APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5260306-16.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RAIMUNDO JUSTINO DE ARAUJO
Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5260306-16.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: RAIMUNDO JUSTINO DE ARAUJO Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Demanda proposta objetivando o restabelecimento de auxílio-doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez, desde a data da cessação do benefício (31/5/2018). O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado, reconhecendo à parte autora o direito ao benefício de auxílio-doença, a partir do dia seguinte à cessação do benefício, “até o término da análise da reabilitação profissional ou até cessada a incapacidade constatada por meio de perícia médica.” Deferida a antecipação dos efeitos da tutela. O INSS apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, o não cumprimento dos requisitos legais à concessão em questão bem como da reabilitação profissional determinada pelo juízo. Com contrarrazões, subiram os autos. É o relatório. AUDREY GASPARINI Juíza Federal Convocada
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5260306-16.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: RAIMUNDO JUSTINO DE ARAUJO Advogado do(a) APELADO: CLAUDINEI APARECIDO DA SILVA - SP244117-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução. DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E DO AUXÍLIO-DOENÇA Os requisitos da aposentadoria por invalidez encontram-se preceituados nos arts. 42 e seguintes da Lei n.° 8.213/91, consistindo, mais precisamente, na presença da qualidade de segurado, na existência de incapacidade total e permanente para o trabalho e na ocorrência do cumprimento da carência, quando exigida. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos art. 59 e seguintes do mesmo diploma legal, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária. Excepcionalmente, com base em entendimento jurisprudencial consolidado, admite-se a concessão de tais benefícios mediante comprovação pericial de incapacidade parcial e definitiva para o desempenho da atividade laborativa, que seja incompatível com a ocupação habitual do requerente e que implique em limitações tais que restrinjam sobremaneira a possibilidade de recolocação no mercado de trabalho, diante das profissões que exerceu durante sua vida profissional (STJ: AgRg no AREsp 36.281/MS, rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 6.ª Turma, DJe de 01/03/2013; e AgRg no AREsp 136474/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, 1.ª Turma, DJe de 29/06/2012). Imprescindível, ainda, o preenchimento do requisito da qualidade de segurado, nos termos dos arts. 11 e 15, ambos da Lei de Benefícios. "Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições: I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício; II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração; III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória; IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso; V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar; VI - até (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo. § 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. § 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social. § 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social. § 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos." A perda da qualidade de segurado, portanto, ocorrerá no 16.º dia do segundo mês seguinte ao término do prazo fixado no art. 30, II, da Lei n.º 8.212/91, salvo na hipótese do § 1.º do art. 102 da Lei n.º 8.213/91 – qual seja, em que comprovado que a impossibilidade econômica de continuar a contribuir decorreu da incapacidade laborativa. Registre-se que, perdida a qualidade de segurado, imprescindível a existência de, pelo menos, seis meses de recolhimento, para que seja considerado novamente filiado ao regime, nos exatos termos do art. 27-A da Lei de Benefícios. Por fim, necessário o cumprimento do período de carência, nos termos do art. 25 dessa mesma lei, a saber: “Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no artigo 26: I – auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;” Em casos específicos, em que demonstrada a necessidade de assistência permanente de outra pessoa, possível, ainda, com base no art. 45 da Lei de Benefícios, o acréscimo de 25% ao valor da aposentadoria por invalidez porventura concedida. DO CASO DOS AUTOS (INCAPACIDADE PARCIAL E TEMPORÁRIA) Objetivando comprovar a qualidade de segurado, o autor juntou cópia de sua CTPS com registro de vínculos empregatícios de 23/6/1987 a 23/11/1992, na condição de servente; 11/2/1994 a 4/7/1996, na condição de carpinteiro; 8/11/1996 a 10/7/1997, na condição de soldador de armação; 16/10/1997 a 2/1/2002, na condição de soldador industrial; 21/6/2002 a 17/10/2003, na condição de soldador de RX; 22/6/2003 a 4/12/2003, na condição de soldador de RX; 19/1/2004 a 7/7/2004, na condição de soldador de RX; 16/5/2006 a 5/2/2007, na condição de soldador de RX; 5/6/2007 a 17/6/2008, na condição de soldador de RX; 11/8/2008 a 8/10/2008, na condição de soldador de RX; 11/12/2008 a 15/6/2009, na condição de soldador de RX; e 16/9/2009 a 21/9/2009, na condição de soldador de RX (f. 5, Id. 133169331). A autarquia federal acostou extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), que corroboram com as informações retromencionadas e do qual se infere que o autor recebeu benefício previdenciário de auxílio-doença de 30/9/2009 a 31/5/2018 (Id. 133169383). Assim, tornam-se desnecessárias maiores considerações a respeito desse requisito, restando demonstrada a inocorrência da perda da qualidade de segurado, nos termos do art. 15, inciso II, da Lei n.º 8.213/91, e tendo em vista o ajuizamento da ação em 3/9/2018. O benefício de auxílio-doença foi concedido até 31/5/2018 (f. 19, Id. 133169331). Demonstrou, outrossim, ter atendido à exigência legal de recolhimento de 12 contribuições previdenciárias para ensejar direito à aposentadoria por invalidez (art. 25 da Lei n.° 8.213/91). No concernente à incapacidade, a perícia médica concluiu ser o autor portador de quadro de epicondilite lateral e tendinopatia crônica bilateral. Considerou-o incapacitado para o trabalho de forma parcial e temporária, desde o laudo médico do INSS, 2/10/2009 (Id. 133169361). Entre os documentos acostados pelo requerente constam laudo médico relatando epicondilite lateral, síndrome do manguito rotador e bursite do ombro, emitido em 14/5/2018, atestado de fisioterapeuta declarando que o autor realiza tratamento fisioterápico desde dezembro de 2011 devido tendinite em ombros direito e esquerdo e epicondilite de ambos os cotovelos, datado de 7/10/2011, bem como resultados de ultrassonografia de ambos os cotovelos indicando epicondilite lateral com ruptura parcial profunda do tendão comum dos extensores e entesite insercional crônica do tendão do tríceps direito, datados de 8/2/2011 (fs. 20, 28 e 30, Id. 133169331). Via de regra, analisam-se suas características pessoais (idade, escolaridade, tipo de doença que o acomete) e, constatada a inelegibilidade à reabilitação profissional diante do contexto social, concede-se a aposentadoria por invalidez. Destarte, o conjunto probatório indica como adequada a concessão do auxílio-doença, nos termos da sentença prolatada, devendo ser mantido indefinidamente, até que identificada melhora nas condições clínicas ora atestadas, facultada pela lei a realização de exames periódicos a cargo do INSS, após o trânsito em julgado, para que se avalie a perenidade ou não das moléstias diagnosticadas, nos termos do art. 101 da Lei nº 8.213/91. Em relação ao processo de reabilitação profissional, a existência de incapacidade apenas parcial permite supor a possibilidade de recuperação e retorno à função habitual, sendo desnecessária, por ora, a reabilitação profissional. Porém, a necessidade de realização do processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade, nos termos no artigo 62, da Lei nº. 8.213/91, poderá ser constatada em novo exame médico a cargo da autarquia federal. Neste sentido: "PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORATIVA PARCIAL E TEMPORÁRIA. NÃO PREENCHIDOS OS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA. TERMO INICIAL. DATA DA CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. DESNECESSIDADE. JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. REPERCUSSÃO GERAL E MANUAL DE CÁLCULOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA IMPROVIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. - Pedido de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. - O benefício objeto da presente demanda possui natureza previdenciária, pois não há notícia, nos autos, de acidente do trabalho e o laudo pericial informa não haver comprovação de nexo entre a patologia e o trabalho. Não há CAT. - A parte autora, operadora de caixa, contando atualmente com 33 anos, submeteu-se à perícia médica judicial, em 09/10/2015. - O laudo atesta que a periciada apresenta como diagnóstico: bursite e protrusão discal. Afirma que existem restrições laborais de acentuada importância para o exercício da sua função laborativa. Conclui pela existência de incapacidade parcial e temporária para sua atividade habitual. Informa que a incapacidade iniciou-se há dois anos. - A qualidade de segurado e a carência restaram incontroversas, uma vez que, em seu apelo, a Autarquia Federal se insurge contra a decisão "a quo" especificamente em função da questão da aptidão para o labor. - O laudo pericial é claro ao descrever as patologias das quais a parte autora é portadora, concluindo pela incapacidade parcial e temporária para as atividades habituais. - A requerente, pessoa relativamente jovem, não logrou comprovar a existência de incapacidade total e definitiva para o exercício de qualquer atividade laborativa, que autorizaria a concessão de aposentadoria por invalidez. - A incapacidade total e temporária resulta da conjugação entre a doença que acomete o trabalhador e suas condições pessoais; de forma que, se essa associação indicar que ele não pode exercer a função habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos, estando insusceptível de recuperação para seu labor habitual e devendo submeter-se a processo de readaptação profissional, não há como deixar de se reconhecer o seu direito ao benefício previdenciário, para que possa se submeter a tratamento, neste período de recuperação. - A parte autora é portadora de enfermidades ortopédicas que impedem o exercício de suas atividades habituais, conforme atestado pelo perito judicial, devendo ter-se sua incapacidade como total e temporária, neste período de tratamento e reabilitação a outra função. - Deve ser mantida a sentença que concedeu o auxílio-doença, face à constatação da existência de incapacidade parcial e temporária. - A parte autora manteve a qualidade de segurado até a data da propositura da ação e é portadora de doença que a incapacita de modo total e temporário para as atividades laborativas, faz jus ao benefício de auxílio-doença. - O termo inicial deve ser mantido conforme fixado na sentença, ou seja, na data seguinte à cessação do auxílio-doença n.º 605.629.577-3, em 23/04/2014, já que o laudo pericial revela a presença das enfermidades incapacitantes àquela época. - O laudo pericial é claro ao apontar a existência de incapacidade apenas parcial, o que permite supor a possibilidade de recuperação e retorno à função habitual, sendo desnecessária, por ora, a reabilitação profissional. - A necessidade de realização do processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade, poderá ser constatada em novo exame médico a cargo do INSS. - Os índices de correção monetária e taxa de juros de mora devem observar o julgamento proferido pelo C. Supremo Tribunal Federal na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947, bem como o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal em vigor por ocasião da execução do julgado. - Cuidando-se de prestação de natureza alimentar, presentes os pressupostos do art. 300 c.c. 497 do CPC, é possível a antecipação da tutela. - A Autarquia deverá proceder à compensação dos valores pagos em função da tutela antecipada, em razão do impedimento de duplicidade. - Apelo da parte autora improvido. - Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida. - Tutela antecipada mantida.” (TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2316012, 0024883-35.2018.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, julgado em 25/02/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/03/2019 ) Quanto ao prequestionamento suscitado, inexiste contrariedade alguma à legislação federal ou a dispostos constitucionais. Posto isso, dou parcial provimento à apelação, para reformar a sentença e julgar improcedente o pedido de reabilitação profissional, nos termos da fundamentação, supra. É o voto. AUDREY GASPARINI Juíza Federal Convocada
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. MANUTENÇÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO. INCAPACIDADE PARCIAL E TEMPORÁRIA RECONHECIDA. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. DESNECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
- Satisfeitos os requisitos legais previstos no art. 42 da Lei n° 8.213/91 - quais sejam, qualidade de segurado, incapacidade total e permanente e cumprimento do período de carência (12 meses) - é de rigor a concessão de aposentadoria por invalidez.
- Deve ser mantida a sentença que concedeu o auxílio-doença, face à constatação da existência de incapacidade parcial e temporária.
- Necessária a contextualização do indivíduo para a aferição da incapacidade laborativa. Impossibilidade de exigir a reabilitação de trabalhador com baixo grau de instrução, para atividade diversa de sua habitual. Incapacidade parcial e temporária configurada. Precedentes do STJ.
- Sendo a incapacidade apenas parcial, possível supor o retorno às atividades laborais habituais, pelo que desnecessário a reabilitação profissional. Precedentes.
- Apelação da Autarquia Federal parcialmente provida.