APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5027262-81.2019.4.03.6100
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE BATISTA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: SALVADOR CORREIA FILHO - SP334707-A
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: BANCO BMG SA
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FLAVIA ALMEIDA MOURA DI LATELLA - MG109730-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5027262-81.2019.4.03.6100 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE BATISTA DA SILVA Advogado do(a) APELADO: SALVADOR CORREIA FILHO - SP334707-A OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: BANCO BMG SA ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FLAVIA ALMEIDA MOURA DI LATELLA - MG109730-A R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO Relator): Cuida-se de apelação, interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, em face da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido, extinguindo o processo com julgamento do mérito, a teor do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para condenar os réus a indenizarem o autor pelos danos materiais sofridos, correspondentes às quantias indevidamente descontadas, corrigidas monetariamente desde a data do respectivo desconto e acrescidas de juros de mora a contar da data da citação. Determinou que sejam aplicados os indexadores constantes no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal para as ações condenatórias em geral). Condenou os réus, ainda, a indenizarem o autor, de forma solidária, pelos danos morais sofridos, arbitrados no montante de R$ 5.000,00, cujo valor deverá ser corrigido desde a data do arbitramento, nos termos da Súmula n° 362 do C. STJ, acrescida de juros de mora a partir do evento danoso. Os indexadores a serem aplicados serão os constantes no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal (para as ações condenatórias em geral) vigentes à época da execução do julgado. Por fim, diante da sucumbência ínfima do autor, condenou os réus em honorários advocatícios em favor do advogado do autor, fixados em 10% por cento do valor da condenação, nos termos do artigo 85, §§ 2º e 3º do Código de Processo Civil. Sem custas em reembolso, uma vez que a autor é beneficiário da Assistência Judiciária Gratuita. Alega o INSS, em síntese, sua ilegitimidade passiva, eis que houve contratação direta com a instituição financeira repassadora da renda mensal, de forma que é obrigação da instituição financeira realizar a exclusão da operação de empréstimo pessoal quitada antecipadamente, em razão dela deter todo o controle das operações. Afirma que a contratação do empréstimo bancário entre o segurado e a instituição financeira e a viabilização da consignação do empréstimo não acarreta nenhum tipo de remuneração ou contraprestação em seu favor. Aduz ser inviável a tentativa de responsabilização da autarquia na medida em que não deu causa ao evento, de modo que eventual dever de devolução das parcelas descontadas deve recair sobre quem recebeu os valores – o banco corréu. Sustenta não ter ficado caracterizado a ocorrência do dano moral, devendo a sentença ser reformada. Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5027262-81.2019.4.03.6100 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: JOSE BATISTA DA SILVA Advogado do(a) APELADO: SALVADOR CORREIA FILHO - SP334707-A OUTROS PARTICIPANTES: INTERESSADO: BANCO BMG SA ADVOGADO do(a) INTERESSADO: FLAVIA ALMEIDA MOURA DI LATELLA - MG109730-A V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Primeiramente é necessário situar o problema posto nos autos no contexto de responsabilidade civil por danos, para o que se faz necessário lembrar que os bens e direitos de pessoas físicas ou jurídicas (Súmula 227 do E.STJ), assim como de universalidades e entes despersonalizados, abrangem itens de diversas naturezas e conteúdos, os quais, em linhas gerais, podem ser divididos em materiais e morais. Nos termos do art. 5º, X, da Constituição Federal, a proteção a esses bens e direitos tem atributos de garantia fundamental, de tal modo que o titular da prerrogativa indevidamente violada tem a faculdade de exigir o dever fundamental de reparação apropriada em face do responsável, sendo certa a possibilidade de cumulação da reparação da lesão material com o dano moral. O objeto do dano material correspondente à lesão sofrida em bens tangíveis, intangíveis, móveis, imóveis, fungíveis e infungíveis, de modo que o ressarcimento é mensurado, em moeda, pela extensão do prejuízo (normalmente aferido pelo preço de mercado dos bens e direitos afetados), com o objetivo de recompor a perda sofrida. Já o objeto do dano moral (ou extrapatrimonial) diz respeito à lesão no âmbito da integridade psíquica, da intimidade, da privacidade, da imagem ou da personalidade (p. ex., dor, honra, tranquilidade, afetividade, solidariedade, prestígio, boa reputação e crenças religiosas), causada por um ato ou fato ou por seus desdobramentos, de modo que sua extensão é a proporção do injusto sofrimento, aborrecimento ou constrangimento; embora a lesão moral possa ser reparada por diversos meios (p. ex., nos moldes do art. 5º, V, da Constituição), a indenização financeira tem sido utilizada com o objetivo dúplice de repor o dano sofrido e de submeter (ordinária e sistematicamente) o responsável aos deveres fundamentais do Estado de Direito. Ao mesmo tempo em que os sujeitos de direito são dotados de liberdade de escolha, todos devem responder por seus atos ou omissões quando violarem limites determinados pelo ordenamento jurídico, gerando responsabilidades de diversas espécies (dentre elas as criminais). Para o que importa a este feito, a atribuição da responsabilidade civil pode ser imputada a todo aquele que causar lesão, por fato ou ato praticado (in committendo), por omissão (in ommittendo), por pessoa que o representante (in vigilando), por empregado, funcionário ou mandatário (in eligendo) e por coisa inanimada ou por animal (in custodiendo). É pela correta delimitação jurídica da responsabilidade civil que se torna possível estabelecer os parâmetros para avaliação do caso sub judice, motivo pelo qual é necessário também consignar que, quanto ao fato gerador, há a responsabilidade contratual (relacionada a negócio jurídico não cumprido, no todo ou em parte, nos termos do art. 389 e seguintes do Código Civil) e responsabilidade extracontratual ou aquiliana (casos de violação à lei e a primados de Direito, independentemente de negócio jurídico, conforme art. 186 e seguintes, também do Código Civil); acerca do fundamento, há a responsabilidade subjetiva (baseada em culpa) e a responsabilidade objetiva (baseada no risco, não exigindo culpa); e, considerando o agente, há a responsabilidade direta ou simples (se oriunda de ato da própria pessoa imputada) e responsabilidade indireta ou complexa (resultante de ato ou fato de terceiro, animal ou coisa inanimada vinculada ao imputado). Friso que a culpa ou o dolo podem aparecer como causa da lesão, mas não são imprescindíveis para atribuição de responsabilidade civil (embora tenham utilidade no caso de fixação de reparação). Nessa linha, não se deve confundir a teoria objetiva da culpa (formulada em contraposição à teoria da culpa subjetiva), com a teoria da responsabilidade objetiva (ou teoria do risco ou da culpa presumida). Para a teoria da culpa objetiva, a culpa é apreciada in abstracto, nos moldes das pessoas comuns, sem considerar as condições subjetivas do agente ou seu estado de consciência (vale dizer, afastando elementos pessoais ou íntimos do agente causador do ato danoso), o que, por consequência, permite responsabilizar incapazes e dementes; já a teoria da culpa subjetiva se serve de abstrações, porém, em menor grau, pois verifica a intenção íntima e pessoal do agente para conferir a responsabilidade civil e o dever de reparar o injusto dano causado a outrem, vale dizer, culpa in concreto. Por sua vez, a teoria da responsabilidade objetiva (ou teoria do risco ou culpa presumida) vê o dever de reparar independentemente de dolo ou culpa do causador da lesão (excluída apenas se o prejuízo for exclusivamente gerado por ato ou omissão do lesado), opondo-se à responsabilidade subjetiva (baseada no elemento subjetivo de culpabilidade do causador do dano, observando também o nexo causal entre a conduta do agente e o dano a ser ressarcido). A responsabilidade objetiva gera o dever de indenizar por parte daquele que interagiu (direta ou indiretamente) com o lesado, ou com o meio no qual está inserido, e se baseia na injustiça do dano por circunstância que não pode ser imputada ao titular do bem ou direito prejudicado; por não depender de dolo ou culpa, a responsabilidade civil decorre do risco gerado por determinada atividade, bastando o ato ou fato, o dano e a relação de causalidade ente ambos. O autor ajuizou a presente ação em face do Banco BMG S.A., e Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, com pedido de tutela antecipada, objetivando a declaração de inexistência de relação jurídica com o Banco BMG concernente aos empréstimos consignados, pleiteando a condenação dos réus ao pagamento de danos materiais em dobro, no montante de R$ 2.206,30 (dois mil, duzentos e seis reais e trinta centavos), acrescentando-se as parcelas descontadas posteriormente, bem como danos morais, no importe de 70 (setenta) vezes o salário mínimo (R$ 69.860,00). Alegou estar sofrendo descontos em seu benefício previdenciário, os quais não reconhece a origem ou como devidos, salientando nunca ter firmado qualquer documento com a instituição financeira ré que pudesse originá-los. Aduz ter comparecido ao INSS por duas vezes, onde foi informado que seu benefício foi bloqueado para a inserção de novos descontos, mas que os descontos já cadastrados não seriam cessados, nem os valores correspondentes devolvidos. Instruiu a inicial com documentos, dos quais destaco a cópia do Boletim de Ocorrência lavrado no 10º D.P. Penha de Franca, no dia 07/11/2018, noticiando o recebimento de um cartão de crédito consignado do Banco BMG e informando a ocorrência de descontos consignados no seu benefício previdenciário; foto do cartão de crédito expedido em seu nome, preso à correspondência em que foi enviado; “Histórico de Créditos” do seu benefício previdenciário, com competência inicial em 09/2018 e final em 12/2019, demonstrando os empréstimos consignados; “Extratos de Empréstimos Consignados”, extraído em 24/01/2019 e o comprovante de alteração/revalidação da senha do INSS, datado de 31/10/2019. Foram deferidos os benefícios da justiça gratuita e o pedido de tutela de urgência, determinando-se a suspensão dos descontos mensais que favoreçam o corréu Banco BMG. Ora, de acordo com a jurisprudência pacífica a respeito do tema, em se tratando de empréstimo consignado obtido fraudulentamente junto à instituição financeira, o INSS está legitimado a figurar no polo passivo de ações indenizatórias. Confira-se: EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. FRAUDE. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PEDIDOS DE CONDENAÇÃO EM DANO MORAL E MATERIAL. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO PROVIDO. 1- Trata-se de agravo de instrumento interposto em face da r. decisão que, em sede de ação pelo rito comum, excluiu o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS do polo passivo da lide, remetendo os autos à Justiça Estadual. 2- Na presente demanda, questiona-se a legitimidade passiva do INSS em ação na qual se discute a existência de fraude em empréstimo consignado, bem como a consequente indenização por danos morais e materiais oriundos de descontos indevidos em benefício previdenciário. 3- De acordo com a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, é pacífico o entendimento de que o INSS é parte legítima nas causas que versem sobre descontos indevidos em benefício previdenciário oriundos de empréstimo consignado fraudulento. Precedentes. 4- Agravo de instrumento a que se dá provimento. (TRF3, AI nº 5022047-62.2017.4.03.0000, 1ª Turma, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. 23.10.2019, e-DJF3 29.10.2019) DIREITO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANFERÊNCIA FRAUDULENTA DE CONTA DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO E DESCONTOS INDEVIDOS DECORRENTES DE EMPRÉSTIMOCONSIGNADO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS E RESPONSABILIDADE DA AUTARQUIA E DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA PELOS PREJUÍZOS EXPERIMENTADOS PELO AUTOR. DANO MORAL CONFIGURADO E ADEQUADAMENTE AQUILATADO PELO JUIZ A QUO. IMPOSSIBILIDADE DE MAJORAÇÃO. APELAÇÕES IMPROVIDAS, COM IMPOSIÇÃO DE HONRÁRIOS RECURSAIS AO INSS. 1. Se e a autarquia previdenciária efetuou indevidamente os descontos no benefício previdenciário do autor, não procedendo com a diligência necessária e esperada para a concessão de empréstimo consignado para aposentados, é parte legítima para figurar no polo passivo da presente demanda. Precedentes dessa Corte: TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1803946 - 0020174-92.2010.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA, julgado em 16/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/09/2017; TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1520826 - 0022996-94.2010.4.03.9999, Rel. JUIZ CONVOCADO SILVA NETO, julgado em 16/08/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2017. (...) (TRF3, ApCiv nº 5000174-67.2018.4.03.6144, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Johonsom di Salvo, j. 20.09.2019, e-DJF3 24.09.2019) Anote-se que a Lei nº 10.820/2003, com as alterações introduzidas pelas Leis nºs 10.953/04 e 13.172/2015, bem como pela Medida Provisória nº 922, de 2020, dispõe as seguintes providências para o empréstimo consignado: Art. 6º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1o e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS. § 1º Para os fins do caput, fica o INSS autorizado a dispor, em ato próprio, sobre: I - as formalidades para habilitação das instituições e sociedades referidas no art. 1º; II - os benefícios elegíveis, em função de sua natureza e forma de pagamento; III - as rotinas a serem observadas para a prestação aos titulares de benefícios em manutenção e às instituições consignatárias das informações necessárias à consecução do disposto nesta Lei; IV - os prazos para o início dos descontos autorizados e para o repasse das prestações às instituições consignatárias; V - os encargos a serem cobrados para remuneração dos serviços de operacionalização das consignações, inclusive o ressarcimento dos custos operacionais; VI - as demais normas que se fizerem necessárias. § 2º Em qualquer circunstância, a responsabilidade do INSS em relação às operações referidas no caput deste artigo restringe-se à: I - retenção dos valores autorizados pelo beneficiário e repasse à instituição consignatária nas operações de desconto, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado; e II - manutenção dos pagamentos do titular do benefício na mesma instituição financeira enquanto houver saldo devedor nas operações em que for autorizada a retenção, não cabendo à autarquia responsabilidade solidária pelos débitos contratados pelo segurado.” A Turma Nacional de Uniformização, do Conselho da Justiça Federal, ao decidir o pedido de uniformização de interpretação de lei nº 0500796-67.2017.4.05.8307/PE, entendeu ser necessária a distinção, para a aferição de culpa do INSS, a respeito da instituição financeira em que o titular recebe o seu benefício. Isso porque, nos termos do § 2º supratranscrito, “havendo distinção entre as instituições financeiras, cabe ao INSS fazer a retenção da quantia devida para posterior repasse ao credor do mútuo (inciso I), ao passo que a autarquia é apenas responsável pela manutenção do pagamento do benefício se houver coincidência entre o credor do mútuo e o banco que faz a entrega do valor do benefício ao seu titular (inciso II)”. Resultou a tese de que “o INSS pode ser civilmente responsabilizado por danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, caso demonstrada negligência, por omissão injustificada no desempenho do dever de fiscalização, se os empréstimos consignados forem concedidos, de forma fraudulenta, por instituições financeiras distintas daquelas responsáveis pelo pagamento dos benefícios previdenciários. A responsabilidade do INSS, nessa hipótese, é subsidiária em relação à responsabilidade civil da instituição financeira” – julgada dia 12/09/2018. A tese firmada tem como precedente a orientação do Superior Tribunal de Justiça firmada no julgamento do AgRg no REsp 1445011/RS: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NÃO AUTORIZADO. INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE E RESPONSABILIDADE DO INSS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, nos termos do art. 6º da Lei 10.820/2003, nas hipóteses em que o empréstimo não tenha sido realizado no mesmo banco em que o aposentado recebe o benefício, cabe ao INSS reter os valores autorizados por ele e repassar à instituição financeira credora. Dessa forma, é de sua responsabilidade verificar se houve a efetiva autorização. Reconhecida, assim, a legitimidade da autarquia para responder os termos da demanda. 2. Consignado pela Corte local que foi autorizado o desconto indevido de valores sobre a aposentadoria do segurado, sem a sua necessária autorização, o que resultou em dano para o autor, fica caracterizada a responsabilidade civil, no caso. A revisão desse entendimento demanda reexame do contexto fático-probatório, o que é inviável no Superior Tribunal de Justiça, ante o óbice da Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja Recurso Especial." 3. Precedentes: AgRg no REsp 1335598/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 24.9.2015; AgRg no REsp 1272441/AL, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 02.6.2015; AgRg no AgRg no REsp 1370441/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 13/05/2015; AREsp 484.968/SE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 20.5.2014; AgRg no REsp 1.369.669/PR, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 12.9.2013; REsp 1.213.288/SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 1º.7.2013; AgRg no REsp 1.363.502/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 2.5.2013. 4. Agravo Regimental não provido.” (STJ, AgRg no REsp 1445011/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 10.11.2016, DJe 30.11.2016) Nos presentes autos, tanto a fraude quanto à responsabilidade do Banco BMG restaram incontroversas. Quanto ao INSS, tendo em vista que ele opera o desconto nos valores do benefício dos segurados, sua conduta constitui elemento indispensável (nexo de causalidade) para a ocorrência do dano. Ao assumir tal papel, deve o INSS adotar as providências necessárias para constatar se de fato o segurado autorizou a ocorrência de descontos em seu benefício. Em decorrência disso, deve ser responsabilizado por eventuais danos causados por transações irregulares. Nesse sentido: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTO DAS PARCELAS NOS PROVENTOS DA PENSÃO POR MORTE DA AUTORA. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA. AUTORIZAÇÃO EXIGIDA. LEI 10.820/2003. OMISSÃO DA AUTARQUIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. RECURSOS IMPROVIDOS. 1. Apesar de alegar a legalidade dos descontos efetuados, a instituição financeira não apresentou qualquer prova, não havendo nos autos qualquer documento assinado pela autora que autorizasse o Banco Cruzeiro do Sul ou o INSS a efetuarem descontos no benefício em questão. 2. O desconto dos proventos deve ser precedido da comprovação de contrato escrito entre segurado e instituição financeira, cabendo ao ente público verificar acerca da efetiva existência do empréstimo consignado, agindo com diligência, em face da natureza alimentar do benefício previdenciário, que sofre o desconto bancário, sob pena de ofensa aos princípios da eficiência e razoabilidade, em conformidade com os artigos 37, CF, e 927, CC, sendo devida a indenização por força até do princípio da solidariedade social por dano injusto, inerente ao risco natural da atividade previdenciária. 3. Havendo causalidade a envolver o INSS o fato de terceiro ter propiciado ou colaborado para a eclosão do dano não prejudica ou condiciona o exame da responsabilidade específica do ente previdenciário em relação a seu segurado. 4. Embora não seja o INSS responsável solidário pelo pagamento do empréstimo contratado em si (responsabilidade contratual), a responsabilidade da autarquia pela retenção e repasse de valores dos proventos do segurado, para o pagamento de tais dívidas às instituições financeiras, envolve, por evidente, a de conferência da regularidade da operação, objetivando evitar fraudes, até porque é atribuição legal da autarquia, não apenas executar as rotinas próprias, mas ainda instituir as normas de operacionalidade e funcionalidade do sistema, conforme previsto nos incisos do § 1º do artigo 6º da Lei 10.820/2003, sendo que eventual falha ou falta do serviço pode gerar responsabilidade extracontratual por danos causados. 5. Estando legalmente previstas as suas atribuições, o fato de o INSS não se desincumbir, adequadamente, de suas responsabilidades, ao simplesmente reter e repassar valores informados pelo DATAPREV, sem a cautela no sentido de conferir, com rigor, os dados do segurado e da operação, para evitar situações de fraude, não o exime de responder pelos danos decorrentes da lesão praticada contra o segurado. 6. O dano moral restou igualmente configurado, diante da prova, de que a retenção e o desconto de parcela do benefício previdenciário não geraram mero desconforto ou aborrecimento, mas concreta lesão moral, com perturbação grave de ordem emocional, tratando-se, ademais, de segurada de baixa renda, que se viu envolvida em situação preocupante, geradora de privação patrimonial imediata, criada pela conduta dos réus. 7. Nos limites da devolução, deve ser mantida, nos termos da sentença apelada, a condenação do Banco Cruzeiro do Sul e INSS ao pagamento de danos materiais e morais, o que não acarreta enriquecimento sem causa e se revela razoável e proporcional, para fins de censura da conduta dos réus e reparação do dano sofrido pela autora, observadas, ainda, a situação econômico-financeira dos ofensores e ofendida, bem como demais circunstâncias do caso concreto. 8. Apelações improvidas. (TRF3, Processo nº 0002114-61.2012.4.03.6113, 3ª Turma, Rel. Juíza Federal Convocada Denise Avelar, j. 24.01.2018, e-DJF3 02.02.2018) ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. FRAUDE EM EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DANOS MORAIS E MATERIAIS. CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. SÚMULA VINCULANTE N. 10. APELAÇÕES DESPROVIDAS. 1. O autor pleiteia declaração de inexistência de débito c/c indenização por danos morais e materiais, em decorrência da contratação de empréstimo consignado sem sua anuência e de descontos indevidos em seu benefício previdenciário. 2. Comparando os documentos acostados aos autos, constata-se, com clareza, que não foi o autor quem contratou o empréstimo, visto que não apenas as fotografias do RG são diferentes, como também as assinaturas, a filiação e o local de nascimento. 3. É evidente que o Banco BMG S.A, no procedimento da contratação do empréstimo, não agiu com a cautela necessária no sentido de verificar a identidade da parte contratante, pois, ainda que a pessoa tenha se apresentado como sendo o autor, mostrando, inclusive, documentos pessoais, o banco réu deixou de checar a veracidade das informações junto a outras repartições públicas. 4. Uma vez comprovado que o contrato em questão foi realizado de modo fraudulento, deve ser este anulado e, em consequência, restituído ao autor o valor descontado indevidamente do benefício previdenciário a título de empréstimo consignado, acrescido de juros de mora e correção monetária. 5. A reparação por danos materiais deverá ser suportada integral e exclusivamente pelo Banco BMG S.A, haja vista ser o destinatário final das quantias descontadas pela autarquia previdenciária. Por outro lado, em relação aos danos morais, todos os réus devem responder pelo resultado danoso. 6. A responsabilidade da CEF decorre do fato de não ter procedido com o zelo necessário na atividade da prestação do serviço bancário, porquanto a análise de todos os documentos apresentados pelo consumidor para abertura de conta é atribuição da instituição financeira, até mesmo para evitar a ocorrência de fraude. 7. Ademais, a súmula nº 479 do Superior Tribunal de Justiça possui a seguinte redação: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 8. Por sua vez, em relação ao INSS, o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal dispõe sobre a responsabilidade objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos, caracterizada pela presença dos seguintes requisitos: conduta lesiva, dano e nexo de causalidade, os quais estão presentes na hipótese dos autos. 9. A responsabilidade da autarquia pela retenção e repasse de valores dos proventos do segurado, bem como para o pagamento de tais dívidas às instituições financeiras, envolve a de conferência da regularidade da operação, objetivando evitar fraudes, uma vez ser atribuição legal da autarquia não apenas executar as rotinas próprias, mas também instituir as normas de operacionalidade e funcionalidade do sistema, conforme previsto nos incisos do § 1º do artigo 6º da Lei 10.820/2003. 10. A propósito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que não há que se exigir reserva de plenário para a mera interpretação e aplicação das normas jurídicas que emerge do próprio exercício da jurisdição, sendo necessário para caracterizar violação à Súmula Vinculante nº 10 que a decisão de órgão fracionário fundamente-se na incompatibilidade entre a norma legal e a Constituição Federal, o que não se verificou no caso concreto. 11. O dano moral restou configurado diante da prova de que a retenção e o desconto de parcelas do benefício previdenciário não geraram mero desconforto ou aborrecimento, mas concreta lesão moral, com perturbação grave de ordem emocional, pois o autor se viu envolvido em situação preocupante, geradora de privação patrimonial imediata, criada pelas condutas dos réus, devendo ser mantido o quantum indenizatório fixado na r. sentença. 12. O fato de terceiro ter propiciado ou colaborado para a eclosão do dano é questão a ser discutida em ação própria a fim de não prejudicar o exame da responsabilidade específica dos réus em relação à vítima da fraud. 13. Precedentes. 14. Sentença mantida. 15. Apelações desprovidas.” (TRF3, Processo nº 0006410-24.2010.4.03.6105, 3ª Turma, Rel. Des. Federal Nelton dos Santos, j. 02.05.2018, e-DJF3 09.05.2018) O autor sofreu desconto indevido em seu benefício previdenciário, sua principal fonte de renda, devido à falta de cuidado das rés, o que lhe acarretou privação de recursos necessários à subsistência e lesão à dignidade moral. Além disso, mediante incursões nos órgãos administrativos o autor não conseguiu resolver a situação, sendo obrigados a acionar o Poder Judiciário para só então ver cessados os descontos no seu benefício. Tudo isso, somado, configura indubitável abalo psíquico, que deve ser imputado às falhas praticadas pelo banco (que autorizou o empréstimo) e ao INSS (que autorizou o desconto no benefício). Confira-se: DIREITO PRIVADO. INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DANO MORAL PRESUMIDO. - Legitimidade passiva do INSS para integrar demanda relativa a reparação de danos decorrente de descontos, em benefício previdenciário, de empréstimo consignado. Precedente. - Hipótese de celebração de contrato de empréstimo consignado com ente bancário, caso em que o artigo 6º, § 2º, da Lei nº 10.820/2003 estabelece a responsabilidade do INSS em relação à retenção e repasse dos valores à instituição consignatária. - Desnecessária a prova do dano moral, que é presumido e decorre do próprio fato. Precedentes. - Recurso desprovido. (TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2059293 - 0006049-92.2010.4.03.6109, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR, julgado em 16/07/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:25/07/2019) ADMINISTRATIVO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. DANOS MORAIS. MAJORAÇÃO. SUCUMBÊNCIA. 1. O INSS possui legitimidade passiva em relação à contratação de empréstimo consignado por beneficiário junto a instituição financeira ainda que não seja intermediário, pois é sua a responsabilidade no que se refere à verificação de efetiva existência de autorização. Precedentes. 2. Indenização por dano moral majorada a R$10.000,00 cabendo a cada um dos réus o pagamento de R$5.000,00. 3. Invertida a sucumbência em relação ao INSS, de rigor sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em R$1.000,00. 4. Apelo provido.” (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1998581 - 0002988-27.2013.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO SARAIVA, julgado em 06/06/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/07/2018 ) Por fim, a indenização financeira por dano moral deve traduzir montante que sirva para a reparação da lesão (considerada a intensidade para o ofendido e a eventual caracterização de dolo ou grau da culpa do responsável) e também ônus ao responsável para submetê-lo aos deveres fundamentais do Estado de Direito, incluindo o desestímulo de condutas lesivas ao consumidor, devendo ser ponderada para não ensejar enriquecimento sem causa do lesado, mas também para não ser insignificante ou excessiva para o infrator. Esse dúplice escopo deve ser aferido por comedida avaliação judicial à luz do caso concreto, dialogando ainda com diversas outras matérias que reclamam indenização por dano moral, denotando coerência interdisciplinar na apreciação do magistrado.de acordo com a jurisprudência pátria, o valor dos danos morais deve guardar dupla função: ressarcir a parte lesada e desestimular o agente lesivo à prática de novos atos ilícitos. Dessa forma, não pode ser ínfimo, nem de tal forma elevado a implicar enriquecimento sem causa à parte lesada. Assim, considerando as circunstâncias do caso concreto, a partir dos parâmetros de arbitramento adotados pela jurisprudência desta E. Segunda Turma em casos análogos, tem-se que o quantum fixado para a indenização deve ser mantido. Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 20% o montante da verba honorária fixada a cargo do INSS em primeiro grau de jurisdição, respeitados os limites máximos previstos nesse mesmo preceito legal, e observada a publicação da decisão recorrida a partir de 18/03/2016, inclusive (E.STJ, Agravo Interno nos Embargos de Divergência 1.539.725/DF, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 2ª seção, DJe de 19/10/2017). Por essas razões, nego provimento ao apelo do INSS. É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. FRAUDE. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E DO INSS – DANOS MATERIAIS E MORAIS COMPROVADOS.
- De acordo com a jurisprudência pacífica, em se tratando de empréstimo consignado obtido fraudulentamente junto a instituição financeira, o INSS está legitimado a figurar no polo passivo de ações indenizatórias.
- Nos presentes autos, tanto a fraude quanto à responsabilidade do Banco BMG restaram incontroversas. Quanto ao INSS, tendo em vista que ele opera o desconto nos valores do benefício dos segurados, sua conduta constitui elemento indispensável [nexo de causalidade] para a ocorrência do dano. Ao assumir tal papel, deve o lNSS adotar as providências necessárias para constatar se de fato o segurado autorizou a ocorrência de descontos em seu benefício. Em decorrência disso, deve ser responsabilizado por eventuais danos causados por transações irregulares.
- O autor sofreu desconto indevido em seu benefício previdenciário, sua principal fonte de renda, devido à falta de cuidado das rés, o que lhe acarretou privação de recursos necessários à subsistência e lesão à dignidade moral. Além disso, mediante incursões nos órgãos administrativos os autores não conseguiram resolver a situação, sendo obrigados a acionar o Poder Judiciário para só então ver cessados os descontos de seus benefícios. Tudo isso, somado, configura indubitável abalo psíquico, que deve ser imputado às falhas praticadas pelo banco (que autorizou o empréstimo) e ao INSS (que autorizou o desconto no benefício).
-Quanto à indenização por danos morais, tenho que essa deve traduzir em montante que represente advertência ao lesante e à sociedade e, ainda, deve levar em consideração a intensidade do sofrimento do ofendido, a intensidade do dolo ou grau da culpa do responsável, a situação econômica deste e também da vítima, de modo a não ensejar um enriquecimento sem causa do ofendido. O valor da condenação imposta às rés deve cumprir esse dúplice escopo, ou seja, ressarcir a vítima do dano moral sofrido e desestimular práticas correlatas; afastando a comissão de condutas análogas; não podendo, pois, tornar baixos os custos e riscos sociais da infração.
- Considerando as circunstâncias do caso concreto, a partir dos parâmetros de arbitramento adotados pela jurisprudência desta E. Segunda Turma em casos análogos, tem-se que o quantum fixado para a indenização deve ser mantido (R$ 5.000,00)
- Quanto aos danos materiais, esses devem ser suportados por ambas os réus, em partes iguais.
- Apelo improvido.