Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5283920-50.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IRACI FABIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IRACI FABIANO

Advogado do(a) APELADO: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5283920-50.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IRACI FABIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IRACI FABIANO

Advogado do(a) APELADO: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

­R E L A T Ó R I O

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhadora rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado, “reconhecendo como de labor rural o período de 09/09/2003 a 22/11/2003, em que esteve em gozo do benefício de auxílio-doença previdenciário, para fins de carência”. Condenou o INSS “a proceder a correspondente averbação para fins previdenciários”.

O INSS apela, requerendo, preliminarmente, o recebimento do recurso no duplo efeito e o reexame necessário (“que seja reexaminada toda a matéria desfavorável ao INSS, em face da sentença proferida no presente caso, na forma prevista no artigo 10 da Lei n. 9.469/1997”). No mérito, pleiteia a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais necessários à concessão em questão. Sustenta, outrossim, “a necessidade de cassação/suspensão da tutela antecipada concedida” (ID n.º 136546539 - Pág. 3). Se vencido, insurge-se com relação à correção monetária e juros de mora. Ao final, prequestiona a matéria.

A parte autora também apela, pugnando pela reforma parcial da sentença, a fim de que sejam também reconhecidos os demais períodos de trabalho rural vindicados (de 23/03/2006 a 01/07/2007, de 24/06/2008 a 06/08/2008, de 18/12/2009 a 18/01/2010, de 08/10/2010 a 27/10/2010 e de 07/04/2011 a 04/04/2018), bem como para condenação da Autarquia a conceder a aposentadoria por idade rural requerida e a fixação dos honorários advocatícios à base de 20% do valor atualizado da causa.

Com contrarrazões da autora, subiram os autos.

É o relatório.

 

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5283920-50.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: IRACI FABIANO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Advogado do(a) APELANTE: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, IRACI FABIANO

Advogado do(a) APELADO: VAGNER PIAZENTIN SIQUEIRA - SP166119-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

­V O T O

Inicialmente, esclareça-se não ser caso de se ter submetida a decisão de 1.º grau ao reexame necessário, considerando o disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.

A alegação veiculada pelo INSS, concernente ao recebimento da apelação no duplo efeito, não se coloca na hipótese dos autos, ante a prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, segundo o qual a apelação terá efeito suspensivo, e a circunstância de não se estar a tratar, aqui, de nenhuma das situações previstas no § 1.º desse mesmo dispositivo legal do CPC, a que se fez menção.

Não é de ser conhecido o apelo do INSS no tocante à “necessidade de cassação/ suspensão da tutela antecipada concedida”, visto encontrarem-se as razões nele aduzidas dissociadas dos fundamentos da sentença recorrida. Ao contrário do que afirma, a Autarquia não “foi obrigada, por medida judicial de antecipação de tutela, a pagar à apelada qualquer benefício”.

Com efeito, nos termos do artigo 932, III, do Código de Processo Civil, o relator não conhecerá de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida, caso da apelação em análise, conforme iterativa jurisprudência desta Corte (AC n.º 5007607-11.2019.4.03.6105, Relator Desembargador Federal Newton de Lucca, 8ª Turma, Intimação via sistema em DATA 23/10/2020; AC n.º 0009129-26.2016.4.03.6183, Relatora Desembargadora Federal Daldice Santana, 9.ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 7/4/2020; AC 5008853-36.2018.4.03.6183, Relatora Desembargadora Federal Inês Virgínia, 7ª Turma, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 17/09/2020).

Passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

APOSENTADORIA POR IDADE (RURAL)

O benefício de aposentadoria por idade a trabalhador rural encontra-se disciplinado nos arts. 39, inciso I; 48, §§ 1.º e 2.º; e 143 da Lei n.º 8.213/91.

Antes mesmo do advento da Lei de Benefícios, a Lei Complementar n.º 11, de 25 de maio de 1971, que instituiu o Programa de Assistência ao Trabalhador Rural, em seu art. 4.º dispunha que a aposentadoria seria devida quando se completassem 65 anos de idade, cabendo a concessão do benefício apenas ao respectivo chefe ou arrimo de família (parágrafo único).

Por sua vez, de acordo com o art. 5.º da Lei Complementar n.º 16/73, o trabalhador rural deveria comprovar a sua atividade pelo menos nos três últimos anos anteriores à data do pedido do benefício.

Referidos dispositivos não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, que passou para 60 anos, para homens, e 55, para mulheres, a idade mínima exigida para a concessão do benefício (art. 201, § 7.º, inciso II), excluindo a exigência da condição de chefe de família.

Além do requisito etário (60 anos, se homem, e 55 anos, se mulher), o trabalhador rural deve comprovar o exercício de atividade rural, mesmo que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do benefício.

O dispositivo legal citado deve ser analisado em consonância com o art. 142 da Lei de Benefícios.

Não se exige do trabalhador rural o cumprimento de carência (art. 26, inciso III), como o dever de verter contribuição por determinado número de meses, senão a comprovação do exercício laboral durante o período respectivo.

Vale dizer: em relação às contribuições previdenciárias, é assente, desde sempre, o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural (STJ, REsp n.º 207.425, 5.ª Turma, j. em 21/9/1999, v.u., DJ de 25/10/1999, p. 123, Rel. Ministro Jorge Scartezzini; e STJ, RESP n. 502.817, 5.ª Turma, j. em 14/10/2003, v.u., DJ de 17/11/2003, p. 361, Rel. Ministra Laurita Vaz).

Noutro passo, com relação ao art. 143 da Lei n.º 8.213/91, a regra transitória assegurou aos rurícolas o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos, contados da vigência da referida Lei.

Assim, o referido prazo expiraria em 25/7/2006.

Entretanto, em relação ao trabalhador rural enquadrado como segurado empregado ou como segurado contribuinte individual, que presta serviços de natureza rural, em caráter eventual, a uma ou mais empresas, sem relação de emprego, o aludido prazo foi prorrogado por mais 2 (dois) anos, estendendo-se até 25/7/2008, em face do disposto na MP n.º 312/06, convertida na Lei n.º 11.368/06.

Posteriormente, a Medida Provisória n.º 410/07, convertida na Lei n.º 11.718/08, estabeleceu nova prorrogação para o prazo previsto no art. 143 da Lei n.º 8.213/91, ao determinar, em seu art. 2.º, que “Para o trabalhador rural empregado, o prazo previsto no art. 43 da Lei n.º 8.213/91, de 24 de julho de 1991, fica prorrogado até o dia 31 de dezembro de 2010” (art. 2.º) e, em seu art. 3.º, que “Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural , em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência: I - até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991; II - de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e III - de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil”.

É de observar-se que, para os empregados rurais e contribuintes individuais eventuais, a regra permanente do art. 48 da Lei n.º 8.213/91 continua a exigir, para concessão de aposentadoria por idade a rurícolas, apenas a comprovação do efetivo exercício de "atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido", consoante §§ 1.º e 2.º do referido dispositivo.

Essa comprovação do labor rural, nos termos dos arts. 48 e 143 da Lei de Benefícios, dar-se-á por meio de prova documental, ainda que incipiente, e, nos termos do art. 55, § 3.º, da retrocitada Lei, corroborada por prova testemunhal.

Acrescente-se que a jurisprudência de longa data vem atentando para a necessidade dessa conjunção de elementos probatórios (início de prova documental e colheita de prova testemunhal), o que resultou até mesmo na edição do verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis:”

"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

DO CASO DOS AUTOS

O requisito etário restou satisfeito, pois a parte autora completou a idade mínima em 30/08/2017, devendo fazer prova do exercício de atividade rural por 180 meses.

Para demonstrar as alegações, juntou documentos, entre os quais destacam-se:

- certidão de casamento, celebrado em 08/03/1980, com SEBASTIÃO DA SILVA CARVALHO, qualificado como “lavrador”;

- cópia da CTPS da autora com vínculos empregatícios somente na função de “trabalhadora rural” por toda a vida laborativa.

À luz das informações contidas no extrato do CNIS da autora, não há registro de qualquer atividade urbana, o que se coaduna com a cópia da CTPS apresentada nos presentes autos.

Da consulta atualizada ao CNIS, há registro da percepção do benefício previdenciário de auxílio-doença pela autora nos períodos de 09/09/2003 a 22/ 11/2003, de 23/03/2006 a 01/07/2007, de 24/06/2008 a 06/08/2008, de 18/12/2009 a 18/01/2010, de 08/10/2010 a 27/10/2010 e de 07/04/2011 a 04/04/2018. Nesse contexto, cabe analisar se haveria a possibilidade do cômputo do período de gozo dos benefícios previdenciários por incapacidade percebidos pela autora dentro da carência de 180 meses, a fim de preencher o tempo necessário à concessão da benesse pleiteada.

Nos termos do art. 29, § 5.º e do art. 55, II, ambos da Lei n.º 8.213/1991, in verbis:

“Art. 29 - O salário-de-benefício consiste:

(...) § 5.º - Se, no período básico de cálculo, o segurado tiver recebido benefícios por incapacidade, sua duração será contada, considerando-se como salário-de-contribuição, no período, o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal, reajustado nas mesmas épocas e bases dos benefícios em geral, não podendo ser inferior ao valor de 1 (um) salário mínimo.”

(...)

Art. 55 - O tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, compreendendo, além do correspondente às atividades de qualquer das categorias de segurados de que trata o art. 11 desta Lei, mesmo que anterior à perda da qualidade de segurado:

(...) II - o tempo intercalado em que esteve em gozo de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.”

Conforme estabeleciam os incisos III e IX do art. 60 do Decreto n.º 3.048/1999 (revogado pelo Decreto nº 10.410/2020, mas aplicável ao presente caso, em virtude do princípio tempus regit actum), in verbis:

“Art. 60 - Até que lei específica discipline a matéria, são contados como tempo de contribuição, entre outros:

(...) III - o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, entre períodos de atividade;

(...)   IX - o período em que o segurado esteve recebendo benefício por incapacidade por acidente do trabalho, intercalado ou não.”

Nesse contexto, as expressões "tempo intercalado" (art. 55, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991) ou "entre períodos de atividade" (art. 60, inciso III do Decreto n.º 3.048/1999) conduzem ao entendimento de que o lapso temporal em que a autora esteve em gozo de benefício por incapacidade - 23/03/2006 a 01/07/2007, de 08/10/2010 a 27/10/2010 e de 07/04/2011 a 04/04/2018 - poderá ser contabilizado para integrar a carência legalmente exigida na espécie (de 180 meses, nos termos do art. 142 da Lei n.º 8.213/91) se houver comprovação do retorno ao trabalho, ainda que por curto período.

À luz das normas de regência, o período em que a requerente esteve em gozo de benefício de auxílio-doença por acidente do trabalho (espécie 91) – de 24/06/2008 a 06/08/2008 e de 18/12/2009 a 18/01/2010 – será contabilizado mesmo que não fosse intercalado com períodos de atividade.

Confira-se o entendimento do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

“PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO DE GOZO DE AUXÍLIO-DOENÇA. CÔMPUTO DO TEMPO PARA FINS DE CARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO EM  PERÍODO INTERCALADO. IMPOSSIBILIDADE. ACÓRDÃO EM CONSONÂNCIA  COM  A JURISPRUDÊNCIA DO STJ.

1. É firme no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que é possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados  com  períodos contributivos, o que não ocorreu na espécie.

2.  Tem-se que o acórdão recorrido está em consonância com a orientação do STJ, incidindo na pretensão recursal, pois, o óbice da Súmula 83/STJ.

3. Ademais, não há como infirmar as conclusões do Tribunal de origem sem arredar as premissas fático-probatórias sobre as quais se assentam, o que é vedado nos termos da Súmula 7/STJ.

4. Recurso Especial não conhecido.”

(STJ, REsp 1709917/SP, Segunda Turma, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe 16/11/2018 - g.n.).

"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ EM APOSENTADORIA POR IDADE. REQUISITO ETÁRIO PREENCHIDO NA VIGÊNCIA DA LEI 8.213/1991. DESCABIMENTO. CÔMPUTO DO TEMPO PARA FINS DE CARÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO EM PERÍODO INTERCALADO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO.

1. A Lei 8.213/1991 não contemplou a conversão de aposentadoria por invalidez em aposentadoria por idade.

2. É possível a consideração dos períodos em que o segurado esteve em gozo de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez como carência para a concessão de aposentadoria por idade, se intercalados com períodos contributivos.

3. Na hipótese dos autos, como não houve retorno do segurado ao exercício de atividade remunerada, não é possível a utilização do tempo respectivo.

4. Recurso especial não provido."

(STJ, REsp 1422081/SC, Segunda Turma, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 02/05/2014 - g.n.).

No mesmo sentido, a jurisprudência desta Corte:

“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE (...) CÔMPUTO DE PERÍODO EM QUE RECEBEU BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE COMO CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. SITUAÇÃO NÃO CONFIGURADA NO PROCESSADO. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.

1. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei 8.213/91.

2. Coerente com as disposições do art. 29, § 5º, e art. 55, II, ambos da Lei 8.213/1991, os incisos III e IX do art. 60 do Decreto 3.048/1999, asseguram, até que lei específica discipline a matéria, que são contados como tempo de contribuição o período em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (entre períodos de atividade), bem como o período em que o segurado esteve recebendo benefício por incapacidade por acidente do trabalho (intercalado ou não).

3. Mas, não é essa a hipótese dos autos, pois a parte autora, após ter iniciado a percepção de diversos benefícios previdenciários por incapacidade, não voltou a exercer qualquer outra atividade laborativa de forma intercalada entre tais percepções, realizando, ao final, apenas uma contribuição previdenciária de forma facultativa, razão pela qual o longo período em que recebeu os benefícios previdenciários não pode ser computado para fins de carência.

4. Apelação do INSS provida.”

(TRF 3.ª Região, SÉTIMA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL 0001172-98.2018.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, e-DJF3 Judicial 07/05/2018 - g.n.).

No caso em tela, restou enfatizado pela magistrada sentenciante ser possível o reconhecimento apenas do período em que a autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença previdenciário “intercalado com períodos de exercício de atividade laboral, para fins de carência, com a devida averbação para fins previdenciários” (ID n.º 136546534 - Pág. 5).

Com base nessa premissa e por entender que apenas o período de 09/09/2003 a 22/11/2003 preenchia tal requisito, a MM. Juíza a quo julgou parcialmente procedente o pedido formulado por IRACI FABIANO, reconhecendo tão somente o interregno supra e determinando “a correspondente averbação para fins previdenciários” (ID n.º 136546534 - Pág. 5).

Ocorre que, na hipótese vertente, existe comprovação de que a parte autora retornou às atividades laborativas após os interregnos em que esteve em gozo de benefícios por incapacidade.

Pesquisando o CNIS (em 01/12/2020), é possível constatar que o vínculo empregatício da autora com a empresa CITROSUCO S/A AGROINDÚSTRIA teve início em 11/04/2005 sem data fim.

Interessante destacar que a CTPS apresentada nestes autos indicam que o vínculo laborativo foi inicialmente firmado com a empregadora FISCHER S/A AGROPECUÁRIA, a partir de 27/05/2002 e que há anotação na referida carteira de trabalho no sentido de que a referida empresa passou a ter nova razão social, a saber: CITROSUCO S/A AGROINDÚSTRIA. Em ambos os contratos, autora permaneceu na função de “trabalhadora rural” e a espécie de estabelecimento é a de “cultivo de frutas cítricas”, na “Fazenda Trindade”, localizada no município de Matão/SP.

Quanto aos períodos nos quais recebeu benefício por incapacidade, o CNIS indica que de 23/03/2006 a 01/07/2007, de 08/10/2010 a 27/10/2010 e de 07/04/2011 a 04/04/2018, a autora recebeu auxílio-doença previdenciário.

De 24/06/2008 a 06/08/2008 e de 18/12/2009 a 18/01/2010, o benefício foi de auxílio-doença por acidente do trabalho (espécie 91).

Convém notar que há comprovação nos autos de que a requerente exercia atividade rural na ocasião do recebimento dos aludidos benefícios por incapacidade.

Nesse aspecto, o Enunciado n.º 188 FONAJEF:O benefício concedido ao segurado especial, administrativamente ou judicialmente, configura início de prova material válida para posterior concessão aos demais integrantes do núcleo familiar, assim como ao próprio beneficiário” (Aprovado no XIV FONAJEF – g.n.).

Não se pode perder de vista que a parte autora providenciou a juntada dos documentos comprobatórios em questão durante a fase instrutória do presente feito, sendo que o instituto previdenciário não se manifestou, quedando-se inerte.

A consulta ao detalhamento do referido vínculo da autora da autora com a empresa CITROSUCO S/A AGROINDÚSTRIA confirma a ocupação de natureza rural - “trabalhadora no cultivo de árvores frutíferas” e compreende os seguintes interregnos: de 11/04/2005 a 30/09/2018, de 01/10/2018 a 31/03/2019, de 01/04/2019 a 30/09/2019 e de 01/10/2019 sem data fim (extrato do CNIS emitido em 01/12/2020).

Diante da comprovação de que, após o referido tratamento de saúde em relação à doença incapacitante, a autora continuou exercendo atividade rural, bem como que preencheu o requisito etário, faz jus ao deferimento do benefício vindicado, porquanto comprovado o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido.

A aposentadoria corresponde ao valor de um salário-mínimo mensal, nos termos do art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O termo inicial do benefício previdenciário deve retroagir à data do requerimento administrativo, de acordo com a previsão contida no inciso II do art. 49 da Lei n.º 8.213/91. Na ausência de demonstração do requerimento, o termo inicial deve retroagir à data da citação, ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão.

No caso, existe comprovação de requerimento, devendo o termo inicial ser nele fixado (18/02/2019).

Devida a gratificação natalina, nos termos preconizados no art. 7.º, inciso VIII, da Constituição da República.

Quer seja em relação aos juros moratórios, devidos a partir da citação, momento em que constituído o réu em mora; quer seja no tocante à correção monetária, incidente desde a data do vencimento de cada prestação, há que prevalecer tanto o decidido, sob a sistemática da repercussão geral, no Recurso Extraordinário n.º 870.947, de 20/9/2017, sob relatoria do Ministro Luiz Fux, quanto o estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para Cálculos na Justiça Federal, em vigor por ocasião da execução do julgado, observada a rejeição dos embargos de declaração no âmbito do julgamento em epígrafe, em 03/10/2019.

Nos termos do art. 4.º, inciso I, da Lei Federal n.º 9.289/1996, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal, assim como o está naquelas aforadas na Justiça do estado de São Paulo, por força do art. 6.º da Lei Estadual n.º 11.608/2003, c. c. o art. 1.º, § 1.º, da mesma Lei n.º 9.289/1996, circunstância que não o exime, porém, de arcar com as custas e as despesas processuais em restituição à parte autora, em decorrência da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.

Já no que diz respeito às ações propostas perante a Justiça do estado de Mato Grosso do Sul, as normativas que tratavam da aludida isenção (Leis Estaduais n.º 1.135/91 e n.º 1.936/98) restaram revogadas a partir da edição da Lei Estadual n.º 3.779/09 (art. 24, §§ 1.º e 2.º), pelo que, nos feitos advindos daquela Justiça Estadual, de rigor a imposição à autarquia previdenciária do pagamento das custas processuais, exigindo-se o recolhimento apenas ao final da demanda, caso caracterizada a sucumbência.

À vista do quanto disposto no art. 85 do Código de Processo Civil, sendo o caso de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II do § 4.º, c. c. o § 11, ambos do art. 85 do CPC, bem como no art. 86 do mesmo diploma legal.

Os honorários advocatícios incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência (STJ, Súmula 111). Na hipótese em que a pretensão do segurado somente seja deferida em sede recursal, a verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão ou acórdão, em atenção ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC.

Quanto ao prequestionamento suscitado, saliente-se inexistir contrariedade alguma a legislação federal ou a dispositivos constitucionais.

Posto isso, rejeito as matérias preliminares, conheço parcialmente da apelação do INSS e, na parte conhecida, nego-lhe provimento. Dou parcial provimento à apelação da autora para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária nos termos da fundamentação, supra.

O benefício é de aposentadoria por idade de trabalhadora rural, no valor de um salário-mínimo, com DIB em 18/02/2019.

É o voto.

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RAZÕES DISSOCIADAS. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADORA RURAL. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE DE RURÍCOLA NO PERÍODO ANTERIOR AO REQUERIMENTO. ANOTAÇÃO EM CTPS E CNIS. ATIVIDADE RURAL. REQUISITOS SATISFEITOS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.

- Não conhecimento do reexame necessário, conforme disposto no art. 496, § 3.º, inciso I, do Código de Processo Civil, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico for inferior a 1.000 salários mínimos.

- Prevalência da regra geral prevista no caput do art. 1.012 do Código de Processo Civil, porquanto não configuradas as hipóteses previstas no § 1.º do mesmo dispositivo legal.

- Não é de ser conhecido o presente apelo na parte em que as razões nele aduzidas encontram-se totalmente dissociadas dos fundamentos da sentença recorrida. 

- Nos termos do artigo 932, III, do Código de Processo Civil, o relator não conhecerá de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida.

- Pacificada no Colendo Superior Tribunal de Justiça a questão relativa à comprovação da atividade rural, exige-se início de prova material, afastando-se por completo a prova exclusivamente testemunhal (STJ, Súmula n.º 149).

- O art. 29, § 5.º, e art. 55, II, ambos da Lei n.º 8.213/1991 e os incisos III e IX do art. 60 do Decreto n.º 3.048/1999 asseguram, até que lei específica discipline a matéria, que são contados como tempo de contribuição o período em que a segurada esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (entre períodos de atividade), bem como o período em que esteve recebendo benefício por incapacidade por acidente do trabalho (intercalado ou não). Precedentes.

- As anotações na CTPS da autora e o extrato do CNIS configuram prova plena do exercício da atividade rural nos períodos anotados e confirmam o retorno ao labor campesino após o tratamento de saúde em relação à doença incapacitante.

- O conjunto probatório é suficiente para ensejar a concessão do benefício vindicado.

- Apelação do INSS conhecida em parte, e, na parte conhecida, improvida. Apelação da autora parcialmente provida para reformar a sentença e julgar procedente o pedido formulado, fixando os critérios dos consectários e determinando a incidência de verba honorária nos termos da fundamentação.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar as matérias preliminares, conhecer parcialmente da apelação do INSS e, na parte conhecida, negar-lhe provimento e dar parcial provimento à apelação da autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.