Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007542-98.2019.4.03.6110

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: SAKERIA THIKARA INDUSTRIA E COMERCIO DE BEBIDAS LTDA

Advogado do(a) APELADO: RENAN LEMOS VILLELA - RS346100-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007542-98.2019.4.03.6110

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: SAKERIA THIKARA INDUSTRIA E COMERCIO DE BEBIDAS LTDA

Advogado do(a) APELADO: RENAN LEMOS VILLELA - RS346100-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de apelação e remessa necessária à sentença concessiva de mandado de segurança, que afastou a exigência de regularidade fiscal (IN RFB 1.432/2013), para o registro especial de produtores, engarrafadores, cooperativas de produtores, estabelecimentos comerciais atacadistas e importadores de bebidas alcoólicas.

Alegou-se que: (1) o cancelamento do registro especial, por falta de regularidade fiscal, tem previsão no artigo 2º do Decreto-Lei 1.593/1977; (2) a exigência não ofende o princípio da livre iniciativa (artigo 170 da CF/1988), pois apoia-se nos também princípios constitucionais da ordem econômica e da função social da propriedade; (3) o artigo 146-A da CF permite aplicar os requisitos do Decreto-Lei 1.593/77 ao ramo das bebidas alcoólicas; e (4) os requisitos legais e regulamentares têm finalidade extrafiscal e regulatória, não apenas de arrecadação, pois objetivam o controle estrito e rigoroso sobre a atividade de produção de bebidas.

Houve contrarrazões e parecer do MPF pelo prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 


APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5007542-98.2019.4.03.6110

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS MUTA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: SAKERIA THIKARA INDUSTRIA E COMERCIO DE BEBIDAS LTDA

Advogado do(a) APELADO: RENAN LEMOS VILLELA - RS346100-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

Senhores Desembargadores, discute-se a exigência de regularidade fiscal, nos termos da IN RFB 1.432/2013, que dispõe sobre o registro especial de produtores, engarrafadores, cooperativas de produtores, estabelecimentos comerciais atacadistas e importadores de bebidas alcoólicas, e sobre o selo de controle a que sujeitos tais produtos.

Por relevante, transcreve-se a previsão normativa de registro especial aplicável ao setor e os requisitos para o respectivo requerimento:

 

Art. 2º Os produtores, engarrafadores, cooperativas de produtores, estabelecimentos comerciais atacadistas e importadores dos produtos a que se refere esta Instrução Normativa estão obrigados à inscrição no registro especial instituído pelo art. 1º do Decreto-Lei nº 1.593, de 21 de dezembro de 1977, sendo vedado exercer estas atividades sem prévia satisfação da exigência legal.

§ 1º O registro especial, mantido pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB), será concedido por estabelecimento, de acordo com o tipo de atividade desenvolvida, e será específico para:

I - produtor, quando no estabelecimento industrial ocorrer, exclusivamente, operação de fabricação ou acondicionamento para venda a granel dos produtos de que trata o Anexo I;

II - engarrafador, quando no estabelecimento industrial ocorrer operação de engarrafamento dos produtos, próprios ou de terceiros, de que trata o Anexo I;

III - atacadista, quando no estabelecimento ocorrer, exclusivamente, operação de venda a granel dos produtos de que trata o Anexo I; e

IV - importador, quando o estabelecimento, ainda que realize outro tipo de operação, efetuar importação dos produtos de que trata o Anexo I, com finalidade comercial.

§ 2º As cooperativas de produtores deverão requerer o registro especial da espécie:

I - prevista no inciso I do § 1º, quando realizarem, exclusivamente, operação de fabricação ou acondicionamento para venda a granel dos produtos de que trata o Anexo I;

II - prevista no inciso II do § 1º, quando no estabelecimento industrial ocorrer operação de engarrafamento.

§ 3º Poderão ser concedidos, cumulativamente, a um mesmo estabelecimento mais de um tipo de registro especial dentre os elencados nos incisos I a IV do § 1º.

§ 4º Ocorrendo a hipótese prevista no § 3º, deverá ser atribuído um número distinto a cada registro especial.

§ 5º A inscrição no registro especial é dispensada para:

I - as lojas francas que efetuarem a importação de bebidas destinadas exclusivamente à venda em suas dependências;

II - os estabelecimentos obrigados à utilização do Sistema de Controle de Produção de Bebidas (Sicobe) que estejam operando em normal funcionamento e desde que todos os produtos sejam controlados pelo sistema;

III - os estabelecimentos que comercializem exclusivamente bebidas, de fabricação nacional ou importadas, enquadradas nos critérios de dispensa da exigência de aplicação do selo de controle nos termos do art. 16;

IV - os Parceiros Comerciais da Fédération Internationale de Football Association (Fifa) nos termos da Instrução Normativa RFB nº 1.313, de 28 de dezembro de 2012.

§ 6º A falta de inscrição no registro especial implica, sem prejuízo da exigência dos tributos devidos e da imposição de sanções previstas na legislação tributária e penal, apreensão das matérias-primas, produtos em elaboração, produtos acabados e materiais de embalagem existentes no estabelecimento, e também dos selos de controle não aplicados em estoque.

§ 7º O estoque das matérias-primas, produtos em elaboração, produtos acabados e materiais de embalagem, apreendido na forma do § 6º:

I - poderá ser liberado, juntamente com os selos de controle, quando, no prazo de 90 (noventa) dias, contado da data da apreensão, o estabelecimento obtiver o registro especial, nos termos dos arts. 2º a 5º; ou

II - será objeto de aplicação da pena de perdimento, com a consequente destinação por alienação, mediante leilão, ou por destruição.

Art. 3º O registro especial será concedido, a requerimento da pessoa jurídica interessada, pelo Delegado da Delegacia da Receita Federal do Brasil (DRF) ou da Delegacia da Receita Federal de Fiscalização no Município de São Paulo (Defis/SP) ou da Delegacia Especial de Maiores Contribuintes no Município do Rio de Janeiro (Demac/RJ), em cuja jurisdição estiver domiciliado o estabelecimento, mediante expedição de Ato Declaratório Executivo (ADE).

§ 1º A pessoa jurídica interessada em requerer o registro especial deverá atender aos seguintes requisitos:

I - prévia adesão ao Domicílio Tributário Eletrônico (DTE), nos termos da Instrução Normativa SRF nº 664, de 21 de julho de 2006;

II - estar legalmente constituída para o exercício da atividade;

III - dispor de instalações industriais adequadas ao tipo de atividade;

IV - regularidade fiscal:

a) da pessoa jurídica requerente;

b) dos sócios, pessoas físicas, diretores, gerentes, administradores e procuradores da pessoa jurídica requerente; e

c) das pessoas jurídicas controladoras da pessoa jurídica referida na alínea “a”, bem como de seus respectivos sócios, diretores, gerentes, administradores e procuradores;

V - estar com a situação cadastral regular e atualizada, inclusive o Quadro de Sócios e Administradores (QSA);

VI - em se tratando de estabelecimento que realize as operações mencionadas nos incisos I, III, IV e VI do art. 4º do Regulamento da Lei nº 8.918, de 14 de julho de 1994, aprovado pelo Decreto nº 6.871, de 4 de junho de 2009, possuir os registros de que tratam os arts. 6º e 7º desse mesmo Regulamento; e

V - em se tratando de estabelecimento importador, possuir habilitação perante o Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex) nos termos da Instrução Normativa RFB nº 1.288, de 31 de agosto de 2012.

§ 2º O ADE de que trata o caput identificará o número de registro especial, mediante numeração específica, e será publicado no Diário Oficial da União (DOU) e no sítio da RFB na internet http://www.receita.fazenda.gov.br/.

§ 3º A cada ADE corresponderá somente um número de registro especial.

§ 4º A autoridade concedente do registro especial determinará, no prazo de 5 (cinco) dias contado da data da publicação a que se refere o § 1º, a inclusão das informações no Sistema de Administração de Selos de Controle (Selecon) da RFB.

§ 5º Para fins do que dispõe este artigo, os empresários individuais equiparam-se à pessoa jurídica.”

 

No caso, a sentença concedeu a ordem, destacando que não há lei em sentido estrito a amparar a exigência de regularidade fiscal para registro e exercício de atividade no ramo empresarial, concluindo no sentido da exorbitância do regulamento administrativo.

Tal entendimento é consentâneo com a pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido da inconstitucionalidade da imposição de restrição de atividades com o objetivo da cobrança indireta de tributos pelo Estado:

 

ARE 914045, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe 19/11/2015: “RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO TRIBUTÁRIO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CLÁUSULA DA RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL PLENO DO STF. RESTRIÇÕES IMPOSTAS PELO ESTADO. LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL. MEIO DE COBRANÇA INDIRETA DE TRIBUTOS. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte, agora reafirmada em sede de repercussão geral, entende que é desnecessária a submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em Súmula deste Tribunal, nos termos dos arts. 97 da Constituição Federal, e 481, parágrafo único, do CPC. 2. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente entendido que é inconstitucional restrição imposta pelo Estado ao livre exercício de atividade econômica ou profissional, quanto aquelas forem utilizadas como meio de cobrança indireta de tributos. 3. Agravo nos próprios autos conhecido para negar seguimento ao recurso extraordinário, reconhecida a inconstitucionalidade, incidental e com os efeitos da repercussão geral, do inciso III do §1º do artigo 219 da Lei 6.763/75 do Estado de Minas Gerais.”

 

A Corte Suprema já enfrentou a questão específica sob exame, em decisões monocráticas. A exemplo:

 

RE 994.586, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 28/02/2019: Trata-se de recurso extraordinário em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado: “MANDADO DE SEGURANÇA. NEGATIVA DE REGISTRO ESPECIAL DE ENGARRAFADOR. EXISTÊNCIA DE DÉBITO FISCAL. A negativa de Registro Especial como Engarrafador (previsto no art. 2º da IN RFB nº 1.432/2013) a pretexto da existência de débitos fiscais, constitui ato abusivo e ilegal, violando o direito ao livre exercício de atividade econômica”. (eDOC 1, p. 165) No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, aponta-se violação aos arts. 97, e 170, IV, do texto constitucional.Nas razões recursais, alega-se que a instituição de um regime especial de IPI para a indústria de bebidas alcoólicas justifica-se pelas mesmas razões que o estabelecido para a indústria de cigarros, o qual já foi julgado constitucional pelo STF. Sustenta-se que a concessão do registro especial que se exige para o ramo de bebidas alcoólicas é condicionada à satisfação de diversos requisitos legais trazidos no Decreto-Lei nº 1.593/77, recepcionado pela CF/88 com força de lei ordinária, concluindo que desproporcional seria a falta dessa exigência legal, pois então se estaria afrontando o princípio da proibição de insuficiência, que decorre do dever estatal de proteção dos direitos e interesses fundamentais. Aduz-se também que ao afastar a aplicação das normas que condicionam o fornecimento de selos à regularidade fiscal o órgão fracionário violou a cláusula de reserva de plenário, pois houve a declaração indireta de inconstitucionalidade. (eDOC 1, p. 207) A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo parcial provimento do apelo. (eDOC 6) É o relatório. Inicialmente, verifico que o presente recurso submete-se ao regime jurídico do Código de Processo Civil de 1973, tendo em vista que impugna decisão publicada em data anterior a 17.3.2016. Decido. A irresignação não merece prosperar. Destaco que o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência desta Corte, no sentido de que não se pode utilizar de meios indiretos de cobrança de débitos fiscais que obstem o livre exercício da atividade econômica. A esse respeito cito os seguintes precedentes:(...) Destaco ainda, decisão monocrática proferida pelo Ministro Celso de Mello, que, em caso análogo ao dos autos, asseverou: “A circunstância de não se revelarem absolutos os direitos e garantias individuais proclamados no texto constitucional não significa que a Administração Tributária possa frustrar o exercício da atividade empresarial ou profissional do contribuinte, impondo-lhe exigências gravosas, que, não obstante as prerrogativas extraordinárias que (já) garantem o crédito tributário, visem, em última análise, a constranger o devedor a satisfazer débitos fiscais que sobre ele incidam. O fato irrecusável, nesta matéria, como já evidenciado pela própria jurisprudência desta Suprema Corte, é que o Estado não pode valer-se de meios indiretos de coerção, convertendo-os em instrumentos de acertamento da relação tributária, para, em função deles – e mediante interdição ou grave restrição ao exercício da atividade empresarial, econômica ou profissional – constranger o contribuinte a adimplir obrigações fiscais eventualmente em atraso. (…) Qualquer que seja a restrição que implique cerceamento da liberdade de exercer atividade lícita é inconstitucional, porque contraria o disposto nos artigos 5º, inciso XIII, e 170, parágrafo único, do Estatuto Maior do País. São exemplos mais comuns de sanções políticas a apreensão de mercadorias sem que a presença física destas seja necessária para a comprovação do que o fisco aponta como ilícito; o denominado regime especial de fiscalização; a recusa de autorização para imprimir notas fiscais; a inscrição em cadastro de inadimplentes com as restrições daí decorrentes; a recusa de certidão negativa de débito quando não existe lançamento consumado contra o contribuinte; a suspensão e até o cancelamento da inscrição do contribuinte no respectivo cadastro, entre muitos outros. Todas essas práticas são flagrantemente inconstitucionais, entre outras razões, porque: a) implicam indevida restrição ao direito de exercer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, assegurado pelo art. 170, parágrafo único, da vigente Constituição Federal; e b) configuram cobrança sem o devido processo legal, com grave violação do direito de defesa do contribuinte, porque a autoridade que a este impõe a restrição não é a autoridade competente para apreciar se a exigência é ou não legal.” (RE 666.405/RS, DJ 28.8.2012). Ainda nesse sentido, cito as seguintes decisões monocráticas: RE 705.898/RS, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe 7.11.2012; RE 639.910/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJ 12.4.2012 e RE 579.176/RS, Rel. Min. Joaquim Barbosa, DJ 1º.12.2011. Ademais, quanto à alegação de violação à cláusula de reserva do plenário, verifico que tal pretensão não merece prosperar.  Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE-RG 914.045, tema 856 da sistemática da repercussão geral, estabeleceu que não há violação à cláusula de reserva do plenário quando o Tribunal de origem afasta aplicação de lei ou ato normativo tendo em vista súmula ou jurisprudência do plenário desta Corte. A respeito, colaciono a ementa do referido julgado: "RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. DIREITO TRIBUTÁRIO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CLÁUSULA DA RESERVA DE PLENÁRIO. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. JURISPRUDÊNCIA DO TRIBUNAL PLENO DO STF. RESTRIÇÕES IMPOSTAS PELO ESTADO. LIVRE EXERCÍCIO DA ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL. MEIO DE COBRANÇA INDIRETA DE TRIBUTOS. 1. A jurisprudência pacífica desta Corte, agora reafirmada em sede de repercussão geral, entende que é desnecessária a submissão de demanda judicial à regra da reserva de plenário na hipótese em que a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do Plenário do Supremo Tribunal Federal ou em Súmula deste Tribunal, nos termos dos arts. 97 da Constituição Federal, e 481, parágrafo único, do CPC. 2. O Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente entendido que é inconstitucional restrição imposta pelo Estado ao livre exercício de atividade econômica ou profissional, quanto aquelas forem utilizadas como meio de cobrança indireta de tributos. 3. Agravo nos próprios autos conhecido para negar seguimento ao recurso extraordinário, reconhecida a inconstitucionalidade, incidental e com os efeitos da repercussão geral, do inciso III do §1º do artigo 219 da Lei 6.763/75 do Estado de Minas Gerais." (ARE 914.045-RG, Rel. Min. Edson Fachin,DJe 19.11.2015)  Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (artigo 932, VIII, do CPC, c/c art. 21, §1º, do RISTF). 

 

Na mesma linha, dentre outras: ARE 1.218.561, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe 02/10/2019; ARE 1.129.644, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe 17/05/2018; RE 895.007, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, DJe 23/10/2015; RE 893.639, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJe 15/06/2015.

Sem discrepância, já decidiu esta Corte que o ato normativo em evidência viola os princípios constitucionais da estrita legalidade e da tipicidade cerrada, previstos no artigo 5º, II, e 150, I, da CF/1988, pois criou obrigação ao contribuinte, passível de gerar estrição de direitos, sem o devido supedâneo legal, resultando em meio de cobrança indireta de tributos.

Neste sentido:

 

ApCiv 5019159-56.2017.4.03.6100, Rel. Des. Fed. MONICA NOBRE, e - DJF3 Judicial 02/01/2019: “REGISTRO ESPECIAL. EMPRESA DO RAMO DE IMPORTAÇÃO E COMÉRCIO ATACADISTA DE BEBIDAS ALCOOLICAS. INRFB 1.432/2013. RESTRIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 547 STF. APELAÇÃO PROVIDA. - A Instrução Normativa INRFB 1432/2013, disciplina as obrigações sobre o selo de controle a que estão sujeitas as bebidas alcoólicas. - Conforme os termos da Instrução Normativa, a impetrante está obrigada a realizar a sua inscrição no Registro Especial para que possa exercer a sua atividade econômica, bem como deve estar em dia com suas obrigações fiscais, ou seja, não podem existir débitos em aberto de sua responsabilidade. Em caso contrário, pode ser negada a inscrição e, posteriormente, pode ser cancelada. - Porém, ao regular a matéria através de normatização diversa de lei ocasiona ofensa aos princípios constitucionais da estrita legalidade e da tipicidade cerrada (CF, art. 5.º, inc. II, e art. 150, inc. I). - O princípio da legalidade em matéria tributária está insculpido no texto constitucional. Anote-se que só a lei stricto sensu, pode obrigar o contribuinte ou restringir-lhe direitos. Tal construção tem seu fundamento na segurança jurídica ou certeza do direito. Por conseguinte, a administração fazendária, ao estabelecer restrições a direitos do contribuinte, ofende o princípio da legalidade. -A Súmula 547 do STF, que regulamenta a discussão travada nessa demanda, refere que “Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e exerça suas atividades profissionais.” -Jurisprudência do E. STJ e dessa Corte. -Apelação provida.”

 

Por fim, assevere-se que o DL 1.593/1977, conforme o artigo 1º, dispõe especificamente sobre obrigações destinadas aos fabricantes de cigarros, sendo o cancelamento de registro previsto no artigo 2º relacionado ao setor tabagista. Assim, não pode ser criada obrigação acessória para o setor de bebidas alcoólicas, não abrangido expressamente por tal lei, por analogia ou interpretação extensiva.

Deste modo, ausente previsão legal específica, não pode prevalecer o ato infralegal que impõe a obrigatoriedade da regularidade fiscal para registro especial sob pena de cancelamento, constituindo a exigência meio de cobrança indireta de tributos, vedada pela jurisprudência.

Ante o exposto, nego provimento à apelação e à remessa oficial.

É como voto.



E M E N T A

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. REGISTRO ESPECIAL. BEBIDAS ALCOÓLICAS. REGULARIDADE FISCAL. IN RFB 1.432/2013. RESTRIÇÃO ILEGAL. SÚMULA 547/STF.

1. É ilegal a exigência da regularidade fiscal, nos termos da IN RFB 1432/2013, prevista para registro especial de produtores, engarrafadores, cooperativas de produtores, estabelecimentos comerciais atacadistas e importadores de bebidas alcoólicas.

2. O DL 1.593/1977 dispõe especificamente sobre obrigações destinadas aos fabricantes de cigarros, sendo o cancelamento de registro previsto no artigo 2º relacionado ao setor tabagista. Assim, não pode ser criada obrigação acessória para o setor de bebidas alcoólicas, não abrangido expressamente por tal lei, por analogia ou interpretação extensiva.

3. Ausente previsão legal específica, não pode prevalecer o ato infralegal que impõe a obrigatoriedade da regularidade fiscal para registro especial sob pena de cancelamento, constituindo a exigência meio de cobrança indireta de tributos, vedada pela jurisprudência. Precedentes do Supremo Tribunal Federal e desta Corte.

4. Apelação e remessa oficial desprovidas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.