Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5705324-29.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: VILMA MARIA RIBEIRO DINIZ

Advogados do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE PRADO MARIANO - SP238154-N, JORGE LUIZ DE OLIVEIRA RAMOS - SP191286-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5705324-29.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: VILMA MARIA RIBEIRO DINIZ

Advogados do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE PRADO MARIANO - SP238154-N, JORGE LUIZ DE OLIVEIRA RAMOS - SP191286-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação à sentença de improcedência da ação ajuizada objetivando a condenação do INSS em indenização por danos morais, ante a cessação indevida do benefício previdenciário, bem como ressarcimento, a título de perdas e danos, pelo pagamento de honorários contratuais. Foi fixada verba honorária de 10% do valor atualizado da causa.

Alegou-se, em suma, que: (1) restou comprovado, por laudo e sentença judiciais, que a apelante encontrava-se totalmente incapacitada na época do indeferimento da prorrogação do auxílio-doença, evidenciando a negligência do perito autárquico; (2) o próprio apelado constatou a impossibilidade de reabilitar a apelante diante da incapacidade laborativa; e (3) o indevido indeferimento do benefício gerou graves danos à apelante, que ficou mais de um ano sem uma renda mínima para sua subsistência e tratamento de suas doenças, sendo atingida de forma efetiva sua integridade psíquica, imagem e honra.

Houve contrarrazões.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5705324-29.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: VILMA MARIA RIBEIRO DINIZ

Advogados do(a) APELANTE: LUIZ HENRIQUE PRADO MARIANO - SP238154-N, JORGE LUIZ DE OLIVEIRA RAMOS - SP191286-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

  

 

V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, trata-se de ação de indenização por danos morais, ajuizada contra o INSS, alegando cessação indevida do benefício de auxílio-doença, aduzindo que foi compelida a ajuizar ação para restabelecer o recebimento do benefício, o que ocasionou sofrimentos, transtornos, e sérias dificuldades.

A sentença assim decidiu (ID 66447666):

 

Os pedidos são improcedentes.

É certo que após exaustiva cognição, em processo judicial, ficou demonstrado ainda pendente de recurso, anote-se que a autora fazia jus ao benefício do auxílio doença.

Porém, a conduta do requerido, de fazer cessar o benefício, embora possa ter causado aflição, ansiedade, preocupação, na autora, não se revestiu de ilicitude. Isso porque a cessação não se deu de modo arbitrário. Ela teve por base procedimento que é amplamente regulamentado, além de perícia médica. Ora, a perícia existe justamente para que o órgão incumbido de decidir a respeito da concessão ou não das benesses previdenciárias possa conhecer a real situação do interessado.

Neste sentido, aliás, é a jurisprudência do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo:

ACIDENTE DO TRABALHO - EVENTO TÍPICO - PERÍCIA - LESÃO NA COLUNA - NEXO CAUSAL E INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE - AUXÍLIOACIDENTE - CABIMENTO - PARCIAL PROCEDÊNCIA DECRETADA. Incontroverso o acidente de trabalho e reconhecido pela perícia o prejuízo funcional decorrente da sequela advinda, de rigor a concessão do auxílio-acidente. JULGAMENTO EXTRA PETITA - NÃO CARACTERIZAÇÃO - É válida a condenação que decorre logicamente do pedido, ainda que não exatamente expresso, ou ainda diverso do constante na inicial, mormente na ação acidentária, cuja lide somente fica bem definida após a instrução probatória. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA - VALORES EM ATRASO - Aplicação do INPC, na vigência da Lei nº 11.430/06. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA - Os índices de correção monetária e juros de mora referente ao período posterior a 30/6/2009, serão fixados em execução tendo em vista o julgamento das ADIs nºs 4.357 e 4.425, pelo plenário do Colendo Supremo Tribunal Federal. No que tange ao dano moral, a cessação do auxílio-doença pela autarquia, não caracteriza conduta capaz de gerar qualquer indenização por dano moral, como, aliás, já decidiu esta Câmara, que, “ao cessar o auxílio-doença, a autarquia julgou-se amparada pela prerrogativa de suspender o benefício do obreiro quando verificada, em perícia administrativa, a cessação da incapacidade, não resultando daí a prática de conduta dolosa ou culposa, tampouco abuso ou arbitrariedade capazes de gerar indenização por dano moral” (TJSP - 16ª CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO; APELAÇÃO Nº: 0035202-25.2013.8.26.0053)

A própria perícia realizada em juízo não tem caráter absoluto e, havendo outros elementos, o juiz pode afastá-la total ou parcialmente. Sendo assim, cabe àquele que vai analisar a plausibilidade do pedido atribuir validade aos elementos de prova que lhe são trazidos.

No caso dos autos, é incontroverso que a cessação se deu com base nos elementos colhidos pelo INSS, o qual, então, decidiu não ser o caso de continuar a pagar o auxílio à autora. Neste cenário, ainda que percalços tenham ocorrido o que não se duvida não há dever de indenizar.

[...]"

 

Na espécie, deve ser confirmada a sentença.

Consta dos autos que a autora recebeu o benefício de auxílio-doença (E/NB - 31/603.811.038-4) no período entre 18/10/2013 e 01/03/2016, data em que a prorrogação foi indeferida em razão de não ter sido constatada incapacidade laborativa pela perícia médica administrativa. Em 12/05/2017, na ação 1000155-41.2016.8.26.0449, foi proferida sentença concedendo-lhe aposentadoria por invalidez, a partir do dia imediato ao do indeferimento da prorrogação do auxílio-doença, ante a comprovação da incapacidade laborativa em perícia judicial.

Embora não seja contestado o indeferimento da prorrogação do benefício, não restou comprovada qualquer responsabilidade civil do INSS para efeito de indenização, conforme pleiteado.

O auxílio-doença previdenciário é benefício que tem caráter temporário, a ser usufruído pelo segurado enquanto estiver impossibilitado de voltar ao trabalho. Então, pode-se afirmar que não existe um período mínimo ou máximo para o beneficiário receber o auxílio-doença. Após tratamento, podem ocorrer três situações: o beneficiário pode ser considerado capaz de voltar ao trabalho (nenhuma invalidez) e o benefício é cessado; o beneficiário não tem mais condições de voltar a exercer um trabalho que lhe garanta a subsistência (invalidez total e permanente); ou o beneficiário pode voltar ao trabalho, seja o mesmo em que atuava antes do sinistro ou outro que lhe garanta a subsistência, apesar de sequelas que possam reduzir a capacidade para exercer o mesmo trabalho da época do acidente (invalidez parcial e permanente).

No presente caso, a autora não comprovou que a cessação do benefício ocorrida em 01/03/2016 ocorreu de forma indevida e abusiva. Inexistente, portanto, na espécie, qualquer fundamento fático-jurídico para respaldar o pedido de reforma da sentença. Não basta o ato de cessação do benefício para configurar causalidade jurídica à reparação postulada, já que a alta médica programada é procedimento adotado para todos os segurados portadores de enfermidades incapacitantes "temporárias", como o auxílio-doença, ainda que o ato de cessação tenha sido revisto na via judicial, pois a perícia administrativa e a decisão de indeferimento inserem-se no regular exercício de poder-dever da Administração, não tendo sido demonstrado que extrapolaram atribuições ou deveres legais.

É firme a orientação, extraída de julgados da Turma, no sentido de que: "O que gera dano indenizável, apurável em ação autônoma, é a conduta administrativa particularmente gravosa, que revele aspecto jurídico ou de fato, capaz de especialmente lesar o administrado, como no exemplo de erro grosseiro e grave, revelando prestação de serviço de tal modo deficiente e oneroso ao administrado, que descaracterize o exercício normal da função administrativa, em que é possível interpretar a legislação, em divergência com o interesse do segurado sem existir, apenas por isto, dano a ser ressarcido (...)" (AC 00083498220094036102, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 17/02/2012).

Além da comprovação da causalidade, que não se revelou presente no caso concreto, a indenização somente seria possível se efetivamente provada a ocorrência de dano moral, através de fato concreto e específico, além da mera alegação genérica de sofrimento ou privação, até porque firme a jurisprudência no sentido de que o atraso na concessão ou a cassação de benefício, que depois seja restabelecido, gera forma distinta e própria de recomposição da situação do segurado, que não passa pela indenização por danos morais.

A Turma já reconheceu o direito à indenização, porém em razão de erro grave na prestação do serviço, assentando que "A suspensão do benefício previdenciário do apelado se deu irregularmente por falha na prestação do serviço, em razão de problema no sistema informatizado do INSS, não tratando de cancelamento de benefício precedido de revisão médica, o qual, via de regra, não dá ensejo à responsabilidade civil" (AC 00034951620074036102, Rel. Des. Fed. NERY JUNIOR, e-DJF3 22/07/2014).

No mesmo sentido, outros julgados podem ser acrescidos:

 

ApCiv 5001771-78.2020.4.03.9999, Rel. Juiza Conv. DENISE AVELAR, e - DJF3 Judicial 1 29/07/2020: “ADMINISTRATIVO. INSS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO CASSADO ADMINISTRATIVAMENTE E RESTABELECIDO POR DECISÃO JUDICIAL. DANOS MORAIS. DESCABIMENTO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. Trata-se de ação ajuizada com o fito de obter indenização por danos morais, decorrente da cessação do benefício previdenciário do autor, em setembro de 2017, o qual foi restabelecido somente em julho de 2018, por meio de decisão judicial, com a concessão de aposentadoria por invalidez. 2. O Poder Público possui responsabilidade objetiva fundamentada pela teoria do risco administrativo, com o consequente enquadramento dos atos lesivos praticados por seus agentes no artigo 37, § 6º da Constituição Federal, no entanto, para que seja possível a responsabilização objetiva, deve-se comprovar a conduta lesiva, o resultado danoso e o nexo de causalidade, os quais não estão presentes na hipótese dos autos. 3. O fato de o INSS ter revisado o benefício, por si só, não gera o dano moral, sobretudo quando o cancelamento é realizado em razão de entendimento no sentido de não terem sido preenchidos os requisitos necessários para a concessão do auxílio-doença, sob a ótica autárquica. 4. A posterior existência de decisão judicial em contrário, reconhecendo o preenchimento dos requisitos para a aposentadoria por invalidez, não tem o condão de tornar ilegal o ato administrativo de cancelamento do benefício de auxílio-doença, pois a divergência entre o entendimento administrativo e o judicial resumiu-se à questão de fato, isto é, a apreciação dos elementos objetivos trata-se de questão inerente à própria atividade decisória. Precedentes. 5. Somente se cogita de dano moral quando houver violação a direito subjetivo e efetiva lesão de ordem moral, em razão de procedimento flagrantemente abusivo ou equivocado por parte da Administração, o que não é o caso. 6. Apelação desprovida.”

 

ApCiv 0022118-32.2010.4.03.6100, Rel. Des. Fed. MAIRAN MAIA, Intimação via sistema 28/02/2020: “ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO (ART. 37, § 6º, DA CF). INSS. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PRORROGAÇÃO INDEFERIDA NA VIA ADMINISTRATIVA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. COMPENSAÇÃO DE DANOS MORAIS E RESSARCIMENTO DE DANOS MATERIAIS. NÃO CABIMENTO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 1. A responsabilidade objetiva pressupõe a responsabilidade do Estado pelo comportamento dos seus agentes que, agindo nessa qualidade, causem prejuízos a terceiros. Impõe, tão somente, a demonstração do dano e do nexo causal, mostrando-se prescindível a demonstração de culpa, a teor do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. 2. Na hipótese do exercício de atividades expressamente atribuídas por lei, exsurge a responsabilidade civil do Estado tão somente quando a Administração Pública (ou seus agentes) exorbite dos limites legais, atuando de forma desarrazoada ou em inobservância às finalidades que presidem a sua atuação. 3. Insere-se no âmbito de atribuições do Instituto Nacional da Seguridade Social - INSS - rejeitar os pedidos de concessão ou prorrogação de benefícios previdenciários sempre que entender pelo não preenchimento dos requisitos legais necessários. 4. Conforme afirmado pelo perito judicial, as enfermidades que acometem a autora apresentam períodos de agravamento, a redundar em incapacidade laborativa, e outros de acalmia, que não obstaculizam o desempenho de suas atividades ordinárias. Dessarte, não se pode concluir, com a convicção necessária, que a autoridade administrativa, ao indeferir o pleito de prorrogação, tenha incidido em erro inescusável ou infringido voluntariamente os termos da lei. 5. O exercício regular de determinado dever-poder delineado por norma legal não pode engendrar, por si só, a obrigação de indenizar, exceto se estiver presente o denominado abuso de poder ou desvio de finalidade, o que não se vislumbra na espécie. Nexo causal afastado. 6. Apelação a que se nega provimento.”

 

Deve, portanto, ser mantida a sentença.

Por fim, cabe a fixação de honorários advocatícios pela atuação na instância recursal, considerando os critérios do artigo 85, §§ 2º a 6º e 11, do CPC, especialmente grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa e tempo exigido de atuação nesta fase do processo, os quais ficam arbitrados em 5% (cinco por cento), em acréscimo ao fixado na sentença, restando suspensa sua exigibilidade, nos termos do artigo 98, §3º, do CPC, por ser beneficiária da Justiça Gratuita.

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INSS. ALEGAÇÃO DE ATO ILÍCITO POR CESSAÇÃO INDEVIDA DE AUXÍLIO-DOENÇA. INEXISTÊNCIA DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. 

1. Inexistente dever de indenizar dano moral, por cassação de auxílio-doença após realização de perícia administrativa, com base na qual motivada a decisão, ainda que revertida a solução em ação judicial pela qual concedida à autora aposentadoria por invalidez. 

2. O auxílio-doença previdenciário é benefício que tem caráter temporário, a ser usufruído pelo segurado enquanto estiver impossibilitado de voltar ao trabalho. Não basta a cessação do benefício para configurar a causalidade jurídica à reparação postulada, já que a alta médica programada é procedimento adotado para todos os segurados portadores de enfermidades incapacitantes "temporárias", como o auxílio-doença, ainda que o ato de cessação tenha sido revisto na via judicial, pois a perícia administrativa e a decisão de indeferimento inserem-se no regular exercício de poder-dever da Administração, não tendo sido demonstrado que extrapolaram atribuições ou deveres legais. 

3. É firme a orientação, extraída de julgados da Turma, no sentido de que: "O que gera dano indenizável, apurável em ação autônoma, é a conduta administrativa particularmente gravosa, que revele aspecto jurídico ou de fato, capaz de especialmente lesar o administrado, como no exemplo de erro grosseiro e grave, revelando prestação de serviço de tal modo deficiente e oneroso ao administrado, que descaracterize o exercício normal da função administrativa, em que é possível interpretar a legislação, em divergência com o interesse do segurado sem existir, apenas por isto, dano a ser ressarcido (...)" (AC 00083498220094036102, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, e-DJF3 17/02/2012).

4. Além da comprovação da causalidade, que não se revelou presente no caso, a indenização somente seria possível se efetivamente provada a ocorrência de dano moral, através de fato concreto e específico, além da mera alegação genérica de sofrimento ou privação, até porque firme a jurisprudência no sentido de que o atraso na concessão ou a cassação de benefício, que depois seja restabelecido, gera forma distinta e própria de recomposição da situação do segurado, que não passa pela indenização por danos morais.

5. Fixada verba honorária pelo trabalho adicional em grau recursal, em observância ao comando e critérios do artigo 85, §§ 8 e 11, do Código de Processo Civil.

6. Apelação desprovida.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.