Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5269284-79.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: VALDEMIR FERREIRA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUCAS TELLES - SP168447-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5269284-79.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: VALDEMIR FERREIRA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUCAS TELLES - SP168447-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

­R E L A T Ó R I O

Demanda proposta objetivando a concessão de aposentadoria por idade a trabalhador rural, prevista no art. 143 da Lei n.º 8.213/91.

O juízo a quo julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, ante a ausência de prévio pedido administrativo, a caracterizar a inexistência de interesse processual ou de agir.

O autor apela, requerendo a anulação da sentença e a determinação do retorno dos autos ao Juízo a quo para a realização da instrução processual. (ID n.º 134307728- Págs. 01 a 07).

Sem contrarrazões, subiram os autos.

É o relatório.

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5269284-79.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA

APELANTE: VALDEMIR FERREIRA DE SOUZA

Advogado do(a) APELANTE: JOAO LUCAS TELLES - SP168447-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

­V O T O

 

Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.

Preliminarmente, quanto à extinção sem resolução de mérito, imperativo ressaltar que Ação é o direito de pedir ao Estado a prestação da atividade jurisdicional num caso concreto.

Assim, o direito de agir se conexiona a um caso concreto, que se manifesta na pretensão, que o autor formula e para a qual pede a tutela jurisdicional.

O direito de ação se subordina a certas condições, em falta das quais, quem o exercita será declarado carecedor, dispensando o órgão jurisdicional de decidir o mérito da pretensão.

O interesse de agir, como uma das condições da ação, consubstancia-se na necessidade de se reclamar a atividade jurisdicional do Estado para que este tutele o direito subjetivo reclamado.

Caracteriza-se pela utilidade/necessidade do provimento jurisdicional à satisfação do direito, ou seja, que a tutela seja hábil a realizar concretamente o bem da vida perseguido e que, sem a intervenção do Poder Judiciário, não se alcance a pacificação ou superação do conflito, dada a impossibilidade ou resistência dos sujeitos de direito material em obter o resultado almejado, pelas próprias forças, traduzidas em iniciativas de ações.

A resistência reveladora da existência de lide não necessita ser ostensiva, veemente, palpável, basta que se evidencie a ausência de disposição ou de possibilidade ao atendimento à pretensão manifestada, inclusive através da inércia.

Cumpre mencionar que a necessidade de prévio requerimento administrativo antes do ajuizamento da demanda foi decidida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, reconhecendo-se a repercussão geral, tendo em vista a relevância constitucional do tema.

Tenha-se presente que o instituto da repercussão geral introduzido pela EC n.º 45/2004 possibilita o efeito multiplicador da decisão proferida pela Suprema Corte em causas iguais, consolidando o entendimento firmado.

Ressalte-se que o Colendo Supremo Tribunal Federal deu parcial provimento ao Recurso Extraordinário n.º 631.240/MG, de relatoria do Exmo. Ministro Roberto Barroso, com repercussão geral reconhecida, por meio do qual a Autarquia Previdenciária defendia a exigência do prévio requerimento do pleito na via administrativa (DJe 10.11.2014).

Por maioria de votos, o Plenário acompanhou o relator, entendendo que a exigência não fere a garantia constitucional de livre acesso ao Judiciário, preconizada no art. 5º, inc. XXXV, da Carta Magna. Entretanto, o pleito poderá ser formulado diretamente em Juízo quando notório e reiterado o entendimento contrário da Administração à postulação do segurado, bem como nos casos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido. Confira-se:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.

1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.

2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.

3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.

4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.

5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.

6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.

7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.

8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."

(STF, Pleno, RE nº 631.240 MG, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, j.03.09.214, DJe 10.11.2014).

Assinale-se que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça alinhou sua jurisprudência ao entendimento da Suprema Corte, como restou assentado no julgamento do RESP n.º 1.369.834/SP (DJe 02.12.2014), cujo aresto restou assim ementado, in verbis:

"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. NECESSIDADE. CONFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR AO QUE DECIDIDO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DO RE 631.240/MG, JULGADO SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL.

1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob rito do artigo 543-B do CPC, decidiu que a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo, evidenciando situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014).

2. Recurso especial do INSS parcialmente provido a fim de que o Juízo de origem aplique as regras de modulação estipuladas no RE 631.240/MG. Julgamento submetido ao rito do artigo 543-C do CPC."

(STJ, Primeira Seção, REsp nº1.369.834/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, j.24.09.2014, DJe 02.12.2014)

Insta asseverar que, no caso dos autos, a ação não se inclui nas exceções que autorizam a formulação do pleito diretamente em Juízo, ensejando a necessária comprovação do prévio requerimento administrativo, em consonância com a decisão proferida pela Corte Suprema.

Da análise dos autos, infere-se que o MM. Juízo de 1.º grau proferiu decisão, em 01/11/2019, oportunizando o prazo de 30 dias para que o autor requeresse administrativamente o benefício pretendido nestes autos junto ao instituto réu (ID n.º 134307723 - pág. 01).

A certidão expedida pela Secretaria da 2.ª Vara Federal de Tupi Paulista/SP em 29/01/2020 revela que, apesar de devidamente intimado, o demandante deixou transcorrer in albis o aludido prazo. Dessa forma, a parte autora não preencheu condição para ingressar com ação judicial.

Como bem ressaltou o magistrado sentenciante, in verbis:

“A inicial da presente ação comporta indeferimento ante a ausência de manifestação por parte da autora quanto à determinação prolatada por este juízo.

Determinado ao requerente a realização do requerimento do benefício na esfera administrativa, permaneceu inerte.

Pois bem, intimado para os fins do art. 321, do Código de Processo Civil, para que formulasse o requerimento do benefício na esfera administrativa, o autor silenciou-se ao chamamento judicial e tal omissão impede o desenvolvimento válido e regular do processo, visto que o art. 320, do CPC é expresso ao determinar que a inicial seja instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação.

Nessa senda, em conformidade com a orientação jurisprudencial firmada pelo C. STJ no julgamento do "Tema 660", AFETADO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS, precedente de observância obrigatória nos termos do art. 927, III, do CPC/2015, onde submeteu a julgamento a questão referente "O feito em que se busca a concessão de benefício previdenciário deve ser extinto sem julgamento do mérito, por falta de interesse processual, sempre que não houver prévio requerimento ou comunicação desse pedido ao INSS na via administrativa", e firmou-se a tese de que "(...) a concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento administrativo", conforme decidiu o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 631.240/MG, sob o rito do artigo 543-B do CPC, observadas "as situações de ressalva e fórmula de transição a ser aplicada nas ações já ajuizadas até a conclusão do aludido julgamento (03/9/2014)", é caso de indeferimento da inicial.

Diante do exposto, INDEFIRO a petição inicial nos termos do art. 321, parágrafo único do Código de Processo Civil e JULGO EXTINTO o processo sem resolução do mérito, o que faço com base no art. 485, inciso I, do mesmo Codex.” (ID n.º 134307726 - Págs. 01 e 02).

Assim, de rigor a manutenção da sentença.

Posto isso, nego provimento à apelação.

É o voto.

 

 

AUDREY GASPARINI
Juíza Federal Convocada



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. ART. 143 DA LEI N.º 8.213/91. APOSENTADORIA POR IDADE A TRABALHADOR RURAL. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. CONCESSÃO DE PRAZO PELO JUÍZO A QUO. APELO DA PARTE AUTORA IMPROVIDO

- Pedido de concessão de aposentadoria por idade rural. Processo extinto sem resolução do mérito, ao fundamento da falta de interesse de agir da parte autora.

- A necessidade de prévio requerimento administrativo antes do ajuizamento da demanda foi decidida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, reconhecendo-se a repercussão geral, tendo em vista a relevância constitucional do tema (RE n.º 631240).

- Contudo, o pleito poderá ser formulado diretamente em juízo quando notório e reiterado o entendimento contrário da Administração à postulação do segurado, bem como nos casos de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, além dos casos em que a Autarquia já contestou o feito.

- O Egrégio Superior Tribunal de Justiça alinhou sua jurisprudência ao entendimento da Suprema Corte, como restou assentado no julgamento do RESP n.º 1.369.834/SP.

- A presente ação não se inclui nas exceções que autorizam a formulação do pleito diretamente em Juízo, ensejando a necessária comprovação do prévio requerimento administrativo, em consonância com a decisão proferida pela Corte Suprema.

- No caso, o MM. Juízo de 1.º grau proferiu decisão, oportunizando o prazo de 30 dias para que o autor requeresse administrativamente o benefício pretendido nestes autos junto ao instituto réu.

- Apesar de devidamente intimado, o demandante deixou transcorrer in albis o aludido prazo, não preenchendo condição para ingressar com ação judicial.

- Apelação a que se nega provimento.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.