Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5459101-02.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: IRANI MORAIS DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: NEILI TAVARES BARBOSA - SP358377-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5459101-02.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: IRANI MORAIS DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: NEILI TAVARES BARBOSA - SP358377-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou IMPROCEDENTE o pedido de concessão de SALÁRIO MATERNIDADE, com fundamento na ausência de comprovação dos requisitos legais.

Em suas razões de recurso, sustenta a parte autora:

-  que comprovou todos os requisitos exigidos para a concessão do benefício.

Pré-questiona, para efeito de recurso especial ou extraordinário, ofensa a dispositivos de lei federal e de preceitos constitucionais.

Sem contrarrazões, os autos foram remetidos a esta E. Corte Regional.

É O RELATÓRIO.

 

 

 


 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5459101-02.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 22 - DES. FED. INÊS VIRGÍNIA

APELANTE: IRANI MORAIS DA SILVA

Advogado do(a) APELANTE: NEILI TAVARES BARBOSA - SP358377-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

 

V O T O

 

A EXMA. SRA. DESEMBARGADORA FEDERAL INÊS VIRGÍNIA (RELATORA): Recebo a apelação interposta sob a égide do Código de Processo Civil/2015, e, em razão de sua regularidade formal, possível sua apreciação, nos termos do artigo 1.011 do Código de Processo Civil. 

O salário-maternidade decorre do artigo 7º, XVIII, da Constituição Federal, regulamentado pelos artigos 71 a 73 da Lei 8.213/1991 e artigos 93 a 103 do Decreto 3.048/1999, sendo devido à empregada, trabalhadora avulsa, empregada doméstica, contribuinte individual, facultativa ou segurada especial, durante cento e vinte dias, com início no período entre vinte e oito dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação concernente à proteção à maternidade (artigo 71, caput, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 10.710/03). 

É devido à segurada especial, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao da data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto   (artigo 93, § 2º, do Decreto 3.048/1999).

Conforme o disposto no artigo 26, inciso III, da Lei 8.2313/1991, a concessão do salário-maternidade para a segurada especial independe de carência:

 Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

III - os benefícios concedidos na forma do inciso I do art. 39, aos segurados especiais referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei.

De outro lado, o benefício é devido por 120 (cento e vinte) dias, nos termos do artigo 71 da Lei 8.213/1991, devendo ser pago diretamente pelo INSS, no caso de segurada especial (artigo 73):

 Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade.

 Art. 73. Assegurado o valor de um salário-mínimo, o salário-maternidade para as demais seguradas, pago diretamente pela Previdência Social, consistirá:

(...)

DO CASO CONCRETO

No caso dos autos, restou incontroverso que a parte autora é segurada da Previdência Social, na condição de segurada especial, como se vê dos documentos juntados - declaração de exercício de atividade rural emitida em 25/01/2017 pelo Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar de Barra do Turvo, em que consta filiação desde 25/05/2011 (ID 47429813); ficha de sindicalização com as contribuições pagas desde maio de 2010 (ID 47429816); recibo do pagamento de mensalidade de julho de 2016 até janeiro de 2017 (ID 47429818); contrato particular de compra e venda, datado de 08/11/2001, referente à aquisição de parte ideal de uma propriedade rural no Município de Barra do Turvo, São Paulo, pelo genitor da autora, qualificado como lavrador (ID 47429820); declaração de ITR (Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural) referente ao exercício do ano de 2012 a 2015 (ID 47429824, ID 47429828 e ID 47429829 e ID 47429832);  guia de recolhimento Darf de 2012 a 2015 (ID 47429835); certificado de cadastro de imóvel rural - CCIR (ID 47429838); certidão de nascimento da autora, na qual são seu genitor é qualificado como lavrador (ID 47429850); certidão de casamento de seus genitores, ocorrido em 16/11/1978, onde seu pai é qualificado como lavrador (ID 47429851); pelo histórico escolar que demonstra os estudos em zona rural (ID 47429852); e pelo depoimento das testemunhas arroladas, que se encontram em mídia digital.

Com efeito, não é difícil supor que a atividade rural sempre foi o labor preponderante da autora, não havendo indícios de que tenha desempenhado outro tipo de atividade laborativa para seu sustento.

COMPROVAÇÃO DO LABOR RURAL

Com efeito, a comprovação do tempo de serviço em atividade rural, seja para fins de concessão de benefício previdenciário ou para averbação de tempo de serviço, deve ser feita mediante a apresentação de início de prova material, conforme preceitua o artigo 55, § 3º, da Lei de Benefícios, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, entendimento cristalizado na Súmula nº 149, do C. STJ:

"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".

EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA

Dentro desse contexto, considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova, admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

Transcrevo, por oportuno, a ementa do julgado:

"RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.

1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.

2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.

3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.

4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.

6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp nº 1.321.493/PR, 1ª Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 19/12/2012).

Consoante jurisprudência do C. STJ, tanto para os "boias-frias" quanto para os demais segurados especiais, é desnecessária a apresentação de prova documental de todo o período pretendido, considerando a dificuldade probatória e a informalidade com que é exercida a atividade rural, desde que o início de prova material seja corroborado por robusta prova testemunhal, de forma a ter sua eficácia estendida tanto para períodos anteriores como posteriores aos das provas apresentadas.

Nessa esteira, a Corte Superior firmou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal (Recurso Especial Repetitivo 1.348.633/SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014).

Ainda, sobre a questão, o Eg. STJ erigiu a Súmula 577, verbis:

"É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório."

Consagrado, pois, o entendimento jurisprudencial de que a prova testemunhal possui aptidão para ampliar a eficácia probatória da prova material trazida aos autos.

Por conseguinte, tendo desenvolvido atividades rurais, ainda que de forma esporádica, comprovada está, portando, a qualidade de segurada da autora, bem assim os demais requisitos necessários à concessão do benefício, de forma que possui direito ao benefício.

A data do parto foi em 27/02/2016 (certidão de nascimento ID 47429811).

Dessa forma, concedo à parte autora o benefício salário-maternidade devido pelo nascimento de sua filha, por 120 dias e no valor de um salário mínimo, nos termos da lei, a ser pago a partir 27/02/2016, data do parto (ID 47429811), compensando-se com eventuais valores recebidos administrativamente.

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, aplicam-se, até a entrada em vigor da Lei nº 11.960/2009, os índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal; e, após, considerando a natureza não-tributária da condenação, os critérios estabelecidos pelo C. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 870.947/SE, realizado em 20/09/2017, na sistemática de Repercussão Geral.

Vencido o INSS, a ele incumbe o pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor das prestações vencidas até a data da sentença (Súmula nº 111/STJ).

Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora para reformar a r. sentença e conceder o benefício requerido, nos termos expendidos na fundamentação.

É COMO VOTO.

/gabiv/jb



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO - SALÁRIO-MATERNIDADE. ARTIGOS 71 A 73 DA LEI 8.213/1991 E ARTIGOS 93 A 103 DO DECRETO 3.048/1999. REQUISITOS PREENCHIDOS. 

1. O salário-maternidade é devido à segurada especial, no valor de 01 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 10 (dez) meses imediatamente anteriores ao da data do parto ou do requerimento do benefício, quando requerido antes do parto   (artigo 93, § 2º, do Decreto 3.048/1999).

2. Considerando as precárias condições em que se desenvolve o trabalho do lavrador e as dificuldades na obtenção de prova material do seu labor, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR, realizado segundo a sistemática de recurso representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C), abrandou-se a exigência da prova, admitindo-se início de prova material sobre parte do lapso temporal pretendido, a ser complementada por idônea e robusta prova testemunhal.

3. Tendo desenvolvido atividades rurais, ainda que de forma esporádica, comprovada está a qualidade de segurada da autora, bem assim os demais requisitos necessários à concessão do benefício.

4. Apelação provida.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação da parte autora para reformar a r. sentença e conceder o benefício requerido, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.