisitórios) não se pode presumir a boa-fé da parte credora, uma vez que estava ciente da importância requisitada judicialmente, não ignorando o seu excesso, de modo que a presente hipótese não se amolda à controvérsia submetida a julgamento no REsp 1.381.734 (Tema 979/STJ).

2. Tal erro material ou procedimental acarretou o locupletamento  indevido, com implicação sobre os cofres públicos, os quais não devem ser acobertados pelo Poder Judiciário, ante a vedação ao enriquecimento sem causa e por força da supremacia do interesse público. Ademais, a teor do disposto no artigo 115, inciso II, da Lei nº 8.213/1991, os benefícios previdenciários pagos indevidamente estão sujeitos à repetição.

3. No tocante ao meio processual apropriado para a aludida repetição, é de rigor que os débitos decorrentes de pagamento a maior em favor do beneficiário da previdência social sejam cobrados e restituídos ao erário, mas não por meio de execução fiscal, nem por intermédio de uma nova ação de conhecimento. Basta a liquidação do valor a ser reposto, a ser realizada nos próprios autos em que tratada a questão de mérito (nesse sentido: Ação Civil Pública n° 0005906-07.2012.403.6183. TRF3. Sétima Turma. DJE: 04/07/2017). Precedentes desta E. Turma.

4. Agravo de instrumento não provido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.