Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5026058-71.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NELSON EVANGELISTA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO - SP119377-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5026058-71.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NELSON EVANGELISTA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO - SP119377-A

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Cuida-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em face de sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria por invalidez, desde a cessação administrativa do benefício assistencial em 1/10/2013, discriminados os consectários legais.

Decisão não submetida ao reexame necessário. 

Nas razões de recurso alega, preliminarmente, cerceamento de defesa e requer seja anulada a sentença para a produção de novas provas. No mérito, sustenta a ausência dos requisitos legais para a concessão do benefício, a impor a reforma integral do julgado. Subsidiariamente, impugna o termo inicial, os juros de mora e a correção monetária.

Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5026058-71.2021.4.03.9999

RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: NELSON EVANGELISTA DE OLIVEIRA

Advogado do(a) APELADO: CRISTIANE PARREIRA RENDA DE OLIVEIRA CARDOSO - SP119377-A

 

 

 

 

V O T O

 

 

Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus requisitos.

Quanto ao pedido de nulidade da sentença por cerceamento de defesa, a razão não assiste à autarquia.

De fato, é pacífico que a incapacidade laborativa somente pode ser atestada por prova documental e laudo pericial, nos termos do que preconiza o artigo 443, inciso III, do Código de Processo Civil (CPC).

Na hipótese, como prevê o artigo 370 do CPC, foi coletada a prova pericial, a fim de verificar a existência, ou não, de incapacidade laborativa.

O laudo pericial apresentado, elaborado pelo médico de confiança do Juízo, mencionou o histórico dos males relatados, descreveu os achados no exame clínico e nos registros complementares que lhe foram apresentados e respondeu aos quesitos formulados.

A mera irresignação da autarquia com a conclusão do perito ou a alegação de que o laudo é contraditório, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para realização de nova perícia, apresentação de quesitos complementares ou realização de diligências.

Desse modo, não se vislumbra ilegalidade na decisão recorrida, pois não houve óbice à formação do convencimento do MM. Juízo a quo por meio da perícia realizada, revelando-se desnecessária a sua complementação.

Discute-se nos autos o direito da parte autora a benefício por incapacidade.

A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da CF/1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor: 

“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:   I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada (...)”

Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.

A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.

O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo 59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128).

Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho.

São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).

O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil. Contudo, o juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos.

Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização são pertinentes a esse tema:

Súmula 33 da TNU: Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o termo inicial da concessão do benefício.

Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez.

Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social.

Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.

No caso dos autos, a perícia médica judicial, realizada no dia 3/10/2019, constatou a incapacidade total e permanente do autor (nascido em 1951) para atividades laborais, por ser portador de sequelas de fratura em ombro esquerdo, fêmur direito e fêmur esquerdo, decorrente de acidente automobilístico ocorrido em 1983.

Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial.

Contudo, o autor não faz jus ao benefício por um motivo bastante preciso.

É que ele havia mantido diversos vínculos empregatícios entre 10/1975 e 12/1986, consoante dados do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS. O mesmo cadastro revela o recebimento de benefício assistencial de prestação continuada de 15/5/2003 a 1/10/2013.

Assim, verifica-se que à época do requerimento administrativo em 20/9/2018 (Id. 151248555) e do ajuizamento da presente ação em 25/10/2018 o autor já não mais detinha a qualidade de segurado, por ter sido superado o "período de graça" previsto no art. 15 da Lei n. 8.213/1991.

Operou-se, portanto, a caducidade dos direitos inerentes à qualidade de segurado da parte autora, nos termos do disposto no art. 102 da Lei n. 8.213/1991.

Entendo, ainda, não ser possível retroagir a data de início da incapacidade para dezembro de 1983. Isso porque, após o alegado acidente automobilístico, o autor continuou a desempenhar suas atividades laborais por certo período.

Observo, ademais, que o autor somente pleiteou o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez em 2018, ou seja, trinta e cinco anos após o acidente.

O recebimento de benefício assistencial de prestação continuada decorrente de ação anterior confirma a ausência da qualidade de segurado do autor na data de início da incapacidade.

Dessa forma, é inviável a concessão dos benefícios pleiteados, em razão da perda da qualidade de segurado, ainda que constatada a incapacidade laboral do autor. 

Nesse sentido, cito o seguinte julgado:

"PREVIDENCIÁRIO - AGRAVO LEGAL - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ - AUXÍLIO DOENÇA - PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADA - OCORRÊNCIA - DOENÇA PRÉ-EXISTENTE I. Para concessão de aposentadoria por invalidez é necessário comprovar a condição de segurado, o cumprimento da carência, salvo quando dispensada, e a incapacidade total e permanente para o trabalho. O auxílio-doença tem os mesmos requisitos, ressalvando-se a incapacidade, que deve ser total e temporária. II. Considerando que as patologias diagnosticadas são de caráter crônico e degenerativo, restou evidenciado que, ao ingressar ao Regime Geral da Previdência Social, na qualidade de contribuinte facultativo, no período de 01/07/2003 a 06/2004, a autora já estava incapacitada. III. Considerando a data da incapacidade fixada nos autos (meados de 08/2008), e a última contribuição vertida pela autora (09/06/2004 - 06/2004), teria sido consumada a perda da qualidade de segurada, conforme disposto no art. 15, II, e §4°, da Lei 8.213/91, uma vez que também não houve o recolhimento das quatro contribuições necessárias, após tal perda, nos termos do art. 24, par. único, da LBPS. IV. Agravo legal improvido." (AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1056095 Processo: 0039855-64.2005.4.03.9999 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA. Data do Julgamento: 03/10/2011 Fonte: DJF3 CJ1. DATA: 17/10/2011 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)

"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL (ART.557, § 1º, DO CPC). APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO INDEVIDO. AGRAVADA MANTIDA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER. 1. O agravo previsto no art. 557, § 1º, do Código de Processo Civil tem o propósito de submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator, bem como a legalidade da decisão monocrática proferida, não se prestando à rediscussão de matéria já decidida. 2. Inexistente qualquer ilegalidade ou abuso de poder na decisão questionada que justifique a sua reforma. 3. Os elementos de prova coligidos nos autos não permitem afirmar que a agravante deixou de laborar e contribuir para previdência em razão de doença ou lesão, aspecto que importa em perda da condição de segurado, sendo indevido o benefício pleiteado. 4. Agravo legal desprovido." (APELREE - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1045936 Processo: 2005.03.99.031572-8 UF: SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento: 28/03/2011 Fonte: DJF3 CJ1 . DATA: 01/04/2011 PÁGINA: 1329 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA)

"PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA ARTS. 42, CAPUT E § 2º, 59 E 62 DA LEI 8.213/91. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO INDEVIDO. 1. Os elementos de prova coligidos nos autos não permitem afirmar que a parte-requerente deixou de laborar e contribuir para previdência em razão de doença ou lesão, aspecto que importa em perda da condição de segurado, sendo indevido o benefício pleiteado. 2. Agravo legal desprovido." (APELREE - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 988554 Processo: 2004.03.99.038961-6 UF:SP Órgão Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:21/06/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:29/07/2010 PÁGINA: 1001 Relator: JUIZ CONVOCADO CARLOS FRANCISCO)

Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre a mesma base de cálculo fixada na sentença, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.

Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação para julgar improcedente o pedido.

É o voto.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PREVIDENCIÁRIO. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR AFASTADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. BENEFÍCIOS INDEVIDOS. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. 

- A mera irresignação da autarquia com a conclusão do perito, sem o apontamento de nenhuma divergência técnica justificável, não constituem motivos aceitáveis para a apresentação de quesitos complementares ou novas diligências. 

- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social.

- Não faz jus à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença o segurado que não possui a qualidade de segurado, por ter sido superado o "período de graça" previsto no art. 15 da Lei n. 8.213/1991.

- Inversão da sucumbência. Condenação da parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo diploma processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.

- Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida. 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.