Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001170-12.2019.4.03.6118

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: MARCELO D ELEUTERIO BARBOSA

Advogado do(a) APELANTE: TIAGO SOARES FONSECA - RJ217325-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001170-12.2019.4.03.6118

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: MARCELO D ELEUTERIO BARBOSA

Advogado do(a) APELANTE: TIAGO SOARES FONSECA - RJ217325-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

 

Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão da aposentadoria especial.

Na r. sentença, o dispositivo restou assim consignado:

“(...)

Ante o exposto, julgo EXTINTO o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inciso VI, do Código de Processo Civil. Defiro o benefício da assistência judiciária gratuita. Sem condenação em honorários. Custas na forma da lei. Transitada em julgado esta decisão, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe.

(...).”. (ID n. 140695688 - Pág. 1/3)

Foram opostos embargos de declaração, os quais foram rejeitados.

Inconformada, a parte autora apela sustentando que “(...) A exigência da sentença encontra-se em total discordância com o que já manifestado pelo STF, através do julgamento do RE 631.240/MG com repercussão geral (Tema 350 do STF), onde fixou a tese que o prévio requerimento administrativo é condicionado para o ajuizamento de ação judicial visando a concessão de benefício previdenciário.”, fazendo jus à aposentadoria vindicada.

É o relatório.

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001170-12.2019.4.03.6118

RELATOR: Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN

APELANTE: MARCELO D ELEUTERIO BARBOSA

Advogado do(a) APELANTE: TIAGO SOARES FONSECA - RJ217325-A

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

 

 

Inicialmente, tempestivo o recurso e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.

A Carta Magna de 1988, em seu art. 5º, XXXV, insculpe o princípio da universalidade da jurisdição, ao assegurar ao jurisdicionado a faculdade de postular em Juízo sem percorrer, previamente, a instância administrativa.

O extinto Tribunal Federal de Recursos, após reiteradas decisões sobre o tema, editou a Súmula nº 213, com o seguinte teor:

"O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza previdenciária."

Trilhando a mesma senda, esta Corte trouxe à lume a Súmula nº 09, que ora transcrevo:

"Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa, como condição de ajuizamento da ação."

Nota-se que a expressão exaurimento consubstancia-se no esgotamento de recursos por parte do segurado junto à Administração, o que significa que, ao postular a concessão ou revisão de seu benefício, o requerente não precisa se utilizar de todos os meios existentes na seara administrativa antes de recorrer ao Poder Judiciário. Porém, na ausência, sequer, de pedido administrativo, não resta aperfeiçoada a lide, vale dizer, inexiste pretensão resistida que justifique a tutela jurisdicional e, por consequência, o interesse de agir.

É bem verdade que, nos casos de requerimento de benefício previdenciário, a prática tem demonstrado que a Autarquia Previdenciária, por meio de seus agentes, por vezes, ao se negar a protocolizar os pedidos, sob o fundamento de ausência de direito ou de insuficiência de documentos, fere o direito de petição aos órgãos públicos (art. 5º, XXXIV, "a", CF e art. 105 da Lei 8.213/91). Mas, não é menos verdade que muitas vezes os pedidos são rapidamente analisados, cumprindo o INSS com o seu dever institucional.

Por isso, correto determinar a comprovação do prévio requerimento na via administrativa, pois incumbe ao INSS analisar, prima facie, os pleitos de natureza previdenciária, e não ao Poder Judiciário, o qual deve agir quando a pretensão do segurado for resistida ou na ausência de decisão por parte da Autarquia, legitimando o interessado ao exercício da actio.

Aceitar que o Juiz, investido na função estatal de dirimir conflitos, substitua o INSS em seu múnus administrativo, significa permitir seja violado o princípio constitucional da separação dos poderes, insculpido no art. 2º da Lex Major, pois, embora os mesmos sejam harmônicos, são, igualmente, independentes, devendo cada qual zelar por sua função típica que o ordenamento constitucional lhes outorgou.

Tanto isso é verdade que o próprio legislador, quando da edição da Lei nº 8.213/91, concedeu à autoridade administrativa, em seu art. 41, § 6º, o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para efetuar o pagamento da primeira renda mensal do benefício, após a apresentação da documentação necessária por parte do segurado. Na ausência de apreciação por parte da Autarquia ou se o pleito for indeferido, aí sim, surgirá o interesse de agir, condição necessária à propositura de ação judicial.

Entender de maneira diversa equivale, a um só tempo, em contribuir para a morosidade do Poder Judiciário, devido ao acúmulo de um sem-número de ações e prejudicar a vida do segurado que, tendo direito ao benefício, aguardará por anos a fio o deslinde final de sua causa, onerando, inclusive, os cofres do INSS com o pagamento de prestações atrasadas e respectivas verbas acessórias decorrentes de condenação judicial.

Por fim, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento de Recurso Extraordinário, sob regime de Repercussão Geral, pronunciou-se quanto à matéria, inclusive modulando os efeitos da decisão:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.

1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.

2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.

3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.

4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.

5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula

de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.

6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.

7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.

8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.

9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.

(R.E. 631.240/MG - Relator: Min. Luis Roberto Barroso - Data do Julgamento: 03/09/2014 - Data da Publicação: 10/11/2014).

DO CASO DOS AUTOS

A demanda foi ajuizada em julho de 2019, buscando o deferimento da aposentadoria especial e a parte autora não carreou o comprovante de indeferimento do seu requerimento administrativo realizado antes do ingresso da ação.

Conforme se depreende dos autos, através do protocolo de requerimento, o requerente ingressou, na esfera administrativa, com o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, constando que o atendimento presencial seria no dia 22/07/2014. (ID n. 140695575 - Pág. 15)

Não se pode olvidar que, na exordial há a informação de que a Autarquia Federal não analisou o pedido até a data do ajuizamento da demanda e que declarou não ter verificado no sistema qualquer requerimento de aposentadoria, seja pendente de análise, concedido ou indeferido.

Por seu turno, o magistrado considerou haver óbice ao prosseguimento da demanda devido à falta de requerimento administrativo recente.

Em que pese o entendimento esposado na r. sentença, este não deve prosperar, tendo em vista que houve o pedido administrativo datado de 22/07/2014, para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, que não fora analisado pelo INSS por mais de 05 (cinco) anos, não sendo crível que o segurado, a parte mais frágil na relação previdenciária, seja penalizado pela omissão da Autarquia Federal.

Diante destes fatos, merece reforma a r. sentença de primeiro grau, tendo em vista a comprovação de que a parte autora ingressou com pedido perante a Autarquia Federal, não se fazendo necessário novo requerimento ou, mesmo, a conclusão do processo administrativo.

Por outro lado, de acordo com o artigo 312 do Código de Processo Civil, “(...) Considera-se proposta a ação quando a petição inicial for protocolada, todavia, a propositura da ação só produz quanto ao réu os efeitos mencionados no art. 240 depois que for validamente citado.”.

Portanto, para a validade do processo é indispensável a citação do réu, que passa a integrar a relação processual (autor, réu e Estado-Juiz). 

Com a citação válida a relação processual se completa, sendo que o réu é instigado a se manifestar e integrar o polo passivo da lide, passando a exercer o seu direito de defesa.

Por seu turno, o artigo 334, caput, do Código de Processo Civil dispõe que:

"(...)Se a petição inicial preencher os requisitos essenciais e não for o caso de improcedência liminar do pedido, o juiz designará audiência de conciliação ou de mediação com antecedência mínima de 30(trinta) dias, devendo ser citado o réu com pelo menos 20(vinte) dias de antecedência.

Com efeito, o entendimento jurisprudencial é no sentido de que a ausência de citação acarreta a anulação do decisum:

PREVIDENCIARIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO DO INSS. SENTENÇA ANULADA. PRELIMINAR ACOLHIDA. MÉRITO DA APELAÇÃO DO AUTOR PREJUDICADO.

1. O INSS não foi citado e, ainda que o MM. Juiz tenha firmado sua convicção pela improcedência do pedido com base na prova material, esta não foi sujeita ao contraditório, em razão da ausência de citação do réu, prevista nos artigos 213 e 214 do Código de Processo Civil de 1973 (arts. 238 e 239 do CPC/2015).

2. Cabe ao Magistrado permitir que as partes, em igualdade de condições, possam apresentar as suas defesas, com as provas de que dispõem, em prol do direito de que se julgam titulares.

3. Não há como ser apreciado o mérito da demanda, pois a matéria não é exclusivamente de direito. Assim, face à ausência de citação da Autarquia, não é caso de se aplicar a teoria da causa madura.

4. Preliminar acolhida. Sentença anulada. Mérito da apelação prejudicado.

(TRF3a. Região – 0029786-55.2014.4.03.9999 – Ap. 2005411 – Sétima Turma – Data da decisão: 07/02/2018 – Data da publicação: 20/02/2018 – Des. Fed. Toru Yamamoto)

PREVIDENCIÁRIO. READEQUAÇÃO DA RENDA MENSAL AOS NOVOS TETOS FIXADOS PELAS EC 20/1998 E 41/2003. BENEFÍCIOS CONCEDIDOS ANTERIORMENTE À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. EXTINÇÃO DO FEITO POR FALTA DE INTERESSE DE AGIR. CARÊNCIA DE AÇÃO AFASTADA. RETORNO DOS AUTOS À VARA DE ORIGEM.

1. Afastada a hipótese de nulidade da sentença por negativa de prestação jurisdicional, ausência de fundamentação e cerceamento de defesa. Embora suscinta, a sentença encontra-se minimamente fundamentada e os documentos acostados aos autos são hábeis a autorizar o deslinde da questão. Preliminares rejeitadas.

2. Não subsiste a tese de falta de interesse de agir. O parecer da Contadoria Judicial limita-se a servir ao embasamento técnico no julgamento da lide pelo magistrado, o qual deverá elencar os argumentos de mérito que fundamentam a decisão, o que não se confunde com a condição da ação: interesse de agir, representada pelo binômio: adequação/necessidade.

3. Carência de ação por falta do interesse de agir afastada de ofício e, considerando a ausência de citação do INSS, devem os autos retornarem à Vara de origem para regular prosseguimento do feito.

4. Preliminares rejeitadas. Carência de ação afastada de ofício. Retorno dos autos à Vara de origem. Apelação prejudicada quanto ao mérito.  

(TRF3a. Região – 0002101-12.2013.4.03.6183 – Ap. Apelação Cível – 1952964 – Sétima Turma – Data da decisão: 24/09/2018 – Data da publicação: 03/10/2018 – Des. Fed. Paulo Domingues)

Nesse contexto, considerando-se a ausência da citação da Autarquia Federal, necessária se faz a anulação do decisum, com o retorno dos autos a vara de origem para o regular prosseguimento do feito, com a citação válida do réu.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte autora, para afastar a necessidade de prévio requerimento administrativo recente e, de ofício, anulo a r. sentença recorrida, determinando a remessa dos autos à Vara de origem, para seu regular processamento.

É o voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINAR. FALTA DE INTERESSE DE AGIR AFASTADA. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO. SENTENÇA ANULADA.

- A ação foi ajuizada em julho de 2019, pleiteando a concessão da aposentadoria especial.

- Verifica-se, através do protocolo de requerimento, que o requerente ingressou, na esfera administrativa, com o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, constando que o atendimento presencial seria no dia 22/07/2014.

- Na exordial há a informação de que a Autarquia Federal não analisou o pedido até a data do ajuizamento da demanda e que declarou não ter verificado no sistema qualquer requerimento de aposentadoria, seja pendente de análise, concedido ou indeferido.

- O entendimento esposado na r. sentença de primeiro grau não deve prosperar, tendo em vista que houve o pedido administrativo datado de 22/07/2014, para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, que não fora analisado pelo INSS por mais de 05 (cinco) anos, não sendo crível que o segurado, a parte mais frágil na relação previdenciária, seja penalizado pela omissão da Autarquia Federal.

- In casu, considerando-se a ausência da citação da Autarquia Federal, necessária se faz a anulação do decisum, com o retorno dos autos a vara de origem para o regular prosseguimento do feito, com a citação válida do réu.

- Apelação da parte autora parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para afastar a necessidade de prévio requerimento administrativo recente e, de ofício, anular a r. sentença recorrida, determinando a remessa dos autos à Vara de origem, para seu regular processamento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.