Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5239798-49.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: VERA LUCIA DE ALBUQUERQUE SANTOS

Advogados do(a) APELANTE: LAYS PEREIRA OLIVATO ROCHA - SP303756-N, IGOR MAUAD ROCHA - SP268069-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5239798-49.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: VERA LUCIA DE ALBUQUERQUE SANTOS

Advogados do(a) APELANTE: LAYS PEREIRA OLIVATO ROCHA - SP303756-N, IGOR MAUAD ROCHA - SP268069-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora): Cuida-se de ação interposta em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.

A r. sentença julgou improcedente o pedido e, em conseqüência, declarou extinto o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I , do Código de Processo Civil. Por força do princípio da sucumbência, a requerente foi condenada ao pagamento de custas e despesas processuais e honorários advocatícios em 10% da causa, valores cuja exigibilidade fica suspensa em razão do que dispõe a Lei nº 1.060/50.

Apela a parte autora requerendo, em síntese, a reforma da sentença com o provimento do recurso.

A parte autora sustenta, em síntese que: a) cumpriu todos os requisitos para obter o benefício requerido; b) não necessita demonstrar o recolhimento de contribuições sociais como trabalhador rural, basta demonstrar o cumprimento da carência; c) a súmula STJ 149 exige apenas início de prova material, que fez juntar aos autos; d) apresentou também prova testemunhal para corroborar; e) não há necessidade de provar o trabalho rural imediatamente após o cumprimento do requisito etário.

Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte Regional.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5239798-49.2020.4.03.9999

RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA

APELANTE: VERA LUCIA DE ALBUQUERQUE SANTOS

Advogados do(a) APELANTE: LAYS PEREIRA OLIVATO ROCHA - SP303756-N, IGOR MAUAD ROCHA - SP268069-N

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):

Da aposentadoria por idade rural

A aposentadoria por idade de rurícola é assegurada na forma do artigo 201, § 7º, inciso II, da Constituição da República de 1988, observando-se: “60 (sessenta) anos de idade, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, se mulher, para os trabalhadores rurais e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de 2019)”.

A Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que estabelece o Plano de Benefícios da Previdência Social (PBPS), disciplina em seus artigos 48 a 51as condições à aposentadoria por idade rural, alterados pelas Leis nºs 9.032, de 1995, 9.876, de 1999 e 11.718, de 2008.

São três os requisitos à aposentação por idade dos trabalhadores rurais: a idade, a carência e a prova da atividade rural.

1. O primeiro consiste na idade mínima de 60 (sessenta) anos, se homem, e 55 (cinquenta e cinco) anos, se mulher, conforme as regras insertas no artigo 11, incisos I, letra “a”; V, letra “g”; VI e VIII, c/c o artigo 48, §1º, todos da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.

2. O segundo requisito diz respeito à carência de 180 (cento e oitenta) meses de efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício. Não se cuida de recolhimento das contribuições indicadas na tabela progressiva, prevista no artigo 142 do PBPS, mas, isto sim, do tempo mínimo de atividade exercida no âmbito rural.

A regra foi expressamente prevista no artigo 143 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, com redação da Lei nº 11.718, de 2008: “Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício”.

2.a. A prorrogação sucessiva do prazo de quinze anos está atualmente fundada no artigo 3º, da Lei nº 11.718, de 20/06/2008, in verbis:

“Art. Na concessão de aposentadoria por idade do empregado rural, em valor equivalente ao salário mínimo, serão contados para efeito de carência:

I– até 31 de dezembro de 2010, a atividade comprovada na forma do art. 143 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991;

II – de janeiro de 2011 a dezembro de 2015, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 3 (três), limitado a 12 (doze) meses, dentro do respectivo ano civil; e

III – de janeiro de 2016 a dezembro de 2020, cada mês comprovado de emprego, multiplicado por 2 (dois), limitado a 12 (doze) meses dentro do respectivo ano civil.

Parágrafo único.  Aplica-se o disposto no caput deste artigo e respectivo inciso I ao trabalhador rural enquadrado na categoria de segurado contribuinte individual que comprovar a prestação de serviço de natureza rural, em caráter eventual, a 1 (uma) ou mais empresas, sem relação de emprego”.

De transição, imperioso aplicar-se a regra permanente estampada no art. 48 e parágrafos do mesmo diploma, na dicção da Lei nº 11.718/2008, fincada, nesse particular, a exigência de demonstração do exercício de labor rural por 180 meses-carência da aposentadoria por idade.

2.b. Anote-se que, quanto ao perfazimento dos requisitos, embora para a aposentadoria por idade urbana esteja assentada a jurisprudência no sentido da desnecessidade de preenchimento a um só tempo, de idade e carência, o mesmo não ocorre na esfera da aposentação por idade rural, para a qual é exigida a simultaneidade. Assim é imprescindível a comprovação do cumprimento conjunto das condições, especialmente da labuta no campo no período imediatamente anterior ao implemento da idade.

Esse entendimento foi cristalizado pela jurisprudência do Colendo Superior Tribunal da Justiça, na forma do precedente emanado do Tema 642:  "O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade".

Eis a ementa do acórdão paradigma tirado do julgamento do RESP nº 1.345.908/SP, sob a égide dos recursos repetitivos, in verbis:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL NO PERÍODO IMEDIATAMENTE ANTERIOR AO REQUERIMENTO. REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 143 DA LEI 8.213/1991. REQUISITOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS DE FORMA CONCOMITANTE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Tese delimitada em sede de representativo da controvérsia, sob a exegese do artigo 55, § 3º combinado com o artigo 143 da Lei 8.213/1991, no sentido de que o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Se, ao alcançar a faixa etária exigida no artigo 48, § 1º, da Lei 8.213/1991, o segurado especial deixar de exercer atividade rural, sem ter atendido a regra transitória da carência, não fará jus à aposentadoria por idade rural pelo descumprimento de um dos dois únicos critérios legalmente previstos para a aquisição do direito. Ressalvada a hipótese do direito adquirido em que o segurado especial preencheu ambos os requisitos de forma concomitante, mas não requereu o benefício.

2. Recurso especial do INSS conhecido e provido, invertendo-se o ônus da sucumbência. Observância do art. 543-C do Código de Processo Civil.

(REsp 1.354.908/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 09/09/2015, DJe 10/02/2016)

O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.

 

3. O terceiro requisito, diz respeito à comprovação da atividade rural realizada mediante início de prova material corroborada por prova testemunhal, observado o teor do § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, com redação da Lei nº 13.846, de 2019, assim dispõe, in verbis:

Art. 55. (...)

§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá efeito quando for baseada em início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, na forma prevista no regulamento.  (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)

3.a. A jurisprudência encontra-se pacificada segundo o verbete da súmula 149 do C. STJ, que estabelece: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, julgado em 07/12/1995, DJ 18/12/1995),

O precedente aplica-se também aos trabalhadores rurais denominados “boias-frias”, por força do entendimento assentado pela E. Primeira Seção do C. STJ no REsp nº 1.321.493/PR,Relator Ministro Herman Benjamin (j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012), sob os auspícios dos recursos repetitivos.

3.b. A comprovação da atividade rural será realizada mediante verificação dos registros de segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos 38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, bem assim mediante a apresentação dos documentos indicados no rol exemplificativo do artigo 106 do mesmo diploma legal, com redação da Lei 13.846, de 2019, conforme o entendimento firmado pelo E. STJ no julgamento do RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe03.08.2009.

3.c. Ademais, com fulcro na possibilidade de eficácia prospectiva e retrospectiva dos documentos, o reconhecimento de tempo de serviço rural vai além do período relativo ao início de prova material, quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado pelo C. STJ no julgamento do Recurso Especial nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014, segundo a sistemática dos repetitivos, viabilizando, assim, a extensão da eficácia dos documentos, pois, conforme consta da ementa, “não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo o período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie a sua eficácia probatória”.

3.d. Anote-se que a declaração de sindicato de trabalhadores rurais foi submetida a três disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em 14/06/1995, passou a ser necessária a homologação do INSS. A partir de 18/01/2019, com a edição da Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a referida declaração para fins de comprovação da atividade rural.

3.e. De outra parte, a natureza processual das normas do artigo 55, § 3°, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que disciplinam a matéria probatória da atividade rurícola, constituem óbice ao julgamento do mérito da lide quando não for apresentado início de prova material, pois conduzem à constatação de ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, na forma do artigo 485, IV, do CPC.

Esse entendimento foi cristalizado pelo C. STJ no julgamento do RESP nº 1.352.721/SP, sob o rito dos repetitivos, firmando-se a tese do tema 629: “A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa”. (Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Corte Especial, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).

Na senda, manifestou-se a E. Terceira Seção desta Colenda Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE.  ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA.

(...)

II - A r. decisão rescindenda reconheceu o direito da então autora ao benefício de aposentadoria rural por idade com base na existência de início de prova material, consistente na certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977), corroborado pelos depoimentos testemunhais.

III - Da análise dos documentos que compuseram os autos subjacentes, verifica-se que o cônjuge da então autora ostentava vários vínculos empregatícios de natureza urbana por tempo relevante (14.03.1978 a 31.03.1981; 01.04.1981 a 03.03.1983; 20.02.1987 a 11.1987 e 02.04.1990 a 10.10.1995), tendo sido contemplado, posteriormente, com o benefício de auxílio-doença a partir de 12.12.2001, convertido em aposentado por invalidez, na condição de comerciário/contribuinte individual, a contar de 13.09.2002.

IV - Considerando que a autora implementou o quesito etário somente em 2008 (nascida em 24.12.1953, completou 55 anos de idade em 24.12.2008), é de se concluir que a r. decisão rescindenda adotou interpretação não condizente com o art. 143 c/c o art. 55, §3º, ambos da Lei n. 8.213/91, na medida em que o documento reputado como início de prova material do labor rural (certidão de casamento) restou esmaecido ante a constatação de que o cônjuge exerceu, após o enlace matrimonial, atividades tipicamente urbanas, não bastando, portanto, a comprovação por prova exclusivamente testemunhal.

(...)

VI - A certidão de casamento em que o marido consta como lavrador (11.09.1977) não se presta como início de prova material do labor rural, tendo em vista o longo histórico de trabalho urbano empreendido por ele (extrato do CNIS).

VII - No que tange ao pedido de reconhecimento de atividade rural, é de se reconhecer que não foi apresentado documento indispensável ao ajuizamento da ação, ou seja, início de prova material no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário (24.12.2008), restando inócua a análise da prova testemunhal colhida em juízo.

VIII - Como o § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 versa sobre matéria probatória, é processual a natureza do aludido dispositivo legal, razão pela qual nos feitos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço a ausência nos autos do respectivo início de prova material constitui um impedimento para o desenvolvimento regular do processo, caracterizando-se, consequentemente, essa ausência, como um pressuposto processual, ou um suposto processual, como prefere denominar o sempre brilhante Professor Celso Neves. A finalidade do § 3º do art. 55 da Lei n. 8.213/91 e da Súmula 149 do E. STJ é evitar a averbação de tempo de serviço inexistente, resultante de procedimentos administrativos ou judiciais promovidos por pessoas que não exerceram atividade laborativa.

IX - A finalidade do legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC.

X - A interpretação teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a ausência nos autos de documento tido por início de prova material é causa de extinção do feito sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e 321 do atual CPC.

XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural.

XII - Cabe ressalvar que os valores recebidos por força de título judicial gerador do benefício de aposentadoria rural por idade (NB 41/150.848.253-2), que ora se rescinde, não se sujeitam à restituição, pois possuem natureza claramente alimentar, tendo como destinação o atendimento de necessidades básicas da ora ré. Importante salientar que a percepção do benefício em comento decorreu de decisão judicial, com trânsito em julgado, não se vislumbrando, no caso concreto, qualquer ardil ou manobra da parte autora na ação subjacente com o escopo de atingir tal desiderato, evidenciando-se, daí, a boa-fé, consagrada no art. 113 do Código Civil.

XIII - Em face da ocorrência de revelia, não há ônus de sucumbência a suportar.

XIV - Ação rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão.

(TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 10396 - 0008699-33.2015.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal SERGIO NASCIMENTO, j.09/06/2016, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016 ).

Postas as balizas, passa-se ao exame do caso dos autos.

DO CASO CONCRETO

A parte autora nascida em 06/05/1957, cumpriu o requisito etário em 06/05/2012, quando completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade.

Quanto à comprovação da carência, não apresentou início de prova material que comprovasse o efetivo exercício em atividade rural por tempo suficiente e imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data do implemento da idade mínima. Vejamos.

Sustenta a parte autora na exordial que “(...) no ano de 1969, aos 12 anos de idade, a requerente começou a laborar no meio rural. Ela morava e trabalhava no “Sítio/Povoado Campo Grande”, no município de “Águas Belas”, estado de Pernambuco, propriedade cujo seu pai e o seu ex-marido eram rendeiros. A atividade era plantação de milho e feijão. A requerente permaneceu nesta propriedade até no ano de 2010, quando veio morar no estado de São Paulo. Para comprovar o seu labor durante todos esses anos, a requerente junta nos autos “CARTEIRINHA DO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS DE ÁGUAS BELAS – PE”, na qual está qualificada como “TRABALHADORA RURAL”, com residência no “Povoado Campo Grande” e data da expedição em “30 de outubro de 2006”. Consta ainda nos autos documentos emitidos pela “SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE – PREFEITURA DE ÁGUAS BELAS”, tais como “DECLARAÇÕES”, “FICHA GERAL DE AMBULATÓRIO” E “PRONTUÁRIO DO PACIENTE”, os quais a qualificam como “AGRICULTORA”, com residência no “Povoado Campo Grande” e também pela “SECRETARIA DE EDUCAÇÃO - GOVERNO DE PERNAMBUCO”, “DECLARAÇÃO E REQUERIMENTO DE MATRÍCULA” do filho da requerente “FLÁVIO TENÓRIO CAVALCANTE” e que a qualifica como “AGRICULTORA CAMPO” e com domicílio no “Campo Grande, Águas Belas-PE”. Por fim, “DECLARAÇÃO DO ITR” do “Sítio Campo Grande”, local que a requerente residia e trabalhava, também anexa.

Alega ter preenchido os requisitos mínimos exigidos em lei para a concessão do benefício ora pleiteado.

Nesse sentido, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos:

1)- CTPS própria constando apenas a qualificação civil;

2)- carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Águas Belas/PE, datada de 30/10/2006, com anotações até o ano de 2009, indicando a qualificação profissional da autora como trabalhadora rural, e estado civil divorciada;

3)- documentos de unidades de saúde e de educação, em nome da autora;

4)- declaração da Secretaria de Educação de Pernambuco, referente aos anos de 1986, 1989 e 1990, indicando a ocupação da autora como agricultora;

5)- declaração do ITR – Imposto Territorial Rural – ano 2001, em nome de terceira pessoa;

Em que pese a documentação apresentada verifica-se que não foi anexado aos autos nenhum documento capaz de comprovar o efetivo labor campesino da parte autora por todo período de carência necessário à concessão do benefício pleiteado, nos termos da legislação previdenciária.

Deveras, nota-se que os documentos acostados aos autos, quais sejam, a CTPS constando apenas a qualificação civil, documentos de unidade de saúde e educação, declaração da Secretaria de Educação de Pernambuco e carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Águas Belas/PE, em nada acrescem o conjunto probatório, não podendo ser aceitos como início de prova material do alegado labor rural pelo período de carência exigível pela legislação previdenciária, sendo que a parte autora não apresentou qualquer documento posterior em seu nome a comprovar a sua permanência nas lides campesinas para fazer jus ao benefício pleiteado na exordial.

Mister apenas esclarecer, quanto à carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Águas Belas/PE, esta só poderia ser considerada como prova de efetivo labor rural caso a parte autora trouxesse, conjuntamente, recibos de pagamento, não sendo suficiente a mera anotação de "pagamento" (ID 131076573). 

Outrossim, no tocante ao ITR – Imposto Territorial Rural, tem-se que tal documento refere-se a terceira pessoa, e demonstra apenas a existência de uma propriedade na qual a parte autora alega ter exercido atividade rural, não fazendo qualquer referência ao efetivo exercício do labor campesino da requerente pelo período de carência, nos termos da legislação previdenciária.

Ademais, a prova oral colhida nos autos mostra-se frágil, não servindo à comprovação do efetivo labor durante o lapso temporal exigido nos termos da legislação previdenciária.

A testemunha Ivaneide Lima da Silva declarou em audiência designada em continuação, que há mais de dez anos a autora trabalha como cuidadora de idosos.

A parte autora, por sua vez, em depoimento pessoal, ora afirmou que apenas trabalhava como rural enquanto estava casada, ora afirmou que permanecia na atividade mesmo divorciada.

Desse modo, não há comprovação efetiva do exercício da atividade rural no período correspondente à carência, pois, à míngua de prova material, a prova oral não confirma objetivamente a vinculação da parte autora ao tempo mínimo necessário de lida rural exigido em Lei.

Com efeito, exsurge dos autos que a parte autora não se desincumbiu do ônus probatório, pois não apresentou documentos  a demonstrar a labuta campesina por ocasião do perfazimento da idade mínima à aposentação, nem tampouco a qualidade de segurada especial durante o período de carência, imediatamente anterior ao requerimento administrativo, em número de meses necessários à concessão da aposentadoria por idade rural, em dissonância com os precedentes cristalizados pelo C. STJ no Tema 642, bem no verbete da Súmula 149.

Na espécie, não há provas materiais a serem corroboradas pelo depoimento das testemunhas. No entanto, considerando-se o teor do Tema 629 STJ, a falta de conteúdo probatório material conduz à extinção sem julgamento de mérito, a teor do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213, de 21/07/1991, por ausência pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, na forma preconizada pelo artigo 485, inciso IV, do CPC.

Honorários advocatícios

Ademais, em atenção ao princípio da causalidade e considerando que a parte autora deu causa à extinção do feito sem julgamento de mérito, deve ser mantida a sua condenação em custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Ante o exposto, de ofício, extingo o feito sem julgamento de mérito, na forma do artigo 485, IV, do CPC, prejudicada a apelação, nos termos da fundamentação.

É o voto.



E M E N T A

 

APELAÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. NÃO COMPROVAÇÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADES RURÍCOLAS NO PERÍODO DE CARÊNCIA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. INSUFICIÊNCIA. EXTINÇÃO SEM MÉRITO. PREJUDICADA APELAÇÃO.

I.Comprovação da idade mínima e o desenvolvimento de atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento (REsp Repetitivo nº 1.354.908) como requisitos para concessão ao benefício previdenciário.

II. A atividade rural deverá ser comprovada por meio de início de prova material, corroborada por prova testemunhal. Precedentes STJ.

III. Os requisitos para concessão do benefício pleiteado não foram preenchidos, especialmente em razão da insuficiência dos documentos juntados aos autos, em dissonância com os precedentes cristalizados pelo C. STJ no Tema 642, bem no verbete da Súmula 149.

V. Evidenciada a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido e regular do processo, afasta-se o julgamento pela improcedência, impondo-se a extinção do feito sem julgamento de mérito, conforme o artigo 485, IV, do CPC, em observância ao Tema 629 do C. STJ.

VI. Apelação prejudicada.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por unanimidade, decidiu, de ofício, extinguir o feito sem julgamento de mérito, na forma do artigo 485, IV, do CPC, prejudicada a apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.