APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5090849-20.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADELISA DO CARMO OLIVEIRA PIRES DOS REIS
Advogados do(a) APELADO: CASSIO HENRIQUE MATARAZZO CARREIRA - SP182889-N, HUMBERTO TIBAGI DE BARROS - SP356402-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5090849-20.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ADELISA DO CARMO OLIVEIRA PIRES DOS REIS Advogados do(a) APELADO: CASSIO HENRIQUE MATARAZZO CARREIRA - SP182889-N, HUMBERTO TIBAGI DE BARROS - SP356402-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou PROCEDENTE o pedido, com fundamento na incapacidade laborativa da parte autora, condenando o INSS a pagar o benefício de AUXÍLIO DOENÇA desde a data da propositura da ação, com a aplicação de juros de mora e correção monetária e ao pagamento de honorários advocatícios. Em suas razões de recurso, alega a parte autora: - que o termo inicial do benefício deve ser fixado à data do pedido administrativo; - que deve ser afastada a data de cessação do benefício; - que os honorários advocatícios foram fixados em valor irrisório. Por sua vez, sustenta o INSS: - que a parte autora não comprovou a carência; - que o termo inicial do benefício deve ser fixado à data da juntada do laudo; - que os honorários advocatícios foram fixados em valor exagerado. Com contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional. É O RELATÓRIO.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5090849-20.2019.4.03.9999 RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ADELISA DO CARMO OLIVEIRA PIRES DOS REIS Advogados do(a) APELADO: CASSIO HENRIQUE MATARAZZO CARREIRA - SP182889-N, HUMBERTO TIBAGI DE BARROS - SP356402-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. Os benefícios por incapacidade, previstos na Lei nº 8.213/91, destinam-se aos segurados que, após o cumprimento da carência de 12 (doze) meses (artigo 25, inciso I), sejam acometidos por incapacidade laboral: (i) incapacidade total e definitiva para qualquer atividade laborativa, no caso de aposentadoria por invalidez (artigo 42), ou (ii) incapacidade para a atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, no caso de auxílio-doença (artigo 59). No tocante ao auxílio-doença, especificamente, vale destacar que se trata de um benefício provisório, que cessa com o término da incapacidade, no caso de ser temporária, ou com a reabilitação do segurado para outra atividade que lhe garanta a subsistência, se a incapacidade for definitiva para a atividade habitual, podendo, ainda, ser convertido em aposentadoria por invalidez, caso o segurado venha a ser considerado insusceptível de reabilitação. Em relação à carência, nos termos do artigo 26, inciso II, da Lei nº 8.213/91, dela está dispensado o requerente nos casos em que a incapacidade é decorrente de acidente de qualquer natureza ou causa, de doença profissional ou do trabalho, ou ainda das doenças e afecções elencadas no artigo 151 da mesma lei. Como se vê, para a obtenção dos benefícios por incapacidade, deve o requerente comprovar o preenchimento dos seguintes requisitos: (i) qualidade de segurado, (ii) cumprimento da carência, quando for o caso, e (iii) incapacidade laboral. No caso dos autos, o exame realizado pelo perito oficial constatou que a parte autora está incapacitada de forma total e temporária para o exercício de sua atividade habitual, como se vê do laudo oficial. E, nesse ponto, não há controvérsia, limitando-se o inconformismo das parte somente em relação à carência, ao termo inicial, à data de cessação e aos honorários advocatícios. Restou incontroverso, nos autos, que a parte autora é segurada da Previdência Social e cumpriu a carência de 12 (doze) contribuições, exigida pelo artigo 25, inciso I, da Lei nº 8.213/91, como se vê dos documentos juntados (extrato CNIS e receituários médicos - IDs 22298938, 22298944, 22298948 e 22298952). A presente ação foi ajuizada em janeiro de 2017. O requerimento administrativo foi apresentado em 30/04/2015. Consta, desse(s) documento(s), que a parte autora recebeu o auxílio-doença no período de 25/10/2012 a 31/03/2015; requereu a prorrogação do benefício em 30/04/2015, em 08/07/2015 e em 08/11/2016, sendo-lhe negado, o que foi objeto de recurso administrativo, também negado. Ocorre que, de acordo com o laudo pericial, as patologias de foi acometida a parte autora já existiam por ocasião da concessão do auxílio doença, de 2012 a 2015 (ID 22299130): "ESCLARECIMENTO: Atendendo determinação judicial para esclarecimentos adicionais relativos ao Laudo Medico Pericial apresentado, tendo em vista a solicitação da parte autora, reafirmamos que com base nas observações registradas, no Laudo concluiu-se que, no momento do exame pericial, a situação médica da pericianda configurava incapacidade, total e temporária, para o desempenho de sua atividade laboral habitual. Reafirmamos que as patologias ortopédicas (degenerativas e inflamatórias) e as queixas da autora, referidas e confirmadas, não a incapacitava para o trabalho, de forma permanente, haja vista que existiam possibilidades terapêuticas a serem implementadas, com perspectiva de melhora do quadro clínico, sendo possível que a mesma readquira sua capacidade funcional. Quanto as datas de inicio das doenças reafirmamos que não havia elementos objetivos para fixar tais datas; Os documentos médicos juntados as fls. 30/46 dos autos apenas indicam que naquelas datas as patologias apontadas já existiam, mas não quando tiveram inicio." Nesse caso, ainda que entre a data da cessação do auxílio-doença (31/03/2015) e e a propositura da ação, em janeiro de 2017, tenha decorrido período superior ao prazo previsto no inciso II do artigo 15 da Lei nº 8.213/91, não há que se falar na perda da qualidade de segurada, vez que restou comprovado, nos autos, que ela não mais contribuiu para a Previdência Social em razão de sua incapacidade laborativa, mantendo, por consequência, a carência exigida. Nesse sentido, é o entendimento pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça: A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça é firme no sentido de que o segurado que deixa de contribuir para a Previdência Social, por estar incapacitado para o labor, não perde a qualidade de segurado. (AgRg no REsp nº 1.245.217/SP, 5ª Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJe 20/06/2012) "O segurado, que deixa de contribuir por período superior a 12 meses para a Previdência Social, perde a sua condição de segurado. No entanto, para efeito de concessão de aposentadoria por invalidez, desde que preenchidos todos os requisitos legais, faz jus ao benefício, por força do artigo 102 da Lei 8.213/91. Precedentes." (REsp nº 233.725/PE, da minha Relatoria, in DJ 5/6/2000). (AgRg no REsp nº 866.116/SP, 6ª Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJe 01/09/2008) No mesmo sentido, é o entendimento firmado por esta Egrégia Corte Regional: Ainda que, entre a data em que a parte autora deixou de contribuir para a Previdência Social e o ajuizamento da ação, tenha decorrido período superior ao prazo previsto no inciso II do artigo 15 da Lei nº 8.213/91, não há que se falar na perda da qualidade de segurada, vez que restou comprovado, nos autos, que ela não mais contribuiu para a Previdência Social em razão de sua incapacidade laborativa. (AC nº 2017.03.99.009063-0/SP, 7ª Turma, Relatora Juíza Federal Giselle França, DE 14/03/2018) O segurado não perde a qualidade de segurado se deixar de contribuir por período igual ou superior a 12 (doze) meses, se em decorrência de incapacidade juridicamente comprovada. Precedentes do C. STJ. (AC nº 0037265-94.2017.4.03.9999/SP, 8ª Turma, Relator Desembargador Federal David Dantas, DE 09/02/2018) É pacífico o entendimento no sentido de que não perde a qualidade de segurado a pessoa que deixou de trabalhar em virtude de doença. Veja-se a respeito: STJ, RESP 84152, DJ 19/12/02, p. 453, Rel. Min. Hamilton Carvalhido. (AC nº 0032952-90.2017.4.03.9999/MS, 10ª Turma, Relator Desembargador Federal Sérgio Nascimento, DE 19/02/2018) O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício. Tal entendimento, pacificado no Egrégio Superior Tribunal de Justiça, está embasado no fato de que "o laudo pericial norteia somente o livre convencimento do juiz quanto aos fatos alegados pelas partes, mas não serve como parâmetro para fixar termo inicial de aquisição de direitos" (AgRg no AREsp 95.471/MG, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 09/05/2012), sendo descabida, portanto, a fixação do termo inicial do benefício à data da juntada do laudo ((do laudo pericial)) ((da perícia judicial)) ((da data de início da incapacidade, estabelecida pelo perito)). No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/04/2015, dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, respeitada a prescrição quinquenal. Na verdade, embora o perito judicial tenha afirmado não saber a data de início da incapacidade, uma vez que constatou que a incapacidade se deu em razão dos mesmos males indicados na petição inicial, não é difícil concluir que quando da cessação do benefício ela continuava incapacitada para o trabalho. No tocante ao termo final do auxílio-doença, a Lei nº 8.213/91 não obriga a fixação de um prazo estimado para a sua duração (artigo 60, parágrafo 8º); apenas recomenda sua fixação nos casos em que a incapacidade é apenas temporária e há possibilidade de recuperação da capacidade do segurado para a atividade habitual, estabelecendo que, não sendo fixado esse prazo, o INSS poderá cessar o benefício no prazo de 120 dias (parágrafo 9). Assim, deve subsistir a sentença na parte em que fixou o prazo de duração do benefício, até porque embasada em conclusão da perícia judicial, cumprindo ao segurado, se entender que não está em condições de retornar ao trabalho, requerer, na esfera administrativa, a prorrogação do seu benefício. Não é o caso de se excluir, do montante devido, os períodos em que a parte autora, não obstante estivesse incapacitada, mas por necessidade, retornou ao trabalho, pois o C. STJ, ao apreciar o Tema 1.013/STJ, assentou a seguinte tese: "No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RGPS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo beneficio previdenciário pago retroativamente" (REsp 1786590/SP, 1ª Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 01/07/2020). Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS. Se a sentença determinou a aplicação de critérios de juros de mora e correção monetária diversos, ou, ainda, se ela deixou de estabelecer os índices a serem observados, pode esta Corte alterá-los ou fixá-los, inclusive de ofício, para adequar o julgado ao entendimento pacificado nos Tribunais Superiores. Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela anteriormente concedida. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada. Ante o exposto, nego provimento ao recurso do INSS; dou parcial provimento ao recurso da parte autora para fixar o termo inicial do benefício em 01/04/2015, dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, respeitada a prescrição quinquenal; e, de ofício, determino a alteração dos juros de mora e da correção monetária. É COMO VOTO. /gabiv/jb
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO - AUXÍLIO-DOENÇA - INCAPACIDADE TEMPORÁRIA PARA A ATIVIDADE HABITUAL - REQUISITOS PREENCHIDOS - TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO - JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. Por ter sido a sentença proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 2015 e, em razão de sua regularidade formal, conforme certificado nos autos, a apelação interposta deve ser recebida e apreciada em conformidade com as normas ali inscritas.
2. Ainda que entre a data da cessação do auxílio-doença (31/03/2015) e e a propositura da ação, em janeiro de 2017, tenha decorrido período superior ao prazo previsto no inciso II do artigo 15 da Lei nº 8.213/91, não há que se falar na perda da qualidade de segurada, vez que restou comprovado, nos autos, que ela não mais contribuiu para a Previdência Social em razão de sua incapacidade laborativa, mantendo, por consequência, a carência exigida.
3. O termo inicial do benefício, em regra, deveria ser fixado à data do requerimento administrativo ou, na sua ausência, à data da citação (Súmula nº 576/STJ) ou, ainda, na hipótese de auxílio-doença cessado indevidamente, no dia seguinte ao da cessação indevida do benefício. No caso, o termo inicial do benefício é fixado em 01/04/2015, dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, respeitada a prescrição quinquenal. Na verdade, embora o perito judicial tenha afirmado não saber a data de início da incapacidade, uma vez que constatou que a incapacidade se deu em razão dos mesmos males indicados na petição inicial, não é difícil concluir que quando da cessação do benefício ela continuava incapacitada para o trabalho.
4. No tocante ao termo final do auxílio-doença, a Lei nº 8.213/91 não obriga a fixação de um prazo estimado para a sua duração (artigo 60, parágrafo 8º); apenas recomenda sua fixação nos casos em que a incapacidade é apenas temporária e há possibilidade de recuperação da capacidade do segurado para a atividade habitual, estabelecendo que, não sendo fixado esse prazo, o INSS poderá cessar o benefício no prazo de 120 dias (parágrafo 9). Assim, deve subsistir a sentença na parte em que fixou o prazo de duração do benefício, até porque embasada em conclusão da perícia judicial, cumprindo ao segurado, se entender que não está em condições de retornar ao trabalho, requerer, na esfera administrativa, a prorrogação do seu benefício.
5. Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, à exceção da correção monetária a partir de julho de 2009, período em que deve ser observado o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial - IPCA-e, critério estabelecido pelo Pleno do Egrégio Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Recurso Extraordinário nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral, e confirmado em 03/10/2019, com a rejeição dos embargos de declaração opostos pelo INSS.
6. Presentes os requisitos - verossimilhança das alegações, conforme exposto na sentença, e o perigo da demora, o qual decorre da natureza alimentar do benefício -, confirmo a tutela anteriormente concedida.
7. Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, mantidos em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ), até porque moderadamente arbitrados pela decisão apelada.
8. Recurso do INSS desprovido. Recurso da parte autora parcialmente provido.