APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016629-53.2019.4.03.6183
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ CARLOS FRANCO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: CARLA DOS SANTOS TELES - SP404353-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016629-53.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUIZ CARLOS FRANCO DA SILVA Advogado do(a) APELADO: CARLA DOS SANTOS TELES - SP404353-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Cuida-se de apelação interposta em face da sentença, não submetida a reexame necessário, que julgou procedente o pedido de restabelecimento do auxílio-doença NB 31/617.753.925-8, desde a cessação administrativa e mantido pelo menos até 2/3/2021, discriminados os consectários legais e antecipados os efeitos da tutela. Nas razões recursais, a autarquia previdenciária impugna a impossibilidade de cessação automática do benefício. Requer a aplicação dos §§8º e 9º do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991 para que, caso não haja pedido de prorrogação por parte do segurado, seja possível a cessação do benefício na data fixada. Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5016629-53.2019.4.03.6183 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: LUIZ CARLOS FRANCO DA SILVA Advogado do(a) APELADO: CARLA DOS SANTOS TELES - SP404353-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Conheço da apelação, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade. Discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício por incapacidade à parte autora. A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor: “Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada (...)”. Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício. A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo 59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005, p. 128). Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o trabalho. São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social. Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n. 8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza, ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei). O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica, por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o juiz não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos autos. Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema: Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez. Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social. Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual. No caso dos autos, os requisitos para a concessão do auxílio-doença estão cumpridos e não foram impugnados nas razões da apelação. A perícia médica judicial constatou a incapacidade laboral total e temporária do autor (nascido em 1970, qualificado como impressor gráfico), em razão de perda da função renal. O perito fixou a data de início da incapacidade em 20/2/2017, data do início das sessões de hemodiálise, e apontou a necessidade de transplante renal, sugerindo reavaliação em 2/3/2021. Ele esclareceu: "(...) Após análise do quadro clínico do periciando devido à perícia feita observa-se que foi acometido pela insuficiência renal crônica e necessitou do transplante renal há 17 anos, todavia retornou ao tratamento com as sessões de hemodiálise desde 20/fev/2017, pois evoluiu com perda progressiva da função renal pela perda do enxerto transplantado pela rejeição, em vista disso acarreta uma limitação funcional e incapacidade total e temporária desde 20/fev/2017, pois caso consiga um novo transplante renal tal comprometimento pode ser debelado, por isso peço uma reavaliação em 02/mar/2021. Em relação à hipertensão arterial, menciono que está bem controlada com a medicação que vem fazendo uso regularmente sem causar nenhuma lesão nos órgãos alvos (cérebro, olhos, rins e coração) que geraria alguma incapacidade. A respeito do alegado comprometimento cardíaco relato que na perícia médica nenhuma anormalidade foi observada no exame clínico e ecocardiograma recente mostrou um acometimento leve, em vista disso não acarreta nenhuma limitação funcional nem incapacidade nas suas atividades laborativas habituais. Conclusão: Foi constatado que o periciando apresenta uma incapacidade total e temporária desde 20/fev/2017 e peço uma reavaliação em 02/mar/2021”. Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial. Contudo, os demais elementos de prova não autorizam convicção em sentido diverso. Com relação à duração do benefício, necessário fazer algumas considerações. Nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei n. 8.212/1991, o benefício de auxílio-doença tem caráter temporário, de modo que a autarquia previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do segurado. Ocorre que a legislação pátria promoveu importante inovação no benefício de auxílio-doença, especialmente quanto à fixação de data de cessação do benefício. A nova redação dada ao artigo 60, da Lei n. 8.213/1991, prevê a possibilidade de fixação de prazo estimado para a duração do benefício. O §8 do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991 determina que o juiz, ao conceder o auxílio-doença, deve, "sempre que possível", fixar o prazo estimado para a duração do benefício. Fixado o prazo, o benefício cessará na data prevista, salvo se o segurado requerer a prorrogação do auxílio-doença, hipótese em que o benefício deverá ser mantido até a realização de nova perícia. A norma estabelece, ainda, que, se não for fixado um prazo pelo juiz, o benefício cessará após o decurso do lapso de 120 (cento e vinte) dias, exceto se houver pedido administrativo de prorrogação (art. 60, § 9º, da Lei n. 8.213/1991). Confiram-se (destaquei): "Art. 60. O auxílio-doença será devido ao segurado empregado a contar do décimo sexto dia do afastamento da atividade, e, no caso dos demais segurados, a contar da data do início da incapacidade e enquanto ele permanecer incapaz. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99) (...) § 8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício. § 9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei. § 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei. § 11. O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício." Como se vê, a fixação de data de cessação do benefício possui, agora, amparo normativo expresso, de modo que a lei não apenas autoriza, mas impõe que o magistrado fixe, "sempre que possível", data para a alta programada. Por oportuno, convém destacar que a alta programada ora instituída por lei não impede a realização de perícia para se aferir a necessidade ou não de manutenção do auxílio-doença. Ela apenas impõe uma condição para que seja feita nova avaliação médica, qual seja, o requerimento de prorrogação do benefício. Trata-se de exigência razoável e que não ofende qualquer dispositivo constitucional, não restando configurada, portanto, nulidade. Além disso, o acréscimo do §10 ao artigo 60 de Lei n. 8.213/1991 veio reforçar o poder-dever que o INSS possui de, a qualquer momento, convocar o segurado em gozo de auxílio-doença para que seja avaliado se ainda permanece a incapacidade ensejadora do benefício. Nesse passo, considerado o disposto no §8º do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991 e tendo em vista que o prazo de reavaliação estimado na perícia já esgotou (em 2/3/2021), o auxílio-doença deverá ser cessado em cento e vinte dias, contados da data da publicação deste acórdão, salvo se a parte requerer sua prorrogação no INSS, hipótese em que o benefício deverá ser mantido até a realização de nova perícia, o que se resolverá na esfera administrativa. Nesse passo, considerado o disposto no §8º do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991 e, ainda, tendo em vista que o prazo de tratamento estimado na perícia já expirou (em 2/3/2021), o auxílio-doença deverá ser cessado em 120 (cento e vinte) dias, contados da data da publicação deste acórdão, ressalvada a possibilidade de a parte requerer prorrogação do benefício, o que se resolverá na esfera administrativa. Diante do exposto, dou parcial provimento à apelação da autarquia para, nos termos da fundamentação, fixar a data de cessação do auxílio-doença em 120 (cento e vinte) dias, contados da data da publicação deste acórdão, ressalvada a possibilidade de a parte requerer prorrogação do benefício, o que se resolverá na esfera administrativa. É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. DURAÇÃO DO BENEFÍCIO. DURAÇÃO DO BENEFÍCIO. ALTA PROGRAMADA. PREVISÃO LEGAL.
- Com a publicação das Medidas Provisórias n. 739, de 7/7/2016, e 767, de 6/1/2017 (convertida na Lei n. 13.457/2017), conferiu-se amparo normativo à denominada alta programada.
- O §8º do artigo 60 da Lei n. 8.213/1991 prevê a possibilidade de fixação de prazo estimado para a duração do auxílio-doença. A norma estabelece, ainda, que, se não for fixado um prazo pelo juiz, o benefício cessará após o decurso do lapso de 120 (cento e vinte) dias, exceto se houver pedido administrativo de prorrogação (artigo 60, § 9º, da Lei n. 8.213/1991).
- Fixação da data de cessação do benefício em 120 (cento e vinte) dias, contados da data da publicação deste acórdão, ressalvada a possibilidade de a parte requerer sua prorrogação, o que se resolverá na esfera administrativa.
- Apelação parcialmente provida.