Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348799-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: ANGELICA APARECIDA PERRESSIM BICUDO

Advogado do(a) APELANTE: ANDREIA MARIA MARTINS - SP218687-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348799-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: ANGELICA APARECIDA PERRESSIM BICUDO

Advogado do(a) APELANTE: ANDREIA MARIA MARTINS - SP218687-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez ou a concessão de auxílio-doença, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios,  fixados em R$ 1.000,00, nos termos do §  8º  do  art.  85  do  Código  de  Processo  Civil, observando-se o disposto no § 3º do art. 98 do mesmo diploma legal.

 

Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, arguindo, preliminarmente, a nulidade da sentença, por não ter sido realizada nova perícia médica com especialista na área de ortopedia e neurologia. No mérito, pugna pela integral reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício.

 

Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5348799-66.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA

APELANTE: ANGELICA APARECIDA PERRESSIM BICUDO

Advogado do(a) APELANTE: ANDREIA MARIA MARTINS - SP218687-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso de apelação, haja vista que tempestivo, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil.

 

A alegação de nulidade da sentença ao argumento de precariedade da perícia realizada deve ser afastada, uma vez que o laudo pericial juntado aos autos apresenta-se completo e suficiente para a constatação da capacidade laborativa da parte autora, constituindo prova técnica e precisa.

 

Com efeito, para a comprovação de eventual incapacidade para o exercício de atividade que garanta a subsistência é necessária a produção de prova pericial, a qual deve ser elaborada de forma a propiciar às partes e ao Juiz o real conhecimento do objeto da perícia, descrevendo de forma clara e inteligível as suas conclusões, bem como as razões em que se fundamenta, e por fim, responder os quesitos apresentados pelas partes e, eventualmente, pelo Juiz.

 

No presente caso, o laudo pericial produzido apresenta-se completo, fornecendo elementos suficientes para formação da convicção do magistrado a respeito da questão. Ademais, determinar a realização de novo exame pericial, sob o argumento de que o laudo médico pericial encartado nos autos não foi realizado por médico especialista, implicaria em negar vigência à legislação em vigor que regulamenta o exercício da medicina, que não exige especialização do profissional da área médica para o diagnóstico de doenças ou para a realização de perícias.

 

Superada tal questão, passa-se ao exame e julgamento do mérito da demanda.

 

Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que se seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas.

 

Quanto à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência, estão presentes tais requisitos, uma vez que a parte autora encontra-se em gozo do benefício de aposentadoria por invalidez na data do ajuizamento da ação, com mensalidades de recuperação até 03/03/2020, nos termos do artigo 47 da Lei nº 8.213/91 (Id 145709558). Dessa forma, foram tais requisitos reconhecidos pela própria autarquia, por ocasião do deferimento do benefício. Da mesma maneira, encontrando-se a parte percebendo o benefício previdenciário, não há falar em perda da qualidade de segurado, nos termos do artigo 15, inciso I, da Lei n.º 8.213/91.

 

Por outro lado, para a solução da lide, é de substancial importância a prova técnica produzida. No caso em exame, o laudo pericial produzido em Juízo concluiu pela capacidade da parte autora para o exercício de sua atividade laboral habitual (Id 145709640).

 

Via de regra, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o juiz firma sua convicção por meio da prova pericial. Todavia, o art. 479 do Código de Processo Civil é no sentido de que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros elementos de prova existente nos autos.

 

Nesse sentido:

 

"PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. AUSÊNCIA. LAUDO PERICIAL. Conforme o art. 436 do Código de Processo Civil o juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com outros elementos ou fatos provados nos autos. Sendo assim, é possível o juiz dispensar o laudo pericial, uma vez presente a fácil constatação pessoal da invalidez. Recurso provido." (STJ, RESP 200300961418, Relator Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, DJ 21/03/2005, p. 00421);

"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE PARCIAL. DEMAIS ELEMENTOS. INCAPACIDADE PERMANENTE. POSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de reconhecer que a concessão da aposentadoria por invalidez deve considerar não só os elementos previstos no art. 42 da Lei nº 8.213/91, mas também aspectos sócio-econômicos, profissionais e culturais do segurado, ainda que o laudo pericial tenha concluído pela incapacidade apenas parcial para o trabalho. Nesse panorama, o Magistrado não estaria adstrito ao laudo pericial, podendo levar em conta outros elementos dos autos que o convençam da incapacidade permanente para qualquer atividade laboral. 2. Agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, AGRESP 200801033003, Relator DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO, j.18/11/2010, DJE 29/11/2010);

"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL CONCLUSIVO PELA INCAPACIDADE PARCIAL DO SEGURADO. POSSIBILIDADE DE AFERIÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONCESSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, UTILIZANDO-SE OUTROS MEIOS. 1. Ainda que o sistema previdenciário seja contributivo, não há como desvinculá-lo da realidade social, econômica e cultural do país, onde as dificuldades sociais alargam, em muito, a fria letra da lei. 2. No Direito Previdenciário, com maior razão, o magistrado não está adstrito apenas à prova pericial, devendo considerar fatores outros para averiguar a possibilidade de concessão do benefício pretendido pelo segurado. 3. Com relação à concessão de aposentadoria por invalidez, este Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido da desnecessidade da vinculação do magistrado à prova pericial, se existentes outros elementos nos autos aptos à formação do seu convencimento, podendo, inclusive, concluir pela incapacidade permanente do segurado em exercer qualquer atividade laborativa, não obstante a perícia conclua pela incapacidade parcial. 4. Agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, AGA 200802230169, Relator Ministro OG FERNANDES, j. 20/10/2009 DJE DATA:09/11/2009).

 

Como se sabe, especialmente em matéria previdenciária (na qual o apelo social é expressivo), a legislação deve ser analisada com moderação e razoabilidade, de modo que a incapacidade para o trabalho deve ser verificada à luz do histórico da pessoa e da realidade social.

 

Assim, apesar de o médico perito ter atestado que a parte autora não se encontra incapacitada para o exercício de sua atividade habitual no momento da elaboração do laudo pericial, no caso concreto, o conjunto probatório carreado aos autos permite concluir que a parte autora, de fato, está incapacitada para o trabalho de forma total e permanente, pois é portadora de "lombalgia  crônica, protrusão discal L4-L5, artrose interapofísária L5-S1, escoliose lombar destro-conexa, desalinhamento sagital de L1 sobre L2, espondiloartrose torácica, abaulamento discal T2-T3,  abaulamento de fibras posteriores dos discos intervertebrais de T3-T4 a T10-T11, abaulamento discal L1-L2, redução da altura discal no nível C5-C6, alterações degenerativas na articulação atlanto-axial, diminuição do sono REM, apnéia do sono, hipertensão arterial e problemas cardíacos", conforme resposta ao quesito 1 formulado pela parte autora, com realização de 2 artrodeses realizadas em coluna cervical e coluna lombar nos anos de 2010 e 2011, aspectos que, aliados a sua idade (61 anos), sua profissão (costureira) e o recebimento do benefício de auxílio-doença no período de 25/02/2008 a 09/06/2009 e de aposentadoria por invalidez no período de 15/02/2009 a 03/09/2018, permitem concluir que ela está incapacitada total e permanente para o exercício de suas atividades profissionais habituais, inviabilizando o trabalho que possa lhe garantir a subsistência.

 

Assim, preenchidos os requisitos legais, é devido o restabelecimento da aposentadoria por invalidez à parte autora.

 

O termo inicial do benefício deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida da aposentadoria por invalidez anteriormente concedida à parte autora (03/09/2018 - Id 145709558), uma vez que o conjunto probatório existente nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então, não tendo sido recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores pagos administrativamente.

 

A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.

 

Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.

 

Por fim, a autarquia previdenciária está isenta do pagamento de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96, do art. 24-A da Lei nº 9.028/95 (dispositivo acrescentado pela Medida Provisória nº 2.180-35/01) e do art. 8º, § 1º, da Lei nº 8.620/93, o que não inclui as despesas processuais. Todavia, a isenção de que goza a autarquia não obsta a obrigação de reembolsar as custas suportadas pela parte autora, quando esta é vencedora na lide. Entretanto, no presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.

 

Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para condenar o INSS a restabelecer a aposentadoria por invalidez, com termo inicial, correção monetária, juros de mora e verba honorária, nos termos da fundamentação.

 

Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as providências cabíveis ao imediato restabelecimento do benefício de aposentadoria por invalidez,  em nome de ANGÉLICA APARECIDA PERRESSIM BICUDO, com data de início - DIB em 04/09/2018 e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC.

 

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. NOVA PERÍCIA MÉDICA. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42, CAPUT E § 2º DA LEI 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. AUSÊNCIA DE INCAPACIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS.

 

- A alegação de nulidade da sentença para a realização de nova perícia médica deve ser rejeitada. No presente caso, o laudo pericial produzido apresenta-se completo, fornecendo elementos suficientes para formação da convicção do magistrado a respeito da questão.

 

- Via de regra, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o juiz firma sua convicção por meio da prova pericial.

 

- Como se sabe, especialmente em matéria previdenciária (na qual o apelo social é expressivo), a legislação deve ser analisada com moderação e razoabilidade, de modo que a incapacidade para o trabalho deve ser verificada à luz do histórico da pessoa e da realidade social.

 

- Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, diante do conjunto probatório e das condições pessoais da parte autora, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e §2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez.

 

- O termo inicial do benefício deve ser fixado no dia imediatamente posterior à cessação indevida da aposentadoria por invalidez anteriormente concedida à parte autora, uma vez que o conjunto probatório existente nos autos revela que o mal de que ela é portadora não cessou desde então, não tendo sido recuperada a capacidade laborativa, devendo ser descontados eventuais valores pagos administrativamente.

 

- A correção monetária e os juros de mora serão aplicados de acordo com o vigente Manual de Cálculos da Justiça Federal, atualmente a Resolução nº 267/2013, observado o julgamento final do RE 870.947/SE em Repercussão Geral.

 

- Honorários advocatícios a cargo do INSS, fixados nos termos do artigo 85, §§ 3º e 4º, II, do Novo Código de Processo Civil/2015 e da Súmula 111 do STJ.

 

- No presente caso, não há falar em custas ou despesas processuais, por ser a autora beneficiária da assistência judiciária gratuita.

 

- Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora provida.

 

 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu REJEITAR A MATÉRIA PRELIMINAR E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para condenar o INSS a restabelecer a aposentadoria por invalidez, com termo inicial, correção monetária, juros de mora e verba honorária, nos termos da fundamentação., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.