APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5365674-14.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MAURICIO LEANDRO DE DEUS
Advogado do(a) APELADO: LAIS RAHAL GRAVA - SP157268-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5365674-14.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MAURICIO LEANDRO DE DEUS Advogado do(a) APELADO: LAIS RAHAL GRAVA - SP157268-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento, objetivando a concessão de auxílio-doença, auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente ou aposentadoria por invalidez, sobreveio sentença de procedência do pedido, condenando-se a autarquia previdenciária a conceder o benefício de auxílio-doença, desde a data do indeferimento administrativo, com correção monetária e juros de mora, além de despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, excluídas as prestações vincendas, nos termos da Súmula 111 do STJ. A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário. Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, em razão da ausência do cumprimento dos requisitos legais para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a alteração do termo inicial e que a cessação do benefício não seja condicionada à reabilitação profissional. Com as contrarrazões, nas quais o autor requer a antecipação da tutela, os autos foram remetidos a este Tribunal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5365674-14.2020.4.03.9999 RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MAURICIO LEANDRO DE DEUS Advogado do(a) APELADO: LAIS RAHAL GRAVA - SP157268-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso de apelação do INSS, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil, haja vista que tempestivo. Os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-doença, de acordo com o artigo 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91 são os que se seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da carência, quando for o caso; 3) incapacidade temporária para o exercício das atividades profissionais habituais, bem como incapacidade que, embora permanente, não seja total, isto é, haja a possibilidade de reabilitação para outra atividade que garanta o seu sustento e 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento daquelas. No presente caso, a qualidade de segurado da parte autora e a carência prevista no inciso I do artigo 25 da Lei 8.213/91 restaram comprovadas, uma vez que a parte autora esteve filiada à Previdência Social, tendo recebido seguro-desemprego até 20/11/2014 (ID 148015844 - pág. 7). Requerido administrativamente o benefício em 22/09/2015, não foi ultrapassado o período de graça previsto no art. 15, inciso II, da Lei nº 8.213/91. Por outro lado, para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo laudo pericial realizado (Id 148015884). De acordo com referido laudo, o autor está incapacitado de forma total e temporária para o trabalho. Assim, preenchidos os requisitos legais, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença à parte autora. Tem-se que, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213/91, in verbis: Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insuscetível de recuperação para sua atividade habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra atividade. § 1º. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou, quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez. (...) Verifica-se, entretanto que, tendo em vista a natureza da doença de que padece a demandante e o tipo de atividade laboral que realiza, bem como as observações do perito judicial, o caso em questão enquadra-se dentre aqueles suscetíveis de eventual recuperação para a atividade habitual e que, portanto, dispensariam a submissão a processo de reabilitação profissional, conforme prerrogativa do caput do referido art. 62. Confira-se, a esse respeito, o seguinte julgado desta Corte: PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. LIMITES RECURSAIS. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. REABILITAÇÃO NÃO OBRIGATORIEDADE. ARTS. 62 E 101, LEI 8.213/91. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1 - Ante a não submissão da sentença à remessa necessária, a discussão na presente esfera deve-se ater aos limites estabelecidos no referido recurso, o qual versou tão somente sobre o obrigatoriedade de se manter o autor em reabilitação, até que esteja apto para retornar ao mercado de trabalho. 2 - A necessidade de reabilitação só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91. 3 - Uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no art. 101 da mesma Lei. 4 - Assim, resta evidente a desnecessidade de o autor ser submetido a procedimento reabilitatório, a menos que configurada sua incapacidade definitiva para o trabalho habitual e na hipótese de ser apto a desenvolver outra profissão, podendo o benefício ser cancelado, caso constatado o restabelecimento da sua capacidade para àquela atividade, mediante perícia administrativa, antes mesmo de qualquer procedimento reabilitatório; ou ainda, sendo indicada a reabilitação, se, no curso desta, o autor recuperar sua aptidão para sua profissão ou estar qualificado para outra, o benefício e a própria reabilitação poderão ser encerrados. 5 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento. 6 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante. 7 - Apelação do INSS parcialmente provida. Sentença reformada em parte. (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0017549-18.2016.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 18/05/2020, Intimação via sistema DATA: 22/05/2020, g.n.) Nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei 8.212/91, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do segurado. Cumpre ressaltar, contudo, que a não obrigatoriedade de submissão do segurado a processo de reabilitação não afasta o fato de que o benefício somente poderá ser cessado no momento em que for constatada a recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação médica periódica. Nesse sentido, a jurisprudência do E. STJ: "PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTERAÇÃO DO REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL PELO DECRETO 5.844/2006. CRIAÇÃO DA DENOMINADA "ALTA PROGRAMADA". ILEGALIDADE. CONTRARIEDADE AO ART. 62 DA LEI 8.213/1991. 1. O acórdão recorrido está no mesmo sentido da compreensão do STJ de que a inserção da chamada "alta programada" para auxílio-doença concedido pelo INSS pelo art. 78, §§ 1º a 3º, do Decreto 3.048/1999 (mediante modificação operada pelo Decreto 5.844/2006) é ilegal, pois contraria o art. 62 da Lei 8.213/1991. A propósito: REsp 1.717.405/PB, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 17.12.2018; AgInt no AREsp 968.191/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20.10.2017; AgInt no REsp 1.546.769/MT, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 3.10.2017; AgInt no AREsp 1.049.440/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 30.6.2017. 2. Recurso Especial não provido" (RESP - 1597725. Relator Ministro HERMAN BENJAMIN. J. 25/06/2019. DJE DATA:01/07/2019.) PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. CESSAÇÃO DO PAGAMENTO DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do STJ tem-se firmado no sentido de que é incompatível com a lei previdenciária a adoção, em casos desse jaez, do procedimento da "alta programada", uma vez que fere o direito subjetivo do segurado de ver sua capacidade laborativa aferida através do meio idôneo a tal fim, que é a perícia médica. 2. De fato, revela-se incabível que o Instituto preveja, por mero prognóstico, em que data o segurado está apto para retornar ao trabalho, sem avaliar efetivamente o estado de saúde em que se encontra, tendo em vista que tal prognóstico pode não corresponder à evolução da doença, o que não é difícil de acontecer em casos mais complexos, como é o versado nos autos. Precedentes: REsp 1.291.075/CE, Relatora Ministra Regina Helena Costa, DJe 18/2/2014; REsp 1.544.417/MT, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 19/8/2015; REsp 1.563.601-MG, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 30/6/2016. 3. Recurso Especial não provido (RESP - 1737688. Relator Ministro HERMAN BENJAMIN. J. 23/11/2018. DJE DATA:23/11/2018.) Quanto ao termo inicial do benefício caberia sua fixação desde a data do requerimento administrativo, formulado em 22/09/2015, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, considerando o conjunto probatório. Entretanto, tendo sido reconhecido o direito em menor extensão a que faria jus a parte autora, e diante da ausência de pedido de reforma da sentença por parte dela, não poderá o magistrado efetuar prestação jurisdicional mais ampla, sob pena de incorrer em reformatio in pejus, mantendo-se a concessão do auxílio-doença, a partir de 28/09/2015, conforme fixado na r. sentença. Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para afastar a obrigatoriedade de inclusão da parte autora em processo de reabilitação profissional, ressaltando, contudo, que o benefício somente poderá ser cessado após a realização de nova perícia médica que comprove a recuperação do segurado, nos termos da fundamentação. Independentemente do trânsito em julgado, comunique-se ao INSS, a fim de que se adotem as providências cabíveis à imediata implantação do benefício de AUXÍLIO-DOENÇA, em nome de MAURÍCIO LEANDRO DE DEUS, com data de início - DIB em 28/09/2015 e renda mensal inicial - RMI a ser calculada pelo INSS, nos termos do art. 497 do CPC. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ARTIGOS 59 E 62 DA LEI N.º 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. NÃO OBRIGATORIEDADE. CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO CONDICIONADA À RECUPERAÇÃO DO SEGURADO. TERMO INICIAL.
- Comprovada a incapacidade total e temporária para o trabalho, bem como presentes os demais requisitos previstos nos artigos 59 e 62 da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão do benefício de auxílio-doença.
- Com efeito, tendo em vista que a incapacidade da parte autora, apurada na perícia realizada em Juízo é total e temporária, não há que se falar em reabilitação, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213/91, pois esta apenas é necessária nos casos em que for insuscetível de recuperação para o exercício de sua atividade habitual, o que não é o caso.
- O benefício de auxílio-doença poderá ser cessado no momento em que for constatada a recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação médica periódica. Precedentes.
- Quanto ao termo inicial do benefício caberia sua fixação desde a data do requerimento administrativo, formulado em 22/09/2015, de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, considerando o conjunto probatório. Entretanto, tendo sido reconhecido o direito em menor extensão a que faria jus a parte autora, e diante da ausência de pedido de reforma da sentença por parte dela, não poderá o magistrado efetuar prestação jurisdicional mais ampla, sob pena de incorrer em reformatio in pejus, mantendo-se a concessão do auxílio-doença, a partir de 28/09/2015, conforme fixado na r. sentença.
- Apelação do INSS parcialmente provida.