APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-35.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELADO: MATILDE CAVALCANTE
Advogado do(a) APELADO: WILLIANS SIMOES GARBELINI - MS8639-A
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-35.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MATILDE CAVALCANTE Advogado do(a) APELADO: WILLIANS SIMOES GARBELINI - MS8639-A R E L A T Ó R I O Cuida-se de apelação interposta em face de sentença que julgou procedente pedido de aposentadoria por idade híbrida, desde a data da citação, com acréscimo dos consectários legais. Houve dispensa do reexame necessário. Inconformada, a autarquia previdenciária, preliminarmente, requer a suspensão do presente processo, inclusive da tutela antecipada concedida, até o trânsito em julgado do REsp n. 1.674.221/SP afetado como representativo da controvérsia do tema 1007, com o posicionamento definitivo de Supremo Tribunal Federal sobre a questão. No mérito, alega precipuamente o não preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do benefício e ausência de início de prova material. Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte. É o relatório.
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5006695-35.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MATILDE CAVALCANTE Advogado do(a) APELADO: WILLIANS SIMOES GARBELINI - MS8639-A V O T O O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido. Discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de aposentadoria por idade híbrida, prevista no artigo 48, §§ 2º e 3º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n. 11.718/2008, que tem o seguinte teor: “Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032/95) (...) § 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008) § 4º Para efeito do § 3º deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)” Consoante se verifica nos dispositivos citados, a Lei n. 11.718/2008 introduziu nova modalidade de aposentadoria por idade, a qual permite ao segurado somar períodos de trabalho rural e urbano para completar o tempo correspondente à carência exigida, desde que alcançado o requisito etário de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. Quanto à qualidade de segurado, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, sua perda não será considerada para a concessão da aposentadoria por idade híbrida, nos termos do artigo 3º, § 1º, da Lei n. 10.666/2003, ou seja, os requisitos legais (carência e idade) não precisam ser preenchidos simultaneamente. Em outras palavras: o implemento da idade depois da perda da qualidade de segurado não obsta o deferimento do benefício, desde que satisfeita a carência exigida a qualquer momento. Sobre o período de carência, o artigo 25, inciso II, da Lei n. 8.213/1991, exige o número mínimo de 180 (cento e oitenta) contribuições mensais, observada a regra transitória disposta em seu artigo 142 para os segurados já inscritos na Previdência Social na época da entrada em vigor dessa lei. Em relação ao tempo rural passível de ser utilizado para completar a carência exigida para a concessão desse benefício, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao apreciar o Tema Repetitivo n. 1.007, fixou a seguinte tese: “O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.” Em 24/9/2020, o Plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu não haver violação aos preceitos constitucionais e repercussão geral do tema relacionado à aposentadoria híbrida, de modo que permanece o hígida a tese firmada pelo STJ no Tema 1007. Nesse contexto, não subsistem os efeitos da decisão do Superior Tribunal de Justiça que determinara nova suspensão dos processos enquanto a questão aguardava a análise do Supremo Tribunal Federal. Por sua vez, a comprovação dessa atividade rural deve ser feita por meio de início de prova material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (REsp. Repetitivo n. 1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ). Neste caso, o requisito etário restou preenchido em 20/10/2013, quando a parte autora completou 60 (sessenta) anos de idade. A parte autora requer o reconhecimento de atividade rural, supostamente realizada no período de 20/10/1967 (14 anos de idade) a 30/6/1987 (data imediatamente anterior ao primeiro vínculo empregatício urbano), a fim de ser somados às contribuições previdenciárias, na condição de empregada doméstica, realizadas entre 1º/7/1987 e 19/7/1999 (vide carteira de trabalho). Na fundamentação da sentença, o Juízo a quo reconheceu um período requerido porque devidamente comprovado por início de prova material e prova testemunhal compatível. Consta pletora de documentos indicativos da atividade rural, cumprindo o requisito do artigo 55, § 2º, da LBPS e Súmula n. 149 do STJ. A autora, solteira, trouxe aos autos: (i) cópia da certidão de casamento de seus genitores, celebrado em 1964, na qual seu pai foi qualificado como lavrador; (ii) sua certidão de nascimento, na qual o genitor também se qualificou como lavrador; (iii) contrato de prestação de serviço, assinado em 4/6/1997, no qual a autora se qualificou como trabalhadora rural; (iv) escritura pública e matrícula de imóvel pertencente ao genitor, ora qualificado como lavrador, desde 9/3/1977; (v) Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) de seu pai, com anotações de trabalhado rural, nos períodos de 1º/4/1987 a 30/6/1988 e de 2/2/1997 a 13/5/1997. Ademais, o artigo 55, § 2º, da Lei n. 8.313/1991 não poderia ser aplicado ao instituto da aposentadoria por idade híbrida, já que criado como expressão jurídica de amparo das situações de êxodo rural, isto é, justamente para amparar aqueles trabalhadores que, por terem migrado para as cidades, não têm período de carência mínimo para obter a aposentadoria por idade urbana, muito menos a por idade rural. Com isso, somando-se o tempo de atividade como trabalhadora rural ao período devidamente anotado em CTPS, a parte autora cumpre o tempo de carência, nos termos dos artigos 48, § 3º c/c. 25, II, da Lei n. 8.213/1991. Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC. Todavia, na fase de execução, o percentual deverá ser reduzido se o valor da condenação ou do proveito econômico ultrapassar 200 (duzentos) salários mínimos (art. 85, § 4º, II, do CPC). Diante do exposto, nego provimento à apelação. É o voto.
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E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ARTIGO 48, §§ 3º E 4º DA LEI 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.718/2008. TEMPO DE ATIVIDADE RURAL: CÔMPUTO. QUALIDADE DE SEGURADO. PERÍODO DE CARÊNCIA CUMPRIDO. REQUISITOS CUMPRIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Os períodos de trabalho rural e urbano podem ser somados para obtenção da carência exigida para fins de aposentadoria por idade híbrida, desde que alcançado o requisito etário, nos termos do art. 48, §§ 3º e 4º, da Lei n. 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n. 11.718/2008.
- O implemento da idade depois da perda da qualidade de segurado não obsta o deferimento do benefício, desde que satisfeita a carência exigida a qualquer momento. Incidência do § 1º do artigo 3º da Lei n. 10.666/2003.
- No cômputo da carência do benefício híbrido é possível contar o tempo de atividade rural exercida em período remoto e descontínuo, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento de contribuições (Tema Repetitivo n. 1.007 do STJ).
- A comprovação do exercício da atividade rural deve ser feita por meio de início de prova material, a qual possui eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à sua data de referência, desde que corroborado por robusta prova testemunhal (REsp Repetitivo n. 1.348.633 e Súmula n. 149 do STJ).
- Conjunto probatório suficiente à comprovação do período de atividade rural debatido. Benefício devido.
- Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, com percentual majorado para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC.
- Apelação desprovida.