Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003551-40.2016.4.03.6003

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: MARIA EUNICE DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: VINICIUS MELEGATI LOURENCO - SP378927-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003551-40.2016.4.03.6003

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: MARIA EUNICE DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: VINICIUS MELEGATI LOURENCO - SP378927-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Cuida-se de ação interposta por Maria Eunice da Silva em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.

A r. sentença julgou improcedente o pedido deduzido por meio desta ação e declarou resolvido o mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC/2015. Condenou a parte autora ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em dez por cento sobre o valor atualizado da causa, ficando suspensa a exigibilidade enquanto persistir o estado de hipossuficiência por até cinco anos após o trânsito em julgado da sentença, extinguindo-se a obrigação após o esgotamento deste prazo, nos termos do artigo 98, parágrafos 2º e 3º, CPC/2015.

Apela a parte autora requerendo, em síntese, a reforma da sentença com o provimento do pedido da exordial.

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte Regional.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0003551-40.2016.4.03.6003

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: MARIA EUNICE DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: VINICIUS MELEGATI LOURENCO - SP378927-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): A aposentadoria por idade de rurícola é assegurada na forma do artigo 201, § 7º, inciso II, da Constituição da República de 1988, observando-se: “60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”.

A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social (PBPS), disciplina em seus artigos 48 a 51as condições à aposentadoria por idade rural, alterados pelas Leis nºs 9.032, de 1995, 9.876, de 1999 e 11.718, de 2008.

São três os requisitos à aposentação por idade dos trabalhadores rurais: a idade, a carência e a prova da atividade rural.

1. O primeiro consiste na idade mínima de 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, conforme as regras insertas no artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII, c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.

2. O segundo requisito diz respeito à carência de 180 (cento e oitenta) meses de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Não se cuida de recolhimento das contribuições indicadas na tabela progressiva, prevista no artigo 142 do PBPS, mas, isto sim, do tempo mínimo de atividade exercida no âmbito rural.

A regra foi expressamente prevista no artigo 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, com redação da Lei nº 11.718, de 2008: “Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício”.

2.a. A prorrogação sucessiva do prazo de quinze anos está atualmente fundada no artigo 3º, da Lei nº 11.718, de 20/06/2008, in verbis:

“Art. Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:

I– até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;

II – de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e

III – de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.

Parágrafo único.  Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego”.

De transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses-carência da aposentadoria por idade.

2.b. Anote-se que, quanto ao perfazimento dos requisitos, embora para a aposentadoria por idade urbana esteja assentada a jurisprudência no sentido da desnecessidade de preenchimento a um só tempo, de idade e carência, o mesmo não ocorre na esfera da aposentação por idade rural, para a qual é exigida a simultaneidade. Assim é imprescindível a comprovação do cumprimento conjunto das condições, especialmente da labuta no campo no período imediatamente anterior ao implemento da idade.

Esse entendimento foi cristalizado pela jurisprudência do Colendo Superior Tribunal da Justiça, na forma do precedente emanado do Tema 642, no julgamento do RESP nº 1.345.908/SP, sob a égide dos recursos repetitivos, cuja ementa foi assim redigida, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO.

REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991.

REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.

2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1354908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)

3. O terceiro requisito, diz respeito à comprovação da atividade rural realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, observado o teor do § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, com redação da Lei nº 13.846, de 2019, assim dispõe, in verbis:

Art. 55. (...)

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.  (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

3.a. A jurisprudência encontra-se pacificada segundo o verbete da súmula 149 do C. STJ, que estabelece: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, julgado em 07/12/1995, DJ 18/12/1995),

O precedente aplica-se também aos trabalhadores rurais denominados “boias-frias”, por força do entendimento assentado pela E. Primeira Seção do C. STJ no REsp nº 1.321.493/PR,Relator Ministro Herman Benjamin (j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012), sob os auspícios dos recursos repetitivos.

3.b. A comprovação da atividade rural será realizada mediante verificação dos registros de segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos 38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, bem assim mediante a apresentação dos documentos indicados no rol exemplificativo do artigo 106 do mesmo diploma legal, com redação da Lei 13.846, de 2019, conforme o entendimento firmado pelo E. STJ no julgamento do RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe03.08.2009.

3.c. Ademais, com fulcro na possibilidade de eficácia prospectiva e retrospectiva dos documentos, o reconhecimento de tempo de serviço rural vai além do período relativo ao início de prova material, quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado pelo C. STJ no julgamento do Recurso Especial nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014, segundo a sistemática dos repetitivos, viabilizando, assim, a extensão da eficácia dos documentos, pois, conforme consta da ementa, “não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo o período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória”.

3.d. Anote-se que a declaração de sindicato de trabalhadores rurais foi submetida a três disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em 14/06/1995, passou a ser necessária a homologação do INSS. A partir de 18/01/2019, com a edição da Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a referida declaração para fins de comprovação da atividade rural.

3.e. De outra parte, a natureza processual das normas do artigo 55, § 3°, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que disciplinam a matéria probatória da atividade rurícola, constituem óbice ao julgamento do mérito da lide quando não for apresentado início de prova material, pois conduzem à constatação de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, na forma do artigo 485, IV, do CPC.

Esse entendimento foi cristalizado pelo C. STJ no julgamento do RESP nº 1.352.721/SP, sob o rito dos repetitivos, firmando-se a tese do tema 629: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”. (Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).

Na senda, manifestou-se a Egrégia Terceira Seção desta Colenda Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE.  ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.

(...)

II - A r. decisão rescindenda reconheceu o direito da então autora ao benefício de aposentadoria rural por idade com base na existência de início de prova material, consistente na certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977), corroborado pelos depoimentos testemunhais.

III - Da análise dos documentos que compuseram os autos subjacentes, verifica-se que o cônjuge da então autora ostentava vários vínculos empregatícios de natureza urbana por tempo relevante (14.03.1978 a 31.03.1981; 01.04.1981 a 03.03.1983; 20.02.1987 a 11.1987 e 02.04.1990 a 10.10.1995), tendo sido contemplado, posteriormente, com o benefício de auxílio-doença a partir de 12.12.2001, convertido em aposentado por invalidez, na condição de comerciário/contribuinte individual, a contar de 13.09.2002.

IV - Considerando que a autora implementou o quesito etário somente em 2008 (nascida em 24.12.1953, completou 55 anos de idade em 24.12.2008), é de se concluir que a r. decisão rescindenda adotou interpretação não condizente com o art. 143 c/c o art. 55, §3º, ambos da Lei n. 8.213/91, na medida em que o documento reputado como início de prova material do labor rural (certidão de casamento) restou esmaecido ante a constatação de que o cônjuge exerceu, após o enlace matrimonial, atividades tipicamente urbanas, não bastando, portanto, a comprovação por prova exclusivamente testemunhal.

(...)

VI - A certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977) não se presta como início de prova material do labor rural, tendo em vista o longo histórico de trabalho urbano empreendido por ele (extrato do CNIS).

VII - No que tange ao pedido de reconhecimento de atividade rural, é de se reconhecer que não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação, ou seja, início de prova material no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (24.12.2008), restando inócua a análise da prova testemunhal colhida em juízo.

VIII - Como o § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 versa sobre matéria probatória, é processual a natureza do aludido dispositivo legal, razão pela qual nos feitos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço a ausência nos autos do respectivo início de prova material constitui um impedimento para o desenvolvimento regular do processo, caracterizando-se, consequentemente, essa ausência, como um pressuposto processual, ou um suposto processual, como prefere denominar o sempre brilhante Professor Celso Neves. A finalidade do § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do E. STJ é evitar a averbação de tempo de serviço inexistente, resultante de procedimentos administrativos ou judiciais promovidos por pessoas que não exerceram atividade laborativa.

IX - A finalidade do legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC.

X - A interpretação teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a ausência nos autos de documento tido por início de prova material é causa de extinção do feito sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e 321 do atual CPC.

XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural.

XII - Cabe ressalvar que os valores recebidos por força de título judicial gerador do benefício de aposentadoria rural por idade (NB 41/150.848.253-2), que ora se rescinde, não se sujeitam à restituição, pois possuem natureza claramente alimentar, tendo como destinação o atendimento de necessidades básicas da ora ré. Importante salientar que a percepção do benefício em comento decorreu de decisão judicial, com trânsito em julgado, não se vislumbrando, no caso concreto, qualquer ardil ou manobra da parte autora na ação subjacente com o escopo de atingir tal desiderato, evidenciando-se, daí, a boa-fé, consagrada no art. 113 do Código Civil.

XIII - Em face da ocorrência de revelia, não há ônus de sucumbência a suportar.

XIV - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão.

(TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016 ).

Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.

A parte autora nascida em 12/09/1953, cumpriu o requisito etário em 12/09/2008, quando completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.

Quanto à comprovação da carência, não apresentou início de prova material que comprovasse o efetivo exercício em atividade rural por tempo suficiente e imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima. Vejamos.

Sustenta a parte autora na exordial que é de família de lavradores e, assim, desde a infância exerceu atividades essencialmente agrícolas, tendo dedicação exclusiva ao labor rural como diarista, safrista, parceiro e meeiro, sempre em regime de economia familiar e de forma contínua, alega que começou a trabalhar na roça com aproximadamente 12 anos de idade juntamente com seus pais e posteriormente nas propriedades rurais denominadas Sítio do José Chaves no cultivo de milho, pasto e diversos afazeres rurais, na propriedade rural sítio Bem-te-vi, onde criava porco, galinha, hortaliças em geral, lida de gado, na propriedade rural da dona Nilda, criando gado, e demais outras propriedades rurais, Atualmente encontra-se no assentamento São Joaquim, onde reside e cultiva hortaliças em geral, cria vaca leiteira, bezerros desmamas entre outros afazeres rurais.

Alega ter preenchido os requisitos mínimos exigidos em lei para a concessão do benefício ora pleiteado.

A parte autora juntou aos autos os seguintes documentos:

1)- conta de energia elétrica em nome próprio indicando domicílio no Assentamento São Joaquim, datada de julho/2016,

2) – carteira da Associação de Produtores do Assentamento São Joaquim, em nome próprio, constando data de associação em 07/07/2011 e data de validade até 31/05/2014,

3) – comprovante de inscrição no cadastro de agropecuária, em nome próprio, constando data do início de atividade em 20/06/2011, na propriedade PA São Joaquim – lote 162 – em exploração da atividade econômica de gado leiteiro,

4) – declaração feita pela autora à Previdência Social de exercício de atividade rural constando domicílio no Assentamento São Joaquim número 162 – localizado em Selviria/MS – datado de 13/11/2015,

5) – Declaração anual de produtor rural – DAP – anos 2012, 2013 e 2014,

6) – contrato de concessão de uso, sob condição resolutiva, datado de 26/04/2010 constando a autora e seu esposo, Nivaldo Correia da Silva,  como beneficiários de um lote de 13,20 hectares no PA São Joaquim/MS,

7) – registro de marca de ferro para marcar gado, em nome do marido da autora,

8) – ficha de atualização cadastral agropecuária – Cadastro de Contribuintes do ICMS – constando como início de atividade de criação de bovinos para leite em 20/06/2011, no Assentamento São Joaquim/MS,

9) – notas fiscais de compra de insumos agrícolas – anos 2012, 2013, 2014, 2015, 2016,

10) – documento de Origem Florestal – DOF  - do Ministério do Meio Ambiente – ano 2013,

11) – recibos da Associação dos Produtores rurais do Assentamento São Joaquim/MS – anos 2011, 2013, 2014, 2015, 2016,

12) – recibos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Selviria/MS – anos 2004, 2005, 2008, 2009, 2010, 2016,

13) – recibo da Cooperativa Agrícola Mista de Adamantina/SP – ano 2015.

Em que pese a documentação apresentada verifica-se que não foi anexado aos autos nenhum documento em nome da parte autora capaz de comprovar o seu efetivo labor campesino por todo período de carência necessário à concessão do benefício pleiteado, nos termos da legislação previdenciária.

Deveras, a parte autora acostou aos autos o contrato do INCRA de concessão de uso, sob condição resolutiva, datado de 26/04/2010, outorgando-lhe, e ao esposo, Nivaldo Correia da Silva, título de beneficiários de um lote de 13,20 hectares no PA São Joaquim/MS, bem como os demais documentos relativos a tal assentamento, quais sejam, conta de energia elétrica em nome próprio indicando domicílio no Assentamento São Joaquim, datada de julho/2016, carteira da Associação de Produtores do Assentamento São Joaquim, em nome próprio, constando data de associação em 07/07/2011 e data de validade até 31/05/2014, comprovante de inscrição no cadastro de agropecuária, em nome próprio, constando data do início de atividade em 20/06/2011, na propriedade PA São Joaquim – lote 162 – em exploração da atividade econômica de gado leiteiro, declaração feita pela autora à Previdência Social de exercício de atividade rural constando domicílio no Assentamento São Joaquim número 162 – localizado em Selviria/MS – datado de 13/11/2015, Declaração anual de produtor rural – DAP – anos 2012, 2013 e 2014, registro de marca de ferro para marcar gado, em nome do marido da autora, ficha de atualização cadastral agropecuária – Cadastro de Contribuintes do ICMS – constando como início de atividade de criação de bovinos para leite em 20/06/2011, no Assentamento São Joaquim/MS, notas fiscais de compra de insumos agrícolas – anos 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, documento de Origem Florestal – DOF - do Ministério do Meio Ambiente – ano 2013, recibos da Associação dos Produtores rurais do Assentamento São Joaquim/MS – anos 2011, 2013, 2014, 2015, 2016, recibos do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Selviria/MS – anos 2004, 2005, 2008, 2009, 2010, 2016, recibo da Cooperativa Agrícola Mista de Adamantina/SP – ano 2015.

Em que pese a documentação apresentada, tem-se que tais documentos são recentes, datados posteriormente ao implemento do requisito etário em 12/09/2008, não contemporâneos ao período de carência que se quer comprovar, não servindo como comprobatórios do efetivo exercício de atividade rural pelo lapso temporal exigido pela legislação previdenciária.

Outrossim, verifica-se do Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS que o cônjuge da requerente possui vínculos de atividade urbana a partir de 07/01/1974, junto à CESP – Companhia Energética de São Paulo, tendo se aposentado por tempo de contribuição - NB: 13/0706534913 – ramo de atividade industriário e forma de filiação empregado, com DIB a partir de 11/10/1995, restando demonstração o não exercício de atividade de cunho rural pelo marido da autora, e consequentemente, descaracterizado o alegado labor campesino em regime de economia familiar.

Dessa forma, a parte autora não se desincumbiu do ônus probatório que lhe competia, qual seja o de provar a carência pelo período necessário à concessão do benefício em questão, pois requer que a pessoa interessada esteja em labor rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo em número de meses iguais e necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, o que não foi comprovado.

Ademais, a prova oral colhida nos autos mostra-se frágil, não servindo à comprovação do efetivo labor durante o lapso temporal exigido nos termos da legislação previdenciária. Vejamos.

A parte autora, em depoimento pessoal, disse: que antes de casar morava na casa de seu pai; que seu pai não tinha sítio, mas trabalhava como rural, que seu pai ficava vários períodos em diversos lugares; que não trabalhou em nenhuma delas; que antes de casar não trabalhava nas lidas rurais; que casou em 1971; que a partir dessa data passou a morar no sítio; que carpia e trabalhava com horta; que trabalhava com o primo de seu marido; que passou a trabalhar no Cinturão verde depois que se casou; que ajudava no sustento da casa; que ficou lá até ir para o sítio do outro primo do marido no "Papagaio"; que no período em que o marido trabalhou na CESP cuidava de casa e trabalhava no cinturão verde, na horta; que ia para o sítio do primo do marido; que seu marido entrou na CESP em 1982; que nessa época morava em Ilha Solteira; que o cinturão verde fica em Ilha Solteira/SP; que o primo de seu marido chama-se Anésio; que a esposa dele chama-se Luzia; que seu marido ia para Araçatuba/SP trabalhar; que seu marido não trabalhava na Zona rural; que não se recorda em que época foi para acampamento, antes de ir para o Assentamento São Joaquim; que ficou na beira da estrada por cerca de 02 anos; que trabalhou nas terras de "Paulo Falcos", em Três Lagoas/MS; que lá plantava mandioca; que no sítio atualmente tem porco, galinhas, vaca leiteira; que não pediu aposentadoria em Ilha Solteira/SP; que no sítio mora com o marido; que seu filho tem um lote próprio. Às perguntas do INSS, disse: que seu marido trabalhou na CESP até se aposentar; que seu marido já está aposentado há quase 30 anos; que depois que o marido passou a receber aposentadoria mudou-se para o sítio do "Papagaio"; que lá plantavam milho, etc; que tinha criação de porco e galinha; que trabalhava em parceria com o dono do sítio; que a produção era para consumo; que com a renda da aposentadoria comprava os mantimentos; que no lote em que mora atualmente tem criação de animais.

IZABEL MARTINS BARBOSA, primeira testemunha, disse: que conhece a autora desde o ano de 1989-1990; que a autora morava num sítio próximo; que depois mudou da região e voltou a encontrar com a autora já no acampamento; que o acampamento foi formado em 2007; que não sabe se o marido da autora trabalhava na CESP em 1989; que não tinha conhecimento do marido da autora; que não sabe quantos filhos tem a autora; que em 2007 acampou em frente ao "Assentamento Alecrim", enquanto pleiteavam os lotes no Assentamento "São Joaquim"; que ficou acampada juntamente com a autora de 2007 a 2009; que a autora ficava a semana inteira no Assentamento; que seu lote fica distante do lote da autora; que já frequentou o sítio da autora; que a autora possui horta; que planta milho, mandioca, tira leite; que possui porco, galinha; que a autora não tem empregados; que a autora trabalha com o marido e o filho.

JOSE CARLOS DA CRUZ, segunda testemunha, por sua vez, afirmou: que conhece a autora desde 1988; que se lembra desta data porque sempre viu a autora; que nessa época morava em Selvíria/MS; que a autora morava no sítio do "Papagaio"; que não sabe o nome do proprietário; que plantava milho; que não se lembra se o marido da autora trabalhou na CESP; que não se recorda quando a autora saiu da região; que se mudou para o Estado de São Paulo; que voltou a encontrar a autora no acampamento; que atualmente ambos moram no Assentamento São João Joaquim; que entrou nos lotes em 2009; que antes disso ficaram cerca de 04 anos em beira de estrada; que vai com frequência no lote da autora; que o marido da autora era presidente da associação que há no assentamento; que a autora trabalha na lavoura; que não possuem empregados; que a autora possui um filho que mora no Assentamento e a ajuda.

ANTONIO CARLOS FERREIRA DE ARAUJO. terceira testemunha, disse: que é vizinho da autora; que mora no Assentamento São Joaquim; que entrou no Assentamento em 2007; que quando chegou no acampamento a autora já estava lá; que ficaram acampados por cerca de 3 anos; que a autora planta milho, maracujá; que somente trabalham no lote a esposa e o marido; que só conheceu a autora de 2007 em diante.

Logo, estes depoimentos acerca da suposta rotina rural vivenciada pela apelante são frágeis e com relatos não dotados da robustez necessária para respaldar o reconhecimento do efetivo exercício de atividade rural no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, nos termos do artigo 143 da Lei nº 8.213/91, para servir de prova do alegado labor rural da demandante até o implemento da idade mínima legalmente exigida (55 anos), e fazer jus ao benefício pleiteado, conforme determina o artigo 48 da Lei nº 8.213/91.

Deste modo, nota-se que não há a comprovação efetiva do período de carência, pois a prova oral não confirma objetivamente a vinculação da parte autora ao tempo necessário de atividade rural exigido em Lei, não restando demonstrado que a requerente sempre foi lavradeira, como afirmado na inicial.

Assim, não estando presentes os requisitos para a concessão de aposentadoria por idade, por ser o início de prova material insuficiente para a comprovação do labor rural alegado pela parte autora na exordial, bem como devido à fragilidade da prova testemunhal, deve a demanda ser julgada improcedente.

Em razão da sucumbência recursal, mantenho a condenação da parte autora em despesas processuais e majoro os honorários advocatícios fixados na sentença em 2% (dois por cento), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 4º, III, 5º e 11, do CPC, suspensa a sua exigibilidade, tendo em vista o benefício da assistência judiciária gratuita.

Ante o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

APELAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. NÃO COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADES RURÍCOLAS NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIÊNCIA. PROVA TESTEMUNHAL. FRAGILIDADE. IMPROVIMENTO.

I.Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para concessão ao benefício previdenciário.

II. A atividade rural deverá ser comprovada por meio de início de prova material podendo ser corroborado por prova testemunhal (Súmula nº 149 do STJ e Recursos Repetitivos nºs 1.348.633 e 1.321.493).

III. Entendimento uniforme de que as contribuições previdenciárias são desnecessárias, contanto que se comprove o efetivo exercício de labor rural. Precedentes do STJ.

IV. Os requisitos para concessão do benefício pleiteado não foram preenchidos.

V. Apelação não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.